Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | ANA LUÍSA GERALDES | ||
| Descritores: | PROVIDÊNCIA CAUTELAR CAUÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 06/14/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO | ||
| Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
| Sumário: | Deferida uma providência cautelar de restituição provisória de posse, não é admissível a sua substituição por caução, porquanto, a defender-se o contrário, estar-se-ia, por essa via, a neutralizar o direito que o Agravante pretendeu acautelar pondo em causa a própria finalidade da providência. A.L.G. | ||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I – 1. Maria instaurou processo especial de prestação de caução, por apenso à providência cautelar de restituição provisória de posse, contra D Pedindo que o Tribunal julgue adequada e suficiente a caução que oferece no valor de 26.000,00 Euros, para garantia do crédito da Requerente e, consequentemente, que seja ordenada a substituição da providência decretada pela referida caução. Alega para o efeito, e em resumo, que No dia 27-1-06 foi decretada pelo Tribunal “a quo” (na providência cautelar de restituição provisória de posse, instaurada pelo aqui Requerido contra a aqui Requerente) a restituição de posse ao ali Requerente D da fracção autónoma correspondente ao 1º andar “A”, do prédio urbano identificado nos autos, no qual ambos viveram vários anos juntos, em união de facto. A partir da altura em que foi decretada essa restituição passou o Requerente da providência, aqui Requerido, a ter a posse, uso e fruição do andar. Tal providência veio a ser deferida com fundamento no direito de retenção e por se ter considerado demonstrada a titularidade do crédito daquele (ali Requerente) sobre a aqui Requerente (e ali Requerida), em virtude de despesas efectuadas com o pagamento e manutenção da fracção em causa. Ora, nos termos do art. 756º, al. d), do CC, não há direito de retenção quando a outra parte preste caução suficiente, pelo que vem a Requerente, por este meio, prestar caução no valor de 26.000,00 Euros, mediante depósito na CGD. 2. Notificado o Requerido, veio este apresentar a sua oposição, defendendo o entendimento que uma vez decretada a providência cautelar não pode esta ser substituída por caução, a pedido do esbulhador, sob pena de se neutralizar a própria finalidade da providência. Refere ainda que o que pretendeu com a providência cautelar decretada não foi assegurar o seu crédito para com a ora Requerente, mediante o exercício do direito de retenção, mas, ao invés, acautelar o seu direito de habitar o imóvel em causa por ter sido esbulhado da sua posse, até à decisão final a ser proferida na acção principal. E caso a providência cautelar decretada fosse substituída pela caução oferecida, o ora Requerido ficaria sem local para morar, tal como ficou quando foi esbulhado pela ora Requerente, aquando da mudança de fechadura operada por esta. 3. O Tribunal “a quo”, embora sufragando “na íntegra as posições defendidas nos Acórdãos reproduzidos pelo Requerido”, conforme refere expressamente na decisão recorrida, chegou, contudo a solução diversa da defendida por aquele e admitiu a substituição da providência cautelar decretada pela caução oferecida pela Requerente – cf. fls. 44 e segts. 4. Inconformado, o Requerido Agravou, tendo formulado, em síntese, as seguintes conclusões: A. O presente Agravo visa demonstrar que a substituição agora ordenada (da providência cautelar de restituição provisória da posse por caução) não é admissível por frustrar a própria natureza e função do procedimento cautelar tipificado e dos direitos que o mesmo visa acautelar. B. A decisão em apreço, não obstante frisar que resultou como provado que o ora Agravante, após o esbulho violento da casa onde morava, teve que ir morar de favor para casa de familiares, considera que, como não é o direito à habitação do Agravante cuja lesão se visou acautelar com o decretamento da providência, a mesma pode ser substituída por caução. C. Acontece que a lei, ao permitir que um possuidor seja restituído, provisoriamente, à posse que tinha de determinada coisa, da qual foi esbulhado com violência, pretende que a providência funcione como uma sanção à violência do esbulho. D. E pretende também, de acordo com a finalidade do procedimento cautelar, que o Requerente, esbulhado, com violência, da sua posse, a recupere, de imediato, a título provisório, e a mantenha enquanto, a seu devido tempo, não for definida a titularidade do direito. E. Assim sendo, a substituição da providência por caução pode neutralizar a própria finalidade da providência. F. Por outro lado, não pretendeu, o Agravante, com a providência cautelar decretada, assegurar o seu crédito para com a Agravada mediante o exercício do direito de retenção, mas, ao invés, acautelar o seu direito de habitar o imóvel em questão por ter sido esbulhado da sua posse, até ser proferida decisão final na respectiva acção principal. G. Nestes termos, e ao contrário do que foi entendido pelo Tribunal “a quo”, verifica-se que o direito acautelado é o direito de o Agravante permanecer na habitação até à decisão transitada em julgado da acção principal. H. Assim, a caução não pode ser legalmente admitida por frustrar o fim pretendido pela providência ordenada, pelo que deve ser revogada a decisão recorrida. 5. Foram apresentadas contra-alegações no sentido de confirmação da decisão proferida. 6. Corridos os Vistos legais, Cumpre Apreciar e Decidir. II – O Direito: 1. É sabido que são as conclusões formuladas pelo Recorrente, nas suas alegações, que delimitam o objecto do recurso. Será, pois, em função das mesmas e das questões que suscita que será apreciado o seu objecto. 2. Está em causa saber se, uma vez decretada uma providência cautelar de restituição provisória de posse, pode haver lugar à substituição dessa providência por caução oferecida pelo requerido. Curiosamente, quer o Agravante, quer o Tribunal “a quo” citam a mesma jurisprudência, que dizem subscrever, para chegar, in casu, a entendimentos contrários… Por tal facto, e porque também subscrevemos a mesma orientação jurisprudencial, seremos mais sucintos na respectiva fundamentação jurídica, profusamente escalpelizada nos autos, porém, desde já se adianta que a conclusão a que chegámos é em sentido oposto à enveredada pelo Tribunal “a quo” e cuja decisão não pode por nós ser sufragada. Vejamos porquê. 3. A este propósito pode dizer-se que, durante muito tempo, tanto a doutrina, como a jurisprudência, se pronunciaram contra a admissibilidade de substituição da providência cautelar de restituição provisória de posse por caução. (1) Entendia-se, então, que a caução não poderia ser aplicada por falta de previsão normativa. São disso exemplo Alberto dos Reis (2) e Moitinho de Almeida (3) e, mais recentemente, Lebre de Freitas. (4) Na jurisprudência, em defesa desta tese, pode inclusivamente ler-se no Acórdão da Relação de Évora, de 15/4/1999, que a substituição da restituição provisória de posse por caução “frustraria o objectivo que ditou a providência, propiciando-se a cobertura legal à actuação ilícita de quem não olhou a meios para conseguir os seus intentos”… assim se consagrando o “triunfo do direito da força contra a força do direito”... (5) Neste sentido cf. também o Acórdão do STJ, de 18/5/1999, in CJSTJ, T. II, pág. 97. 4. Com a reforma do processo civil de 1995 e a alteração de alguns normativos relativos aos procedimentos cautelares, maxime o teor dos arts. 387º, nº 3, e 392º, nº 1, ambos do CPC, assistiu-se a uma inflexão no sentido da admissibilidade de caução. Nesta matéria, e em sede legal, rege o disposto no art. 387º do CPC. De acordo com este normativo a providência cautelar decretada pode ser substituída por caução adequada, a pedido do requerido, sempre que a caução oferecida, ouvida o requerente, se mostre suficiente para prevenir a lesão ou integrá-la integralmente – cf. seu nº 3. 5. Da análise deste preceito resulta desde logo que: A prestação de caução foi fixada pelo legislador tendo sobretudo em vista compatibilizar os interesses em jogo: por um lado, os do Requerente de ver acautelado o seu direito e por outro, os do Requerido que, sem pôr em causa os direitos daquele, procura igualmente acautelar os seus, através da fixação de um valor que se mostre suficiente para prevenir a lesão ou repará-la integralmente. Caução a prestar a pedido de uma das partes. Fora deste contexto, em que tal caução não foi solicitada pelo Requerido, o Tribunal apenas a pode determinar nos termos estabelecidos no art. 390º, nº 2 do CPC. Ou seja: sempre que o julgue conveniente em face das circunstâncias concretas. Sendo certo que, em matéria de procedimentos cautelares nominados, essa substituição por caução por iniciativa do Tribunal, e sem audiência do Requerido, só é permitida quanto ao arresto e ao embargo de obra nova, por força do disposto no nº 2 do art. 392º do CPC. Ressalva que se reporta, literalmente, aos procedimentos cautelares nominados e mesmo relativamente a estes só aos que enuncia: arresto e embargo de obra nova. Quanto aos restantes e ao procedimento cautelar comum somos remetidos para o princípio inserido no art. 387º, nº 3, do CPC, que não pode de modo algum ser interpretado como permitindo, de forma automática e irrestrita, a substituição da providência por caução. 6. Com efeito, como adverte Abrantes Geraldes, em tal circunstância, e uma vez solicitada a substituição pelo Requerido da providência, e ouvido o respectivo Requerente, ponto é que “o juiz adquira a convicção de que, pela sua forma e valor e pela natureza dos interesses em jogo, a caução constitua medida adequada e suficiente para tutelar a posição jurídica que pela restituição provisória da posse se pretendia obter”. (6) O que significa, de acordo com este Autor, a sujeição de uma tal medida substitutiva a um apertado condicionalismo que não prejudique os interesses que através da medida se pretendem acautelar. (7) Assim, a decisão final “deve projectar o resultado derivado da análise casuística das circunstâncias realmente verificadas, só possível em face do caso concreto e depois de ponderadas a natureza do direito, a concreta situação de risco, a avaliação das consequências da medida na esfera jurídica do requerido e as potencialidades que a caução demonstra para efeitos de eliminação concreta dos prejuízos que com a medida cautelar se pretendem prevenir”. (8) Só após ponderadas as respectivas circunstâncias é que o Tribunal está habilitado a decidir. Em conclusão: pode dizer-se que só a análise casuística permitirá encontrar a solução mais adequada, a qual deve sempre atender aos interesses subjacentes à situação a tutelar, de forma a não defraudar, por via do instituto da caução, o objectivo que presidiu à providência cautelar. Destarte, confrontado o Tribunal com a questão de saber se deve ou não autorizar a substituição da providência cautelar de restituição provisória de posse por caução, a resposta há-de buscar-se na ponderação concreta que se efectue relativamente aos interesses em conflito. Ou melhor: importa aferir, in concreto, em que medida é que a caução se mostra ou não adequada a assegurar o direito que através da providência que foi determinada se pretendeu desde logo tutelar. 7. Posto isto e reportando-nos ao caso sub judice constatamos que: O Tribunal “a quo” decretou a providência de restituição provisória de posse aludindo apenas à tutela possessória do Requerente assente no seu direito de retenção pelo crédito resultante de despesas feitas com e na fracção. Apesar de existirem factos provados que permitiam outra fundamentação mais consolidada, o Mº Juiz “a quo” não lhes atribuiu relevo em tal decisão. Todavia, a leitura da decisão da matéria de facto provada deixa clara uma posição do ali Requerente (e aqui Requerido) da providência cautelar bem mais sólida do que a que faria supor a decisão recorrida. Senão, atentem-se nos seguintes factos provados e que constam dos autos: - O Requerente e Requerida encetaram um relacionamento amoroso estável em 1968, do qual resultou o nascimento de uma filha, actualmente já casada e independente (factos provados e inseridos no ponto 3); - Contudo, antes da dissolução judicial dos seus vínculos matrimoniais, e em 1983, o Requerente e a Requerida decidiram viver juntos em comunhão de mesa, leito e habitação, situação que se manteve até Março de 2002 (factos do ponto 5); - Durante esses catorze anos, o Requerente e a Requerida construíram uma comunhão plena de vida em comum, cada um contribuindo com bens e afecto para a manutenção da união (factos do ponto 6); - Em 1997, o Requerente e a Requerida decidiram comprar casa em Lisboa, local de residência, à altura, de ambos (ponto 7); - Assim, foi celebrada, em 7 de Fevereiro de 1997, escritura pública de compra e venda da fracção autónoma identificada nos autos; - O referido prédio urbano foi, então, adquirido pelo valor de Esc. 11.159.02$00, equivalente a 55.512,50 Euros; - Para a aquisição do imóvel foi contraído, junta da Companhia Geral de Crédito Predial Português, S.A. (CPP), «um empréstimo de Esc. 8.000.000$00, no Regime de Crédito Bonificado...», amortizável no prazo de 30 anos; - O R. D contribuiu, para a aquisição da casa de morada de família, com montante não apurado e o Requerido com o valor remanescente. - O Requerente decidiu, movido pelos fortes laços de afecto que desse há muito o uniam à Requerida e por nunca equacionando o terminus de uma relação de catorze anos, permitir que fosse esta a única proprietária de tal imóvel; - Por razões de maior facilidade nas negociações relativas à contracção do empréstimo bancário (para compra do imóvel) ficou a Requerida a única a figurar no contrato de mútuo caem hipoteca; - Contudo, o Requerente fez questão que o imóvel não representasse qualquer encargo para a Requerida, pelo que sempre suportou sozinho – as mensalidades atinentes ao reembolso do empréstimo. - O Requerente efectuou depósitos na conta da Requerida n.º 0150055293600 junto da Caixa Geral de Depósitos, para que aquela procedesse ao pagamento das prestações de amortização do empréstimo bancário contraído junto do então CPP; - Ademais, foi o Requerente que comprou e pagou o mobiliário do imóvel; - Foi, igualmente, o Requerente quem suportou parte das despesas de água, luz, gás, telefone e TV cabo, bem como o condomínio do prédio. - Em Janeiro de 2002, a Requerida comprou uma casa no Algarve, (…), Tavira; - Dois meses depois, em Março de 2002, e ao fim de todos esses anos de vida em comum, a Requerida resolveu terminar a relação que os unia, abandonando aquela que fora, durante a união do casal, a respectiva casa de morada de família, tendo-se mudado para a residência que adquirira em Tavira; - Desde essa data, e até ao passado dia 22 de Dezembro de 2005, o R. D viveu sozinho no referido imóvel, continuando a pagar todas as despesas inerentes ao mesmo, incluindo as prestações do empréstimo contraído junto do CPP; - Sucede que, em meados de Setembro de 2004, a Requerida contactou o Requerente, comunicando-lhe que deveria abandonar o imóvel, pois pretendia vendê-lo; - O R. D deslocou-se a Inglaterra, a convite e expensas do seu filho, actualmente a trabalhar e residir em Londres, para com este passar a quadra natalícia; - Sucede que a R. A mandou mudar as fechaduras de acesso ao imóvel; - O R. D chegou a casa, no dia 2 de Janeiro de 2006 e deparou-se com tal cenário, constatando que lhe fora efectivamente vedado o acesso ao seu próprio apartamento, apartamento esse que já habitava desde 1997; - Neste momento (na data da propositura da providência cautelar de restituição provisória de posse) o R. D não tem acesso à fracção; - Não tem acesso ao seu vestuário (incluindo agasalhos), aos seus bens de higiene pessoal (correio, escova de dentes,…), aos seus medicamentos pré-comprados e demais bens pessoais e de valor sentimental; - Encontra-se, actualmente (àquela data), o R. D a viver de favor em casa de familiares; - Sobrevive com os bens que levou aquando da visita ao seu filho, e com outros que familiares seus lhe vão emprestando; - O Requerente é hoje um reformado e aufere uma pensão no valor de €407,48 e sofre de doença do foro cardíaco, tendo sido já submetido a duas intervenções cirúrgicas às coronárias. 8. Em face do que se provou na providência cautelar de restituição provisória de posse, com destaque para a prova sumária na parte em que se deu como provado que o R. D suportara as despesas de aquisição e outras, relativas à fracção aqui em causa, e que vivera nessa fracção, durante anos, em união de facto, tendo aí constituído a sua habitação conjuntamente com a Requerida, não se pode deixar de, seriamente, ponderar todo este acervo fáctico e o que o mesmo representa. Daí que consideremos incorrecto que se acentue, como o fez a decisão recorrida, tão só o crédito do R. D relativo ao pagamento de outras despesas efectuadas com e na fracção. É que não se está apenas perante um mero crédito por parte do R., acessório do direito de retenção, e capaz de conferir, por extensão, a tutela possessória, mas antes perante um verdadeiro possuidor (pelo menos), em regime de composse com a R. Adelaide Almeida. Situação a que surge ainda associado o facto, cujo relevo foi completamente ignorado na decisão recorrida, de a fracção esbulhada constituir a habitação do Agravante e o único local que lhe garante o tecto necessário para viver. Neste contexto, a posição do Agravante não pode ser encarada com a displicência que transparece da decisão agravada, quer no que concerne à composse, quer no que respeita ao direito de habitação, porquanto ambos decorrem dos factos sumariamente provados nos autos, devendo ser feita a ponderação de tais interesses quando se trata de averiguar se em que medida a caução prestada é suficiente para garantir os direitos que com a providência de restituição de posse se visaram acautelar. Assim, se a ponderação exclusiva da qualidade de credor do Agravante tornava defensável a admissão da substituição da providência por prestação de caução, designadamente através do depósito de uma quantia igual ao valor do crédito reconhecido, já tal medida substitutiva se apresenta insuficiente e incapaz de garantir simultaneamente as suas outras qualidades de maior relevo: a de verdadeiro possuidor (compossuidor) e a de titular de um direito de habitação, situações jurídicas comprometidas seriamente com o acto de esbulho praticado pela Agravada. Pelo que, in casu, não é admissível a prestação de caução como substituição da providência cautelar de restituição provisória de posse já decretada pelo Tribunal “a quo”. (9) Defender-se o contrário seria contribuir para a neutralização do direito que o Agravante pretendeu acautelar, pondo em causa a própria finalidade da providência. Destarte, resulta claro que a fundamentação veiculada na decisão recorrida não pode prevalecer porque assenta no pressuposto que a restituição provisória de posse foi decretada apenas para assegurar o direito de retenção do ora Agravante e como forma de garantia do seu crédito, em detrimento do que é essencial e se quis, de facto, acautelar nos presentes autos: a composse e o direito à habitação do ora Agravante. 9. Ora, conforme se deixou antever em ponto anterior, ao permitir que um possuidor seja restituído, provisoriamente, à posse que tinha de determinada coisa, da qual foi esbulhado com violência, pretende a lei, obviamente, que a providência funcione como uma sanção à violência do esbulho. A ratio inerente ao procedimento de restituição provisória de posse radica na possibilidade conferida ao Requerente, esbulhado, com violência, da sua posse, de a recuperar, de imediato, a título provisório, e de a poder manter enquanto, a seu devido tempo, não for definida a titularidade do direito. E tanto assim que a lei permite o seu decretamento desde que o Requerente prove que tinha a posse da coisa e que dela foi esbulhado com violência, caso em que o Juiz pode até determiná-la sem citação ou audiência do Requerido – cf. art. 394º do CPC. Ora, ao admitir-se, em tal circunstância, a substituição da providência por caução a consequência acabaria por ser a de, por essa via, neutralizar a própria finalidade da providência. O que não faria qualquer sentido, porquanto, ao requerer a restituição provisória de posse do bem imóvel o que se pretende é a retoma imediata da posse desse bem, traduzindo tal retoma para o Requerente um valor que nenhuma caução pode substituir. (10) 10. Pelo que, e sem necessidade de mais considerações, se concede provimento ao Agravo, revogando-se a decisão que admitiu a prestação de caução, ficando, em consequência, a subsistir a providência de restituição provisória de posse oportunamente decretada. III – Decisão: - Termos em que se acorda em dar provimento ao presente Agravo, revogando-se a decisão recorrida que admitiu a prestação de caução, ficando a subsistir a providência de restituição provisória da posse oportunamente decretada. - Custas pela Agravada. Lisboa, 14 de Junho de 2007 Ana Luísa de Passos Geraldes (Relatora) Fátima Galante Ferreira Lopes _____________________ 1 No âmbito do regime processual civil anterior a substituição por caução só estava prevista nas situações assinaladas por Abrantes Geraldes in “Temas da Reforma do Processo Civil” – “Procedimento Cautelar Comum”, Vol. III, pág. 255 e segts. 2 Veja-se, nesse sentido, este Autor in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, pág. 674. 3 Cf. a posição deste Autor in “Restituição da Posse e Ocupação de Imóveis”, 2ª Ed., pág. 125 4 Este Autor apenas prevê a ressalva de eventual acordo entre as próprias partes… – cf. “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, pág. 81. 5 Acórdão inserido no BMJ, 486º, pág. 376. 6 Neste sentido António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil” – “Procedimentos Cautelares Especificados”, IV Volume, págs. 60 e segts. 7 Ibidem. Cf. também, de Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil” – “Procedimento Cautelar Comum”, III Vol., págs. 254 e segts. 8 Ibidem. 9 No mesmo sentido, Abrantes Geraldes, que expressamente exemplifica: “…parece descabida a substituição por caução quando estiver em causa a posse que colida com o direito à habitação” – ibidem, III Vol., pág. 60. 10 Cf. os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 19/06/2001, e do STJ, de 18/05/1999, in www.dgsi.pt. |