Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
55/07.7PASCR.L2-5
Relator: JOSÉ ADRIANO
Descritores: PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
REVOGAÇÃO
NULIDADE INSANÁVEL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/14/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: Iº O arguido tem de ser pessoalmente notificado para se pronunciar relativamente à revogação da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade;
IIº Não tendo o arguido sido ouvido, nem pessoalmente notificado para se pronunciar acerca dessa revogação, foi cometida a nulidade insanável prevista na alínea c) do art.119, do Código de Processo Penal, independentemente do motivo da revogação;
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
1. Em processo comum que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Santa Cruz e após julgamento, foi o arguido A... condenado, por sentença de 14/12/2009[1], como co-autor material de um crime consumado de contrafacção de moeda, previsto e punível pelo artº 262.º, do Código Penal, na pena especialmente atenuada de 14 (catorze) meses de prisão, substituída pela prestação de 420 (quatrocentos e vinte) horas de trabalho a favor da comunidade.
Por despacho de 19/10/2011 (fls. 509), foi revogada a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e determinado o cumprimento efectivo da pena de 14 meses de prisão.

2. Não se conformando com esta última decisão, dela interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões:
1. ….
2. ….

3. Respondeu o Ministério Público, concluindo pela manutenção da decisão recorrida, negando-se provimento ao recurso.
4. Admitido este, subiram os autos ao Tribunal da Relação, tendo a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitido douto parecer no sentido da improcedência, manifestando integral concordância com a resposta apresentada pelo MP em 1.ª instância.
5. Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, nada mais adiantou o recorrente.
6. Após exame preliminar foram colhidos os vistos legais e teve lugar a conferência.
***
II. Fundamentação:
1. Conforme Jurisprudência uniforme nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respectiva motivação que fixam o objecto do recurso, sem prejuízo da apreciação das demais questões que sejam de conhecimento oficioso e de que seja ainda possível conhecer.
No caso sub-judice, o recurso está limitado, pela sua natureza, a uma única questão, sobre a qual versa a decisão impugnada: se estão ou não verificados os pressupostos para a revogação da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade aplicada ao recorrente em substituição da pena de 14 meses de prisão.
*
2.
Vejamos, antes de mais, o teor do despacho recorrido:
Atenta a promoção que antecede, compulsados os autos verifico que A... foi condenado, por douta sentença já transitada em julgado, na pena de 14 (catorze) meses de prisão, substituída por 420 (quatrocentos e vinte) horas de trabalho a favor da comunidade.
Dispõe a al. a) do n.º 2 de artigo 59.° do Código Penal (CP) que "(O) tribunal revoga a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ordena o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença se o agente, após a condenação se colocar intencionalmente em condições de não poder trabalhar.”
Vem o I. Mandatário do condenado indicar aos autos que aquele regressará à RAM apenas no p. dia 2 de Janeiro de 2012, e somente por um período de 2 (duas) semanas.
Ora, conforme bem referido pelo Ministério Público na sua promoção entendemos que tal período de "férias" e a data de regresso são manifestamente incompatíveis com o cumprimento da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade com a qual o arguido concordou (artigo 58.º, n.º 5 do C. Penal) e na qual foi condenado.
Solicitado à Direcção-Geral de Reinserção Social - Madeira, a elaboração de relatório, nos termos do artigo 490.º, n.° 2, do CPP e do artigo 5.º- ex vi do artigo 15.º, ambos de Decreto-lei n.° 375/97, de 24 de Dezembro, veio esta Direcção comunicar a impossibilidade de realização do plano uma vez que o arguido emigrou para Inglaterra.
Destarte, por facto imputável ao arguido e a ele tão só, porquanto sabendo o condenado do teor da pena aplicada, com a qual concordou, colocou-se, intencionalmente, em condições de não a poder cumprir ao ausentar-se do país, não se mostrando assim reunidas as condições para o cumprimento da referida pena substitutiva, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 59.º, n.º 2, al, a) de CP revogo a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade aplicada e em consequência determino o cumprimento efectivo da pena de 14 meses de prisão aplicada ao condenado A....
Notifique, sendo o arguido pessoalmente.”

Face à sua relevância para a decisão do presente recurso, passamos a transcrever os artigos 58.º e 59.º, do Código Penal, na sua actual redacção:
Artigo 58.º
Prestação de trabalho a favor da comunidade
1 -   Se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2 -   A prestação de trabalho a favor da comunidade consiste na prestação de serviços gratuitos ao Estado, a outras pessoas colectivas de direito público ou a entidades privadas cujos fins o tribunal considere de interesse para a comunidade.
3 -   Para efeitos do disposto no n.º 1, cada dia de prisão fixado na sentença é substituído por uma hora de trabalho, no máximo de 480 horas.
4 -   O trabalho a favor da comunidade pode ser prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como nos dias úteis, mas neste caso os períodos de trabalho não podem prejudicar a jornada normal de trabalho, nem exceder, por dia, o permitido segundo o regime de horas extraordinárias aplicável.
5 -   A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade só pode ser aplicada com aceitação do condenado.
6 -   O tribunal pode ainda aplicar ao condenado as regras de conduta previstas nos n.ºs 1 a 3 do artigo 52.º, sempre que o considerar adequado a promover a respectiva reintegração na sociedade.

Artigo 59.º
Suspensão provisória, revogação, extinção e substituição
1 -   A prestação de trabalho a favor da comunidade pode ser provisoriamente suspensa por motivo grave de ordem médica, familiar, profissional, social ou outra, não podendo, no entanto, o tempo de execução da pena ultrapassar 30 meses.
2 -   O tribunal revoga a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ordena o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença se o agente, após a condenação:
a) Se colocar intencionalmente em condições de não poder trabalhar;
b) Se recusar, sem justa causa, a prestar trabalho, ou infringir grosseiramente os deveres decorrentes da pena a que foi condenado; ou
c) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
3  - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 57.º
4 -   Se, nos casos previstos no n.º 2, o condenado tiver de cumprir pena de prisão, mas houver já prestado trabalho a favor da comunidade, o tribunal desconta no tempo de prisão a cumprir os dias de trabalho já prestados, de acordo com o n.º 3 do artigo anterior.
5 -   Se a prestação de trabalho a favor da comunidade for considerada satisfatória, pode o tribunal declarar extinta a pena não inferior a setenta e duas horas, uma vez cumpridos dois terços da pena.
6 -  Se o agente não puder prestar o trabalho a que foi condenado por causa que lhe não seja imputável, o tribunal, conforme o que se revelar mais adequado à realização das finalidades da punição:
a) Substitui a pena de prisão fixada na sentença por multa até 240 dias, aplicando -se correspondentemente o disposto no n.º 2 do artigo 43.º; ou
b) Suspende a execução da pena de prisão determinada na sentença, por um período que fixa entre um e três anos, subordinando -a, nos termos dos artigos 51.º e 52.º, ao cumprimento de deveres ou regras de conduta adequados.

Por força do art. 498.º, n.º 3, do CPP, à revogação da prestação de trabalho a favor da comunidade é aplicável o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 495.º, do mesmo Código - disposição que está inserida no capítulo respeitante à “execução da pena suspensa” -, ali estando consignado que, para efeitos, nomeadamente, de revogação da medida,  “o tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, obtido o parecer do Ministério Público e ouvido o condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão”.

Norma que vem dar resposta directa a uma das questões colocadas pelo recorrente e abordada em anteriores despachos proferidos no processo - cfr. fls. 427, 430 e 471 a 473, onde, em apreciação de um requerimento do mandatário do arguido no sentido de ser pessoalmente notificado o seu constituinte, se tomou posição expressa no sentido de que basta a notificação ao respectivo mandatário), que é a de saber se o arguido tinha ou não de ser pessoalmente notificado para se pronunciar relativamente à revogação da medida substitutiva ou se a lei se contentaria com a notificação feita ao seu mandatário, como aconteceu no presente caso. Daí que, o recorrente tenha vindo arguir a existência de nulidade insanável, nos termos da alínea c), do art. 119.º, do CPP, precisamente com o argumento de que não foram asseguradas as condições para o exercício efectivo do direito de defesa do arguido, por não ter sido ouvido.
Na resposta ao recurso, o Ministério Público pronunciou-se sobre tal questão nos seguintes termos:
No que à audição presencial do arguido concerne, perfilhamos o entendimento seguinte:
É hoje entendimento unânime que a não audição presencial do arguido, em violação do disposto no n° 2 do artigo 495.° do CPP, constitui a nulidade insanável cominada na alínea c) do artigo 119.° do mesmo diploma legal.
Deste modo, verifica-se que é, de facto, indiscutível a aplicação do disposto no artigo 4950, n.o 2 do C.P.Penal, porquanto se entende que qualquer decisão que diga respeito ao arguido deve ser precedida da sua audição prévia – inclusivamente a de revogação da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade – quando tal se mostre viável e possível.
Contudo, essa obrigatoriedade de audição presencial não pode ser encarada em termos absolutistas, sem qualquer tipo de restrição. Basta para o efeito pensar na hipótese verificada nos autos de o arguido se encontrar, concomitantemente, na impossibilidade de, não só não prestar a pena substitutiva como, bem assim, na impossibilidade de ser ouvido em tempo útil, atenta a ausência do mesmo em território britânico.
Nesta hipótese, caso assim se entendesse, ficaria de todo inviabilizada a resposta cabal por parte do sistema punitivo, “perante quer o impedimento tanto da execução da pena de substituição (prestação de trabalho a favor da comunidade), como da pena principal (prisão), solução, de todo em todo, irrazoável, para não dizer absurda, e que o direito manifestamente não postula (neste sentido, vide Acórdão da Relação de Coimbra de 13 de Outubro de 2010, in www.dgsi.pt).
Importa ainda referir que, no caso em apreço nestes autos, o Tribunal a quo criou as condições para o efectivo exercício do direito de defesa por parte do condenado, logrando por isso proferir uma decisão ponderada e proporcional, pelo que se nos afigura que o recurso do recorrente não poderá merecer provimento, pelo que o douto despacho recorrido não deverá ser alterado.
Pelo exposto, entendemos não ter existido qualquer violação quer do artigo 495.º n.° 2, ex vi artigo 498.º, n.o 3, do C.P.Penal, quer da norma constitucional do n.º 1 do artigo 32.° da CRP, não se verificando, consequentemente, a nulidade (insanável), prevista na alínea e) do artigo 119.° do C.P.Penal, arguida pelo recorrente.

O pressuposto essencial para a substituição da pena de prisão pela de prestação de trabalho é o de que esta realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
A subsequente revogação desta última pena tem subjacente um juízo contrário – de que já não é possível realizar aquelas finalidades -, o qual decorre de uma determinada atitude do condenado, demonstrativa de que houve culpa da sua parte na frustração do objectivo que se pretendia alcançar com a medida não detentiva, elencando a lei os casos concretos em que tal revogação pode ter lugar:
- ter-se colocado o arguido em condições de não poder trabalhar;
- recusar-se, sem justa causa, a prestar trabalho ou infringir grosseiramente os deveres decorrentes da pena;
- cometer crime pelo qual venha a ser condenado.
Porquanto, se o trabalho não puder ser prestado por razões não imputáveis ao condenado, então não poderá ser revogada a pena de prestação de trabalho, mas antes substituída por multa ou suspensa a pena de prisão determinada na sentença (n.º 6 do art. 59.º, do CP).
Daí que, para aferir da culpa do arguido na não prestação do trabalho, ou seja, para se poder concluir se essa não prestação lhe é imputável ou não, impõe-se que aquele seja ouvido sobre as respectivas razões subjacentes ao incumprimento. A única pessoa que pode esclarecer o tribunal acerca dessas razões é o próprio condenado.
Razão pela qual a lei impõe que o mesmo seja previamente ouvido no caso de revogação da medida não detentiva, pois tal revogação implica o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença. Trata-se de uma modificação substancial na posição processual do arguido, relativamente à qual este não pode deixar de ser ouvido. Para o efeito, terá de ser convocado pelo tribunal, ou, no mínimo, notificado para se pronunciar sobre tal matéria. O importante é que lhe seja dada efectiva oportunidade de exercer o seus direitos de defesa, contraditando as razões avançadas na promoção do MP para a revogação da pena não detentiva. Faltando à diligência para que é convocado e nada dizendo no prazo concedido para o efeito, não deixará de estar cumprido o ónus de audição, o arguido é que optou por não querer ser ouvido.
A jurisprudência dos nossos tribunais superiores, nomeadamente desta Relação de Lisboa, é maioritária no sentido de que a não audição do arguido em caso de revogação da suspensão – e, por remissão do art. 498.º, n.º 3, já mencionado, também em caso de revogação da prestação de trabalho a favor da comunidade – constitui a nulidade insanável prevista na alínea c) do art. 119.º, do CPP, independentemente do motivo da revogação – a título exemplificativo, veja-se a jurisprudência citada por Paulo Pinto de Albuquerque, “Comentário do Código de Processo Penal”, pág. 1250, em anotação ao art. 495.º.
Diremos, porém, que a invalidade do acto não estará no facto de o arguido não ter sido ouvido quanto à revogação, mas no facto de não lhe ter sido dada oportunidade de se fazer ouvir ou de simplesmente se pronunciar sobre tal matéria. Para tal, terá de ser pessoalmente notificado, sob pena de não se considerar satisfeita aquela exigência legal – versando um caso de exigência de notificação pessoal da decisão de revogação da suspensão ao arguido, de molde a garantir um efectivo direito ao recurso previsto no art. 32.º, n.º 1, da CRP, sob pena de violação desta norma, veja-se o acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 422/05, onde se tomou posição no sentido de que nem a notificação feita por via postal simples, para a residência constante do TIR, garantiria aquele direito, por não subsistir tal medida de coacção após o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Não tendo o arguido A... sido ouvido, nem pessoalmente notificado para se pronunciar acerca da revogação da prestação de trabalho a favor da comunidade, foi efectivamente cometida nulidade, que acarreta a anulação dos actos subsequentes, incluindo o próprio despacho recorrido.
Ainda que, em divergência da jurisprudência acima mencionada (cfr. nomeadamente, o Ac. da Rel. de Évora de 22/02/2005, CJ, tomo I de 2005, pág. 267), se entenda que a situação descrita não configura a invocada nulidade insanável, prevista o art. 119.º, al. c), do CPP, por ausência de cominação expressa nesse sentido e face ao princípio da legalidade do art. 118.º, n.º 1 do CPP, nem se tratando de mera “irregularidade que afecta a decisão da causa”, nos termos do art. 123.º, n.º 2, do CPP (como defende o Ac. da Rel. de Évora, de 8/7/03, CJ, tomo IV/03, pág. 253), estaríamos, pelo menos, perante nulidade por omissão de diligência essencial à descoberta da verdade, prevista no art. 120.º, n.º 2 al. d) do CPP, a qual foi oportunamente invocada.
E não se diga, como o faz o MP na sua resposta ao recurso, que aquela notificação deve ser dispensada no presente caso pelo facto de o arguido residir no estrangeiro. Não é pela circunstância de o arguido residir e trabalhar no estrangeiro que podem ser reduzidos ou eliminados os correspondentes direitos de defesa.
Por outro lado, tem a revogação como pressuposto um facto imputável ao arguido, do qual se extraia que este teve culpa no não cumprimento da sanção imposta.
A revogação foi determinada com base na alínea a) do n.º 2 do art. 59.º, do CP, ou seja, porque o arguido se colocou “intencionalmente em condições de não poder trabalhar” ao ausentar-se do país e na medida em que se prevê o regresso de férias à Madeira, em 2 de Janeiro de 2012 e apenas por duas semanas, o que é incompatível com o cumprimento da pena.
É certo que a pena de substituição foi imposta com o consentimento do arguido. Todavia, também é certo que o tribunal tinha conhecimento da actual situação do arguido, que vivia e trabalhava no estrangeiro mesmo antes do julgamento, constando da própria sentença, na matéria de facto provada, que o arguido A... “é empregado de mesa, exercendo a sua actividade profissional em Inglaterra” e “desloca-se regularmente a Portugal, durante as férias e quando não está a trabalhar”.
Por isso, o arguido não se colocou após a condenação em condições de não poder cumprir a pena de prestação de trabalho, a verdade é que não houve qualquer modificação na situação do arguido após tal condenação, tendo o tribunal, no momento em que decretou a pena não detentiva, perfeita noção da dificuldade que seria cumprir uma tal pena em Portugal, residindo e trabalhando o arguido em Inglaterra. Porque, tal cumprimento ficaria, desde logo, limitado ao período de férias do arguido - as de um ano serão seguramente insuficientes para o cumprimento de toda a pena - , já que a própria lei protege o condenado que trabalha, determinando que o trabalho a favor da comunidade pode ser prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como nos dias úteis, mas neste caso os períodos de trabalho “não podem prejudicar a jornada normal de trabalho, nem exceder, por dia, o permitido segundo o regime de horas extraordinárias aplicável”, sendo certo que, não sendo exigível que o arguido se desloque de Inglaterra a Portugal todos os fins de semana ou nos dias em que tem folga semanal, para aquele cumprimento, muito menos será que se despeça do emprego ou corra o risco de ser despedido por ausência prolongada em Portugal, ainda que para cumprir a pena em que foi condenado.
Obviamente que, em tais circunstâncias, o cumprimento da pena de prestação de trabalho só seria possível após prévia combinação com o arguido quanto à respectiva disponibilidade no que concerne a férias ou eventual licença sem vencimento, a combinar com a sua entidade patronal. O que, mais uma vez, só seria possível com a notificação pessoal do arguido para esclarecer como pretendia cumprir.
Por isso, se o arguido não se colocou intencionalmente em condições de não trabalhar – expressão utilizada pelo art. 59.º, n.º 2 al. a), como pressuposto para a revogação decretada - , já que, objectivamente, o arguido continua a poder trabalhar e efectivamente trabalha, nem se ausentou para o estrangeiro para se eximir ao cumprimento da pena, pois já residia e trabalhava na Inglaterra antes da condenação, nem se recusou, por enquanto, sem justa causa, a prestar o trabalho, nem há notícia de ter cometido outros crimes, então é de concluir que não se verificam, por ora, os pressupostos que podem conduzir à revogação da pena.
Não pode, pelas razões expostas, subsistir o despacho recorrido, que revogou a prestação de trabalho a favor da comunidade sem ter ouvido o arguido e sem que se verifiquem, por ora, os pressupostos de tal revogação.
Razão pela qual é o recurso procedente.

III. Decisão:
Nos termos expostos, julga-se procedente o presente recurso do arguido A..., revogando-se a decisão recorrida.
Sem custas, por não serem devidas.
Notifique.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2012

Relator: José Adriano;
Adjunto: Vieira Lamim;
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[1]  Transitada em julgado.