Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1572/18.9YRLSB.L1-4
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: GREVE
PROFESSORES
SERVIÇOS MÍNIMOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/17/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. O direito de greve só deve ser sacrificado no mínimo indispensável.
2. A obrigação de recolha, pelo diretor de turma, ou de quem o substitua, em momento anterior ao da reunião do Conselho de Turma, de todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno, esvazia o direito de greve, traduzindo-se numa imposição ilegal de serviços mínimos se essa reunião tem que realizar-se em período de greve.
3. A decisão que impõe tal prestação viola o princípio da proporcionalidade.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

AAA), titular do NIPC n° (..), com sede na Rua (..) Lisboa, BBB, titular do NIPC n° (..), com sede em (..) Lisboa, CCC, titular do NIPC n° (..), com sede na Avenida (..)Lisboa, DDD, titular do NIPC n° (..), com sede na (..)Lisboa, EEE, titular do NIPC n° (…) com sede na (…) Lisboa, FFF, titular do NIPC n° (…), com sede na (…) Lisboa, GGG titular do NIPC n° (…), com sede na Rua (…) Lisboa, HHH,  titular do NIPC n°(…), com sede na (…) Lisboa, III, titular do NIPC n° (…), com sede na (…) Lisboa, JJJ, titular do NIPC n° (…), com sede na (…) Carnaxide, recorrentes nos autos à margem identificados, não se conformando com o Acórdão nos mesmos proferido, no dia 26 de junho de 2018 vêm, ao abrigo do artigo 22° do Decreto-Lei n° 259/2009, de 25 de novembro, por remissão do artigo 405° da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, interpor recurso de apelação.
Pedem a revogação do acórdão arbitral.
 Fundam-se nas seguintes conclusões:
1 - O presente recurso é interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral, no dia 26 de junho de 2018, que determinou a fixação de serviços mínimos a cumprir na greve convocada pelas associações sindicais recorrentes para os dias 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11, 12 e 13 de julho de 2018.
2 - Entendem as recorrentes que os serviços mínimos fixados pelo referido Acórdão se encontram feridos de ilegalidade e de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 18° e 57° da Constituição e do artigo 397° n° 2 d), da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
3 - De facto, os serviços mínimos fixados pelo douto Acórdão recorrido obrigam à presença de metade mais um dos membros nos Conselhos de Turma, obrigam os Diretores de Turma a recolher previamente junto dos colegas que aderiram à greve os documentos de avaliação dos alunos destes docentes e obrigam estes últimos a fornecer tais elementos, o que significa que nenhum destes docentes pode fazer greve.
4 - Por sua vez, os docentes que pretendam fazer greve têm de entregar os documentos ao Diretor de Turma ou a quem o substitua o que significa que, encontrando-se em greve, anteriormente a esta, já prestaram o trabalho que não pretendiam realizar, através do exercício do direito à greve.
5 - O facto de nenhum dos docentes grevistas ficar de fora dos serviços mínimos fixados, configura o esvaziamento integral do direito à greve já que este último ficou injustificadamente comprimido pelo outro direito fundamental em confronto (direito à Educação).
6 - Tendo a greve em questão sido decretada para um período de apenas 10 dias, não se alcança qualquer fundamento para justificar a existência de uma necessidade social impreterível cuja satisfação se sobreponha ao exercício legítimo do direito à greve.
7 - Ainda mais, quando não ficou provado que não se podiam realizar reuniões dos Conselhos de Turma em data posterior à do fim da greve.
8 - Mesmo que se concluísse que a greve em questão põe em causa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, que tinham que ser asseguradas através da fixação de serviços mínimos, ainda assim os que foram fixados pelo Acórdão recorrido, são claramente os desadequados para alcançar tal objetivo.
9 - Para além dos serviços mínimos obrigarem, como se demonstrou, os Diretores de Turma a recolher os elementos de avaliação dos alunos junto dos professores que vão aderir à greve sendo estes obrigados e entregar tais elementos, o Acórdão referido também obriga ilegalmente a presença nas reuniões dos Conselhos de Turma de metade mais um dos seus membros.
10 - Tal determinação também enferma de ilegalidade já que a mera fixação dos serviços mínimos não garante que as deliberações a tomar pelos Conselhos de Turma, no período em greve, reúnam o voto favorável da maioria absoluta dos seus membros como é exigido para que tais deliberações sejam válidas e produzam efeitos.
11 - A obrigação da presença de metade mais um dos membros do Conselho de Turma, prevista nos preceitos legais identificados no Acórdão requerido (artigo 19° n° 8, da Portaria n° 243/2012, de 10 de agosto e artigo 23° n° 5 do Despacho Normativo n° 1-F/2016, de 5 de abril) só se obtêm se numa votação concreta, votarem a favor ou votarem contra metade mais um dos professores que compõem o Conselho de Turma e não apenas aqueles que se encontram presentes.
12 - Ou seja, mesmo dando cumprimento aos serviços mínimos não fica garantida a validade das deliberações tomadas já que basta que um docente a cumprir esses serviços mínimos vote contra o sentido dos votos de todos os restantes para que não seja obtido o quorum deliberativo exigido (maioria absoluta dos membros que compõem o Conselho).
13 - A greve em questão não acarreta, assim, mais do que os normais transtornos que qualquer greve gera às pessoas pela mesma abrangidas uma vez que não atenta irremediavelmente contra o direito em confronto e não provoca danos irreparáveis.
14 - Os serviços mínimos fixados pelo Acórdão recorrido, violam deste modo, os princípios da proporcionalidade, da adequação e da necessidade por porem em causa o conteúdo essencial do direito à greve plasmado no artigo 57° da Constituição.
15 - O douto Acórdão recorrido encontra-se assim, ferido de ilegalidade e inconstitucionalidade por violação dos artigos 18° e 57° da Constituição e do artigo 397° n° 2 d), da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas devendo, por isso, ser revogado.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, notificado da interposição de recurso pela AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH, IIII, e JJJ,  no âmbito do Acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral em 26 de junho de 2018, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 405.° da Lei n.º 35/2014 de 20 de junho, 22.° números 1 e 2 e 27.° n.º 5 do Decreto-Lei n.º 259/2009, de 25 de setembro e 638.° n.º 5 do Código do Processo Civil, apresentar as respetivas contra-alegações, nas quais pugna pela manutenção da decisão.

O MINISTÉRIO PÚBLICO pronunciou-se no sentido da improcedência da apelação.
BBB respondeu.
***
Exaramos, abaixo, um breve resumo dos autos para melhor compreensão.
   XXX, dirigiu às entidades competentes um aviso prévio de greve às reuniões de avaliação, decretada para os dias 2 a 31 de julho de 2018.
   Foram também emitidos por AAA, BBB, EEE, FFF, HHH, III, JJJ, avisos prévios de greve à atividade de avaliação, para os dias 2, 3, 4, 5, 6, 9, 10, 11, 12 e 13 de julho de 2018.
  Em consequência, veio o Ministério da Educação solicitar a intervenção da DGAEP ao abrigo do disposto no n.2 2 do artigo 398.2 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP) aprovada pela Lei n.2 35/2014, de 20 de junho.
   Assim, e em cumprimento do disposto no n.2 2 do artigo 398.2 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP) aprovada pela Lei n.2 35/2014 de 20 de junho, realizou-se na DGAEP, no dia 19 de junho de 2018, uma reunião com vista à negociação de um acordo de serviços mínimos para as greves em referência, não tendo as partes chegado a acordo quanto aos serviços mínimos e aos meios necessários para os assegurar.
   Foi, entretanto, promovida a formação de Colégio Arbitral, que ficou constituído.
   Foram as partes notificadas para a audição prevista no n.º 2 do artigo 402.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP) aprovada pela Lei n.º 35/2014 de 20 de junho.
   Nas posições fundamentadas apresentadas por escrito, as partes pronunciaram-se nos termos que, em síntese, se enunciam:
   O Ministério da Educação entende que "na medida em que a não realização das reuniões de avaliação interna final, nos anos de exames e provas de carácter nacional a realizar, na mesma data em todo o território nacional, terá exatamente o mesmo resultado prático que a não realização das provas ou exames finais, haverá necessidade de acautelar serviços mínimos para garantir o cumprimento da necessidade social impreterível reconhecida pela alínea d) do n.º 2 do artigo 397.º da LTFP".
  Sustenta o Ministério que "não sendo possível obter a classificação final do aluno (que resulta da média ponderada das avaliações interna e externas) estão vedados aos alunos os efeitos práticos associados à realização dos exames e provas — conhecimento das notas para efeito de conclusão do ciclo e de prosseguimento de estudos no ensino secundário, no caso das provas do 9.º ano, e ainda para efeitos de candidatura ao ensino superior nos casos dos exames do 11.º e 12.º anos de escolaridade".
  Sublinha ainda que a ordenação cronológica das etapas do processo avaliativo que, nestes anos de escolaridade, culmina com a publicação do resultado das provas e exames, não pode ser subvertida, ou seja, primeiro há que apurar a avaliação interna final (em conselho de turma) e só após essa avaliação obtida, publicar as pautas de exame".
   O Ministério sustenta que todos os conselhos de turma terão de estar concluídos até ao dia 5 de julho de 2018, atenta a impossibilidade de alteração do calendário de exames.
  Assim entende que a fixação de serviços mínimos deverá acautelar:
   A realização pelos conselhos de turma, até à data limite de 5 de julho de 2018, das reuniões de avaliação interna final, relativas aos 9.º, 11.º e 12.º anos de escolaridade;
   A quantificação do quórum deliberativo dos conselhos de turma.
  O XXX, por seu turno, defende que "as reuniões de avaliação ora em causa não são passíveis de aplicação do conceito, legal e constitucional, de serviços mínimos, não só porque não é legalmente possível uns professores darem as notas que competem a outros professores, como também porque reuniões de avaliação não podem ser consideradas avaliações finais".
   Refere ainda que o ME está "a tentar confundir incómodos ou dificuldades acrescidas (consequências naturais e inerentes à própria greve) com a pretensa, mas não demonstrada, existência de prejuízos irreparáveis".
   A AAA vem arguir como questão prévia que, estando em causa dois períodos de greve com duração distinta, essa diferença impõe que a apreciação da questão sub judice (fixação de serviços mínimos) seja efetuada por Colégios Arbitrais distintos ou, no caso de assim não ser possível, que tal questão seja apreciada em processos distintos decididos separadamente." Sublinha ainda que, como consta da ata da reunião de promoção de acordo, "esta posição da signatária mereceu o acolhimento das restantes associações sindicais promotoras da greve para o mesmo período e até da que subscreve pré-aviso distinto."
   Sustenta que a realização da greve em causa não põe em causa a realização dos exames nacionais ou de equivalência à frequência, citando a Nota Informativa da DGESTE de 11 de junho onde se lê "Os alunos cujas avaliações internas não tenham sido ainda formalmente atribuídas à data em que os exames e outras provas nacionais se devam realizar são admitidos condicionalmente às mesmas
   Por outro lado, acrescenta a AAA, "na mesma Nota Informativa, no ponto 8, a DGE refere que também as renovações de matrícula e a constituição de turmas não serão afetadas, devendo as turmas «ser constituídas e lançadas na (…), de acordo com o calendário que resulta do Despacho n.º 6/2018, de 12 de abril (...)".
   A AAA entende que, "se esta greve estivesse sujeita a serviços mínimos, eles teriam sido requeridos para as greves realizadas entre 18 e 29 de junho, o que não aconteceu, indiciando que o que está a ser posto em causa não é o objeto da greve, mas o seu horizonte temporal".
   Sublinha que "a fixação de serviços mínimos corresponderia ao esvaziamento total do direito à greve já que isso impunha que todos os docentes tivessem de ser convocados e estar presentes".
   Considera ainda que, terminando a greve em 13 de julho, é viável o adiamento da data de afixação dos resultados da 1ª fase dos exames nacionais e das provas de equivalência à frequência, prevista para 12 de julho, bem como do início do período a apresentação da candidatura à 1ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior.
  ABBB coloca também como questão prévia que o Colégio Arbitrai deve pronunciar-se "se, em face do objeto desta greve, estamos perante necessidades sociais impreteríveis que obriguem à definição de serviços mínimos e, a ser esse o seu entendimento, pronunciar-se, separadamente, sobre os serviços mínimos que, eventualmente possam caber a cada um dos pré-avisos de greve, atento o seu horizonte temporal".
  Defende que não está em causa uma necessidade social impreterível, nos termos previstos na alínea d) do n.º 2 do artigo 397.º da LTFP, porquanto as reuniões do Conselho de Turma "não realizam nem atribuem avaliações finais (---)".
   A BBB sustenta que nos 11º e 12º anos "não estarão em causa, nem a realização dos exames (que vêm acontecendo com total normalidade), nem a publicitação das avaliações, sendo uma questão de mera recalendarização e otimização de tempo e de recursos, para que tal seja possível", não estando também em causa o acesso ao ensino superior.
  A CCC começa também por referir que atento o facto de os Pré-Avisos de greve "terem um alcance temporal diferente e serem promovidos por organizações sindicais distintas, devem ser analisados separadamente".
  Defende que a atividade de avaliação não se enquadra na previsão do artigo 397.º n.º 2 alínea d), que apenas admite a definição de serviços mínimos para " as provas do sistema público previstas na calendarização do ano letivo".
  Acrescenta que "a própria natureza das reuniões de avaliação não é compatível com a realização de serviços mínimos, dado que nas reuniões de avaliação é exigida a presença de todos os docentes e não é possível os professores darem as notas de outros professores". Os serviços mínimos "seriam uma forma ilegal de limitar o direito à greve constituindo serviços máximos e não serviços mínimos".
  Entende que "não é beliscado o acesso ao ensino superior", porquanto as greves por si decretadas terminam dia 13 de julho e "a 1ª fase de inscrição se encontra programada de 18 a 27 de julho de 2018".
  O DDD começa também por requerer que o Colégio Arbitral se pronuncie separadamente sobre "os pré-avisos de greve decretados pelo SPLIU, juntamente com outras organizações sindicais, e o pré-aviso decretado pelo S.TO.P., e respetivos horizontes temporais (...)".
  Defende que "as reuniões de avaliação agendadas pelo Conselho de Turma (ou outras que se realizem nesse âmbito) é uma necessidade cuja satisfação se deva qualificar como preterível, atento o momento temporal proposto nos pré-avisos de greve (13 de julho) e a possibilidade de adiamento".
  Entende ainda que "a definição de serviços mínimos estaria a limitar de forma excessiva o direito à greve, passando a serviços máximos, uma vez que é obrigatória e imprescindível a presença de todos os professores" e "dado o seu carácter deliberativo e nominativo, não é passível de substituição por motivos de greve".
  O  EEE opõe-se também à fixação de serviços mínimos e reforça que "todos os docentes titulares de turma têm de estar presentes no Conselho de Turma e não outros professores em sua substituição, que não conhecem os alunos".
  O FFF defende que "não estando em causa avaliações finais o efeito prático desta greve não será igual ao de uma greve aos exames".
  Considera que não estão em causa necessidades sociais impreteríveis, e que "a própria natureza da atividade docente de avaliação de alunos não é compatível com a realização de serviços mínimos, uma vez que não é possível aos docentes avaliarem os seus alunos por intermédio de outros colegas."
   Pelo que a definição de serviços mínimos neste caso comprimiria o direito à greve, "os serviços mínimos seriam serviços máximos".
   Sustenta ainda que, estando a candidatura de acesso ao ensino superior calendarizada entre 18 de julho e 7 de agosto, o prejuízo provocado pela greve não é insanável.
   A GGG sustenta que o direito à greve só poderá ser restringido "nos termos do nº 2, do art. 18º da CRP, para a salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos v.g.. quando estejam em causa necessidades sociais impreteríveis".
  Concede que os dias de greve previstos "acarretam constrangimentos às escolas e respetivos discentes" mas entende que estes "não são de molde a provocar um dano irreversível no percurso avaliativo dos alunos ou a causar-lhes um prejuízo irreparável". Pelo que considera não estarmos perante uma necessidade social impreterível.
   Acrescenta ainda que "o estabelecimento de serviços mínimos, no caso vertente, significaria o estabelecimento de serviços máximos, já que todos os professores participam nas reuniões de avaliação" pelo que "a haver lugar a serviços mínimos, neste caso, o direito à greve seria excessiva e desproporcionalmente comprimido, se não mesmo completamente esvaziado do seu conteúdo constitucional".
   A HHH defende que na presente greve às avaliações não devem ser decretados serviços mínimos. Entende que "os serviços mínimos transformar-se-iam em desvirtuados serviços máximos, em franca violação dos preceitos constitucionais e legais, atropelando os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade".
  Sustenta ainda que os conselhos de turma não integram a previsão da alínea d) do nº 2 do artigo 397º da LTFP, que "deve ser considerada inconstitucional na interpretação que o M. E. pretende (...) uma vez que colhe totalmente o exercício do direito inalienável à greve".
  Por fim, defende que não estão em causa necessidades sociais impreteríveis, "já que podem ser satisfeitas uns dias ou semanas mais tarde, sem outro prejuízo para os estudantes para além do incómodo".
  A III defende, como questão prévia, que se deveriam constituir colégios distintos, para a greve decretada pelo S.TO.P. e para as greves decretadas em conjunto por AAA, BBB,  CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH, III e JJJ por estarmos "perante greves que não coincidem nem no objeto nem no período para o qual estão decretadas, sendo também distintas as entidades promotoras (...)".
  Entende que, "quanto à greve decretada pela III e restantes nove subscritores" não está irremediavelmente prejudicado o direito de acesso ao ensino superior, "estando apenas em causa uma ligeira prorrogação de prazos, mas nunca um dano irreparável ou o impedimento da satisfação de necessidades sociais impreteríveis (...)".
  O JJJ começa por sublinhar que a presente greve não se enquadra no previsto na alínea d) do nº 2 do artigo 397.º da LTFP quanto a serviços mínimos para a Educação porquanto "a greve decretada se refere às reuniões de avaliação, implicando as reuniões do Conselho de Turma, mas nunca se referindo greve aos exames nacionais, avaliações finais ou outras provas de caracter nacional."
  Acrescenta que "o Ministério não refere de forma suficientemente concludente quais os prejuízos externos injustificados que estarão em causa agora", apontando que "os exames da 1.ª fase, que se iniciaram na data de 18 de junho, decorrem com normalidade e nunca foi alegada qualquer necessidade de serviços mínimos."
  Salienta ainda que as greves às reuniões do mês de junho "não foram motivo suficiente para a decretação de serviços mínimos", tendo sido vistas pelo Ministério como um simples transtorno em virtude da descontinuidade do serviço.
  Sustenta ainda que "os serviços mínimos devem obedecer aos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade" e, no presente caso, "teriam que ser, necessariamente, serviços máximos" uma vez que "cada um dos professores desempenha um papel insubstituível no processo avaliativo de cada aluno."   
    Foi proferido acórdão no âmbito do qual o Colégio Arbitral determinou, por unanimidade, que devem ser prestados os seguintes serviços mínimos:
   - A realização dos Conselhos de Turma, até à data limite de 5 de Julho, das reuniões de avaliação interna final, relativas aos 9º, 11º e 12º anos de escolaridade, devendo o diretor de turma, ou quem o substitua, recolher antecipadamente todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno., que ainda não tenha nota atribuída, para que possa surtir efeito a deliberação a tomar.
   Quanto aos meios para assegurar os serviços mínimos:
   - Quórum que corresponda à maioria absoluta (metade mais um) da totalidade do número de professores que constituem cada um dos Conselhos de Turma. 

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  OS FACTOS:
  Do acórdão arbitral extraem-se os seguintes factos:
   1 - XXX dirigiu às entidades competentes um aviso prévio de greve às reuniões de avaliação, decretada para os dias 2 a 31 de julho de 2018.
   2 - Foram também emitidos por AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH, III e JJJ, avisos prévios de greve à atividade de avaliação, para os dias 2, 3, 4, 5, 6,9,10, 11, 12 e 13 de julho de 2018.
   3 - Em consequência, veio o Ministério da Educação solicitar a intervenção da DGAEP tendo em vista a negociação de acordo quanto a serviços mínimos e meios necessários para os assegurar[1]. 4 - Assim, realizou-se na DGAEP, no dia 19 de junho de 2018, uma reunião com vista à negociação de um acordo de serviços mínimos para as greves em referência, não tendo as partes chegado a acordo quanto aos serviços mínimos e aos meios necessários para os assegurar[2].
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As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso.
Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, são as seguintes as questões a decidir, extraídas das conclusões:
  1ª - O facto de nenhum dos docentes grevistas ficar de fora dos serviços mínimos fixados, configura o esvaziamento integral do direito à greve?
  2ª - Tendo a greve em questão sido decretada para um período de apenas 10 dias, não se alcança qualquer fundamento para justificar a existência de uma necessidade social impreterível cuja satisfação se sobreponha ao exercício legítimo do direito à greve?
  3ª - Mesmo que se concluísse que a greve em questão põe em causa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, que tinham que ser asseguradas através da fixação de serviços mínimos, ainda assim os que foram fixados pelo Acórdão recorrido, são claramente desadequados para alcançar tal objetivo?
  4ª - O Acórdão referido também obriga ilegalmente à presença nas reuniões dos Conselhos de Turma de metade mais um dos seus membros?
  5ª – Os serviços mínimos violam os princípios da proporcionalidade, da adequação e da necessidade?
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 O DIREITO:
 A CRP garante o direito à greve (Artº 57º/1), estabelecendo que compete aos trabalhadores definir o âmbito dos interesses a defender e, ao mesmo tempo, remete para a lei a definição das condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis (nº 2 e 3).
O direito à greve, sendo um direito fundamental, é também um direito limitado, coexistindo com outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos. Daí que se entenda que o direito em causa pode ser objeto de limitações.
Entre tais limitações encontra-se a determinação de serviços mínimos.
Serviços, que por força de imperativo constitucional se hão-de ter como indispensáveis e, por outro lado, visar a satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
Na verdade “O conceito de serviços mínimos não pode ser considerado isoladamente ou fora de um contexto relacional, impondo o Artº 57º/3, numa solução conforme às exigências da proporcionalidade, que seja assegurada a prestação do conjunto mínimo de serviços que se revele, em concreto, indispensável para garantir a satisfação de necessidades sociais impreteríveis” (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 581).
 Nestas necessidades relevam as exigências da comunidade, o interesse coletivo.
   A “obrigação de serviços mínimos só existe quando e na estrita medida em que a necessidade afetada não possa ser satisfeita por outros meios, isto é, quando e na medida em que as prestações com que se cumpre aquela obrigação se revelem indispensáveis à satisfação de necessidades socias impreteríveis” (Jorge Leite, Direito do Trabalho, Vol. I, Serviços de Acção Social da U.C., 301).
 Monteiro Fernandes ensina que a definição dos limites externos do direito de greve envolve a articulação de dois conceitos difusos: o de necessidade social impreterível e o de serviços mínimos (Direito do Trabalho, 12ª Ed., 918).
Assim, é, antes de mais, necessário identificar aquelas necessidades e, num segundo momento, o próprio conceito de serviços mininos indispensáveis à respetiva satisfação.
O autor identifica duas perspetivas definitórias: uma primeira que estabelece uma correlação entre a medida da prestação e a natureza das necessidades a satisfazer, delimitando tais serviços como os adequados a cobrir necessidades impreteríveis; numa segunda, o carater mínimo dos serviços corresponde a um certo grau de satisfação das necessidades em causa, um grau abaixo do que se entraria em situação idêntica à de insatisfação. Conclui que a primeira é a que permite corresponder ao sentido da lei.
O Artº 397/1 da Lei 35/2014 de 20/06 (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas) dispõe que nos órgãos ou serviços que se destinem à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, a associação que declare a greve, ou a comissão de greve, e os trabalhadores aderentes devem assegurar, durante a greve, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação daquelas necessidades.
Para efeitos do ali disposto, consideram-se órgãos ou serviços que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, os que se integram, nomeadamente, no setor da Educação, no que concerne à realização de avaliações finais, de exames ou provas de caráter nacional que tenham de se realizar na mesma data em todo o território nacional [3](nº 2/d)).
No caso concreto, a identificação das necessidades decorre, pois, diretamente da lei, conforme se extrai do preceituado no mencionado Artº 397º/2-d). Resta, assim, encontrar o critério delimitador do conceito de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação das necessidades identificadas.
Estes conceitos expostos passemos, então, à abordagem das questões colocadas na apelação.
Ponderou-se na decisão recorrida:
  “…a aferição da necessidade de fixação de serviços mínimos depende do preenchimento de determinados critérios:
a) Estarmos na presença de necessidades sociais impreteríveis (designadamente as enquadradas nos sectores definidos no artigo 397º/2 da LTFP);
b) Serem essas necessidades insuscetíveis de auto satisfação individual;
c) Não existirem meios paralelos ou alternativos viáveis para a satisfação das necessidades concretas;
d) Não poderem as necessidades em apreço, pela sua natureza, ficar privadas pelo tempo de paralisação que a greve importa, sob pena de prejuízos irreparáveis.
  Estão em causa as greves decretadas pelo S.T.O.P. para o período compreendido entre 2 e 31 de julho, às reuniões de avaliação e pela AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH, III e JJJ para os dias 2 a 13 de julho, à atividade de avaliação, com incidência nas reuniões do Conselho de Turma, ou outras que se realizem naquele âmbito.
 Os períodos de greve são parcialmente coincidentes e sucedem-se a outros já decorridos (desde 4 de junho de 2018) ou em curso (para os dias 18 a 30 de junho).
  As greves às reuniões de avaliação vêm desde 4 de junho de 2018 e vão até 31 de julho de 2018. Tal período excede largamente o do calendário fixado para o apuramento das avaliações internas finais dos alunos.
  A não realização das reuniões de avaliações internas finais tem exatamente o mesmo resultado prático que a não realização das provas ou exames finais, porque são necessárias para a concretização das notas finais, o que constitui, pois, necessidade social impreterível, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 397.º da LTFP.
  Necessidades sociais impreteríveis são apenas aquelas que são urgentes, isto é, "cujo cumprimento seja inadiável ou irrepetível sem prejudicar ou pôr em risco grave os interesses por ela tutelados", no dizer de Maria do Rosário Palma Ramalho (Tratado de Direito do Trabalho, Parte III — Situações Laborais Coletivas, Almedina, Coimbra, p. 488).
  As greves decretadas às reuniões de avaliação interna, que respeitam a anos de realização de exames de caráter nacional, a realizar na mesma data em todo o território nacional, estão, assim, a pôr em causa uma necessidade social impreterível.
  A educação é um direito fundamental constitucionalmente consagrado (artigo 73.º da CRP) que assume a dimensão de necessidade social impreterível no que toca à realização dos exames e provas finais de caráter nacional, cuja realização é inadiável e suscetível de prejudicar, ou pôr em risco, os interesses por ela tutelados.
  Ora, a não realização da avaliação interna final põe em crise o resultado da prova ou exame já realizado e a possibilidade de apresentação a exame em fase subsequente já previamente calendarizada.
  Nos anos em que há exames finais (9º, 11º e 12º) a nota final resulta da média ponderada entre a nota da avaliação interna e a nota de exame ou da prova final. Logo, se não for conhecida a nota da avaliação interna não podem ser afixadas as notas finais.

Nesta altura é impossível a alteração do calendário dos exames fixado pelo Despacho n.º 5458-A/2017 de 22 de junho, pelos motivos que são apresentados pelo Ministério da Educação e todos os Conselhos de Turma devem estar concluídos até ao dia 5 de julho de 2018.
Há, pois, necessidade de serviços mínimos e estes devem respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (n.º 7 do artigo 398.º da LTFP) pelo que, os serviços mínimos a fixar são os que se mostrem necessários, adequados e proporcionais para que as necessidades sociais impreteríveis (realização das avaliações internas) sejam satisfeitas, sob pena de irremediável prejuízo no sacrifício incomportável de uma necessidade primária da coletividade.
A não realização das avaliações internas tem o mesmo efeito da não realização dos exames finais.
As deliberações dos Conselhos de Turma são tomadas por maioria absoluta (artigos 19º n.º 8 da Portaria n.2 243/2012, de 10 de agosto e 23.º, n.º 5 do Despacho Normativo n.º 1—F/2016,de 5 de abril) e não é obrigatório que todos os professores da turma tenham de estar presentes (artigo 19.º, n.ºs 3 e 4 da Portaria 243/2012 e 23, n.º 8 do Despacho Normativo n.º 1-F/2016), daí que, em caso de greve, também possam os Conselhos de Turma funcionar sem a presença da totalidade dos seus membros, conquanto haja quórum de que resulte maioria absoluta. Aí se chega quer por analogia, quer por interpretação extensiva (artigos 10.º, 11.º do Código Civil). O diretor de turma, ou quem o substitua, deve recolher antecipadamente todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno, que ainda não tenha nota atribuída, para que possa surtir efeito a deliberação a tomar, por aquela maioria.
§
A 1ª questão a abordar incide sobre o facto de nenhum dos docentes grevistas ficar de fora dos serviços mínimos fixados, o que configura o esvaziamento integral do direito à greve.
Alegam os Apelantes que de modo a assegurar a realização dos Conselhos de Turma, até à data limite de 5 de julho, das reuniões de avaliação interna final, relativas aos 9.°, 11.° e 12.° anos de escolaridade o Tribunal Arbitral fixou serviços mínimos que obrigam:
- O Diretor de Turma a recolher antecipadamente todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno, que ainda não tenha nota atribuída, para que possa surtir efeito a deliberação a tomar. O que inclui a obrigação dos professores grevistas entregarem a documentação solicitada;
- A presença obrigatória em todas as reuniões de todos estes Conselhos de Turma de metade mais um dos professores que os constituem.
   Ora – alegam -, é inequívoco que estes serviços, ditos mínimos, limitam o direito à greve, aniquilando a sua eficácia. E isto, porque obrigam à presença de metade mais um dos membros nos Conselhos de Turma, obrigam os Diretores de Turma a recolher previamente junto dos seus Colegas que vão fazer greve, os documentos de avaliação dos alunos destes docentes e obrigam estes últimos a fornecer tais elementos o que significa, em bom rigor, que nenhum destes docentes pode fazer greve. Os que são convocados para estar presentes nas reuniões estão a trabalhar, cumprindo os serviços mínimos. No entanto, os Colegas que pretendam fazer greve têm de entregar os documentos ao Diretor de Turma ou a quem o substitua, o que significa que estando em greve anteriormente a esta já realizaram a prestação do trabalho que pretendiam não realizar através do exercício do direito à greve.
  A argumentação assim expendida apresenta-se-nos como convincente.
  Começamos por realçar que o acórdão arbitral não enuncia qualquer facto capaz de sustentar a decisão de obrigar os docentes – todos, pois que nenhum vem excecionado – a, antecipadamente, fazer entrega dos elementos de avaliação.
  Contudo, tal como avançam as partes nas argumentações que sintetizámos, a disponibilização das avaliações deve ser efetuada por todos os professores, não sendo possível intermediar na avaliação.
  Está provado que a greve foi convocada, nuns casos, para os dias 2 a 31/07 e noutros para os dias 2, 3, ,4, 5, 6, 9, 10, 11, 12 e 13/07.
  Ora, ao consignar-se a obrigação de recolha, pelo diretor de turma, ou de quem o substitua, até à data de 5 de Julho, de todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno, esvazia-se o direito de greve, porquanto, tal como alegado, todos os docentes estão obrigados a fornecer (antecipadamente) elementos aos diretores de turma. Ou seja, nenhum docente pode fazer greve. Situação que não configura serviços mínimos. Antes se apresenta, como bem salientam as partes, como serviços máximos.
  Consequência natural da greve, qualquer que ela seja, é causar perturbação, incómodos, dificuldades…
  Sabido que é que o ordenamento jurídico português não contém uma noção de greve, podemos, na senda de Monteiro Fernandes, assentar em que a mesma é preenchida por “comportamentos conflituais consistentes na abstenção coletiva e concertada da prestação de trabalho, através da qual um grupo de trabalhadores intenta exercer pressão no sentido de obter a realização de certo interesse ou objetivo comum” (Direito do Trabalho, 12ª Ed., Almedina, 873).
  Trata-se, pois, de uma forma de abstenção coletiva de trabalho com um móbil previamente determinado e comum aos trabalhadores envolvidos.
  A imposição efetuada, sob a veste de serviços mínimos, descaracteriza completamente a greve. Greve que, lembremo-lo, é no caso do S.T.O.P às reuniões de avaliação, e no dos demais envolvidos, à atividade de avaliação.
  Na verdade, na conciliação entre os direitos fundamentais em presença – de uma lado, o de greve, de outro o de educação – não pode resultar a prática inutilização do direito de greve, que é a situação que se nos configura.
  Com o que não subscrevemos a argumentação trazida aos autos pelo Ministério da Educação.
  Afirma este que nos termos do n.° 1 do Artigo 536.° do Código do Trabalho, aplicável por força da alínea m) do n.° 1 do artigo 4.° e do n.° 3 do artigo 394.°, ambos da LTFP, a greve suspende, enquanto esta durar, o contrato de trabalho do trabalhador aderente, incluindo o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade. Fora desse âmbito, os docentes não estão em greve e têm de cumprir com todos os deveres associados ao seu conteúdo funcional. A entrega de elementos de avaliação não se confunde com a presença e participação em reunião de avaliação. Os elementos de avaliação resultam de um trabalho prévio dos docentes, a realizar como trabalho individual na sua componente não letiva, não estando, por isso, abrangido pelo aviso prévio de greve. Trata-se de um trabalho feito antes da reunião de avaliação, em dias anteriores e não abrangidos pela greve. É o que resulta do disposto no artigo 82.° do Estatuto da Carreira Docente, nos termos do qual a componente não letiva do pessoal docente abrange a realização de trabalho a nível individual e a prestação de trabalho a nível do estabelecimento de educação ou de ensino, compreendendo o trabalho a nível individual, para além da preparação das aulas, a avaliação do processo de ensino-aprendizagem. No conselho de turma de avaliação os docentes apresentam as suas propostas e as informações que as suportam, que são apreciadas e debatidas pelos e com os restantes docentes, de modo a permitir uma deliberação final quanto à classificação a atribuir a cada aluno em cada disciplina.
  Com o devido respeito a argumentação não colhe.
  É certo que o trabalho docente – o de avaliação incluído - não se esgota com a participação no Conselho de Turma.
  Porém, a avaliação é ali decidida. O trabalho previamente realizado por cada docente configura a fundamentação da proposta que irá efetuar.
   Ora, sendo o local próprio para a efetuar o Conselho de Turma, se se obrigam todos os professores a entregar as suas propostas antes da reunião deste órgão, se a greve é decretada à atividade de avaliação, é óbvio que, com a medida em causa se cerceia o direito a dela participar, impondo-se a quem quiser aderir uma obrigação de facere antecipada. Obrigação que se tem de cumprir, necessariamente, em período de greve.
  Aliás, tal como alega o Apelado, nos termos dos normativos que dispõem sobre a sua constituição e funcionamento (artigo 19.° da Portaria n.° 243/2012, de 10 de agosto, e artigo 23.° do Despacho Normativo n.° 1-F/2016, de 5 de abril), o conselho de turma é o órgão deliberativo que, para efeitos de avaliação dos alunos, é constituído por todos os professores e presidido pelo diretor de turma. A avaliação interna realizada no final do 3.° período decorre, assim, da decisão tomada em conselho de turma e é indispensável para o apuramento da situação escolar do aluno.
  Por fim, como é assumido pela doutrina avalizada, o direito de greve só deve ser sacrificado no mínimo indispensável. Donde, a obrigação de prestar serviços mínimos só se constitui se não houver outra forma de satisfazer as necessidades reconhecidamente impreteríveis. O que não vem provado.
  Donde, a resposta à 1ª questão que enunciámos é positiva – o direito de greve fica injustificadamente comprimido pelo direito à educação.
§
 E chegamos à 2ª questão - Tendo a greve em questão sido decretada para um período de apenas 10 dias, não se alcança qualquer fundamento para justificar a existência de uma necessidade social impreterível cuja satisfação se sobreponha ao exercício legítimo do direito à greve?
  A resposta a esta questão encontramo-la na Lei 35/2014 de 20/06, quando, no Artº 397º/2-d) dispõe que se consideram órgãos ou serviços que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, os que se integram, nomeadamente, no setor da Educação, no que concerne à realização de avaliações finais, de exames ou provas de caráter nacional que tenham de se realizar na mesma data em todo o território nacional[4].
  Provou-se que XXX dirigiu às entidades competentes um aviso prévio de greve às reuniões de avaliação, decretada para os dias 2 a 31 de julho de 2018 e foram também emitidos por AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH e III, avisos prévios de greve à atividade de avaliação, para os dias 2, 3, 4, 5, 6,9,10, 11, 12 e 13 de julho de 2018.
  Uma vez que a greve se situa no campo de aplicação deste normativo – realização de avaliações finais-, parece não oferecer dúvidas que a delimitação de serviços mínimos se impunha na área.
  Não será despiciendo chamar à colação a argumentação expendida pelo Apelado, bem elucidativa da necessidade social impreterível em presença.
  Por um lado, a Educação é um direito fundamental constitucionalmente consagrado (artigo 73.° da CRP) que assume dimensão de necessidade social impreterível no que tange à realização dos exames e provas finais de caráter nacional, na medida em que, como refere a doutrina, a prestação devida ­-realização das provas e exames - é inadiável ou irrepetível se prejudicar ou puser em risco os interesses por ela tutelados. Por outro, a não realização das reuniões de avaliação interna final impacta no calendário de provas e exames. Assim:
Nos anos com realização de exame ou provas finais - casos dos 9°, 11° e 12° anos - a nota final do aluno resulta da média ponderada entre a nota da avaliação interna e a nota de exame ou da prova.
· Não sendo conhecida a avaliação interna final de todos os alunos, não podem ser afixados os resultados de exame (afixação de pautas), sob pena de poder haver a suspeição de aquelas classificações internas serem "ajustadas" ou "contaminadas" pelos resultados das notas de exame, notas com a qual fazem média para obtenção da classificação final do aluno.
· Não sendo possível obter a classificação final do aluno (que resulta da média ponderada das avaliações interna e externas), estão vedados aos alunos os efeitos práticos associados à realização dos exames e provas - conhecimento das notas para efeito de conclusão de ciclo e de prosseguimento de estudos no ensino secundário, no caso das provas do 9° ano, e ainda para efeitos de candidatura ao ensino superior nos casos dos exames dos 11 ° e 12° anos de escolaridade.
   Assim, tal como se consignou no acórdão recorrido “As greves decretadas às reuniões de avaliação interna, que respeitam a anos de realização de exames de caráter nacional, a realizar na mesma data em todo o território nacional, estão, assim, a pôr em causa uma necessidade social impreterível.
§
  Mesmo que se concluísse que a greve em questão põe em causa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, que tinham que ser asseguradas através da fixação de serviços mínimos, ainda assim os que foram fixados pelo Acórdão recorrido, são claramente desadequados para alcançar tal objetivo?
  A resposta a esta questão já a demos ao analisarmos a que enunciámos em primeiro lugar.
  São, pois, dispensáveis, outros considerandos.
§
  Partimos, pois, para a 4ª questão - O Acórdão referido também obriga ilegalmente à presença nas reuniões dos Conselhos de Turma de metade mais um dos seus membros?
  Expendeu-se a este propósito no acórdão recorrido que “As deliberações dos Conselhos de Turma são tomadas por maioria absoluta (artigos 19º nº 8 da Portaria n.º 243/2012, de 10 de agosto e 23º, n.º 5 do Despacho Normativo n.º1—F/2016,de 5 de abril) e não é obrigatório que todos os professores da turma tenham de estar presentes (artigo 19º, n.ºs 3 e 4 da Portaria 243/2012 e 23, n.º 8 do Despacho Normativo n.9 1-F/2016), daí que, em caso de greve, também possam os Conselhos de Turma funcionar sem a presença da totalidade dos seus membros, conquanto haja quórum de que resulte maioria absoluta. Aí se chega quer por analogia, quer por interpretação extensiva (artigos 10.º, 11.º do Código Civil).
  Alegam os Apelantes que a mera fixação de serviços mínimos não garante este resultado. Ou seja, com a obrigação da presença de metade mais um dos membros do Conselho de Turma apenas se obtém o quórum de funcionamento exigido pelo artigo 29.° do CPA. O quórum deliberativo exigido pelo n.° 8 do artigo 19.° da Portaria n.° 243/2012, de dez de agosto e pelo n.° 5 do artigo 23° do Despacho Normativo n.° 1-F/2016, de 5 de abril apenas se obtém se, numa votação concreta, votarem a favor ou votarem contra metade mais um dos professores que compõem o Conselho de Turma e não apenas aqueles que se encontram presentes. Quer isto dizer que, mesmo cumprindo os serviços mínimos, não fica garantida a validade das deliberações tomadas pois basta que um professor a cumprir esses serviços mínimos vote contra o sentido do voto de todos os restantes para que não se obtenha o quórum deliberativo exigido que corresponde à maioria absoluta dos membros que compõem o Conselho.
Se a realização dos conselhos de turma pode ou não levar-se a cabo com um ou outro número de elementos é questão que em nada se prende com o objeto deste recurso, a saber, a ilegalidade e inconstitucionalidade da imposição de serviços mínimos no caso. Isso mesmo reconhecem os Apelantes quando alegam que fica demonstrado que, para além de violar os princípios já enunciados, os serviços mínimos fixados podem produzir deliberações inválidas que, essas sim, irão produzir danos irreparáveis ou de difícil reparação na esfera jurídica dos seus destinatários, podendo ser anuladas por vício de violação de lei.
  Ora, não só falha aqui a competência para avaliar da legalidade das eventuais deliberações, como, sendo elas eventuais não pode o Tribunal emitir pronúncia, como ainda, em presença da resposta dada à 1ª questão, esta fica prejudicada.
§
  Por fim, a 5ª questãoOs serviços mínimos violam os princípios da proporcionalidade, da adequação e da necessidade?
  Conforme acima já expusémos o exercício do direito de greve pode ser comprimido nas situações definidas na lei.
  Daí que o Artº 397º/1 da Lei 35/2014 disponha que os trabalhadores aderentes à greve devem assegurar, durante a mesma, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação das necessidades tidas como impreteríveis.
  Sendo apenas os indispensáveis, resulta óbvia a necessidade de acautelar a observância não só da adequação, como da proporcionalidade e da necessidade de tais serviços.
  Ora, sendo o direito de greve protegido pela CRP, também é certo que os direitos, liberdades e garantias assim protegidos, só podem ser restringidos nos casos expressamente previstos naquele diploma, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos (Artº 18º/2 da CRP).
  No caso concreto, conforme o que vimos expondo, assume particular relevância a questão da proporcionalidade nas suas várias vertentes.
  Os Apelantes, recorrendo à lição de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, descrevem o princípio da proporcionalidade, enquanto pressuposto material da restrição de direitos constitucionalmente protegidos, invocando que o princípio se desdobra em três subprincípios:
(a) princípio da adequação (também designado por princípio da idoneidade), isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos);
b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade) ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias (tornaram-se exigíveis), porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias;
c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa «justa medida», impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos" (Constituição da Republica Portuguesa Anotada, Vol. I, 4ª Ed. Revista).
  Concluem a partir de tais ensinamentos, tal como acima já mencionámos, pela necessidade de densificação do conceito de serviços mínimos, de modo que a limitação constitucional do direito à greve revela que os direitos dos trabalhadores carecem, como os outros direitos, de tarefas metódicas de concordância prática e de juízos de ponderação e de razoabilidade, não prevalecendo em abstracto contra certos bens constitucionais colectivos, designadamente os que têm a ver com serviços de primacial importância social.
  De quanto já expusémos, resulta demonstrado que não é razoável a fixação de serviços nos termos em que o foi porquanto todos os trabalhadores estão afetos à observância de tais serviços. Temática abordada a propósito da resposta à questão que enunciámos em primeiro lugar, da qual emerge a conclusão acerca da violação do princípio da proporcionalidade já que a restrição decretada não se situa numa justa medida, sendo excessiva.
   Procede, pois, a apelação.
§
   A responsabilidade tributária recairia, segundo o dispoto no Artº 527º do CPC, sobre o Apelado.
  Contudo, por força do disposto no Artº 4º/1-g) do RCP este está isento.
  Porém, dado o disposto no Artº 4º/7 do mesmo diploma a isenção de custas não abrange os reembolsos à parte vencedora a título de custas de parte, que, naqueles casos, as suportará.
  Termos em que se decidirá que as custas devidas pelo Apelado se cingem às de parte.
*
 Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente e,em consequência, revogar o acórdão arbitral proferido.
   Custas pelo Apelado (restritas às de parte).
   Notifique.
Lisboa, 2018-10-17

MANUELA BENTO FIALHO
SÉRGIO ALMEIDA
FRANCISCA MENDES

[1] A factualidade descrita no acórdão remete para o disposto no Artº 398º da Lei 35/2014 de 20/06 nos termos que constam do relatório antecedente
[2] Idem
[3] Sublinhado nosso
[4] Sublinhado nosso