Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
648/11.8TTFUN.L1-4
Relator: PAULA SÁ FERNANDES
Descritores: CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO
REFORMA
INVALIDEZ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/06/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I.O acto de reforma, seja ela por velhice ou invalidez, actua como causa autónoma de caducidade do contrato de trabalho, não precisando da verificação dos requisitos da causa de caducidade prevista na alínea b), isto é, de se verificar se o reformado se encontra, ou não, em situação de impossibilidade absoluta e definitiva de prestar a respectiva actividade.
II. Para efeito da caducidade do contrato de trabalho, também, não faz sentido fazer a distinção entre invalidez relativa e absoluta. O facto do Decreto-Lei n.º187/2007, de 10 de Maio, ter passado a distinguir entre invalidez relativa e invalidez absoluta em nada veio a alterar a causa de caducidade do contrato de trabalho devido a reforma por invalidez, pois o que é essencial nessa causa de caducidade é o acto de reforma e não se a reforma foi determinada, por velhice ou invalidez e, dentro desta última, por invalidez relativa ou por invalidez absoluta.
III. Quando a lei não distingue entre invalidez absoluta e relativa, à luz do disposto no artigo 9º, n.º2, do Código Civil, o intérprete não o deverá fazer, tornando-se claro que o sentido da alínea c) do artigo 343º do Código do Trabalho é o de que a reforma por invalidez é causa de caducidade do contrato de trabalho, independentemente da segurança social ter considerado e qualificado tal invalidez como relativa ou absoluta.
(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

AA, moveu acção em processo comum emergente de contrato de trabalho, contra:
BB (Madeira) Ld.ª pedindo a condenação da ré no pagamento do complemento de subsídio de doença, conforme previsto na clª 117 do CCT, no valor a apurar em liquidação de sentença

Na contestação a Ré invoca a excepção de prescrição e defende-se por impugnação.
Foi proferido despacho saneador em que foi proferida decisão nos seguintes termos: Pelo exposto, julgo verificadas as excepções de caducidade do contrato de trabalho e de prescrição dos créditos reclamados, e, consequentemente, absolvo a Ré, BB (MADEIRA), LDA. do pedido.

O autor, inconformado, interpôs recurso de apelação, tendo nele formulado as a seguir transcritas,
Conclusões
(…)

Nas contra-alegações ré pugnou pela confirmação do decidido.
Colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir

I.Tal como resulta do recurso interposto a questão essencial suscitada é a de saber se o contrato de trabalho entre autor e ré cessou por caducidade com a reforma por invalidez do autor, ocorrendo a prescrição dos créditos reclamados.

II. Fundamentos de facto
Resultaram apurados os seguintes factos
1. O Autor trabalhava por conta da Ré em 22 de Setembro de 2006, altura em que entrou de baixa.
2. Por carta remetida pelo Centro Nacional de Pensões à Ré, recebida por esta em 5 de Novembro de 2009, consta que AA passou à situação de pensionista, por invalidez.

III. Fundamentos de direito
Como a cima se referiu, a questão essencial apreciar é a de saber se a reforma por invalidez do trabalhado/recorrente constitui causa de caducidade do contrato de trabalho, em que momento, e em que condições esta opera.
Vejamos então
A caducidade é a extinção de um contrato em resultado da verificação de um facto jurídico não voluntário, sendo que o art.º343 do CT, relativamente ao contrato de trabalho, admite a sua caducidade nos termos gerais, nomeadamente: a) verificando-se o seu termo; b) por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber; c) com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez. A caducidade é pois uma cessação automática do vínculo em consequência directa da ocorrência de certas situações que tornam o contrato inviável ou inútil, operando independentemente de qualquer manifestação de vontade extintiva.
No caso, a reforma do trabalhador, seja por velhice ou invalidez, está regulamentada no Decreto-Lei n.º187/2007, de 10 de Maio, que veio a distinguir a invalidez relativa da absoluta.
O autor veio alegar que apenas a invalidez absoluta conduz à caducidade do contrato, pretendendo que a sua reforma por invalidez relativa não constitui causa de caducidade, porque tal situação não corresponderia a uma situação de impossibilidade absoluta e definitiva de prestar a respectiva actividade, requisito que, no seu entendimento, teria de se verificar.
Mas afigura-se-nos que não lhe assiste razão.
Com efeito, na reforma, por velhice ou invalidez, o trabalhador pode não se encontrar impossibilitado, de forma absoluta e definitiva, para continuar a trabalhar, na grande maioria dos casos de reforma, por velhice ou invalidez, o trabalhador não está absoluta e definitivamente impossibilitado de continuar a trabalhar, seja na actividade que vinha prestando, seja noutro tipo de actividade diferente. A reforma constitui um acto de retirada do trabalhador da vida activa que tem a sua origem num acto voluntário do próprio trabalhador, pois, regra geral, é ele que efectua o correspondente pedido de reforma à entidade competente do respectivo regime de protecção social e através do qual exprime a sua vontade de se retirar da vida activa, para passar a auferir rendimentos, não através da prestação de trabalho, mas sim através do pagamento de uma pensão vitalícia, pelo sistema de protecção social que lhe seja aplicável, por isso, o acto de reforma, seja ela por velhice ou invalidez, actua, como causa autónoma de caducidade do contrato de trabalho, não precisando da verificação dos requisitos da causa de caducidade prevista na alínea b), isto é, de se verificar se o reformado se encontra, ou não, em situação de impossibilidade absoluta e definitiva de prestar a respectiva actividade.
Assim, como não faz sentido, para efeito da caducidade do contrato de trabalho, fazer a distinção entre invalidez relativa e absoluta. O facto do Decreto-Lei n.°187/2007, de 10 de Maio, ter passado a distinguir entre invalidez relativa e invalidez absoluta em nada veio a alterar a causa de caducidade do contrato de trabalho devido a reforma por invalidez, pois o que é essencial nessa causa de caducidade é o acto de reforma e não se a reforma foi determinada, por velhice ou invalidez e, dentro desta última, por invalidez relativa ou por invalidez absoluta. Tal como consta do preâmbulo do referido Decreto-lei n.º187/2007: “O presente decreto-lei traz uma outra importante novidade ao nosso ordenamento jurídico. Vem introduzir uma distinção no regime da protecção social na invalidez, entre a invalidez relativa, até aqui objecto de regulamentação anterior, e a invalidez absoluta, situação a merecer pela primeira vez atenção e tratamento especiais”.
Assim invalidez que agora – por contraposição – se chama relativa, era a invalidez, quando só havia um conceito, pelo que o que mudou foi a consagração de um novo regime, mais favorável, para o que hoje, se chama invalidez absoluta (fixação de um prazo de garantia mais baixo, não aplicação do factor de sustentabilidade, no momento da conversão da pensão por invalidez em velhice e a fixação de uma regra mais favorável nos, assim chamados, mínimos sociais).
Por outro lado, quando a Lei n.°7/2009, de 12 de Fevereiro, aprovou a revisão do Código do Trabalho e manteve, na alínea c) do respectivo art.º343, que o contrato de trabalho caduca com a reforma do trabalhador, por velhice e invalidez, já existia, no ordenamento jurídico, o Decreto-Lei n.°187/2007, de 10 de Maio, o qual, como se referiu, veio estabelecer, pela primeira vez, a distinção entre invalidez relativa e absoluta.
Assim, o legislador ao aprovar a revisão do CT de 2009, sabia e não podia ignorar que, em relação ao sistema de protecção social na velhice e invalidez, o Decreto-Lei n.°187/2007, de 10 de Maio, tinha estabelecido e consagrado a novidade de distinguir na reforma por invalidez, entre a invalidez relativa e a invalidez absoluta. Não obstante, continuou a estatuir, na alínea c) do art.º343, do CT, que a reforma por invalidez constitui causa de caducidade do contrato de trabalho, independentemente de se tratar de invalidez relativa ou absoluta.
Ora, se neste caso a lei não distingue entre invalidez absoluta e relativa, à luz do disposto no art.º9, n.º2, do Código Civil, o intérprete não o deverá fazer, isto é, onde a lei não estabeleceu distinção, também, não é lícito ao intérprete estabelecê-la, tornando-se claro que o sentido da alínea c) do art.º343, do CT é o de que a reforma por invalidez é causa de caducidade do contrato de trabalho, independentemente da segurança social ter considerado e qualificado tal invalidez como relativa ou absoluta. Neste sentido também já decidiu o tribunal da Relação de Coimbra, no seu acórdão de 2.06.2011, in wwwdgsi.
Na verdade, as situações previstas nas alíneas b) e c), do citado artigo 343º, são distintas, nem fazendo sentido que assim não o fosse, sendo que na alínea c) se consagra a reforma por invalidez, seja ela relativa ou absoluta.
Deste modo, a reforma do autor por invalidez relativa fez cessar, por caducidade, o contrato de trabalho a partir de 5 de Novembro de 2009, data em que a ré recebeu e tomou conhecimento da comunicação do Centro Nacional de Pensões a informar que o autor tinha sido reformado por invalidez, com efeitos desde 17 de Outubro de 2009.
Assim sendo, à luz do disposto na al. c) do art.º343, do CT, o tribunal recorrido julgou correctamente procedente a ocorrência da caducidade do contrato de trabalho. E assente que o contrato de trabalho, que vigorou entre o autor e a ré, cessou em 5 de Novembro de 2009 – sendo o direito que o autor pretende fazer valer emergente desse contrato, logo, sujeito ao prazo de prescrição previsto no art.º337, n.º 1 do CT – o tribunal recorrido concluiu, com acerto, no sentido de que o prazo de prescrição de um ano terminou no dia 6 de Novembro de 2010, uma vez que a presente acção deu entrada no tribunal no dia 19 de Dezembro de 2011, altura em que o prazo prescricional já se tinha completado, sem que tivesse ocorrido qualquer facto interruptivo, e julgou pela ocorrência da prescrição dos créditos reclamados pelo autor.

IV. Decisão
Face ao exposto, julga-se improcedente o recurso interposto e confirma-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 6 de Fevereiro de 2013.

Paula Sá Fernandes
Filomena de Carvalho
Isabel Tapadinhas
Decisão Texto Integral: