Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2426/08.2YXLSB.L1-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: CONTRATO DE MANDATO
ADVOGADO
HONORÁRIOS
OBRIGAÇÃO CONJUNTA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/29/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I–Os atos referidos no artigo 1º, n.º 6, alínea a), da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, deverão, para se conterem no balizamento dos atos próprios dos advogados, terem sido “exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional.”.
II–A verificação de tal interesse passará pelo equacionar da potencial vantagem ou realização de escopo, no âmbito da esfera jurídica do terceiro – designação abrangente, na economia da norma, de quem não estabeleceu com o advogado relação abrangida pelos “actos próprios dos advogados” referidos nas alíneas a) e b), do n.º 5 do mesmo artigo 1º.
III–Não se prescindindo, em qualquer caso, da vontade do “terceiro”, determinante/confirmativa, da prática dos atos em causa pelo advogado.
IV–Porque a solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes o regime regra é o das obrigações conjuntas ou parciárias.
V–O regime das obrigações conjuntas aflora no regime das obrigações divisíveis, constante do artigo 534º do Código Civil.
VI–Não obstante a supressão da referência à “moderação”, constante do artigo 65º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março, nos EOA que lhe sucederam, não deve aquele fator – entendido como querendo significar justeza e adequação, evitando-se a carestia, excesso e exagero insuportável, deixar de ser ponderado na justa remuneração.”.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


I–M, advogando em causa própria, intentou ação declarativa com processo comum, então sob a forma sumária, contra a Cooperativa de Habitação B e C, pedindo:
-a condenação solidária das RR. “no pagamento ao A. da quantia de €5.935,11, acrescida de juros à taxa legal, a contar do trânsito em julgado da decisão a proferir nos presentes autos”;
-e que sejam “ambas condenadas na sanção pecuniária compulsória a que se refere o artigo 829º-A do Cód. Civil.”.

Alegando, para tanto e em suma, que:

No exercício da sua referida atividade profissional de advogado patrocinou os interesses da 1ª R. e 2ª R., com vista a desbloquear o processo de loteamento 28/85, atinente à designada AUGl/CH, pendente na Câmara Municipal de ...
Tendo em atenção, além do mais, a importância dos serviços prestados, a dificuldade do assunto, designadamente, os diversos processos e incidentes que a resolução do assunto envolveu, e o tempo despendido, o cômputo geral dos honorários a pagar ao A. fixou-se em €15.000,00.
A esta importância, há que acrescer a quantia de € 4.000,00, a título de despesas e, ainda, o valor de €3.800,00, pelo I.V.A.
A quantia global a pagar pelas ora R.R., correspondente a metade dos supra referidos valores, no montante de €11.400,00, tendo o A. chegado a um acordo com a D. D para pagamento da outra metade, proporcional à respetiva quota na compropriedade de parte do terreno que integra o loteamento, cujo processo assim foi desbloqueado com a intervenção do A.
Porém, por conta do predito montante de €11.400, apenas lhe foi liquidado o valor de €5.464,89, permanecendo em dívida o montante de €5.935,11.

Contestaram as Rés, arguindo a ineptidão da petição inicial, por ininteligibilidade da causa de pedir, deduzindo no mais formal impugnação, e rematando com a procedência “por provada”, da “matéria de excepção da ineptidão da petição inicial, e, em consequência, absolverem-se as Rés da instância;”, ou, “Para a eventualidade da não procedência da referida matéria de excepção”, com a improcedência da acção, “e, em consequência, absolverem-se as Rés do pedido contra elas formulado”.

Apresentou o A. nominada réplica, concluindo com a improcedência “por não provadas” das “excepções alegadas na contestação dos autos”, devendo “ser considerada demonstrada litigância de má fé por parte de ambas as R.R., e consequentemente estas (…) condenadas, desta feita não no pagamento solidário mas sim conjunto, de multa e indemnização”.

Requerendo subsequentemente as RR. – na consideração de haver o A. excedido a resposta sobre a matéria de exceção efetivamente arguida na contestação – que fosse “o referido articulado (…) objeto de desentranhamento, ou então (…) declarar-se como não escrito e sem qualquer efeito jurídico o conteúdo de tal articulado, na parte em que está para além do que lhe era legalmente permitido fazer (…)”.

Por despacho reproduzido a folhas 84 e vº, foi descartada a arguida ineptidão da petição inicial, convidando-se no entanto o A. “a especificar de forma detalhada e concreta os actos que praticou em relação a cada uma das RR, despesas realizadas com ou na sequência daqueles, bem com a factualidade onde alicerça o interesse comum daquelas, atenta a configuração por si dada à causa.”.
Ao que aquele correspondeu, nos termos que se alcançam de folhas 87 a 96.

O processo seguiu seus termos, com saneamento, sendo dispensada a fixação da base instrutória.

E Solicitado laudo à O.A., foi o mesmo elaborado, mostrando-se junto a folhas 370-375.

Notificado daquele, veio o A. requerer a ampliação do pedido, em termos de se condenarem as RR. também no pagamento de juros à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
E, desde logo, dar conta de haver requerido junto da O.A. a aclaração e retificação do Acórdão que concedeu o laudo anteriormente aludido, mais tendo arguido, subsidiariamente, a nulidade daquele.

Posteriormente veio a remetido aos autos, pela O.A., e juntos a folhas 406-409, novo Parecer e Acórdão da O.A., este dando “provimento ao pedido de aclaração e reforma do laudo”, e concedendo laudo “ao montante dos honorários apresentados de € 15.000,00”.

Realizada que foi a audiência final, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“Por todo o exposto, julga-se a presente acção procedente e, em consequência, condena-se as Rés a pagar solidariamente ao Autor a quantia de € 5.935,110 acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data da citação, até integral pagamento”.

Inconformadas, recorreram as RR., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões:
“1ª-Vem o Autor alegar que levou a efeito, na sua qualidade de advogado, em nome e representação das ora Rés, um conjunto de atos identificados na petição inicial, que culminou na realização duma escritura de divisão de coisa comum, em que foram intervenientes MC, a ora Ré, JAC, JC e D. D.
2ª-Mais alegando que, devido a esse facto, as Rés lhe estão a dever a quantia de € 5.935,11, acrescida dos respetivos juros de mora.
3ª-Contudo, não alegou, de forma discriminada, a factualidade respeitante a cada um dos intervenientes na escritura, nomeadamente no que respeita às ora Rés, ou seja, os serviços que diz ter prestado, as despesas, o tempo gasto, bem como os respectivos resultados e benefícios, em relação a cada um dos interessados.
4ª-O A. alega factos, nomeadamente, celebração da escritura de divisão de coisa comum, na qual intervieram apenas os titulares do direito de propriedade sobre os terrenos, com os quais a 1ª Ré nada tem a ver, por a ela não respeitarem, uma vez que não podia intervir, nem por si, nem por interposta pessoa, pois que não era comproprietária dos ditos prédios.
5ª-Todo o trabalho desenvolvido pelo A neste processo foi anterior à celebração da dita escritura.
6ª-O A apresentou uma conta de € 22.800,00 (€ 15.000,00 de honorários + 4.000,00 de despesas e € 3.800,00 de IVA, alegando ter chegado a acordo com a sua constituinte D. D para pagamento de metade, ou seja de € 11.400,00, dizendo que a outra metade era da responsabilidade das ora Rés.
7ª-Acontece que o A nunca prestou quaisquer serviços às ora Rés.
8ª-O A, interveio, em todos os actos por ele referidos, apenas no exercício do patrocínio e defesa dos interesses da sua cliente D. D, comproprietária dos terrenos, que posteriormente foram integrados no loteamento em questão.
9ª-A Ré CH esteve sempre representada em todo este processo pela sua advogada Drª CM, como o A expressamente o reconhece no artigo 7° da petição inicial, sendo ela que levou a efeito todos os actos necessários praticar em todo este processo de constituição de loteamento dos prédios em questão, no que a ela respeitavam.
10ª-As Rés nunca aceitaram o patrocínio do A, nem o constituíram como seu advogado, nunca lhe tendo conferido qualquer mandato, ou procuração, nem lhe solicitaram a prestação de qualquer serviço.
11ª-Mas mesmo que lhe assistisse legitimidade legal para exigir das Rés tal pagamento de honorários, o que só por mera hipótese de raciocínio jurídico se admite, nunca poderia haver lugar à aplicação do regime da condenação solidária, uma vez que não foram praticados, nem antes nem depois da atrás referida celebração de escritura, quaisquer atos relativamente às Rés, demonstrativos do seu interesse comum.
12ª-Como é evidente o interesse dos proprietários vendedores dos ditos prédios era alienar e o interesse da Ré CH era adquirir.
13ª-Daí que, no caso presente, nunca poderia haver lugar à aplicação do regime da condenação solidária no pagamento dos pretensos e pretendidos honorários, uma vez que não foram praticados nem aduzidos pelo A factos demonstrativos do interesse comum das Rés (conceito de direito), alegado pelo A.
14ª-Não existindo solidariedade de devedores, a alegada dívida teria que considerar-se conjunta e, como tal, o A teria que discriminar separadamente em relação a cada uma das ora Rés, especificando de forma concreta e proporcionada os serviços prestados, o tempo despendido e a parte dos honorários que a cada uma das Rés competia pagar.
15ª-Pelo que se está perante uma situação de petição irregular ou deficiente que leva à absolvição das Rés do pedido.
16ª-O Autor não provou, e muito menos alegou, que possuísse procuração ou mandato para representar as Rés em todo este processo.
17ª-O A, interveio, em todos os actos por ele referidos, apenas no exercício do patrocínio e defesa dos interesses da sua cliente D. D, comproprietária dos terrenos, que vieram posteriormente a ser integrados no loteamento em questão.
18ª-A Ré CH não teve nada a ver com a legalização da situação registral dos prédios tendo-se limitado a fazer a sua aquisição a fim dos mesmos serem integrados no loteamento que pretendia levar a efeito.
19ª-As despesas e encargos com a regularização da situação registral dos prédios a vender são da responsabilidade dos proprietários vendedores e não dos adquirentes compradores.
20ª-A 1ª Ré ao fazer tais adiantamentos não aceitou, de forma expressa ou tácita, o patrocínio dos seus interesses por parte do A
21ª-O valor fixado a título de honorários, no montante de €15.000,00, por conta dos quais o A, já recebeu metade da sua cliente D. D, mais € 4.000,00 para despesas, peca por excessivo e desproporcionado, face ao trabalho desenvolvido e resultados obtidos.
22ª-O A, na determinação de tais honorários não respeitou os princípios consignados no Estatuto da Ordem dos Advogados, nem tão pouco o disposto no artigo 2°, n° 1 do Regulamento de Honorários, nomeadamente os princípios da moderação, da proporcionalidade e da equidade.
23ª-O valor de € 16.864,89, já recebido pelo Autor, a título de honorários, despesas e IVA (€ 1.400,00 da sua cliente D. Dolores mais 5.464,89), que a 1ª Ré entregou ao A., a título de adiantamento por conta do herdeiro JAC, mostra-se mais que suficiente para pagar o trabalho desenvolvido em cumprimento do mandato que lhe foi conferido pela sua cliente D. D.
24ª-Daí que as Rés nada tenham que lhe pagar A. pela simples e singela razão de que nada lhe devem.
25ª-Pelo que, no caso presente, não foi feita a melhor interpretação da lei, nem a justa aplicação do direito, pelo que se mostram violadas, de entre outras, as normas constantes dos artigos 552°, n° 1, alínea d) do C.P.C.; 513°,1157° e 1158°, n° 2 do C.C. e 100°, n.ºs 2 e 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados
26ª-Pelo que é insubsistente e carecida de base legal a douta decisão recorrida.”.

Termina com a revogação da sentença recorrida “com as respetivas consequências legais”.

Contra-alegou o A., dizendo, em conclusões:

“1.A douta sentença recorrida fixou a matéria constante dos autos com um criterioso rigor de análise, procedendo depois, ao consequente enquadramento legal, segundo os melhores parâmetros lógico-discursivos.
2.Assim, a Meritíssima Juiz "a quo" decidiu na posse de todos os elementos materiais necessários e bastantes para uma decisão de direito, não cometendo qualquer irregularidade ou infracção à lei
3.Pelo que a referida douta sentença não violou qualquer disposição legal.
4.O recurso interposto pelas Apelantes deve ser indeferido e rejeitado, por inobservância do disposto nos artigos 639.º, n.º 2, alínea b), 640.º, n.º 1, alíneas a), b), e c) e 641.º, n.º 2, alínea b), todos do C.P.C.
5.Quando assim não seja entendido, deverá ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida na plenitude da sua formulação e respectivas consequências.
6.Devendo, outrossim, as Rés ora Apelantes ser condenadas, como litigantes de má-fé, a pagar ao Autor ora Apelado uma indemnização não inferior a €1.500,00 (mil e quinhentos euros).”.

II-Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.

Importando que, preliminarmente, nos debrucemos sobre o “indeferimento e rejeição” do recurso propugnado pelo Recorrido, nas suas contra-alegações.

1.Considera aquele, a propósito, que:

«Ora, vistas as conclusões da alegação das Rés ora recorrentes, verifica-se que estas alegam "... que, no caso presente, não foi feita a melhor interpretação da lei, nem a justa aplicação do direito, pelo que se mostram violadas, de entre outras, as normas constantes dos artigos 552º, nº 1, alínea d) do C.P.C.; 513º, 1157º e 1158, nº 2, do C.C. e 100º nºs 2 e 3 do Estatuto da Ordem dos Advogados" (cit. conclusão 25ª).
Contudo, as apelantes não se dignam indicar "O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas” postergando, assim, o prescrito na alínea b), do nº 2, do artº 639º do C.P.C.
Por outro lado, do teor das preditas alegações e conclusões resulta que as apelantes também questionam a existência de “…factos demonstrativos do interesse comum das rés..." (cit. alegações das apelantes, p. 4), e impugnam a (… aplicação do regime de condenação solidária, uma vez que não foram praticados (...) quaisquer atos relativamente às Rés, demonstrativos do seu interesse comum" (cit. conclusão 11ª das apelantes, p. 8).
Assim, as apelantes impugnam o sentido da decisão relativa à matéria de facto, designadamente, o ponto ou alínea 25) dos “…factos provados, com relevância para a decisão da causa” e refutam o corolário do referido questionado ponto da matéria de facto provada, ou seja, que "Logo improcede a alegação de que pelo Autor não foram praticados quaisquer factos demonstrativos do interesse comum das Rés." (vidé douta sentença recorrida, pág. 5 e 11).
Porém, ao arrepio do disposto no artº 640º. do C.P.C., as apelantes também não se dignam especificar onde está o erro (os concretos pontos de facto tidos por incorretamente julgados}, qual a causa do erro (os concretos meios probatórios da prova produzida que impunham decisão diversa da recorrida}, nem como corrigir o erro que imputam à decisão relativa à matéria de facto (especificando a decisão tida por adequada).».

2.Começando pela assacada inobservância do disposto no artigo 639º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil, logo se assinalará que – como se presumiria ser do conhecimento do ilustre mandatário da parte – a inobservância do correspondente ónus começa por dar lugar a um convite ao recorrente para completar as conclusões, cfr. n.º 3, do citado artigo.
Apenas no caso de não corresponder o recorrente a tal convite se não conhecendo “do recurso na parte afetada.”, (ibidem, in fine). 

Isto dito.

Nos termos de tal inciso, “Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas.”.
Ou seja, importa que o recorrente indique nas conclusões o “sentido que deve ser atribuído às normas cuja aplicação e interpretação determinou o resultado que pretende impugnar;”.[1]
Diversamente, portanto, da outra hipótese de violação de “norma jurídica”, contemplada na alínea c) do mesmo n.º 2, a saber, de invocação de “erro na determinação da norma aplicável”, em que deverá ser indicada “a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.”.

Das normas cuja violação vem imputada à sentença recorrida, nas alegações das Recorrentes, apenas a do artigo 100º do novo Estatuto da O.A. e a do artigo 1158º, n.º 2, do Código Civil, se incluem no elenco das expressamente convocadas na fundamentação da dita sentença.
Concedendo-se, porém – considerada a inicial inclusão, em sede de julgamento de direito, de parágrafo correspondente a linhas 25 e 26 de folhas 430, depois suprimido, por despacho de folhas 523-524, onde era feita referência a tal normativo – a implícita convocação, também, do artigo 1157º do Código Civil.

Apenas quanto a elas sendo pois de colocar a questão da pretendida omissão, em sede de conclusões, da indicação do “sentido com que, no entender do recorrente”, as mesmas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.

Como do conjunto das conclusões de recurso incontornavelmente resulta, os Recorrentes pretendem ser de afastar, pura e simplesmente, a aplicação daquelas disposições, por, em suma, nenhum negócio jurídico bilateral, envolvendo a prática de qualquer dos atos invocados pelo A., haver sido celebrado entre aquele e qualquer das RR., vejam-se as conclusões 4ª, 7ª, 8ª, 9ª e 10ª.
Sem prejuízo de mais concluírem que “22ª - O A., na determinação de tais honorários não respeitou os princípios consignados no Estatuto da Ordem dos Advogados, nem tão pouco o disposto no artigo 2°, n.º 1 do Regulamento de Honorários, nomeadamente os princípios da moderação, da proporcionalidade e da equidade.”
Pois “23ª - O valor de €16.864,89, já recebido pelo Autor, a título de honorários, despesas e IVA (€11.400,00 da sua cliente D. Dolores mais 5.464,89), que a 1ª Ré entregou ao A., a título de adiantamento por conta do herdeiro JAC, mostra-se mais que suficiente para pagar o trabalho desenvolvido em cumprimento do mandato que lhe foi conferido pela sua cliente D. D.”.

Destarte, sempre a alternativa proposta pelas Recorrentes à aplicação feita, na sentença recorrida, das referenciadas normas, estaria consignada nas conclusões das suas alegações.

3.No que concerne ao 552º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil – determinando a obrigatoriedade de o A. expor na petição inicial os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação – e ao artigo 513º do Código Civil – dispondo quanto às fontes da solidariedade – cuja violação é igualmente apontada na conclusão 25ª das alegações dos Recorrentes, conquanto se não trate de disposições referenciadas na sentença recorrida, mas porque nela – implicando pressuposições normativas – se procedeu à condenação solidária das RR., sempre se dirá:
Como uma vez mais se colhe no conjunto das restantes conclusões – que, é facto, tal como o corpo das alegações respetivas, que em grande medida decalcam, não primam pela clareza, sistematização ou síntese – a violação das sobreditas disposições é equacionada pelas Recorrentes com a ausência de alegação discriminada, na petição inicial, relativamente a cada uma das RR., de factos suficientes para a condenação solidária, ou mesmo conjunta, daquelas, vejam-se as conclusões 3ª, 11ª, 13ª, 14ª.
Daí retirando “que se está perante uma situação de petição irregular ou deficiente que leva à absolvição das Rés do pedido.”, vd. conclusão 15ª.
Logo assim se vendo como foi feita, nas conclusões respetivas, e também nesta parte, a indicação do sentido com que aquelas normas, no entender das Recorrentes, deveriam ter sido aplicadas.
*

Não sendo pois caso de não conhecimento do recurso, nos quadros do artigo 639º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

4.Quanto à apontada impugnação do “sentido da decisão relativa à matéria de facto”.
1.Nos termos do artigo 640º, do Código de Processo Civil:
“1-Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2-No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a)Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
(…)”.

Ora, e desde logo, não se vislumbra nas alegações das Recorrentes a expressão de uma impugnação da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto.

Confrontando-nos, apenas, com uma narrativa paralela, alheada, em vários trechos, do acervo factual julgado provado, ou não provado, na sentença recorrida.

Ou seja, e em suma, não se reconhece nas alegações das Recorrentes, mais do que a expressão de um inconformismo com o julgado na 1ª instância, a vontade processualmente expressa de impugnar o decidido, nesse plano.

2.Mas ainda quando assim não fosse de entender, ponto é que, como se julgou em Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-07-2016[2] – no que parece refletir algum distanciamento de soluções de magnânima condescendência – “I-Para que a Relação conheça da impugnação da matéria de facto é imperioso que o recorrente, nas conclusões da sua alegação, indique os concretos pontos de facto incorrectamente julgados, bem como a decisão a proferir sobre aqueles concretos pontos de facto, conforme impõe o artigo 640º, nº 1, alíneas a) e c) do CPC. II-Não tendo o recorrente cumprido o ónus de indicar a decisão a proferir sobre os concretos pontos de facto impugnados, bem andou a Relação em não conhecer da impugnação da matéria de facto, não sendo de mandar completar as conclusões face à cominação estabelecido naquele nº 1 para quem não os cumpre. III-A imposição daquele ónus ao recorrente não viola o direito de acesso aos tribunais, não impondo a Constituição da República Portuguesa ao legislador ordinário que garanta aos interessados o acesso ao recurso de forma ilimitada.” (o grifado é nosso).
Tendo-se decidido, em Acórdão daquele mesmo Tribunal, de 31-05-2016,[3] que “VI - Nas conclusões, deve ser incluída a questão atinente à impugnação da matéria de facto, ou seja, aí deve introduzir-se, sinteticamente “os fundamentos por que pede a alteração (ou anulação) da decisão” (art. 639.º, n.º 1), o que servirá para o recorrente afirmar que matéria de facto pretende ver reapreciada, indicando os pontos concretos que considera incorrectamente julgados, face aos meios probatórios que indica nas alegações.” (idem).
No mesmo sentido podendo ver-se ainda, e entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-06-2016,[4] e 29-10-2015.[5]

Ora, para além de serem as conclusões das alegações das Recorrentes omissas no tocante à especificação dos pontos da matéria de facto que considerarão incorretamente julgados – e que, de resto, sempre teria de ser feita com reporte aos correspondentes números dos elencos respetivos, na sentença recorrida – também ponto é que nem nas conclusões nem no corpo das alegações procederam as Recorrentes à indexação de específicos meios de prova à impugnação de cada um de concretos pontos de facto que assim considerassem incorretamente julgados.

3.Assinalando-se, conquanto assim apenas marginalmente, que sendo as referências aos Doc. 11 e 7, as únicas a concretos meios de prova, temos que com o primeiro, aquelas visam a demonstração de facto…que não encontra oposição no petitório do A.: “Acontece que esses actos, que o A.. alega ter praticado em nome das Rés, relativamente aos prédios descritos na petição inicial, nenhum deles diz respeito à 1ª Ré, pois que esta não era proprietária de quaisquer dos bens imóveis referidos em tal articulado, como se prova pela fotocópia notarial da escritura de divisão de coisa comum, que se encontra junta aos autos sob a designação de Doc. n.º 11”.
Resultando aquele, de resto, da factualidade apurada, a que assim nada acrescenta, cfr. n.ºs 2, 3, 25 (I) e 25 (II), dos factos provados.

Reportando o segundo “Doc.” à “justificação” para os “pagamentos referidos pelo A. no artigo 14º da petição inicial”.
Quando certo é que – tendo o A. referido naquele ponto do seu articulado inicial que “tanto a primeira R. como a segunda R. aceitaram o patrocínio do advogado signatário e ora A., como resulta dos pagamentos efectuados pela primeira R, em Novembro de 2006 e Abril de 2007, por conta de honorários e despesas, conforme cartas juntas em anexo (doc.s 7 e 8), e bem assim, atesta o requerimento subscrito pela segunda R., em 30/03/07, aqui também junto em anexo (doc.9).” – tal aceitação e nexo não transitaram para o elenco dos factos provados.
Estando provado, e apenas, recorda-se, que: “A primeira Ré efectuou pagamentos ao A. em Novembro de 2006 e Abril de 2007, por conta de honorários e despesas, conforme cartas juntas como doc. 7 e 8 juntas aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, bem como o docº nº 9 junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido, subscrito pela 2ª Ré.”.
Que não já terem “tanto a primeira R. como a segunda R.”, aceitado “o patrocínio do advogado signatário e ora A.”.
E isso, assim, para lá do não provado de que o A. “No exercício da sua actividade profissional de advogado não patrocinou os interesses da 1ª Ré e 2ª Ré com vista a desbloquear o processo de loteamento 28/85 atinente à designada AUGI/CH, pendente na Câmara Municipal de ...”, e de que “Tanto a primeira como a segunda Ré não aceitaram o patrocínio do advogado signatário e ora R.”.

Certo ainda, a propósito, que o não provado de um facto não implica o provado do seu contrário.
***

Tendo-se assim que, quando tivessem as RR. pretendido impugnar a decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto, sempre seria de rejeitar o recurso, nessa parte.
*

Que face ao teor do dito doc. 7 – como dos documentos 8 e 9 – seja de alcançar, em sede de valoração da matéria de facto, conclusão diversa da  subscrita na 1ª instância – e designadamente enquanto pressupõe a celebração de um contrato de mandato entre o A. e as RR. – é questão que transcende já os quadros da hipoteticamente deduzida impugnação da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto.
Presente aqui que como refere Teixeira de Sousa,[6] em comentário a Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-04-2016, “Importa ter presente que, tendo o nCPC removido a separação entre o julgamento da matéria de facto e de direito e, portanto, permitido uma (inevitável) combinação entre a matéria de facto e de direito, não pode ser retirada ao tribunal a possibilidade de fazer juízos valorativos e conclusivos sobre a matéria de facto. A única condição é que esses juízos tenham suficiente apoio na matéria de facto dada como provada ou não provada.
Seria desejável que se encontrasse definitivamente ultrapassada uma certa "escolástica" que se instalou na prática dos tribunais, nomeadamente na proibição da utilização de conceitos jurídicos para enquadrar a matéria de facto e do recurso a juízos conclusivos ou de valor para referir a matéria de facto (nomeadamente, aquela que deve ser provada). As únicas coisas que podem ser relevantes é que a apreciação da matéria de facto esteja devidamente fundamentada e que o julgamento de direito esteja de acordo com a matéria de facto provada e não provada.”.

Isto posto:
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objeto daquele – vd. art.ºs 635º, n.º 3, 639º, n.º 3, 608º, n.º 2 e 663º, n.º 2, do novo Código de Processo Civil – são questões propostas à resolução deste Tribunal:
-o exercício pelo A de patrocínio das RR., por vontade e no interesse destas;
-a ilegalidade da condenação solidária das RR.;
-o excessivo e desproporcionado, do valor fixado a título de honorários.

Considerou-se assente, na 1ª instância, a matéria de facto seguinte:
“1)O Autor exerce a profissão de advogado, com escritório no Campo Grande, em Lisboa.
2)Tendo em consideração o facto de parte do terreno que integra o aludido loteamento ser então, detido em compropriedade, a Câmara Municipal de …convocou os legítimos proprietários em questão (herdeiros do falecido JAC e D. D) e a Administração Conjunta da AUGI/Ch, para uma reunião comum, que se realizou no Edifício dos Paços do Concelho a 10 de Julho de 2006, na qual comunicou a constatação do vício de falta de legitimidade, assinalando a circunstância deste constituir questão prejudicial à emissão do pretendido alvará de loteamento, e por consequência, advertiu expressamente as partes interessadas para a viabilidade e aprovação do referido projecto de loteamento.
3)As partes interessadas (herdeiros do falecido JAC/CH e D. D), chegaram a um consenso, com vista a pôr termo à supra assinalada compropriedade, mediante a outorga da competente escritura de divisão de coisa comum.
4)Porém as inscrições de propriedade relativas aos prédios objecto da pretendida divisão, à data, não se encontravam actualizadas, o mesmo sucedendo quanto aos respectivos averbamentos matriciais, designadamente, em relação à parte pertencente aos Herdeiros do finado JAC.
5)Neste contexto a CH e ora 1ª Ré deu instruções à respectiva ilustre Advogada Drª CM para desenvolver as diligências necessárias ao averbamento matricial e à actualização das inscrições de propriedade dos acima mencionados prédios relativamente à parte detida pelos Herdeiros de JAC.
6)A actualização das inscrições de propriedade dos prédios em apreço carecia de prévia actualização das respectivas descrições prediais, nomeadamente em relação à respectiva matriz predial, sendo certo que, para além da harmonização do teor matricial com a descrição predial, era também necessário proceder à rectificação da descrição predial relativamente à área e confrontações de dois dos mencionados prédios.
7)O A. patrocinou o assunto em questão dedicando-lhe mais de um ano e meio todo o cuidado toda a dedicação e todo o tempo necessários ao bom andamento e êxito do mandato.
8)Para uma melhor apreciação deste empenhamento o A. enviou a conta especificada dos seus honorários e despesas tanto à primeira Ré como à segunda Ré pelo seguro dos correios.
9)A missiva enviada pelo A. à primeira Ré foi por esta devolvida, juntamente com a “Conta de Honorários e despesas” que a acompanhava, por aquela entender que a mesma lhe tinha sido enviada “possivelmente por lapso”.
10)A segunda R. por sua vez, não fez o mais leve comentário à carta que lhe foi remetida pelo A.
11)A primeira Ré efectuou pagamentos ao A. em Novembro de 2006 e Abril de 2007, por conta de honorários e despesas, conforme cartas juntas como doc. 7 e 8 juntas aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, bem como o docº nº 9 junto aos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido, subscrito pela 2ª Ré.
12)Os Herdeiros do finado JAC também subscreveram as pertinentes declarações complementares prestadas com as diversas apresentações efectuadas pelo ora A. junto da Conservatória do Registo Predial de ....
13)E ainda com os vários contactos e múltiplas deslocações junto das diversas entidades envolvidas na resolução do assunto em apreço (C.M. de…, Conservatória do Registo Predial de …, Serviço de Finanças de …, Direcção Distrital de Finanças de …, Arquivo da Torre do Tombo, Arquivo Distrital de …, Arquivo do Palácio da Justiça, Conservatória do Registo Civil, Instituto Geográfico Português, Topográfico e Notário).
14)Designadamente junto da Conservatória do Registo Predial de …, para instauração e acompanhamento dos processos especiais de rectificação 3/2007 e 4/2007 junto do Serviço de Finanças de …, com a promoção dos diversos processos de reclamação instaurados e a obtenção de diversas certidões negativas, e junto do Instituto Geográfico Português, para acompanhamento do processo de cadastro instaurado.
15)Bem como com a marcação e acompanhamento da referida escritura de divisão de coisa comum, nomeadamente, com as reuniões tidas com a Notária LS (que condicionou a celebração da pretendida escritura à obtenção de parecer favorável por parte da Direcção Regional de Agricultura com competência na área dos prédios a dividir) e, posteriormente com o notário RJ, para análise e discussão do caso.
16)O patrocínio exercido pelo A. culminou na outorga da escritura de divisão de coisa comum, celebrada em 23.06.2008, permitindo a resolução extrajudicial de uma contenda com mais de vinte décadas.
17)Tendo em atenção a importância dos serviços prestados, a dificuldade do assunto designadamente os diversos processos e incidentes que a resolução do assunto envolveu e o tempo despendido, o A. fixou os seus honorários em € 15.000.
18)A esta importância o autor acresceu a quantia de €4.000, a que acrescem € 3.800 de IVA, a título de despesas que incluem encargos relativos ao pagamento de taxas e emolumentos com apresentações e obtenção de certidões, taxa de activação ou abertura de processo de cadastro, honorários de topógrafo, bem como despesas de escritório, durante mais de dezoito meses, envolvendo comunicações, expediente e inúmeras deslocações, nomeadamente a ...
19)A quantia global pedida pelo Autor às ora RR. corresponde a metade dos referidos valores, num total de € 11.400,00 tendo o A. chegado a acordo com a D. D, para pagamento da outra metade, proporcional à respectiva quota na referida compropriedade.
20)Por conta do referido montante de € 11.400,00 apenas foi liquidado o valor de € 5.464,89, tendo o Autor já emitido e entregues à primeira Ré CH recibos por honorários no montante de € 3.025,00.
21)O Autor cobrava, à época, € 75,00 por cada hora de trabalho.
25)O prédio que foi adjudicado à 2ª Ré, tem área superior (cerca de 130.000 m2) e integra o mencionado loteamento da AUGI/CH, promovido pela 1ª Ré com respectivo interesse ou expectativa comum de ambas as RR na capitalização das mais valias decorrentes da circunstância dos respectivos prédios de sua propriedade passarem de rústicos a urbanos, por efeito da aprovação do aludido projecto de loteamento 28/85, denominado AUGI/CH, com 162 lotes para construção de moradias.
25)Os prédios adjudicados à D. D, por seu turno, são prédios rústicos, com menos área (cerca de 75.000 m2) e encontram-se na sua globalidade em área de reserva ecológica e reserva agrícola, tendo todos problemas com ocupações e respectivas acções de reivindicação.”.

Tendo-se julgado não provado:
“1.No exercício da sua actividade profissional de advogado não patrocinou os interesses da 1ª Ré e 2ª Ré com vista a desbloquear o processo de loteamento 28/85 atinente à designada AUGI/CH, pendente na Câmara Municipal de ...
2.Em virtude da forma leviana como a Comissão de Administração Conjunta da AUGI/CH promoveu o predito processo de loteamento, sem acautelar a necessária legitimidade, a Câmara Municipal de … condicionou a emissão do competente alvará de loteamento à prévia expurgação do verificado vício de falta de legitimidade.
2.Em face do trabalho acrescido e da complexidade do assunto a Distinta Advogada da CH Drª CM, em meados de Novembro de 2006, tomou a iniciativa de contactar telefonicamente o advogado signatário e ora A. e de lhe solicitar os seus bons ofícios, no sentido deste se ocupar inteiramente do caso e, promover as diligências tidas por convenientes com vista à obtenção da documentação necessária à outorga da pretendida escritura de divisão de coisa comum.
3.Tanto a primeira como a segunda Ré não aceitaram o patrocínio do advogado signatário e ora R. como resulta dos pagamentos efectuados pela primeira Ré em Novembro de 2006 e Abril de 2007, por conta dos honorários e despesas.
4.A necessidade de regularização do processo de loteamento, em termos registrais, só surgiu devido à pressão exercida pelo A. junto da CM.
5.Não fossem as ameaças exercidas pelo A. nunca a CM teria levantado problemas dessa ou de qualquer outra natureza.
6.Foi dito na reunião, realizada em 10 de Julho de 2006 na CM, que a questão da necessidade de regularização registral tinha sido levantada como consequência da queixa apresentada pelo A. em que o mesmo ameaçava levar o assunto a tribunal, se não fosse obtida uma solução negociada através da via extrajudicial.
7.Foi devido à intervenção do A. que a D. D, sua constituinte, se recusou a assinar um acordo, já devida e anteriormente negociado entre a 2ª Ré e demais comproprietários, tendente à divisão dos terrenos objecto de compropriedade, que veio mais tarde a ser levada a efeito pela escritura de divisão de coisa comum referida.
8.O que atrasou a mencionada escritura de divisão de coisa comum não foi a actualização das descrições e inscrições prediais, mas sim o atraso verificado pela não conclusão do processo do cadastro não respeitante à 2ª Ré.
9.Resultando de tal procedimento uma situação mais vantajosa para a sua cliente, com manifesto prejuízo para a 2ª Ré, pois que teve de abdicar de parte do seu património a favor da cliente do A. em relação ao acordo verbal anteriormente celebrado.
10.Desta conduta, levada a efeito pelo A. junto da CM em nome e representação da sua cliente D. D, resultou uma grande morosidade na outorga da escritura (cerca de dois anos) e consequente aprovação e concessão do dito alvará.”.

E sendo ainda que:
“Não se provaram factos contrários aos supra enunciados ou quaisquer outros com relevância para a decisão da causa, designadamente que a Ré procedeu ao pagamento de todas as quantias pedidas pelo Autor, correspondentes aos serviços objecto da presente acção.
Não se faz igualmente menção a articulados contendo matéria conclusiva ou meras alegações de direito.”.
***

Vejamos.

II–1-Do exercício pelo A de patrocínio das RR., por vontade e no interesse destas.

1.Como é sabido, a prestação de serviços por advogado pode assentar, paradigmaticamente, em contrato de mandato, contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços.
No contrato de trabalho é traço fundamental a subordinação jurídica – cfr. Artigos 11.º, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei, n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro e artigo 7º desta Lei – sendo que o contrato de prestação de serviços “tendo a natureza de prestação continuada com remuneração fixa pode assumir a tipologia de contrato de avença, ou resultar ainda de acto administrativo ou jurisdicional por força de nomeação oficiosa.”.[7]
Logo assim sendo de descartar, face à causa de pedir desenhada pelo A. e ao conjunto dos factos provados, qualquer uma dessas fontes da prestação de serviços pelo A. às RR.

No tocante ao contrato de mandato, dispõe-se no artigo 62º do EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro – vigente à data dos factos, e com lugar paralelo no artigo 67º, do nEOA, aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 09 de Setembro – que:

“1-Sem prejuízo do disposto na Lei n." 49/2004, de 24 de Agosto, considera-se mandato forense:
a)O mandato judicial para ser exercido em qualquer tribunal, incluindo os tribunais ou comissões arbitrais e os julgados de paz;
b)O exercício do mandato com representação, com poderes para negociar a constituição, alteração ou extinção de relações jurídicas;
c)O exercício de qualquer mandato com representação em procedimentos administrativos, incluindo tributários, perante quaisquer pessoas colectivas públicas ou respectivos órgãos ou serviços, ainda que se suscitem ou discutam apenas questões de facto.
2-O mandato forense não pode ser objecto, por qualquer forma, de medida ou acordo que impeça ou limite a escolha pessoal e livre do mandatário pelo mandante.”.

Ora, também esta modalidade de mandato não poderia estar aqui em causa.
Desde logo, não se tratou, na versão apresentada pelo A., e face à factualidade apurada, de mandato para ser exercido em qualquer tribunal.
Depois, não foi invocada a investidura do A., por qualquer das RR., em poderes de representação, referindo-se aquele apenas a atos por si praticados no interesse comum das RR e com proveito para ambas, vd. v.g., o articulado de “esclarecimento” do A., a folhas 87-96.
Poderes aqueles que sempre teriam de ser conferidos através da competente procuração, cfr. artigo 262º do Código Civil.

Aliás, a própria circunstância de – como provado está – os Herdeiros do finado JAC também terem subscrito “as pertinentes declarações complementares prestadas com as diversas apresentações efectuadas pelo ora A. junto da Conservatória do Registo Predial de Palmela”, exclui tais poderes de representação que, a existirem, tornariam redundante aquela subscrição por parte da 2ª Ré.

2.Resta verificar se, face à factualidade apurada, nos confrontaremos com algum dos outros atos da profissão de advogado, definidos na lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto.

De acordo com o disposto no artigo 1º, da referida Lei:
(…)
“5-Sem prejuízo do disposto nas leis de processo, são actos próprios dos advogados e dos solicitadores:
a)O exercício do mandato forense;
b)A consulta jurídica.
6-São ainda actos próprios dos advogados e dos solicitadores os seguintes:
a)A elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
b)A negociação tendente à cobrança de créditos;
c)O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de actos administrativos ou tributários.
7-Consideram-se actos próprios dos advogados e dos solicitadores os actos que, nos termos dos números anteriores, forem exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou actividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei.
8-Para os efeitos do disposto no número anterior, não se consideram praticados no interesse de terceiros os actos praticados pelos representantes legais, empregados, funcionários ou agentes de pessoas singulares ou colectivas, públicas ou privadas, nessa qualidade, salvo se, no caso da cobrança de dívidas, esta constituir o objecto ou actividade principal destas pessoas.
9-São também actos próprios dos advogados todos aqueles que resultem do exercício do direito dos cidadãos a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
10-Nos casos em que o processo penal determinar que o arguido seja assistido por defensor, esta função é obrigatoriamente exercida por advogado, nos termos da lei.
11-O exercício do mandato forense e da consulta jurídica pelos solicitadores está sujeito aos limites do seu estatuto e da legislação processual.”.

Resultando de cristalina evidência que os apurados atos praticados pelo A. são reconduzíveis aos previstos no antecedentemente transcrito n.º 6 alínea a).
Importando porém que tais atos – enquanto não integrantes de um contrato de mandato não forense, que sempre exigirá a natureza jurídica dos atos a praticar por conta do “mandante”, cfr. artigo 1157º, do Código Civil – e para que se contenham no balizamento dos atos próprios dos advogados, hajam sido “exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional.”, cfr. cit. n.º 7.
Aparentemente neste sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19-04-2007 – proc. 0970/06, Relator COSTA REIS, in www.dgsi.pt/jsta.nsf.

2.1.-A verificação de tal interesse passará pelo equacionar da potencial vantagem ou realização de escopo, no âmbito da esfera jurídica do terceiro – designação abrangente, na economia da norma, e como decorre do contraponto com o disposto no n.º 8 do mesmo artigo, de quem não estabeleceu com o advogado relação abrangida pelos “actos próprios dos advogados” referidos nas alíneas a) e b), do n.º 5 do mesmo artigo 1º.
Não prescindindo, em qualquer caso, da vontade do “terceiro”, determinante/confirmativa, ainda que tacitamente, da prática do(s) ato(s) em causa pelo advogado.

Pois bem.
Que as Rés tinham interesse naqueles atos praticados pelo A., no exercício da sua profissão de advogado, resulta incontornavelmente da factualidade apurada.
Aqueles visaram a viabilização da celebração da escritura de divisão de coisa comum do prédio aludido em 2 da matéria de facto assente, sendo que o termo de tal compropriedade constituía, por sua vez, “questão prejudicial” à emissão do alvará de loteamento de parte do dito prédio…
…Loteamento esse promovido pela 1ª Ré… “com respectivo interesse ou expectativa comum de ambas as RR na capitalização das mais valias decorrentes da circunstância dos respectivos prédios de sua propriedade passarem de rústicos a urbanos, por efeito da aprovação do aludido projecto de loteamento 28/85, denominado AUGI/CH, com 162 lotes para construção de moradias.”.
Tendo a 1ª Ré participado na “reunião comum realizada a 10 de Julho de 2006, no Edifício dos Paços do Concelho do Município de Palmela, para que foram convocadas “As partes interessadas (herdeiros do falecido JAC/CH e D. D)” (o grifado é nosso).
Ali se tendo chegado “a um consenso, com vista a pôr termo à supra assinalada compropriedade, mediante a outorga da competente escritura de divisão de coisa comum.”.
Vindo tais atos a culminar, está provado, “na outorga da escritura de divisão de coisa comum, celebrada em 23.06.2008, permitindo a resolução extrajudicial de uma contenda com mais de vinte décadas”.
Escritura – reproduzida a folhas 29-35 – em que outorgou a 2ª Ré, integrando um grupo de comproprietários, herdeiros de JAC.

2.2.-Verificar-se-á outrossim a determinante/confirmadora, vontade das RR. no tocante à prática de tais atos pelo A.?
No que respeita à 2ª Ré, este é ponto que – salvo o devido respeito – não pode suscitar dúvidas sérias.
Bastando relembrar que “Os Herdeiros do finado JAC também subscreveram as pertinentes declarações complementares prestadas com as diversas apresentações efectuadas pelo ora A. junto da Conservatória do Registo Predial de…”, “E ainda com os vários contactos e múltiplas deslocações junto das diversas entidades envolvidas na resolução do assunto em apreço (C.M. de …, Conservatória do Registo Predial de …, Serviço de Finanças de …, Direcção Distrital de Finanças de …, Arquivo da Torre do Tombo, Arquivo Distrital de …, Arquivo do Palácio da Justiça, Conservatória do Registo Civil, Instituto Geográfico Português, Topográfico e Notário)”, “Designadamente junto da Conservatória do Registo Predial de …, para instauração e acompanhamento dos processos especiais de rectificação ?/2007 e ?/2007 junto do Serviço de Finanças de …, com a promoção dos diversos processos de reclamação instaurados e a obtenção de diversas certidões negativas, e junto do Instituto Geográfico Português, para acompanhamento do processo de cadastro instaurado”.
Tendo a 2ª Ré, com invocação da sua “qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito do malogrado JAC”, subscrito requerimento, apresentado junto do Chefe da Repartição/Serviço de Finanças do Concelho de …, onde declara “ratificar o processado e todos os requerimentos subscritos e apresentados no âmbito do mencionado processo de cadastro n.º ?/05, pelo Dr. A, advogado com escritório no Campo Grande, em Lisboa.”, vd. doc. de folhas 28.

Mas também assim será de concluir no tocante à 1ª Ré.
Recorde-se que tendo os interessados convocados para a sobredita “reunião comum” – entre eles a 1ª Ré – chegado “a um consenso, com vista a pôr termo à supra assinalada compropriedade, mediante a outorga da competente escritura de divisão de coisa comum.”, a tal desiderato obstava o facto de que de “as inscrições de propriedade relativas aos prédios objecto da pretendida divisão, à data, não se encontravam actualizadas, o mesmo sucedendo quanto aos respectivos averbamentos matriciais, designadamente, em relação à parte pertencente aos Herdeiros do finado JAC.”.
Sendo assim que, “Neste contexto a CH e ora 1ª Ré deu instruções à respectiva ilustre Advogada Drª CM para desenvolver as diligências necessárias ao averbamento matricial e à actualização das inscrições de propriedade dos acima mencionados prédios relativamente à parte detida pelos Herdeiros de JAC.”.
Porém, tais diligências acabaram por ser realizadas, como visto, pelo ora A., que “patrocinou o assunto em questão dedicando-lhe mais de um ano e meio todo o cuidado toda a dedicação e todo o tempo necessários…”.
Tendo a 1ª ré efetuado “pagamentos ao A. em Novembro de 2006 e Abril de 2007, por conta de honorários e despesas”, e certo aqui que a coexistência daqueles com uma acordada desvinculação da mesma no que respeita ao pagamento de honorários ao A. – designadamente cometendo a correspondente obrigação apenas ao então comproprietário JAC, sucedendo naquela os seus herdeiros – é matéria claramente de exceção, cuja prova constituía ónus – assim não atuado – da 1ª Ré, cfr. artigo 342º, n.º 2, do Código Civil.
Sendo, de qualquer modo, que o não assumir da obrigação de tal pagamento, não excluiria a vontade da 1ª R. quanto à prática, pelo A. – no âmbito do sobredito “consenso”, e em convergência com as instruções subsequentemente dadas pela 1ª Ré à “ilustre Advogada Drª CM” – dos atos e diligências em causa, que aquela última assim não realizou…
*

Com improcedência, nesta parte, das conclusões das recorrentes.

II–2–Da condenação solidária das RR.

1.-A sentença recorrida limita-se, no tocante à fundamentação de tal responsabilização solidária, a remeter para o “parecer” da OA e “toda a matéria exposta com base na matéria de facto dada como provada” (sic).
Certo sendo que o laudo da AO se não pronuncia sobre tal matéria – nem tinha que o fazer – também ponto é que na matéria de facto apurada não encontramos suporte para tal condenação solidária.

Na noção do artigo 512º, n.º 1, do Código Civil “A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera (…)”.
E, de acordo com o disposto no artigo 513º, do mesmo Código “A solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes.”.
Anotando P. Lima e A. Varela[8] que “Os termos em que a disposição está redigida – dizendo que a solidariedade só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes – mostram claramente que o regime – regra é o das obrigações conjuntas ou parciárias.”.

Nenhuma disposição legal vem invocada – seja pelo A., seja na sentença recorrida, que prescreva o regime da solidariedade passiva relativamente à obrigação de pagamento de honorários devidos por serviços prestados por advogado.
Por outro lado, e como anotam os mesmos Autores,[9] “Não se exige uma declaração expressa de vontade para constituir a solidariedade. Basta que a vontade se manifeste tacitamente nos termos admitidos no artigo 217º”.
Sendo a declaração tácita “quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade a revelam.”, cfr. cit. artigo 217º, n.º 1, 2ª parte.
E certo, a propósito, que – sendo o mandato não forense um negócio consensual, posto que não sujeito a “quaisquer exigências em matéria de forma”,[10] nenhuma forma sendo também exigida para a incumbência, expressa ou tácita, de atos próprios dos advogados que não sejam atos jurídicos – também nada obstaria, in casu, a emissão de declaração tácita no sentido da solidariedade passiva daquela obrigação.

2.- Ora, como antecipado já, não se retira da factualidade apurada qualquer sugestão no sentido de se haver pretendido constituir a solidariedade passiva, no tocante à obrigação de pagamento dos honorários do A.
Aliás, e desde logo, tal é liminarmente afastado pela circunstância de que – como provado está – “A quantia global pedida pelo Autor às ora RR. corresponde a metade dos referidos valores, num total de € 11.400,00 tendo o A. chegado a acordo com a D. D, para pagamento da outra metade, proporcional à respectiva quota na referida compropriedade.”.
O que claramente aponta no sentido de o próprio A. considerar tratar-se de uma obrigação conjunta.

O regime das obrigações conjuntas – em que, como refere Antunes Varela,[11] “As prestações dos devedores ou dos credores conjuntos resultam do fraccionamento ou parcelamento da prestação global, na qual tendem a integrar-se de novo, logo que cesse a causa da sua divisão” – aflora no regime das obrigações divisíveis, constante do artigo 534º do Código Civil, inciso nos termos do qual, “São iguais as partes que têm na obrigação divisível os vários credores ou devedores, se outra proporção não resultar da lei ou do negócio jurídico; mas entre os herdeiros do devedor, depois da partilha, serão essas partes fixadas proporcionalmente às suas quotas hereditárias, sem prejuízo do disposto nos n,05 2 e 3 do artigo 2098,°.” (o grifado é nosso).

Destarte, a condenação das RR. não poderá ser solidária, mas apenas conjunta, e na proporção de metade para cada uma.
Assinalando-se – neste plano e no confronto da alegação das Recorrentes, no sentido de que “A Ré CH não teve nada a ver com a legalização da situação registral dos prédios tendo-se limitado a fazer a sua aquisição a fim dos mesmos serem integrados no loteamento que pretendia levar a efeito – que nada aponta no sentido de a vantagem patrimonial obtida pela 1ª Ré com a compra dos prédios e sua integração no loteamento respetivo, ser inferior à obtida pela 2ª Ré, com a sua venda…
Isto, para além do que se deixou já referido supra, em II – 1, quanto ao “consenso” em que a 1ª Ré participou, no sentido da dita legalização, de que tratou o A., e que “culminou” com a escritura de divisão de coisa comum, sem a qual não seria possível a aquisição pela 1ª Ré dos prédios incluídos no loteamento por si promovido e a emissão do alvará de loteamento respetivo.

Nesta conformidade procedendo aqui as conclusões das Recorrentes.

II–3–Do valor fixado a título de honorários.

Consideram as Recorrentes – em termos puramente conclusivos – que “o valor fixado a título de honorários no montante de € 15.000,00, por conta dos quais o A. já recebeu da sua cliente D. Dolores a quantia de 7.500,00, mais € 4.000,00 para despesas, peca por excessivo e desproporcionado, face ao trabalho desenvolvido e resultados obtidos”, não tendo sido respeitados, nessa fixação, “os princípios da moderação, da proporcionalidade e da equidade.”.

Dispondo-se no artigo 100º, do EOA aqui considerável – Lei n.º 15/2005, de 26-01 – posto que vigente à data dos factos – e a que corresponde, de resto, o artigo 105º, n.º 3, do atual EOA/ Lei n.º 145/2015, de 09 de Setembro – que:
“1-Os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa.
2-Na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respectiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados.
3-Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais.”.

Na sentença recorrida ponderou-se que “o número de horas despendido – 76 – não se afigura irrazoável, assim como o quantitativo horário praticado pelo Autor (€75,00/hora), face à praxe do foro e ao estilo da comarca de Lisboa.”.

E, assim, tendo ainda em conta o provado de que na escritura de divisão de coisa comum – viabilizada pelos atos praticados pelo A., ao longo de mais de ano e meio, envolvendo deslocações várias daquele – o prédio que foi adjudicado à 2ª Ré tem cerca de 130.000m2 de área “e integra o mencionado loteamento da AUGI/CH, promovido pela 1ª Ré com respectivo interesse ou expectativa comum de ambas as RR na capitalização das mais valias decorrentes da circunstância dos respectivos prédios de sua propriedade passarem de rústicos a urbanos por efeito da aprovação do aludido projecto de loteamento 28/85 denominado AUGI/CH com 162 lotes para construção de moradias.”.

O que – e sopesado o teor do Parecer da O.A., que estando sujeito à livre apreciação do tribunal não deixa de constituir um elemento da maior relevância, nesta matéria – merece a nossa concordância…
…Com a ressalva – embora sem repercussão na justeza do assim concluído no tocante ao montante dos honorários – do esclarecimento que se impõe quanto um ponto.
É que as 76 horas de tempo gasto surgem mencionadas na “Nota de Despesas e Honorários” de folhas 19 e 20.
Porém, o A. mais juntou – integrando o mesmo doc. 1- uma “Conta de Honorários e Despesas” – a folhas 15-18 – que, nos seus termos, “constitui aditamento à nota de honorários e despesas junta em anexo(…)”.
Ora, deste “aditamento” resulta ser o tempo despendido de (“mais de”) 20 horas + (“mais de”) 24 horas + (“mais de”) 30 horas + (“mais de”) 10 horas + (“mais de”) 5 horas = (“mais de”) 89 horas, correspondendo ao que no laudo da O.A. se considera ter sido “o tempo despendido” que “O Colega requerido quantifica”, cfr. folhas 374, n.º 15.
E por reporte ao qual – ao fim de alguma turbulência no processo de laudo respetivo – foi concedido “laudo ao montante dos honorários em apreço”…
…Simplesmente, o montante do tempo despendido referido no dito “aditamento”, era a acrescer ao referido no dito “anexo”, e por isso “ascende a mais de 165 horas”, conforme alegado no artigo 18º da petição inicial: (“mais de”) 89 horas+76 horas = (“mais de”) 165 horas.

Sendo em qualquer caso que esse número de horas despendido não se nos afigura empolado, face ao que foi a atividade do A., ao longo de cerca de ano e meio, em prol da consecução do objetivo consensualizado na reunião conjunta de 10-07-2006, e que se ilustra no carreado para os n.ºs 3 a 6, 12, 13, 14 e 15, dos factos provados.
Concluindo-se pelo razoável – face à prática do foro e da comarca, e atenta a matéria e objetivos alcançados – do montante reclamado a título de honorários.
Certo aqui que se a OA, ponderando a “moderação” da remuneração reclamada – “entendida como querendo significar justeza e adequação, evitando-se a carestia, excesso e exagero insuportável, preocupação que não devem os Advogados deixar de ter apesar da eliminação”[12] da referência àquela, constante do n.º 3 do artigo 65º do anterior EOA – deu laudo ao montante de € 15.000,00, com reporte a 76 horas, também seguramente, e por maioria de razão, o daria com referência àquele superior número de 165 horas.
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Improcedendo pois, neste segmento, e sem necessidade de maiores considerações, as conclusões das Recorrentes.

III–Nestes termos, acordam em julgar a apelação parcialmente procedente, e, julgando a ação parcialmente procedente, revogam correspondentemente a sentença recorrida, condenando cada uma das RR. a pagar ao A. a quantia de € 2.967,60 (dois mil novecentos e sessenta e sete euros e sessenta cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento.

Custas em ambas as instâncias por A. e RR., na proporção de 1/50 para aquele e 49/50 para estas.
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Nas suas contra-alegações requer o A./recorrido a condenação das “Rés ora Apelantes (…) como litigantes de má-fé, a pagar ao Autor ora Apelado uma indemnização não inferior a €1.500,00 (mil e quinhentos euros).”.

Não se nos afigura, porém – e presente o que se considerou em sede de conhecimento do objeto do recurso – que seja possível, em segurança, reconduzir a atuação processual das Recorrentes à previsão de qualquer das alíneas do n.º 2 do artigo 542º, do Código de Processo Civil.

Não havendo assim lugar à requerida condenação das Recorrentes por aquele título.
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Em observância do disposto no n.º 7 do art.º 663º, do Código de Processo Civil, passa a elaborar-se sumário, da responsabilidade do relator, como segue:
“I–Os atos referidos no artigo 1º, n.º 6, alínea a), da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, deverão, para se conterem no balizamento dos atos próprios dos advogados, terem sido “exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de actividade profissional.”. II - A verificação de tal interesse passará pelo equacionar da potencial vantagem ou realização de escopo, no âmbito da esfera jurídica do terceiro – designação abrangente, na economia da norma, de quem não estabeleceu com o advogado relação abrangida pelos “actos próprios dos advogados” referidos nas alíneas a) e b), do n.º 5 do mesmo artigo 1º. III - Não se prescindindo, em qualquer caso, da vontade do “terceiro”, determinante/confirmativa, da prática dos atos em causa pelo advogado. IV – Porque a solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes o regime regra é o das obrigações conjuntas ou parciárias. V - O regime das obrigações conjuntas aflora no regime das obrigações divisíveis, constante do artigo 534º do Código Civil. VI – Não obstante a supressão da referência à “moderação”, constante do artigo 65º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março, nos EOA que lhe sucederam, não deve aquele fator – entendido como querendo significar justeza e adequação, evitando-se a carestia, excesso e exagero insuportável, deixar de ser ponderado na justa remuneração.”.
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Lisboa, 2016-09-29


(Ezagüy Martins)
(Maria José Mouro)
(Maria Teresa Albuquerque)


[1]Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 114.
[2]Proc. 220/13.8TTBCL.G1.S1, Relator:  GONÇALVES ROCHA, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[3]Proc. 1572/12.2TBABT.E1.S1, Relator: GARCIA CALEJO, ibidem.
[4]Proc. 781/07.0TYLSB.L1.S1, Relator: OLINDO GERALDES, ibidem.  
[5]Proc. 233/09.4TBVNG.G1.S1, Relator: LOPES DO REGO, ibidem.
[6]BLOG do IPPC, 21/07/2016, Jurisprudência (404), in https://blogippc.blogspot.pt/2016/07/jurisprudencia-404.html?m=1.
[7]Apud Fernando Sousa Magalhães, in “Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado e Comentado”, 2ª Ed. – 2006, Almedina, pág. 80.
[8]In “Código Civil, Anotado”, Vol. I, 3ª Ed., Coimbra Editora, 1982, págs. 499-500, nota 3.
[9]In op. cit., pág. 499, anotação 1.
[10]Apud Menezes Cordeiro, in “Direito das Obrigações”, 3º Vol. “Contratos em Especial”, Ed. da AAFDL, 1991, pág. 288.
[11]In “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 10ª Ed., Almedina, 2003, pág. 748.
[12]Apud Fernando de Sousa Magalhães, in op. cit., pág. 136, nota 7.