Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9940/18.0T8LSB.L1-4
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL DE RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO
DATA DE INÍCIO DE CONTRATO
DECISÃO SURPRESA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/30/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: Na ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho prevista nos artigos 186-K a 186-R do Código de Processo do Trabalho e em face do que se estipula no art. 186-N, não é necessário prosseguir com os autos para uma fase de audiência de discussão e julgamento se, porventura, o juiz, no final dos articulados, dispuser dos necessários elementos para, de uma forma conscienciosa, conhecer e decidir do mérito da causa.

(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


Na sequência de participação elaborada pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e remetida em 23 de abril de 2018 para o Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Unidade Central – Juízo do Trabalho, e que este recebeu em 24 de abril de 2018, o Ministério Público interpôs naquele Tribunal a presente ação declarativa de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, com processo especial, contra a AAA, Lda., com sede na Rua (…) Lisboa.

Alega, em síntese e com interesse, que, no dia 20 de março de 2018, a ACT levou a cabo uma ação inspetiva nas instalações da clínica da “AAA” e verificou que (…), residente na Rua (…) Lisboa, se encontrava a exercer as suas funções próprias de «coordenadora» nas instalações propriedade da Ré, desempenhando as funções de receção e registo de utentes, efetuando, designadamente, o atendimento de chamadas telefónicas, procedia à marcação de consultas e de tratamentos, recebia pagamentos e emitia faturas/recibos, assim como efetuava a gestão de correio eletrónico da clínica, em local pertencente à Ré, que era beneficiária da prestação de tal atividade, utilizando os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes à Ré, ou por esta disponibilizados, tais como secretária, material de escritório, telefone fixo, computador e telefone móvel cujos custos eram suportados pela empresa.

A trabalhadora em causa tinha chave de acesso às instalações, chave que lhe fora entregue pela Ré quando começou a exercer aquelas funções, sendo que, para além disso, aquela recebe ordens, diretrizes, orientações e instruções do sócio gerente da Ré, (…), a quem a mesma tem de comunicar as suas ausências ao trabalho e, quando necessita de faltar, é-lhe ainda imposto que avise a fisioterapeuta (…) para a substituir.

A trabalhadora tem, para além disso, um horário de trabalho fixo, das 09h00 às 19h00 com o intervalo de uma hora para almoço, de segunda a sexta-feira, efetuando o registo diário dos seus tempos de trabalho numa folha de dossier própria, que depois remete para o sócio gerente da Ré.

Como contrapartida do seu trabalho, a trabalhadora recebe da Ré, mensalmente e por transferência bancária, uma importância calculada com base em € 5,00 por hora de trabalho prestado, importância que lhe é paga pela Ré, beneficiária da atividade desenvolvida pela referida trabalhadora.

A referida trabalhadora está integrada na cadeia hierárquica existente na Ré e é economicamente dependente desta, para quem trabalha ininterruptamente desde 12 de fevereiro de 2018, data em que se iniciou o vínculo por ajuste verbal e que se mantém até à presente data.

A Ré, apesar de notificada pela ACT nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1 do art. 15º-A da Lei n.º 107/2009 de 14.09 (alteração que a este diploma foi introduzida pela Lei n.º 63/2013 de 27.08), ou seja, para regularizar a situação daquela trabalhadora, nada disse.

Concluiu que a presente ação deve ser julgada procedente, reconhecendo-se e declarando-se a existência de um contrato de trabalho entre a trabalhadora (…) e a Ré, com efeitos desde 12 de fevereiro de 2018.

Citada a Ré para contestar, veio fazê-lo, alegando, em resumo que, entre a Ré e (…) foi celebrado, em 1 de abril de 2018, um contrato de trabalho, tendo, nessa mesma data, sido inscrita no sistema contributivo do Instituto da Segurança Social e não antes uma vez que, entre 12 de fevereiro de 2018 e 1 de abril de 2018 a (…)emitiu recibos verdes à Ré, sendo entendimento desta que a referida trabalhadora não poderia ter duas situações diversas.

Conclui que a ação deve ser julgada improcedente, absolvendo-se a Ré do pedido.

A Ré juntou aos autos um contrato de trabalho celebrado com a referida trabalhadora e porque na respetiva cláusula 2ª se afirmava que «o presente contrato é celebrado sem termo, com início no dia doze de Fevereiro de 2018”, foi a Ré notificada para esclarecer em que data teve início o referido contrato de trabalho.

Dado que a Ré nada disse, foi o Ministério Público notificado para se pronunciar sobre a inutilidade superveniente da lide.

O Ministério Público requereu que fosse a trabalhadora (...) notificada para se pronunciar quanto ao teor do contrato junto pela Ré e para dizer se o mesmo correspondia à sua vontade.

Entretanto, a Ré veio esclarecer nos autos que o contrato de trabalho sem termo celebrado com a trabalhadora produziu efeitos desde 1 de abril de 2018, tendo sido mencionado no mesmo, por lapso, o dia 12 de Fevereiro de 2018.

A trabalhadora (…) foi notificada para, em prazo que lhe foi concedido aderir aos factos apresentados pelo Ministério Público ou apresentar articulado próprio, bem como para dizer se concorda com a inutilidade da presente lide decorrente do contrato celebrado com a Ré.

A trabalhadora referiu apenas não aderir ao relatado nos documentos que lhe foram enviados, uma vez que não têm qualquer correspondência com a realidade.

O Ministério Público requereu o prosseguimento dos autos até pela posição assumida pela Ré no esclarecimento pela mesma prestado.

O Sr. Juiz da 1ª instância determinou que a Ré fosse notificada para dizer se reconhecia a existência do contrato de trabalho celebrado entre si e a trabalhadora (…) com efeitos desde 12 de fevereiro de 2018.

Como a Ré nada veio dizer, o Sr. Juiz da 1ª instância proferiu sentença em 21 de setembro de 2018, sentença que culminou do seguinte modo:
«Pelos fundamentos expostos, julgo a acção procedente, e, em consequência, declaro a existência de um contrato de trabalho entre a trabalhadora (…) e a AAA, LDA. desde 12 de Fevereiro de 2018.
Custas pela ré (art.º 527º do C. P. Civil).
Fixo o valor da causa em 5.000,01 € (art.º 79º, al. a) e 186º-Q, nº 2
do C. P. Trabalho), atendendo-se ao disposto no art.º 186º-Q, nº 1 do C. P. Trabalho para efeitos do pagamento de custas.».

A Ré, inconformada com esta sentença, mas apenas na parte em que fixou o início desse contrato de trabalho em 12 de fevereiro de 2018, interpôs recurso de apelação para este Tribunal da Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes conclusões:
(…)

Contra-alegou o Ministério Público, concluindo que a sentença recorrida deve ser mantida nos seus precisos termos.

Admitido o recurso com adequado regime de subida e efeito e remetidos os autos para esta 2ª instância, verifica-se que nada obsta à apreciação do mérito do mesmo.

Pelas razões mencionadas a fls. 77 foram dispensados os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos.

Cumpre, pois, agora, apreciar e decidir sobre o mérito do recurso em causa.

APRECIAÇÃO
Dado que, como se sabe, são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto perante o Tribunal ad quem, em face das que são extraídas pela Ré/apelante no recurso em causa, colocam-se à apreciação deste Tribunal da Relação as seguintes questões:
Saber se a sentença recorrida constitui uma decisão surpresa por ter sido proferida sem audiência de discussão e julgamento;
Impugnação de matéria de facto;
Data a partir da qual se deve considerar existente o contrato de trabalho estabelecido entre a Ré e (…) e consequências daí decorrentes face à sentença recorrida.

Fundamentos de facto
Em 1ª instância, com base nas alegações constantes da petição inicial apresentada pelo Ministério Público, não impugnadas pela Ré, bem como nos documentos dos autos, considerou-se provada a seguinte matéria de facto:
1 A “AAA, Lda. é uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada, que tem por objeto a prestação de consultas de medicina, tratamentos de fisioterapia e trabalhos conexos, com o CAE 6....-R....
2 No dia 20 de Março de 2018, pelas 11H00, a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) levou a cabo uma ação inspetiva nas instalações da clínica AAA, explorada pela Ré empregadora, sua proprietária, sitas na Rua (…) em Lisboa.
3 Nessa visita inspetiva, verificou a ACT que (…), com o NIF (…), residente na Rua (…) Lisboa se encontrava a exercer as suas funções próprias de “Coordenadora”, sita naquelas instalações propriedade da Ré empregadora.
4 Concretamente, aquando da referida visita inspetiva, encontrava-se a trabalhadora (…) a desempenhar tarefas de receção e registo de utentes, designadamente efetuava o atendimento de chamadas telefónicas, procedia a marcações de consultas e de tratamentos, recebia pagamentos e emitia faturas/recibos e efetuava, também, a gestão de correio eletrónico da clínica.

5 Estas funções que a referida trabalhadora leva a cabo no seu dia-a-dia, processam-se nos seguintes moldes:
a)- Em local pertencente à Ré empregadora, beneficiária da prestação de tal atividade, designadamente a clínica sita no local acima indicado, propriedade da Ré e local que esta lhe determinava e destinava para a realização das suas funções;
b)- Utilizando os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes à Ré empregadora ou por esta disponibilizados, tais como secretária, telefone fixo, computador, telefone de serviço móvel com o n.º 9.. ... ..., (cujos custos são suportados pela empresa) e material de escritório (canetas, papel, etc).
c)- A trabalhadora em causa tinha, também, uma chave de acesso às instalações que lhe fora entregue pela Ré empregadora quando ali começou a exercer funções.
d)- A referida trabalhadora recebe ordens e diretrizes, orientações e instruções de (…), sócio gerente da Ré empregadora, a quem tem de comunicar as suas ausências ao trabalho, sendo que quando necessita de faltar lhe é imposto, ainda, que avise a fisioterapeuta (…) para a substituir.
e)- A trabalhadora obedece, também, a um horário de trabalho fixo, entrando às 9H00 e saindo às 19H00, com intervalo de uma hora para almoço, e de segunda a sexta-feira efetuando, por outro lado, um registo diário dos seus tempos de trabalho numa folha em dossier próprio que depois remete ao sócio-gerente (…).
f)- Como contrapartida das referidas funções prestadas à Ré empregadora, e com periocidade mensal, a referida trabalhadora recebe da Ré uma quantia calculada com base no valor de 5,00 Euros por cada hora efetivamente prestada, a qual lhe é paga pela Ré empregadora, beneficiária da atividade, por transferência bancária realizada pelo seu sócio-gerente (…).
g)- A trabalhadora encontra-se integrada numa cadeia hierárquica, de onde depende funcionalmente, recebendo ordens, orientações e instruções que tem de cumprir.

6 O vínculo jurídico entre a AAA, Lda. e (…), nos moldes supra referidos, ocorre desde 12 de Fevereiro de 2018, ininterruptamente, tendo-se iniciado por ajuste verbal, emitindo a segunda “recibos verdes” dos montantes que lhe eram pagos pela primeira. (redação alterada nos termos referidos infra)
7 Na sequência da mencionada intervenção inspetiva, ao abrigo do disposto no artigo 15.º-A da Lei 107/2009 de 14 de Setembro, foi pela ACT levantado auto por utilização indevida do contrato de prestação de serviços (cfr. fls. 6 e seguintes dos autos).
8 A Ré, apesar de notificada pela ACT por carta de 02.04.2018 (fls. 2 a 8 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do citado artigo 15.º-A, ou seja, para regularizar a situação da trabalhadora ou para se pronunciar, nada disse no prazo indicado de 10 dias, tendo a ACT, em obediência ao disposto no referido preceito legal, remetido ao Ministério Público a participação aí aludida, a qual deu entrada na Procuradoria da República junto do Tribunal de Trabalho de Lisboa em 26 de Abril de 2017 (cfr. fls. 2 dos autos).
9 Entre a ré AAA, Lda. e BBB foi assinado um documento denominado “Contrato de Trabalho Sem Termo” no qual foi aposta a data de assinatura de “aos 01 dias do mês de fevereiro de 2018”, o qual consta de fls. 30 e 31 dos autos e se dá aqui por reproduzido, designadamente a sua cláusula Segunda do seguinte teor: “O presente contrato é celebrado, com início no dia doze de Fevereiro de 2018”.
10 A ré AAA, Lda. inscreveu a (…) no sistema contributivo do Instituto da Segurança Social como “Trabalhador por Conta de Outrem”, indicando como data de início do vínculo o dia “2018-04-01” (cfr. fls. 32 dos autos).

Fundamentos de direito
A primeira questão suscitada no recurso em causa, prende-se com a circunstância alegada pela Ré/Apelante de a sentença recorrida constituir, para si, uma decisão surpresa, porquanto, proferida sem audiência de julgamento e sem se ter dado oportunidade à Ré de produzir prova, designadamente através da audição de testemunhas.

Sucede que, em face das incidências processuais mencionadas no precedente relatório e tendo em consideração as normas legais aplicáveis, de forma alguma se poderá concluir nesse sentido.

Na verdade, no que concerne à ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho prevista nos artigos 186-K a 186-R do Código de Processo do Trabalho (normas aditadas pela Lei n.º 63/2013 de 27.08), verifica-se que, sob a epígrafe «Termos posteriores aos articulados», estabelece o art. 186-N que:
«1- Se a ação tiver de prosseguir, pode o juiz julgar logo procedente alguma exceção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer ou decidir do mérito da causa.
2- A audiência de julgamento realiza-se dentro de 30 dias, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 1 a 3 do artigo 151º do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de junho.
3- As provas são oferecidas na audiência, podendo cada parte apresentar até três testemunhas» (realce nosso)

Decorre, pois, deste preceito legal que não é necessário prosseguir com os autos para uma fase de audiência de discussão e julgamento se, porventura, o juiz, no final dos articulados, dispuser dos necessários elementos para, de uma forma conscienciosa, conhecer e decidir do mérito da causa.

Ora, no caso em apreço, verifica-se que, tendo o Ministério Público invocado diversos factos, sumariamente descrito no precedente relatório, que, a resultarem demonstrados, seriam suscetíveis de levar a concluir pela existência de um contrato de trabalho entre a Ré AAA, Lda. e (…) desde 12 de fevereiro de 2018, a verdade é que, na sua contestação, de apenas quatro artigos, a Ré limitou-se a referir que, «[c]omo se demonstrará, entre a ré e (…), em 01 de Abril de 2018, foi celebrado um contrato de trabalho, conforme cópia do mesmo que protesta juntar em 05 (cinco) dias…[e] não antes, uma vez que entre 12 de Fevereiro de 2018 e 01 de Abril de 2018, a (…)emitiu Recibos Verdes à aqui R.. [e], salvo melhor juízo, é entendimento da R. que a trabalhadora (...) não poderia ter duas situações diversas.» (artigos 1º, 3º e 4º daquela peça processual)

Para além disso, tendo a Ré juntado aos autos, em 30.05.2018, cópia do contrato estabelecido com a (…) e assinado por ambas as partes, verifica-se que, na cláusula 2ª desse contrato, refere-se de uma forma clara que «[o] presente contrato é celebrado sem termo, com início no dia doze de Fevereiro de 2018» e no final do mesmo escreveu-se que «[o] presente contrato é feito em duas vias, de igual valor e conteúdo, uma para cada uma das Outorgantes, as quais vão ser assinadas em Lisboa, aos 01 dias do mês de fevereiro de 2018», circunstância que levou o Sr. Juiz do Tribunal a quo a ponderar a possibilidade de fazer terminar a presente instância por inutilidade superveniente da lide, como resulta do referido no precedente relatório.

Acresce que, tendo a Ré sido convidada a esclarecer em que data teve início o contrato de trabalho, isto face à divergência entre o por si alegado na contestação apresentada e o que constava do contrato estabelecido com (…) e junto ao processo, depois de a Ré nada ter mencionado no prazo de que dispôs para prestar esse esclarecimento, veio posteriormente referir nos autos que o contrato de trabalho sem termo celebrado com a trabalhadora produziu efeitos desde 1 de abril de 2018, tendo mencionado no mesmo, por lapso, o dia 12 de Fevereiro de 2018, sem, contudo, alegar qualquer facto donde se pudesse concluir pela verificação desse invocado lapso, para mais quando na aludida cláusula 2ª do contrato estabelecido entre as partes, se refere, por extenso, que o mesmo era celebrado sem termo, «…com início no dia doze de Fevereiro de 2018.» e, no final do mesmo contrato, se refere que foi assinado «… aos 01 dias do mês de fevereiro de 2018».

Importa ainda ter presente que, como se referiu no precedente relatório, o Sr. Juiz do Tribunal a quo, numa atitude que aqui se reputa de bastante zelosa e cuidada, determinou que a Ré fosse notificada para dizer se reconhecia a existência do contrato de trabalho celebrado entre si e a trabalhadora (…) com efeitos desde 12 de fevereiro de 2018 e, como a Ré nada veio dizer, proferiu então sentença nos presentes autos.

Ora, em face de tudo isto, não pode a Ré vir alegar que a sentença recorrida tenha constituído para si uma surpresa, sendo certo que, como já se observou, o Sr. Juiz dispunha dos elementos necessários para, de uma forma conscienciosa, proferir sentença conhecendo do mérito da causa após os articulados e demais incidências processuais supra referidas.

Improcede, pois, nesta parte o recurso interposto pela Ré/apelante.
Impugnação de matéria de facto
A este respeito, alega e conclui a Ré/apelante que o Tribunal a quo não podia julgar provados os factos vertidos nos pontos 6º, 8º e 9º por falta de elementos suficientes para a sua comprovação, designadamente aquele Tribunal não podia ter fixado o início do contrato de trabalho em 12 de fevereiro de 2018 sem audiência das partes em sede de julgamento, por ter sido impugnado pela Ré, que apenas reconheceu a existência do mesmo a partir de 1 de abril de 2018 e não podia ter dado como provado que “A Ré, apesar de notificada pela ACT por carta de 02.04.2018, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 15.º-A, ou seja, para regularizar a situação da trabalhadora ou para se pronunciar, nada disse no prazo indicado de 10 dias (…)”, por ser contrariado pelo contrato junto aos autos e comprovativo da regularização junto da Segurança Social, razão pela qual deveria aquele Tribunal considerar essa matéria como não provada.

Vejamos!

Nos mencionados pontos o Tribunal a quo – com base nas alegações constantes da petição inicial apresentada pelo Ministério Público e não impugnadas pela Ré, bem como nos documentos dos autos – considerou como provado, respetivamente, que:
- O vínculo jurídico entre a AAA, Lda. e (…), nos moldes supra referidos, ocorre desde 12 de Fevereiro de 2018, ininterruptamente, tendo-se iniciado por ajuste verbal, emitindo a segunda “recibos verdes” dos montantes que lhe eram pagos pela primeira; (ponto 6)
- A Ré, apesar de notificada pela ACT por carta de 02.04.2018 (fls. 2 a 8 dos autos), nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do citado artigo 15.º-A, ou seja, para regularizar a situação da trabalhadora ou para se pronunciar, nada disse no prazo indicado de 10 dias, tendo a ACT, em obediência ao disposto no referido preceito legal, remetido ao Ministério Público a participação aí aludida, a qual deu entrada na Procuradoria da República junto do Tribunal de Trabalho de Lisboa em 26 de Abril de 2017 (cfr. fls. 2 dos autos); (ponto 8)
- Entre a ré AAA, Lda. e (…) foi assinado um documento denominado “Contrato de Trabalho Sem Termo” no qual foi aposta a data de assinatura de “aos 01 dias do mês de fevereiro de 2018”, o qual consta de fls. 30 e 31 dos autos e se dá aqui por reproduzido, designadamente a sua cláusula Segunda do seguinte teor: “O presente contrato é celebrado, com início no dia doze de Fevereiro de 2018”. (ponto 9)

Ora, perante o que já tivemos oportunidade de referir em relação à anterior questão de recurso, donde resulta com particular relevo a circunstância de ter sido a própria Ré quem juntou aos autos o contrato estabelecido entre si e (…) e do qual emerge, de forma clara, que as partes contratantes estabeleceram como início do mesmo o dia doze (12) de fevereiro de 2018, aliado à circunstância de a Ré, na sua contestação, ter alegado que entre 12 de fevereiro de 2018 e 1 de Abril de 2018 a (…) emitiu recibos verdes, sem que, por sua vez, tivesse mencionado algo em oposição ao que o Ministério Público invocara na petição inicial, donde pudesse emergir a existência de um contrato de prestação de serviços entre ambas as partes contratantes no período compreendido entre aquelas datas, não se pode deixar de considerar como assente a matéria de facto que consta do referido ponto 6, apenas se retirando do mesmo, por imprópria, a expressão «[o] vínculo jurídico…”, expressão que se substitui por «[o] contrato estabelecido…».

Também se mantém a matéria que consta do ponto 9, porquanto, a mesma corresponde fielmente ao que resulta do documento (contrato de trabalho sem termo) junto pela Ré aos autos e a que esta faz referência na sua contestação.

Quanto à matéria que consta do ponto 8 a mesma também é de manter pois isso resulta da própria participação feita pela ACT ao Ministério Público, participação que consta de fls. 1 dos autos e que deu origem ao presente processo.

Improcede, pois, também nesta parte o recurso interposto.
Data a partir da qual se deve considerar existente o contrato de trabalho estabelecido entre a Ré e (…)e consequências daí decorrentes face à sentença recorrida
Relativamente a esta questão de recurso e perante tudo quanto já anteriormente tivemos oportunidade de mencionar e aqui damos por reproduzido, não poderemos deixar de concluir como na 1ª instância, ou seja que o contrato de trabalho sem termo estabelecido entre a Ré AAA, Lda. e (…) teve o seu início em 12 de fevereiro de 2018, não merecendo, portanto, censura a sentença recorrida, sentença que aqui é de manter.

DECISÃO.
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo da Ré/apelante.



Lisboa, 2019-01-30  

                                    

José António Santos Feteira (Relator)
Filomena Maria Moreira Manso 
José Manuel Duro Mateus Cardoso