Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
17355/17.0T8LSB-B.L1-8
Relator: CARLA MENDES
Descritores: CONDENAÇÃO EM CUSTAS
FUNCIONÁRIO JUDICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/12/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE/REVOGADA A DECISÃO
Sumário: - Vedado está a aplicação das normas relativas à condenação em
custas ao Sr. Funcionário Judicial uma vez que este não é
interveniente no processo, nem dele retira qualquer proveito.


SUMÁRIO: (elaborado pela relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:    Acordam na 8ª secção do tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório: 


Em sede de execução, foi proferido despacho no sentido do se proceder à impressão e junção aos autos e demais apensos o suporte em papel dos actos processuais em falta, tendo o Sr. Juiz mencionado a não subscrição do provimento relativo à desmaterialização dos processos – fls. 3.

Na conclusão, datada de 13/11/17, o Sr. Escrivão SI, enquanto coordenador do grupo de trabalho, suscitou dúvidas, quanto ao cumprimento do despacho, referindo que “ se na totalidade dos actos a que o despacho se refere também estão englobados os actos mencionados nas diversas alíneas do art. 28 da Portaria 280/2013 de 26/8, alterada pela Portaria 170/17 de 25/5, rectificada pela declaração 16/17, considerados como não sendo relevantes para a decisão material em causa” - fls. 4.

Consequentemente, foi proferido despacho, com o seguinte teor: “Dado que, por ora, não compete ao Sr. Escrivão-Adjunto questionar os despachos proferidos e porque o despacho proferido é perfeitamente claro e compreensível, não se percebe quais as dúvidas, apenas se podendo considerar que tal informação mais não é do que uma renitência abusiva do Sr. Escrivão em cumprir aquilo que foi ordenado no despacho anterior.

Assim, deverá o Sr. Escrivão cumprir sem reservas aquilo que lhe é determinado nos despachos proferidos pelo signatário.

Custas da ocorrência processual anómala a que deu causa o Sr. Escrivão-Adjunto que abriu a conclusão, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC, nos termos dos arts. 7/4 e 8 RCP” – fls. 4.

Inconformado, o Sr. Escrivão-Adjunto apelou, formulando as conclusões que se transcrevem:

1 O Recorrente, Escrivão-Adjunto, está a chefiar um grupo de trabalho, constituído pela DGAJ e pelo CSM para reduzir a pendência processual nos Juízos de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa.
2 No seguimento do despacho "Sendo certo que o signatário não subscreveu, por dele discordar, o provimento relativo à desmaterialização dos processos e na medida em que os autos (onde se incluem os vários apensos) não contêm em suporte de papel a totalidade dos atos processuais, antes de mais, proceda à impressão e junção aos autos e demais apensos (se for o caso) dos elementos em falta, tarefa a ser realizada pelo(a) Sr(a) Funcionário(a) que concluiu os autos e não à respectiva Secção (in casu)
3 O Recorrente abriu a conclusão "Como coordenador do grupo de trabalho, suscitam-se-me dúvidas se na "totalidade" dos actos a que se refere o despacho que antecede também estão englobados os actos mencionados nas diversas alíneas do art. 28° da Portaria 280/2013, de 13 de agosto, alterada pela Portaria 170/2015 de 25 de Maio e rectificada pela Declaração 16/2017, considerados como não sendo relevantes para a decisão material da causa."
4 Em resposta, o Mmo Juiz do Tribunal a quo proferiu o despacho: “ ora, não compete ao Sr. Escrivão Adjunto questionar os despachos proferidos e porque o despacho proferido é perfeitamente claro e compreensível, não se percebe quais as dúvidas, apenas se podendo considerar que tal informação mais não é do que uma renitência abusiva do Sr. Escrivão em cumprir aquilo que foi ordenado no despacho anterior.
Assim, deverá o Sr. Escrivão cumprir sem reservas aquilo que lhe é determinado nos despachos proferidos pelo Signatário.
Custas da ocorrência processual anómala a que deu causa a cargo do Sr. Escrivão Adjunto que abriu a presente conclusão, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC nos termos do art. 7/ 4 e 8.
Tendo em conta que o Sr. Escrivão Adjunto foi condenado no pagamento de custas incidentais, os presentes autos passarão a ser tramitados pelo Sr. Escrivão de Direito PL(da Secção 7), a quem competirá, desde já, a liquidação do incidente e a competente notificação.

Mais deverá ser extraída certidão do despacho de fls.86 e deste despacho e ser-me a mesma entregue.

5 O despacho que antecede o despacho recorrido, atendendo ao no n.° 1 do art. 28° da Portaria 280/2013, não é claro ao contrário do que entende o Mmo Juiz a quo.
6 O despacho recorrido também não teve em consideração que o Recorrente, escrivão adjunto, encontra-se em funções de chefia, num modelo (equipa) de recuperação processual, em que não contacta directamente com os senhores magistrados.
7– No âmbito das suas funções, o Recorrente teve uma dúvida no cumprimento do despacho de fls ... nomeadamente quando manda proceder à impressão e junção aos autos e demais apensos, dos elementos em falta atendendo ao disposto no n.° 1 da Portaria 280/2013.
8 O facto do Recorrente abrir conclusão ao Mmo. Juiz titular do processo, para esclarecer se pretende que seja impresso e junto aos autos os actos identificados no n.° 1 do art. 28 da Portaria 280/2013, como não sendo relevantes, não consubstancia um incidente anómalo.
9 A dúvida do Recorrente tinha que ser esclarecida pelo Mmo. Juiz titular do processo nomeadamente quais as peças que entendia serem relevantes para a decisão material da causa e que deviam constar do processo físico em papel.
10 Dispõe o n.° 8 do art. 7 RCP que "Consideram-se procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo princípios que regem a condenação em custas".
11 Sendo que, a conclusão aberta pelo Recorrente não constitui um incidente anómalo nos termos descritos no n.° 8 artigo 7 RCP, pelo que deverá ser revogado o douto despacho recorrido.
12– Assim, deve o despacho ser revogado.

Dispensados os vistos, cumpre decidir.

A questão a decidir consiste em saber se há ou não lugar ao pagamento de custas por parte do apelante.

Vejamos então.

Os factos com interesse constam do exarado supra.

A decisão que julgue a acção ou alguns dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento na acção quem do processo tirou proveito – art. 527/1 CPC.

De acordo com os princípios gerais em matéria de custas  (arts. 527 e Sgs. CPC e RCP) os processos estão sujeitos a custas, compreendendo estas a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.

Daqui se extrai, que a actividade processual dos intervenientes processuais está sujeita a tributação, tributação essa que se traduz no pagamento de custas.

Não obstante, a lei prevê também, em caso de infracções processuais, a condenação, em multa – cfr. arts. 27 RCP e 542 CPC.
 
O reclamante é Funcionário Judicial e, como tal, as funções que exerce, entre outras, é de cumprir o ordenado nos despachos que vão sendo proferidos pelos Srs. Magistrados Judiciais ou do Ministério Público, na sequência da tramitação processual dos respectivos processos.

Assim, vedada está ao Sr. Funcionário Judicial a aplicação das normas relativas à condenação em custas, uma vez que este não é interveniente no processo, nem dele retira qualquer proveito.

Não obstante, tal como os demais, os seus actos podem se sancionados com multa, nomeadamente, em caso de incidentes anómalos por ele causados.

Incidente anómalo, tal como é definido, traduz-se em ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide – cfr.   art. 7/8 RCP. 
In casu, as dúvidas colocadas, na conclusão aberta ao Sr. Juiz, atento o teor da Portaria, não consubstanciam incidente anómalo e, como tal, afastada está a sua tributação.

Destarte, procede a pretensão.

Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente e, consequentemente, revoga-se o despacho.
Sem custas



Lisboa, 12-04-2018



(Carla Mendes)
(Octávia Viegas)
(Rui da Ponte Gomes)