Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1823/2008-6
Relator: OLINDO GERALDES
Descritores: EXECUÇÃO
REMESSA A CONTA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/06/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I. Não sendo conhecidos bens ao executado e apesar da insuficiência dos bens penhorados para satisfazer os créditos exigíveis, o processo executivo deixa de ter utilidade, dada a impossibilidade de realização de outras providências executivas.
II. Nesse contexto, e não havendo convocação dos demais credores, resta proceder à respectiva liquidação.
O.G.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
No âmbito da execução para pagamento de quantia certa, que sob o n.º 4362/1994, pela 11.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, S, S.A., move contra M, a Exequente, alegando não ter conhecimento da existência de mais bens ou valores penhoráveis pertencentes à Executada, requereu a remessa à Secção Central, para efeitos de se proceder a liquidação.
Sobre esse requerimento, em 26 de Novembro de 2007, recaiu o seguinte despacho:

“Indefiro a requerida remessa dos autos à conta, uma vez que o produto da venda do veículo é, sem dúvida alguma, insuficiente para pagar as custas.
Notifique a Exequente, sendo ainda que os autos aguardam pelo seu impulso processual, sem prejuízo do disposto no art. 51.º, n.º 2, alínea b) do C.C.J.”

Inconformada com a decisão, a Exequente recorreu e, tendo alegado, formulou essencialmente as seguintes conclusões:
a) Não se conhecendo outros bens ou valores à executada, para além do já penhorado, o único comportamento processual útil da exequente é requerer a remessa dos autos à conta, para liquidação.
b) Esse pedido deveria ter sido deferido.
c) Por erro de interpretação e de aplicação, foram violados os arts. 264.º, 916.º, 919.º, do CPC, e 9.º e 47.º, n.º 3, do CCJ.

Pretende, com o provimento do recurso, a revogação do despacho recorrido e que se ordene a remessa dos autos à conta.

Não foram apresentadas contra-alegações.
O despacho recorrido foi, tabelarmente, sustentado.
Cumpre apreciar e decidir.

Neste recurso, discute-se essencialmente a remessa de uma execução à conta, a requerimento do exequente, com a alegação do desconhecimento de outros bens penhoráveis.

II. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. Para além da dinâmica processual descrita, prova-se também nos autos que se encontra depositada a quantia de € 30,00.

2.2. Delimitada a materialidade processual relevante, importa então conhecer do objecto do recurso, definido pelas respectivas conclusões, e cuja questão jurídica emergente foi antes destacada.
A acção, donde resultou o requerimento apresentado pela Recorrente, respeita a uma acção executiva, destinada à obtenção do pagamento de quantia certa. Procurou-se, assim, lograr o cumprimento coercivo da obrigação pecuniária que impendia sobre o devedor, executando o respectivo património, garantia geral das obrigações. Dizendo de outra maneira, pretendeu-se obter a reparação efectiva do direito, requerendo as providências adequadas (art. 4.º, n.º 3, do CPC).
Assim, não sendo pago o crédito devido, os bens do executado são penhorados, com a subsequente liquidação, e é satisfeito o direito do credor.
Sem prejuízo do poder de direcção que compete ao tribunal, cabe ao exequente, por força do princípio do dispositivo o ónus de impulsionar o andamento do processo executivo, requerendo as diligências necessárias ao normal prosseguimento do processo (art. 265.º, n.º 1, do CPC).
Nesse contexto, bem como no âmbito do princípio da cooperação (266.º, n.º 1, do CPC), o exequente tem um importante protagonismo, designadamente na identificação dos bens penhoráveis, através da sua indicação, facilitando a sua apreensão e execução e, assim, tornando efectiva a satisfação do seu direito de crédito.
Não sendo já conhecidos quaisquer bens ao executado, apesar da insuficiência dos bens penhorados para satisfazer os créditos exigíveis, o processo executivo deixa de ter a utilidade que lhe está inerente, dada a impossibilidade de realização de outras providências executivas.
Nestas circunstâncias, não ocorrendo a convocação dos demais credores, não é possível exigir ao exequente qualquer impulso processual. Não havendo ou não sendo conhecidos outros bens ao executado, mais não restará do que proceder à liquidação dos créditos e ao seu pagamento, independentemente do valor do depósito constante do processo.

Era essa a situação revelada pelos autos, quando a Recorrente pediu a remessa dos autos à conta.
Ignorando-se a existência de quaisquer bens susceptíveis de serem penhorados, era a única opção que restava à Recorrente.
Ao Tribunal, no âmbito do seu poder de direcção (art. 265.º, do CPC), também não ocorreu a determinação de qualquer diligência útil para o processo.
Nesse contexto, que sentido faria os autos aguardarem o requerimento de eventuais providências executivas, quando o exequente já havia declarado não conhecer a existência de quaisquer outros bens?
Seria, a nosso ver, inconsequente e agravaria a situação patrimonial do exequente, que teria de suportar ainda as custas do processo, por fatal inércia do impulso processual, face ao teor da norma consignada na alínea b) do n.º 2 do art. 51.º do Código das Custas Judiciais.
Não é minimamente aceitável uma situação dessas, para mais quando a parte não consegue sequer obter a satisfação efectiva do seu direito de crédito, como sucede no caso vertente, onde apenas se encontra depositada a quantia insignificante de € 30,00.
É irrelevante que essa quantia possa ser insuficiente para o pagamento das custas do processo, que, como se sabe, saem precípuas. Não sendo possíveis já quaisquer diligências executivas, resta unicamente proceder à respectiva liquidação.
Assim, não pode subsistir o despacho impugnado.

2.3. Em conclusão, pode extrair-se de mais relevante:
I. Não sendo conhecidos bens ao executado e apesar da insuficiência dos bens penhorados para satisfazer os créditos exigíveis, o processo executivo deixa de ter utilidade, dada a impossibilidade de realização de outras providências executivas.
II. Nesse contexto, e não havendo convocação dos demais credores, resta proceder à respectiva liquidação.

Nestes termos, o recurso merece obter provimento, com a consequente revogação do despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro, determinando, designadamente, a sua liquidação.

2.4. Apesar do vencimento por decaimento, não há lugar ao pagamento das custas do recurso, por efeito da isenção subjectiva, em virtude da Recorrida, não tendo dado causa ou expressamente aderido à decisão recorrida, a não a ter acompanhado.

III. DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
Conceder provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido.
Lisboa, 6 de Março de 2008
(Olindo dos Santos Geraldes)
(Fátima Galante)
(Ferreira Lopes)