Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | A. AUGUSTO LOURENÇO | ||
Descritores: | CÚMULO JURÍDICO DE PENAS PRESSUPOSTOS | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/15/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROVIDO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | 1.O momento decisivo para a verificação da ocorrência de um concurso de crimes a sujeitar a uma pena única, segundo as regras vigentes (artº 77º nº 1 e 2 e 78º nº 1 do cód. penal), é o do trânsito em julgado da primeira condenação. 2.Na realização do cúmulo jurídico importa ter em conta duas realidades distintas: a) o momento temporal da prática dos crimes; e, b) a data do trânsito em julgado de cada uma das condenações. 3.Na previsão do artº 77º nº 1 do cód. penal é necessário que as várias infracções tenham sido praticadas antes de ter transitado em julgado a pena imposta por qualquer uma delas, excluindo-se do âmbito da pena única os crimes praticados posteriormente. 4.No caso do artº 78º nº 1 do cód. penal (concurso superveniente) importa fundamentalmente saber a data do trânsito em julgado da primeira condenação. 5.A medida da pena única anteriormente determinada não pode condicionar os limites da moldura a atender para a fixação da nova pena conjunta, a qual, há-de ser encontrada atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa. RELATÓRIO: No âmbito do processo nº 673/13.4PLSNT, que corre termos na Secção Criminal de Sintra, foi o arguido ... ... Varela, julgado e condenado, por acórdão de 16.02.2016, para efectivação do cúmulo jurídico, nos seguintes termos: -«Assim, e pelo exposto, o Tribunal acorda: a)Operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao Arguido ... da ... Varela nos Processos nº 738/13.2PLSNT, nº 577/13.0PHSNT, nº 450/14.5PLSNT (relativamente aos factos de 13-5-2013, conforme a factualidade referida em 3.1.) e nº 673/13.4PLSNT, condená-lo na pena única de 12 anos de prisão e 53 dias de prisão subsidiária; b)Operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao Arguido ... da ... Varela no Processo nº 450/14.5PLSNT, relativamente aos factos de 20-3-2014, de 28-3-2014 e de 1-4-2014 (conforme a factualidade referida em 3.2., em 3.3. e em 3.4.), condená-lo na pena única de 12 anos de prisão; c)Ordenar que o Arguido cumpra sucessivamente as penas únicas mencionadas em a) e em b); d)Ordenar a oportuna remessa de boletim ao registo criminal [artigo 374º, nº 3, al. d) do Código de Processo Penal]; e)Ordenar que seja dado conhecimento do Acórdão ao Tribunal de Execução de Penas de Coimbra, com menção do trânsito em julgado (artigo 138º, nº 2 da Lei nº 115/2009, de 12-10); f)Ordenar que seja dado conhecimento do Acórdão ao estabelecimento prisional em que o Arguido cumpre pena; e g)Ordenar a remessa de certidão do Acórdão aos Processos referidos em I.1., I.2. e I.3., com menção do trânsito em julgado. * Inconformado com a decisão, veio o arguido ... da ... Varela a recorrer nos termos de fls. 795 a 801, tendo apresentado as seguintes conclusões: «a)Para efeito deste cúmulo jurídico deve considerar-se a pena de 15 anos de prisão, já resultante do cúmulo jurídico das penas aplicadas no Proc. 450/14. b)A esta deverão acrescer, após novo cúmulo jurídico, as penas aplicadas nos Procs. 738/13, 577/13 e 673/13, as quais estão entre si numa relação de concurso. c)No entender da defesa, o cúmulo jurídico obtido no Proc. 450/14 não pode desfazer-se para proceder a novo reagrupamento de condenações (1., 2., 3.1. e 4., por um lado, e 3.2., 3.3., e 3.4., por outro lado), como se fez no CAP. IV do acórdão recorrido; d)O Cúmulo jurídico operado no Proc. 450/14, do qual resultou a pena de 15 anos de prisão, deve ter-se como definitivo e transitado em julgado. e)Por outro lado os crimes punidos nos Procs. 738/13, 577/13 e 673/13, estando em relação de concurso entre si, devem cumular-se e daí resultando uma pena não superior a 7 anos de prisão, porquanto a pena mais elevada é de 5 anos e 6 meses de prisão, aplicada no Proc. 673/13. f)Não sendo possível cumular-se a pena de 15 anos de prisão com a resultante do cúmulo das outras três penas, no entender do recorrente 7 anos de prisão, deverá o T.E.P. proceder ao seu somatório, de forma a obter uma pena única de 22 anos de prisão. g)Já não parece justo, e ressocializante, aplicar-se ao arguido ... Varela duas penas de 12 anos de prisão, a cumprir sucessivamente, tratando-se de um jovem de 20 anos de idade, com as condições pessoais descritas no CAP. II do acórdão recorrido; h)Tal decisão contraria todas as finalidades das penas, violando o disposto nos artºs. 40º, 71º e 77º do Código Penal. Devendo, por isso, ser revogado, como é de Justiça!». * O Ministério Público, em 1ª instância, respondeu às alegações do recorrente nos termos de fls. 812 a 817, defendendo a improcedência do recurso e concluindo nos seguintes termos: 1)O douto acórdão condenatório proferido nos autos não padece de nenhum vício, que, de resto, também não foi invocado, sendo que nenhuma disposição legal foi, outrossim, preterida. 2)À luz da motivação do Recorrente ... da ... Varela, não nos merece qualquer reparo o douto acórdão proferido pelo tribunal a quo. 3)Concluímos, pois, que as penas únicas aplicadas não são desproporcionadas, nem ultrapassam a medida da culpa, satisfazendo, do mesmo passo, pelo mínimo, os interesses preventivos gerais e especiais, que no caso se fazem sentir com particular acuidade. 4)A opção tomada pelo tribunal a quo de realizar cúmulos jurídicos distintos é juridicamente correcta à luz do que vem disposto nos artigos 77º, nºs 1 a 3 e 78º, nºs 1 e 2, ambos do cód. penal. O cumprimento sucessivo de penas constitui, aqui, mera decorrência jurídica de uma tal opção; 5)A acentuada gravidade dos factos e da culpa revelada pelo Recorrente e as elevadas necessidades de prevenção, geral e especial, estas últimas resultantes das exigências de defesa do ordenamento jurídico perante violação tão intensa de bens jurídicos pessoais, e de prementes necessidades de intimidação face ao percurso criminoso já trilhado pelo arguido, que apesar da sua jovem idade revela uma personalidade propensa à prática de crimes particularmente violentos de que são vítimas preferenciais pessoas idosas e que evidenciem especial vulnerabilidade e/ou debilidade, não permitem qualquer redução das penas únicas impostas pelo tribunal recorrido. Termos em que se conclui que o douto acórdão recorrido não violou nenhuma das disposições legais invocadas pelo arguido, nem quaisquer outras, efectuando, ao invés, um correcto e justo enquadramento jurídico-penal do caso concreto em apreço, pelo que deverá ser mantido nos seus precisos termos, com o que, decidindo pelo exposto, V. Exas., farão Justiça». * Neste Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, emitiu o Douto Parecer de fls. 826 a 829, defendendo a improcedência do recurso. * O recurso foi tempestivo, legítimo e correctamente admitido. Colhidos os vistos, cumpre decidir. * FUNDAMENTOS. Objecto do recurso. Em face das conclusões apresentadas, importa unicamente apreciar a questão da admissibilidade ou não, do cúmulo jurídico sucessivo entre as condenações proferidas nos processos citados e a medida das penas únicas. * FACTOS RELEVANTES A CONSIDERAR. 1.No Processo (Sumário) nº 738/13.2PLSNT, do (ora extinto) Juízo de Pequena Instância Criminal de Sintra, Juiz 1, por factos de 3-5-2013 e Sentença de 3-5-2013, transitada em julgado em 16-9-2013, pela autoria material de um crime de condução de veículo a motor sem carta de condução, p. e p. pelo artigo 3º, nº 2 do Dec.-Lei nº 2/98, de 3-1, foi condenado na pena de 80 dias de multa, à quantia diária de 5,00 €, a cujo pagamento não procedeu, tendo, por despacho transitado em julgado em 11-12-2015, a multa sido convertida em prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ou seja 53 dias de prisão subsidiária. 2.No Processo nº 577/13.0PHSNT, do (ora extinto) Juízo de Grande Instância Criminal de Sintra, Juiz 1, por factos de 13-5-203 e Acórdão de 22-1-2014, transitado em julgado em 24-2-2014, pela co-autoria material de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do Código Penal, foi condenado na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, com regime de prova. 2.1.Consistiram os factos, em síntese, na apropriação pelo Arguido, através de um puxão, de uma mala de computador, com o respectivo computador, que uma senhora levava ao ombro, quando viajava de comboio, enquanto outros dois seus acompanhantes seguravam a porta do comboio, pondo-se os três em fuga, com os bens, de valor superior a 500,00 €, que a dona não mais recuperou. 3.No Processo nº 450/14.5PLSNT, da Instância Central Criminal de Sintra, Juiz 1, por factos de 13-5-2013, de 20-3-2014, de 28-3-2014 e de 1-4-2014 e Acórdão de 22-6-2015, transitado em julgado em 21-12-2015, pela co-autoria material de quatro crimes de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do Código Penal, de dois crimes de sequestro, p. e p. pelo artigo 158º, nº 1 e nº 2, al. e) do Código Penal e de dois crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 do Código Penal, foi condenado nas penas, respectivamente, de 7 anos, de 7 anos, de 7 anos, de 5 anos, de 3 anos, de 3 anos, de 3 anos e de 3 anos de prisão e, em cúmulo jurídico destas penas, na pena única de 15 anos de prisão. 3.1.Em síntese, consistiram os factos de 13-5-2013 (correspondentes ao NUIPC 798/13.6PLSNT, pelos quais, pela co-autoria material de dois crimes de roubo qualificado, foi condenado em duas penas de 7 anos de prisão) na deslocação do Arguido e de outros dois indivíduos a um apartamento num terceiro andar de um prédio, em Fitares, Rio de Mouro, onde residia e se encontrava um casal, sendo o homem invisual, com o intuito de os desapossarem de bens, tendo para o efeito o Arguido e os seus acompanhantes se munido de um objecto com a aparência de uma arma de fogo e coberto parcialmente as faces, bateram à porta, a senhora abriu-a, os três entraram, disseram à senhora para não gritar e que se gritasse matavam o seu marido, derrubaram-na ao solo, taparam-lhe a boca com um pano, levaram-na para outro compartimento, amarraram-lhe os pés com um cabo de computador e vasculharam a casa, de onde retiraram e levaram com eles 600,00 € em dinheiro e objectos de ouro de valor superior a 5.000,00 €. 3.2.Em síntese, consistiram os factos de 20-3-204 (correspondentes ao NUIPC 450/14.5PLSNT, pelos quais, pela co-autoria material de dois crimes de roubo qualificado e de dois crimes de sequestro, foi condenado nas penas de 7 anos, de 5 anos, de 3 anos e de 3 anos de prisão) na deslocação do Arguido e de outros dois indivíduos a um apartamento num quarto andar de um prédio, em Rinchoa, Rio de Mouro, onde residia um casal, com as idades de 73 e de 72 anos, com o intuito de os desapossarem de bens, tendo para o efeito empurrado o homem quando este abriu a porta, atirando-o ao solo, para dentro do apartamento, introduzido um pano na sua boca e pisado as suas costas e os seus pés, impedindo-o de gritar e de se mover, agarrado a mulher e igualmente lhe tapado a boca, impedindo-a de gritar, tendo posteriormente arrastado o homem para a casa de banho, para lá também tendo levado a mulher, ali os trancando, seguidamente ao que vasculharam a casa, apoderando-se de pouco mais de cem euros em dinheiro, de uma carteira, de um relógio e de objectos de ouro no valor global de cerca de 900,00 €, tendo abandonado a residência e deixado os donos fechados na casa de banho, onde permaneceram por mais cerca de meia hora, até que chegaram ao apartamento agentes de P.S.P., chamados por vizinhos que ouviram os gritos de socorro daqueles, agentes que arrombaram a porta e libertaram-nos. 3.3.Em síntese, consistiram os factos de 28-3-2014 (correspondentes ao NUIPC 517/14.0PLSNT, pelos quais, pela co-autoria material de um crime de roubo, foi condenado na pena de 3 anos de prisão) na abordagem do Arguido e de outro indivíduo a um jovem que, pelas 23H30, caminhava num parque, em Rinchoa, ao qual o Arguido lhe encostou uma faca a um braço e exigiu que lhe mostrasse o telemóvel, o que o jovem fez, tendo-lho o Arguido retirado e levado consigo, telemóvel que valia cerca de 90,00 €. 3.4.Em síntese, consistiram os factos de 1-4-2014 (correspondentes ao NUIPC 516/14.1PLSNT, pelos quais, pela co-autoria material de um crime de roubo, foi condenado na pena de 3 anos de prisão) na abordagem do Arguido e de outros seis indivíduos a um jovem que, pelas 23H00, caminhava na via pública, em Rio de Mouro, ao qual primeiro pediram dinheiro e depois revistaram, tendo-o desapossado do dinheiro que tinha com ele, no montante de cerca de 12,00 €. 4.No presente Processo (nº 673/13.4PLSNT), por factos de 22-4-2013 e Acórdão de 22-9-2015, transitado em julgado em 23-10-2015, pela co-autoria material de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do Código Penal, foi condenado na pena de 5 anos e 6 meses de prisão. 4.1.Consistiram os factos, em síntese, na abordagem do Arguido e de outros dois indivíduos a um jovem com a idade de 16 anos, que caminhava para sua casa, em Rio de Mouro, com o qual entabularam conversa, dela se apercebendo que na residência desse jovem não se encontravam outras pessoas, pelo que o Arguido e os seus acompanhantes formularam o propósito de se introduzirem na residência do jovem, de neutralizarem a sua eventual resistência e de daí retirarem bens, para o que o acompanharam até ao prédio em que habitava, subiram com ele no elevador do prédio, até ao respectivo piso, onde saíram, tendo então o Arguido “pedido” ao jovem se lhe dava um copo de água, ao que este anuiu, para esse efeito entrando no seu apartamento, mas fechando a respectiva porta, pelo que quando o jovem voltou à porta, com o copo com água, o Arguido e os seus acompanhantes empurraram a porta e empurraram o jovem para o interior do apartamento, onde o esbofetearam e ordenaram que lhes dissesse onde se encontrava dinheiro, o que este fez, acabando um dos três por o imobilizar enquanto os outros dois revistaram o apartamento, de onde retiraram e levaram com eles 170,00 €, objectos de ouro de valor não inferior a 350,00 €, um computador portátil no valor de 499,00 €, um telemóvel no valor de 100,00 € e uma câmara de filmar no valor de 200,00 €, bem assim, a fim de evitar que o jovem gritasse, taparam-lhe a boca, com um objecto não apurado, bem como ataram-lhe as mãos com um atacador. 5.O Arguido é o mais velho de uma fratria de dois irmãos, tendo os seus pais se separado quando tinha a idade de oito anos, ficando ele a cargo do pai e a mãe emigrado para França, com a filha. 6.O seu pai constituiu nova família, tendo mais dois filhos desse relacionamento, em cujo agregado o Arguido se integra sem dificuldade, sendo bem aceite pela companheira do pai. 7.Manteve contactos regulares com a mãe, com a qual passava os períodos de férias. 8.A nível escolar registou percurso regular até ao 6º ano, altura em que reprovou. 9.Aos 14 anos, quando frequentava o 8º ano, o seu pai foi preso e condenado na pena de 3 anos de prisão, por crime relacionado com estupefacientes. 10.O Arguido foi então viver com a mãe, em França, altura em que completou o 8º e o 9º ano de escolaridade. 11.Aos 17 anos, quando regressou a Portugal, reintegrou o agregado da família paterna. 12.Aguardava o comprovativo dos estudos efectuados em França, aparentemente projectando continuar a estudar em Portugal, o que não se chegou a concretizar em virtude de ter sido, entretanto, preso preventivamente, situação que se voltou a verificar em 8-4-2014, à ordem do Processo nº 450/14.5PLSNT, cuja pena de prisão em que aí foi condenado actualmente cumpre. 13.Desde que regressou de França e nos períodos que antecederam as reclusões a que foi sujeito não tinha outra ocupação para além de treinos de futebol, aos fins dos dias. 14.No estabelecimento prisional trabalha como ajudante de faxina e frequenta aulas do 11º ano de escolaridade. 15.Recebe aí visitas do seu pai, com regularidade sensivelmente mensal, da mãe, residente em França, quando vem a Portugal e de uma amiga. * Fundou-se o Tribunal nos elementos documentais constantes do Processo, de fls. 487 a 507, 580 a 601, 651 a 693, 694 a 722, 747 a 752 e 759 a 762, bem como nas declarações do Arguido em audiência. * DO DIREITO. A questão a decidir afigura-se de alguma simplicidade tendo em conta os elementos acima descritos e as disposições legais aplicáveis. Com efeito, nos termos do artº 77º do cód. penal: -«1.Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2.A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. 3.Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores. 4.As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis». Por sua vez, no artº 78º do cód. penal prevêem-se as situações similares à dos presentes autos. «1.Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. 2.O disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado. 3.As penas acessórias e as medidas de segurança aplicadas na sentença anterior mantêm-se, salvo quando se mostrarem desnecessárias em vista da nova decisão; se forem necessárias em face da decisão anterior». Basta uma leitura atenta das normas referidas e do contexto factual descrito e provado, para se concluir que as penas aplicadas nos processos identificados, nem todas estão entre si numa relação de concurso, pois o momento decisivo para a verificação da ocorrência de um concurso de crimes a sujeitar a uma pena única, segundo as regras fixadas pelo artigo 77°, nº 1 e 2 do cód. penal, aplicáveis também ao conhecimento superveniente de um crime que deva ser incluído nesse concurso, por força do artigo 78º, nº 1, do mesmo código, é o trânsito em julgado da primeira condenação[1]. Ao contrário do que refere o recorrente, alegando que o cúmulo jurídico efectuado no processo nº 450/14.5PLSNT se deveria manter acrescendo as penas dos demais processos, não é aceitável nem encontra suporte legal, porquanto, no concurso superveniente de infracções, “tudo se passa como se, por pura ficção, o tribunal apreciasse, contemporaneamente com a sentença, todos os crimes praticados pelo arguido, formando um juízo censório único, projectando-o retroactivamente”[2]. Com efeito, o nosso sistema, (bem ou mal) não acolheu a tese atomística da pluralidade dos crimes, que preconiza a aplicação de uma pena única, como a sanção ajustada à unidade relacional de ilícito e de culpa, numa ponderação do conjunto dos crimes e da relação da personalidade com o conjunto dos factos – neste sentido cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 02.11.2011, disponível em www.dgsi.pt/trl. Na realização do cúmulo jurídico importa ter em conta duas realidades distintas: a)O momento temporal da prática dos crimes; e, b)A data do trânsito em julgado de cada uma das condenações. Na previsão do artº 77º nº 1 do cód. penal é necessário que as várias infracções tenham sido praticadas antes de ter transitado em julgado a pena imposta por qualquer uma delas, excluindo-se do âmbito da pena única os crimes praticados posteriormente. No caso do artº 78º nº 1 do cód. penal (concurso superveniente) importa fundamentalmente saber a data do trânsito em julgado da primeira condenação. O denominado “cúmulo por arrastamento” tem sido rejeitado pela nossa jurisprudência por se entender que contraria expressamente a lei e não se adequa ao sistema legal de distinção entre punição do concurso de crimes e da reincidência. Foi seguida em data anterior a 1997, mas postergada pelo Acórdão do S. T. J. de 04.12.1997, in CJ, STJ, III, 246, assinalando-se que “aniquila a teleologia e a coerência interna do ordenamento jurídico-penal, ao dissolver a diferença entre as figuras do concurso de crimes e da reincidência (Comentário de Vera Lúcia Raposo, RPCC, Ano 13º, nº 4 , pág. 592)”. E ao refazer um cúmulo jurídico que englobe cúmulos anteriores, como é o caso, - em concurso superveniente de crimes -, “a operação tendente a encontrar a pena conjunta, na qual se incluam penas parcelares que, por seu turno, já anteriormente hajam dado origem a uma pena de igual natureza, apenas se tem de ater às ditas penas parcelares, desconsiderando, por isso, as eventuais penas conjuntas antes fixadas”, - cfr. Ac. Trib. Rel. Coimbra de 03.12.2014, disponível em www.dgsi.pt/trc. Havendo duas penas únicas de cumprimento sucessivo, a escolha das penas que hão-de integrar cada um dos cúmulos jurídico não pode ser aleatória ou arbitrária, já que o resultado difere consoante as penas parcelares. A escolha tem de ser feita de acordo com o disposto nos arts. 77º e 78º, ambos do cód. penal, e o resultado a que se chegar com a inclusão daquelas penas terá de ser o mais favorável para o arguido, - neste sentido cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 02.11.2011, disponível em www.dgsi.pt/trl. Ao contrário do que defende o recorrente, a medida da pena única anteriormente determinada não pode condicionar os limites da moldura a atender para a fixação da nova pena conjunta, a qual, há-de ser encontrada atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente. Actualmente, a corrente dominante dos Tribunais Superiores, maxime do Supremo Tribunal de Justiça, vai no sentido de que, para a verificação de uma situação de concurso de infracções, a punir por uma única pena, se exige desde logo, que as várias infracções tenham, todas elas, sido cometidas antes de haver transitado em julgado a condenação imposta por qualquer uma delas, isto é, o transito em julgado da condenação imposta por uma dada infracção obsta a que, com essa infracção, ou com outras cometidas até esse trânsito, se cumulem infracções que venham a ser praticadas em momento posterior a esse transito. “I.Uma pluralidade de infracções/crimes cometidas pelo mesmo arguido/agente pode dar lugar ou a um concurso de penas (quando os vários crimes/infracções tiverem sido cometidos antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles) ou a uma sucessão de penas (nos demais casos de pluralidade de crimes/infracções cometidos pelo mesmo arguido/agente)” – cfr. acórdão do STJ de 14.01.2009 in www.dgsi.pt/stj, II.Elemento relevante e fundamental para determinar a possibilidade de efectivação de cúmulo jurídico das penas é o trânsito em julgado da condenação pelo primeiro crime. III. Na verdade, a jurisprudência mais recente e dominante deste STJ vai no sentido de que não poderá haver cúmulo jurídico de penas respeitantes a crimes praticados uns antes e outros depois da primeira condenação transitada em julgado. Depois daquele trânsito haverá sucessão de crimes e de penas”. Se os crimes conhecidos forem vários, tendo uns ocorrido antes de condenação anterior e outros depois dela, o tribunal proferirá duas penas conjuntas, uma a corrigir a condenação anterior e outra relativa aos factos praticados depois daquela condenação; a ideia de que o tribunal devia proferir aqui uma só pena conjunta, contraria expressamente a lei e não se adequaria ao sistema legal de distinção entre punição do concurso de crimes e da reincidência - vide Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, § 425 - dando lugar a cúmulos separados e a pena executada separada e sucessivamente. Neste sentido se pronuncia também o Prof. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao Código Penal, pág. 247. No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.05.2009, (disponível na internet em www.dgsi.pt, processo nº 6/03.8TPLSB.S1), defendeu-se que o limite determinante e intransponível da consideração da pluralidade de crimes para o efeito de aplicação de uma pena de concurso é, pois, o trânsito em julgado da condenação que primeiramente teve lugar por qualquer crime praticado anteriormente; no caso de conhecimento superveniente de infracções aplicam-se as mesmas regras, devendo a última decisão que condene por um crime anterior ser considerada como se fosse tomada ao tempo do trânsito da primeira, se o tribunal, a esse tempo, tivesse tido conhecimento da prática do facto[3] como se, por ficção de contemporaneidade, todos os factos que posteriormente foram conhecidos tivessem sido tivessem sido julgados conjuntamente no momento da decisão primeiramente transitada. No caso concreto, a condenação sofrida pelo recorrente que primeiro transitou em julgado ocorreu no processo nº 738/13.2PLSNT, no qual foi condenado por factos de 03.05.2013 e sentença de 03.05.2013, transitada em julgado em 16.09.2013, pela prática de um crime de condução de veículo a motor sem carta de condução, p. e p. pelo artigo 3º, nº 2 do Dec.-Lei nº 2/98, de 3-1, foi condenado na pena de 80 dias de multa, à quantia diária de 5,00 €, a cujo pagamento não procedeu, tendo, por despacho transitado em julgado em 11.12.2015, a multa sido convertida em prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ou seja 53 dias de prisão subsidiária. Assim, a englobar no primeiro cúmulo jurídico apenas o podem ser os crimes praticados antes de 16.09.2013. Estão nesta situação, o processo nº 577/13.0PHSNT em que o arguido foi condenado pela prática do crime de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do cód. penal, na pena de 3 anos e 9 meses de prisão, por factos de 13.05.2013 e acórdão de 22.01.2014, transitado em julgado em 24.02.2014; o processo nº 673/13.4PLSNT (estes autos), no qual o recorrente foi condenado pela prática do crime de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do cód. penal, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, por factos de 22.04.2013 e acórdão de 22.09.2015, transitado em julgado em 23.10.2015; e no processo nº 450/14.5PLSNT, apenas os crimes que se reportam aos factos praticados em 13.05.2013 (correspondentes ao NUIPC 798/13.6PLSNT), pelos quais, foi condenado como co-autor material de dois crimes de roubo qualificado, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1 e nº 2, al. b) do cód. penal duas penas de 7 anos de prisão cada uma, por acórdão de 22.06.2015, transitado em julgado em 21.12.2015. Os restantes crimes julgados no processo nº 450/14.5PLSNT, que se reportam a factos ocorridos, respectivamente em 20.03.2014, (correspondentes à co-autoria material de dois crimes de roubo qualificado e de dois crimes de sequestro, pelos quais foi condenado nas penas de 7 anos, de 5 anos, de 3 anos e de 3 anos de prisão); de 28.03.2014 (correspondentes à co-autoria material de um crime de roubo, em que foi condenado na pena de 3 anos de prisão) e de 01.04.2014, (correspondentes à co-autoria material de um crime de roubo, em que foi condenado na pena de 3 anos de prisão), terão que ser objecto de outro cúmulo jurídico a cumprir sucessivamente. Ao contrário da tese recorrente, no caso concreto há que efectuar dois cúmulos jurídicos a cumprir sucessivamente pelo condenado. Esta posição não atenta contra princípios fundamentais do Estado de direito, particularmente no tocante ao respeito pela dignidade humana, da tipicidade, culpa e legalidade, tendo sido sufragada sendo, pelo TC no seu Ac. nº 212/02, de 22/5/2002, Pº nº 243/2002, DR II Série nº 147, de 28.06.2002, em ponderação da conformidade constitucional decidida pelo Ac. do STJ, de 17.01.2002, in CJ STJ, 2002, I, 180, repudiando interpretação favorável ao cúmulo por arrastamento. O acórdão recorrido não merece censura neste ponto, por se mostrar em conformidade com a lei, doutrina e jurisprudência dominantes. * Quanto à determinação dos cúmulos jurídicos e quantum das penas únicas a cumprir em cada um deles, não obstante as múltiplas e elevadas penas parcelares[4], tendo em conta, a situação pessoal do condenado, a sua idade e o facto dos vários crimes terem sido cometidos num espaço temporal relativamente pequeno, (entre 13.05.2013 e 01.04.2014), impõe-se reduzir a pena única em cada um dos cúmulos, devendo à pena parcelar mais elevada acrescer cerca de 1/5 de cada uma das penas parcelares restantes. Assim, no primeiro cúmulo a realizar, que engloba as penas aplicadas nos crimes em que foi condenado nos processos nº 738/13.2PLSNT, nº 577/13.0PHSNT, nº 673/13.4PLSNT e nº 450/14.5PLSNT, (neste apenas os crimes que se reportam aos factos praticados em 13.05.2013 referentes NUIPC 798/13.6PLSNT), temos como adequado fixar a pena única em 10 anos e 2 meses aos quais acrescem os 53 dias de prisão subsidiária, que poderá ainda evitar, pagando a multa em que foi condenado, nos termos do artigo 49º, nº 2 do cód. penal. No segundo cúmulo, englobando as penas aplicadas no processo nº 450/14.5PLSNT, referentes aos crimes cometidos em, 20.03.2014, em 28.03.2014 e em de 01.04.2014, temos como adequado fixar a pena única em 10 anos e 4 meses. Assim, em face do exposto e sem necessidade de mais considerandos, dada a simplicidade e liquidez da questão, se conclui pelo provimento parcial do recurso, no tocante à redução do quantum das penas únicas. * DECISÃO. Nestes termos, acordam os Juízes da ...ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, em conceder provimento parcial ao recurso e decidem: a)Efectuar o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido ... da ... Varela nos Processos nº 738/13.2PLSNT, nº 577/13.0PHSNT, nº 450/14.5PLSNT (relativamente aos factos ocorridos em 13.05.2013) e nº 673/13.4PLSNT, e condená-lo na pena única de 10 (dez) anos e 2 (dois) meses de prisão efectiva, a que acrescem 53 (cinquenta e três) dias de prisão subsidiária; b)Efectuar o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao mesmo arguido no Processo nº 450/14.5PLSNT, relativamente aos factos de 20.03.2014, de 28.03.2014 e de 01.04.2014 e condená-lo na pena única de 10 (dez) anos e 4 (quatro) meses de prisão efectiva. c)O arguido ... Varela cumprirá sucessivamente as penas únicas mencionadas nas alíneas antecedentes. d)No mais, cumpra-se o determinado no acórdão recorrido, [al. d), e), f) e g) da parte decisória]. * Sem custas (artº 513º nº 1 do cód. procº penal). * Lisboa 15 de Junho de 2016 (A. Augusto Lourenço)[5] (Ana Paula Grandvaux) [1]-“A fronteira do primeiro nível de concurso é instituída, de acordo com o disposto no nº 1 do art. 78º do Código Penal, pela data da primeira condenação do arguido transitado em julgado”, cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 09.03.2011 disponível in www.dgsi.pt/trl [2]-Cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 02.11.2011, disponível em www.dgsi.pt/trl. [3]-Cfr. também Ac. do STJ, de 17.3.2004, in CJ, STJ, I, 2004, 229 e segs. e de 15.3.2007, in Recº nº 4796 /06, da 5ª Sec., de 11.10.2001, Pº nº 1934/01 e de 17.1.2002, Pº nº 2739/01. [4]-Embora não tenhamos todos os elementos, pelo que nos foi possível avaliar do processo remetido a este Tribunal “ad quem”, algumas das penas parcelares parecem-nos excessivas, mormente os 7 anos por cada crime de roubo. Todavia, quanto a estas, não se podendo neste momento alterar, tendo em conta o princípio do caso julgado, há que repor algum equilíbrio na fixação da pena única. [5]-Elaborado e revisto pelo relator, sendo da sua responsabilidade a não aplicação do acordo ortográfico. |