Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RICARDO SILVA | ||
Descritores: | RECUSA DE JUÍZ IMPARCIALIDADE DATA PARA JULGAMENTO FALTA DE ACORDO INDEFERIMENTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/28/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | INCIDENTE PROCESSUAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | I - O regime do art.º 155.º do CPC, aplicável ao processo penal por força do disposto no n.º 4 do art.º 312.º do CPP, consagra um princípio de cooperação, que abrange as relações dos sujeitos processuais, em todas as suas direcções possíveis. II - Este princípio de cooperação, para além de óbvias implicações de natureza ético-deontológica, visa a aplicação de uma justiça expedita e eficaz, ou seja, não lhe são estranhos fins de natureza prática directamente relacionados com a celeridade processual. Aliás, outros institutos do Código vão no mesmo sentido, dos quais o mais evidente é o da “aceleração processual”. III - A alteração de datas, após marcação, referida nos n.os 2 e 3 do art.º 155.º, em causa, não prescinde de um princípio de acordo entre os sujeitos processuais envolvidos – não contando o tribunal –, pelo menos quanto às datas comuns livres em agenda, como resulta da expressão «após contacto com os restantes mandatários interessados», inserta no n.º 2, respectivo. Se assim não fosse, colocar-se-ia o tribunal na iminência de marcar às cegas quanto aos interessados não requerentes, ficando sempre sujeito a que lhe fossem levantados sucessivos impedimentos de agenda. IV - O acordo a que se refere o art.º 155.º não é uma condição necessária do prosseguimento dos autos, cabendo sempre ao tribunal a gestão da sua correcta tramitação, como se depreende da expressão «poderá alterar a data inicialmente fixada», que aponta para ser deixado ao poder discricionário do tribunal proceder ou não à alteração. V - Ora, o tribunal está, antes de mais, vinculado ao dever de fazer justiça pela aplicação do direito, sendo condição indispensável deste desiderato público que ele conduza o processo até ao seu termo natural, que é a prolação de uma decisão final de mérito em tempo útil. VI – É manifestamente infundado o pedido de recusa de juiz em que é invocado estar comprometida a imparcialidade deste, baseado no facto de terem sido indeferidos vários requerimentos do recusante, nos quais pedia a alteração das datas designadas para julgamento para cerca de dois meses depois, com o argumento de que lhe não era possível comparecer nas datas designadas. VII – A realização da audiência de julgamento na data designada, apesar de o mandatário do arguido não ter comparecido, sendo-lhe nomeado defensor, não atenta contra o direito que assiste ao arguido de escolher advogado. . | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, 1. S... veio deduzir o incidente de recusa de intervenção da Ex.ma Sr.ª “Juíza titular da 3.ª secção do 2.º Juízo Criminal de Lisboa”, no processo comum n.º 1550/01.7SILSB, … de que é arguido, com fundamentos em terem sido proferidas, consecutivamente, decisões de "protecção" da posição processual do assistente, em detrimento e grave prejuízo da defesa do arguido; assim: 1.1.– Por carta registada remetida no dia 31 de Outubro de 2006, o mandatário do arguido foi notificado da designação da data de 19 de Janeiro de 2007; para a realização do julgamento no processo referido; – No dia 13 de Novembro de 2006 o mandatário do arguido apresentou requerimento, a informar estar impossibilitado de comparecer na data designada e que, contactado, o mandatário do assistente discordava da alteração da data designada, por ter disponibilidade nessa data, e se tinha recusado a propor datas alternativas; e a requerer a marcação de novas datas compatíveis com todos os sujeitos processuais; 1.2.– Este requerimento foi indeferido com dois fundamentos: – Que o requerimento tinha sido apresentado 10 dias depois da notificação feita para o efeito; Que, deferindo-o, o tribunal se arriscava a designar datas incompatíveis com a agenda do mandatário do assistente, suscitando novo incidente; e que [o requerido] contendia com a pretensão punitiva do Estado e que o signatário poderia substabelecer num colega da sua confiança. 1.3. Inconformado com esta decisão, o signatário viria a apresentar, no dia 8 de Janeiro de 2007 – a 11 dias da data designada –, novo requerimento, com vista à modificação da data designada para a realização do julgamento, acompanhado de cópia de douto despacho proferido no processo n.º 577/95.0JGLSB, da 3.ª Secção da 3ª Vara Criminal de Lisboa, justificando a sua impossibilidade de comparência na sexta-feira, 19 de Janeiro; 1.4. Apesar de a decisão de tal requerimento se enquadrar no elenco das decisões previstas na alínea b) do n.º 1 do art.º 400.º do Código de Processo Penal (CPP), a Sr.ª Juíza notificou o Sr. Mandatário do assistente para se pronunciar, o qual manifestou oposição. 1.5. A Sr.ª Juíza, pese embora todo o circunstancialismo descrito pelo signatário, indeferiu, novamente, a designação de outras datas compatíveis com todos os sujeitos processuais; Além de indeferir o referido requerimento, "escudou-se" no trânsito em julgado do despacho que designou data para julgamento. E acrescentou, que "a falta do I. Mandatário do arguido não constitui causa de adiamento da audiência de julgamento, como resulta inequivocamente do disposto no art.º 330.º do Cód. de Processo Penal, devendo o juiz presidente, sob pena de nulidade insanável, proceder à sua substituição por outro advogado ou advogado estagiário (…)” Com isto, a Sr.ª Juíza transformou o trabalho do mandatário do arguido em algo absolutamente dispensável e relega para plano secundário o direito do arguido, legal e constitucionalmente consagrado, de escolher advogado e ser por ele assistido em todos os actos processuais, com manifesto desprezo pelo exercício dos direitos constitucionais garantidos ao arguido; 1.6. Perante a «intransigente posição da Sr.ª Juíza» o arguido apresentou novo requerimento, no qual para além de reiterar o impedimento, suscitou questão respeitante ao cumprimento de prazos em curso; Apesar da apresentação do referido requerimento, a Sr.ª Juíza procedeu à abertura da audiência e à nomeação de defensora oficiosa ao arguido e só não deu início ao julgamento devido ao facto de ainda se encontrar em curso prazo que o Tribunal havia concedido para que o arguido, relativamente a testemunhas por si arroladas e residentes em Angola, indicasse "em cinco dias, a que factos pretendia o respectivo depoimento e em que medida eram os mesmos essenciais para a defesa". 1.7. Confrontado com o novo agendamento e considerando que se verificava a sobreposição de diligências judiciais, para duas das três sessões designadas, o signatário apresentou novo requerimento, ao abrigo do mencionado art.º 312.º, n.º 4, do CPP, requerendo a designação de outras datas, tendo proposto, desde logo, datas alternativas (aliás, propôs quatro datas alternativas para os dois dias de impedimento). Requerimento este que viria a ser indeferido, com fundamento no facto de que as datas tinham sido designadas por acordo com os intervenientes processuais presentes e impedimentos previamente informados pelo I. Mandatário do arguido; nunca tendo, porém, o mandatário do arguido sido consultado sobre a sua disponibilidade de agenda para as novas datas designadas. O direito concedido ao mandatário do assistente de compatibilizar a sua agenda com a marcação de datas para a realização do julgamento, em oposição com a absoluta negação desse direito ao arguido e seu mandatário, constitui flagrante tratamento privilegiado a uma das partes, incompatível com o dever de isenção que se espera e exige; Ao dar "sem efeito" datas designadas para julgamento – o que deveria ter acontecido muito antes e pelos motivos supra aludidos –, o Tribunal teria necessariamente de actuar conforme dispõe o art.º 312.º, n.º 4, do CPP, sendo que o mero acordo de um dos mandatários – para além de constituir sensível tendência do Tribunal a favor da posição processual de uma das partes (in caso, do assistente) – não é suficiente para cumprir tal injunção legal. 1.8. É evidente que ao efectuar aquela notificação, a 4 dias da data designada para a realização do julgamento, a Sr.ª Juíza tinha de já ter decidido que iria indeferir a inquirição daquelas testemunhas, mesmo que estas sejam (com são) essenciais à defesa; Aliás, o arguido apresentou o seu requerimento (pelo qual justificou a importância daquelas testemunhas e indicou a matéria a que as mesmas deveriam responder) no dia 30 de Janeiro de 2007 e no dia 31 de Janeiro de 2007, já estava a ser-lhe remetida notificação da decisão de indeferimento da inquirição daquelas testemunhas; É óbvio e resulta da experiência comum dos operadores da Justiça que se a Sr.ª Juíza estava na firme e verdadeira disposição de apreciar os fundamentos do arguido justificativos da essencialidade do depoimentos daquelas testemunhas, jamais poderia "exigir" dar início ao julgamento no dia 19 de Janeiro de 2007, pois dessa forma estaria a colocar em risco a prova que viesse a produzir (pois esta poderia vir a perder a eficácia, caso a inquirição daquelas testemunhas não se mostrasse possível no período de 30 dias); seria, pois, no mínimo, pouco prudente iniciar o julgamento sem que houvesse previsão da data em que se mostrariam juntos aos autos os depoimentos daquelas testemunhas; Tal notificação remetida ao arguido mais não se tratou, efectivamente, senão do mero cumprimento de uma formalidade, sendo certo que a decisão de indeferimento se encontrava já patentemente presente; 1.9 A tendência que vêm seguindo as decisões da Sr.ª Juíza, sempre no sentido da protecção da posição processual do assistente em detrimento da do arguido, manifestada em circunstâncias objectivas coloca em causa, fundada e seriamente, a imparcialidade daquela Sr.ª Juíza, sendo absolutamente incompaginável com os direitos de defesa conferidos ao arguido pela Lei e pela Constituição da República Portuguesa (CRP), antes constituindo frontal violação desta Lei Fundamental, nomeadamente do seu art.º 32.º, bem assim como constitui violação do art.º 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Art.º 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, vigentes directamente no Estado Português, nos termos do disposto no art.º 8° da CRP. Terminou pedindo o provimento do requerimento e que seja proferida decisão que ordene a recusa da Sr.ª Juíza da 3.ª Secção do 2° Juízo Criminal de Lisboa e, na sequência desta, sejam anulados todos os actos por esta praticados, dos quais resulta prejuízo para a justiça da decisão. * * * 2. Não havendo diligências de prova a realizar, colhidos os vistos vieram ao autos à conferência, cumprindo decidir.1. O extenso rol de aceradas críticas que o recusante enumera ao longo do seu requerimento de recusa, podem condensar-se em quatro situações: – Indeferimento do requerimento de 2006/11/13; – Indeferimento do requerimento de 2007/01/08; – Abertura da audiência de 2007/01/19; – Indeferimento do requerimento supra referido em 1.1.7. – interposto em 2007/01/30 – e no qual o requerente requereu a alteração das datas agendadas para julgamento – 13 e 15 de Fevereiro de 2007 – pelas de 1, 7 e 8 de Março de 2007. * * * Vejamos:2. O despacho de recebimento da acusação foi proferido em 2006/05/10 e, por absoluta indisponibilidade de agenda – para datas anteriores, entende-se –, foram designados os dias 19 de Janeiro e 26 de Janeiro, para a realização do julgamento. Isto é, para 8 meses e 9 dias depois, quanto à primeira data. Desse despacho constam os seguintes parágrafos: « Previamente ao cumprimento integral do presente despacho, notifique o(s) I. Advogado(s) constituídos(s), nos termos e para os efeitos do disposto nos art.os 312.º, n.º 4 do Código de Processo Penal e 155.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, Caso nada seja requerido, cumpra o demais ordenado. « (…) « Atendendo ao disposto no art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 184/2000, de 10 de Agosto, mas também à previsível demora dos actos a praticar antes do julgamento, cumpra o presente despacho seis meses antes da primeira data designada.» ([1]) Este despacho foi notificado ao arguido/ recusante em 2006/10/31 ([2]), pelo que se presume que ele foi notificado em 6, p. f., isto é, dois meses e oito dias antes da primeira data designada (mas seis meses e vinte e um dias depois da prolação do despacho notificado). Depois disto, o recusante endereçou ao processo o requerimento de 2006/11/13, em que propôs para a realização do julgamento as datas de 2, 9 16, 23 e 30 de Março de 2007 ou, alternativamente, 16, 23, e 30 de Março e 13 e 20 de Abril, todas de 2007. Acrescentou que, fora das sextas feiras e posteriormente a 7 de Março de 2007, o julgamento poderia ser marcado para qualquer data, informação esta que não alterou posteriormente. Estas datas foram propostas unilateralmente, por não ter conseguido o acordo do assistente, para a alteração das datas designadas. Assim, a primeira das datas propostas situa-se 42 (quarenta e dois dias depois da primeira data designada pelo Tribunal). Ora, que dizem os art.os 312.º, n.º 4, do CPP e 155.º do CPC? Dizem que: « Artigo 312.º « (Data da audiência) « (…) « 4. Se no processo existir advogado constituído, o tribunal deve diligenciar pela concertação da data para audiência, de modo a evitar o conflito com a marcação de audiência, por acordo feito ao abrigo ao art.º 155.º do Código de Processo Civil (CPC).» * * * « Artigo 155.º ([3])« (Marcação e adiamento de diligências) « 1. A fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização mediante prévio acordo com aqueles, podendo encarregar a secretaria de realizar, por forma expedita, os contactos prévios necessários. « 2. Quando a marcação não possa ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar o facto ao tribunal, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados. « 3. O juiz, ponderadas as razões aduzidas, poderá alterar a data inicialmente fixada, apenas se procedendo à notificação dos demais intervenientes no acto após o decurso do prazo a que alude o número anterior. « 4. Logo que se verifique que a diligência, por motivo imprevisto, não pode realizar-se no dia e hora designados, deve o tribunal dar imediato conhecimento do facto aos intervenientes processuais, providenciando por que as pessoas convocadas sejam prontamente notificadas do adiamento. « 5. Os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença e que determinem o adiamento de diligência marcada.» Por outro lado
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