Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
20633/20.8T8LSB.L1-4
Relator: SÉRGIO ALMEIDA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
CADUCIDADE
IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE
ABSOLUTA E DEFINITIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/14/2021
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: A falta de comunicação prévia e de obtenção do parecer aludido no artigo 161º da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro, não torna ilícita a cessação do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva do sinistrado prestar a sua actividade laboral, devendo o empregador que declarou a caducidade alegar e provar a dita impossibilidade e a inexistência de outro posto de trabalho que possa atribuir ao trabalhador.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa   


   
I.– A)-Autor, também designado por A. e recorrente: AAA
Ré– (R.) e recorrida: BBB

O A. alegou que trabalhou para a R., como vigilante, e sofreu um acidente de trabalho, tendo-lhe sido fixada uma IPP com IPATH desde 2016. Refere que não conseguia desempenhar as suas funções de vigilante, mas como a medicina do trabalho o considerava apto condicionalmente entrou de baixa médica pelo serviço nacional de saúde até 3/8/2020. Recebeu então a notificação de que o seu contrato de trabalho tinha cessado por caducidade, em agosto de 2020. Porém, tal decisão não foi precedida de parecer do IEFP.

Com estes fundamentos pediu que a comunicação de caducidade do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente do trabalhador seja considerada um despedimento ilícito por não ter sido precedida de parecer do IEFP, condenando-se a R. a reintegrar o trabalhador ou no pagamento de uma indemnização em substituição da reintegração que atualmente ascende a € 14.850,29.

Não havendo acordo a R. contestou, pedindo a improcedência da ação. Alega que o A. não tinha condições para o exercício das suas funções de vigilante em virtude das sequelas do acidente. Não tem funções compatíveis com o estado do A., sendo-lhe impossível proceder à reconversão profissional. Nessa medida indica cada um dos departamentos existentes e da impossibilidade de ser integrado num. E conclui nos termos indicados pela impossibilidade de manutenção do contrato de trabalho. Mais refere que o parecer do IEFP não é obrigatório para a constatação dessa impossibilidade, motivo pelo qual pede a improcedência da ação.
Efetuado o julgamento, o Tribunal a quo proferiu sentença julgando a ação improcedente e absolvendo a R. do pedido.

*

B)–O A. não se conformou e recorreu, concluindo:

1.-Em 16 de março de 2015 o A., no exercício das suas funções como vigilante sob as ordens, direção e fiscalização de BBB ora Recorrida, sofreu um acidente de trabalho.

2.-Do referido acidente resultaram sequelas, nomeadamente “cicatrizes no joelho, atrofia da coxa de 3cm, rigidez no joelho, flexão até 60% e laxidez antero externa do joelho”, tendo sido fixada por sentença, em 09.06.2020, uma IPP de 21,43% com IPATH, desde 07.11.2016.

3.-Em 10.08.2020 o A. recebeu notificação da R. de que o seu contrato de trabalho tinha cessado por caducidade, em agosto de 2020, por motivo de impossibilidade de assegurar ocupação e função compatível com o estado de saúde do recorrente. À data da comunicação, ainda não existia nenhum parecer do IEFP acerca dos postos ou funções compatíveis com o estado clínico do recorrente e que o mesmo pudesse desempenhar dentro da mesma empresa.

4.-Ainda assim, constava expressamente na comunicação que a R. lhe dirigiu que a mesma teria “eficácia suspensiva da obrigação do pagamento da retribuição, embora sujeita à condição resolutiva decorrente do sentido do parecer do serviço público competente da área do emprego e formação profissional que venha a ser emitido”.

5.-A R. suspenderia o pagamento da retribuição ao A., mas o contrato de trabalho mantinha-se em vigor até verificação da eventual condição resolutiva decorrente do teor do parecer do IEFP, o qual viria a ser emitido.

6.-Esta foi a declaração da Recorrida correspondente à sua vontade e foi assim que o A. entendeu, ou seja, que o contrato se mantinha em vigor até à condição resolutiva decorrente da conclusão do parecer do IEFP.

7.-Uma vez que a R. entende e considera que o contrato de trabalho cessou, terá que se considerar que se trata de um despedimento ilícito, pelo que era expetável que o Tribunal a quo considerasse como tal, por violação do disposto no art.º 343º, al. b), do Código do Trabalho. Conferindo, desse modo, ao Recorrente o direito à reintegração, ou à indemnização em substituição da reintegração.

8.-A este propósito, tal matéria encontra-se discutida e decidida na nossa jurisprudência, e a título meramente exemplificativo, atente-se ao Acórdão do Tribunal do Porto, de 13-05-2019, o qual se cita o seguinte:

I-A impossibilidade absoluta de o trabalhador prestar o trabalho tem de se reportar apenas às atividades para que foi contratado, caducando o contrato de trabalho se o trabalhador não se encontrar em condições de as executar, uma vez que não existe o dever genérico de o empregador modificar o objeto do contrato em função da limitação do trabalhador; II-Mas se essa solução vale em geral, já não serve para os casos em que essa situação decorra da incapacidade permanente resultante de acidente de trabalho ou doença profissional, dado a lei impor ao empregador que assegure ao trabalhador ocupação em funções e condições de trabalho compatíveis com o respetivo estado; III-Nos casos excecionais, a lei obriga o empregador, se necessário for, a propor a modificação da categoria, sob pena de não poder invocar a caducidade do contrato de trabalho.”

9.-Tal entendimento encontra-se estabelecido no regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, incluindo a reabilitação e reintegração profissionais, nos termos do art.º 284º do Código do Trabalho e aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro (doravante, referido por LAT), nomeadamente no seu artigo 155º.

10.-A entidade empregadora BBB é uma empresa especializada em operações e vigilância, constituída maioritariamente pelo Departamento de Vigilantes (do qual o Recorrente fazia parte), formado por trabalhadores com aptidão física, mental e psicológica, atendendo naturalmente à função de vigiar e proteger o local/cliente que lhe foi incumbido.

11.-Conforme atestado pela Recorrida na sua contestação, verifica-se a existência de mais quatro departamentos: Departamento de Guarda e Tratamento de Valores, Departamento de Operações de Transportes de Valores, Departamento Técnico e Departamento de Segurança.

12.-Se por um lado é certo que, os trabalhadores do Departamento de Operações necessitam de maior aptidão física considerando a função de transporte e carregamento de valores, bem como a condução de veículos apropriados para o efeito; por outro lado, não é certo que, salvo melhor entendimento, para o exercício de funções no Departamento de Guarda e Tratamento de Valores, essa aptidão física seja exigível, de acordo com as funções genéricas descritas pela Recorrida.

13.-No Departamento de Guarda e Tratamento de Valores, os trabalhadores “procedem ao recebimento, contagem e tratamento dos valores” (conforme articulado 40º da contestação), não se compreendendo, por isso, a exigência de estar “em pé” e de “alguma robustez física”, na medida em que nada mais se diz sobre a função. E por isso, não se entendo o motivo de se considerar que o Recorrente não poderia reintegrar neste Departamento.

14.-Quanto ao Departamento Técnico, a Recorrida refere ser constituído por técnicos relacionados com sistemas de alarmes e que “claramente exige firmeza física”, não se percebendo mais uma vez a descrição das funções que estão inerentes à categoria de técnicos. Por sua vez, existe o Departamento de Segurança, consistindo em funções de chefia, em que aqui a incompatibilidade de o Recorrente as exercer já não se afigura pelas incapacidades de que o mesmo padece, mas por não existir relação de confiança.

15.-Conclusões estas que a R. analisou sozinha e por iniciativa própria, expondo que, não obstante às incapacidades do A. que, lamentavelmente, não se demonstram compatíveis com nenhuma das funções inerentes aos departamentos acima descritos, também não existem vagas por preencher em nenhum deles e termina a referir que “não são necessárias mais análises às caraterísticas destes departamentos” (conforme articulado 43 da contestação). Parece-nos que nesse caso, em circunstância alguma seria necessário recorrer-se do parecer prévio do IEFP.

16.-Considerando o Acórdão referido anteriormente, consta ainda que: “VII- Tendo ficado demonstrado – e com natureza vinculativa dada a confirmação por parecer da entidade pública competente (n.º 4, do art.º 166º da Lei 98/2009) – que a Ré não tinha a possibilidade de assegurar ocupação e função compatíveis com o estado da autora e a sua capacidade residual, resultantes de doença profissional que a afeta, a qual foi contraída na vigência do contrato de trabalho e no exercício das funções contratadas e tem natureza irreversível, na medida em que lhe determina uma incapacidade permanente parcial, é forçoso concluir que se verifica a impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de que a lei faz depender a possibilidade do empregador fazer cessar o contrato por caducidade (artigo 343º/b do CT).”

17.-Resultando por isso, no entendimento do A., que é absolutamente essencial a avaliação pelo serviço da entidade pública competente e posterior confirmação de que inexiste posto ou função compatível de acordo com as incapacidades de que o mesmo padece, para que se possa concluir que existe impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva deste, para prestar o seu trabalho, inserindo-se assim na alínea b) do artigo 343º do Código do Trabalho, a qual se considera uma das causas lícitas para a caducidade do contrato de trabalho.

18.-A solicitação do parecer do IEFP consta como requisito vinculativo caso o empregador, feita a sua análise à estrutura da empresa, considere que não lhe é possível assegurar uma ocupação e função compatível com o estado do trabalhador, conforme disposto no artigo 161º da LAT. Assim, no referido parecer irá constar a declaração da viabilidade da ocupação do trabalhador num outro posto de trabalho da mesma empresa ou da impossibilidade total de ocupação do trabalhador numa função compatível com o seu estado. Sendo o último caso aplicado, então ainda há lugar à solicitação da intervenção do centro de emprego, pelo empregador, no sentido de apoiar o trabalhador a procurar outras alternativas com vista à sua reabilitação e reintegração profissional.

19.-Cremos que a previsão da intervenção do IEFP nestes casos constitui uma norma especial, legislada por lei avulsa, e como tal, prevalece sobre a normal geral do Código do Trabalho, em relação à caducidade do contrato de trabalho, por impossibilidade superveniente do trabalhador.

20.-Na comunicação dirigida ao Recorrente consta expressamente que a Recorrida iria servir-se deste mecanismo, e tal não aconteceu, vigorando automaticamente os efeitos de cessação do contrato de trabalho. Note-se que foi a própria Recorrida que assumiu que os efeitos do contrato estariam dependentes da realização do parecer do IEFP, referindo que estaria sujeita à condição resolutiva decorrente do sentido do parecer do serviço público competente da área do emprego e formação profissional que venha a ser emitido”.

21.-Tal declaração encontra-se sujeita às regras constantes dos art.º 236º a 238º do Cód. Civil e neste sentido e a título exemplificativo, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12.06.2012, o qual se cita o seguinte:
II-As regras constantes dos arts. 236.º a 238.º do CC constituem diretrizes que visam vincular o intérprete a um dos sentidos propiciados pela atividade interpretativa, e o que basicamente se retira do art.º 236.º é que, em homenagem aos princípios da proteção da confiança e da segurança do tráfico jurídico, dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (recetor). No entanto, a lei não se basta com o sentido realmente compreendido pelo declaratário (entendimento subjetivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objetivo para o declaratário); III- Em termos práticos, o intérprete deve, relativamente a ambos os contraentes, tentar definir a posição em que se encontram perante a declaração da contraparte, e colocar um declaratário ideal (normal) na posição do declaratário real.”

22.-O Recorrente, como qualquer outra pessoa colocada na posição do mesmo, face à comunicação da Recorrida, concluiu que o contrato de trabalho se mantinha em vigor até realização de parecer do IEFP, ficando apenas suspensa a obrigação do pagamento de retribuição.

23.-O A. foi impedido de exercer as suas funções, e por sua vez, a R. considerou o seu contrato de trabalho caducado, sem preceder da realização do parecer do IEFP tal como havia declarado ao Recorrente.

24.-Pelas razões expostas, o Recorrente conclui assim, que a Recorrida procedeu ao seu despedimento ilicitamente, o que confere ao mesmo o direito à reintegração ou à indemnização em substituição da reintegração, de acordo com o artigo 389º do Código do Trabalho.
Remata impetrando que seja anulada a sentença e substituída por outra que considere que a comunicação de caducidade do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente do trabalhador seja considerada um despedimento ilícito, por não ter sido precedida do parecer do IEFP, condenando a Ré na reintegração do trabalhador ou no pagamento da indemnização em substituição da reintegração.
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A R. contra-alegou, pedindo a confirmação da sentença.
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O DM do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido da confirmação da sentença.

Foram colhidos os competentes vistos.
*

II
A)-É sabido e tem sido jurisprudência uniforme a conclusão de que o objecto do recurso se limita em face das conclusões insertas nas alegações do recorrente, pelo que, em princípio, só abrange as questões aí contidas, como resultado aliás do disposto nos artigos 635/4, 639/1 e 2, 608/2 e 663 do CPC. Deste modo o objecto do recurso consiste em saber se existe despedimento ilícito por falta da comunicação feita nos termos do art.º 161 da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, Lei dos Acidentes de Trabalho (também designada por LAT) à autoridade administrativa do trabalho.
*
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Consta do ponto 1 que o A. aufere a retribuição anual de 554,76€, acrescidos de subsídio de função.
A expressão “anual” decorre da transposição de quanto se exarou no art.º 2º da PI, sendo, porém, óbvio, que não pode corresponder à realidade. Que assim é, e que se trata de um lapso, emerge também do documento que titulou o contrato de trabalho, em 2003, onde se exarou uma retribuição mensal de 554,76€ e subsídio de função.
Retificar-se-á, pois, aquele ponto de facto em conformidade.
*

São estes os factos apurados nos autos:
1.-O autor foi admitido ao serviço da ora ré, em 01/01/2003 para exercer as funções inerentes à categoria de Vigilante, mediante a retribuição mensal de 554,76 Euros, acrescidos do Subsídio de Função, correspondente a 30% do valor da retribuição;
2.-Sucede, que em 16/03/2015, o autor sofreu um acidente de trabalho, que foi também, simultaneamente de viação;
3.-Por ter ficado com sequelas reconhecidas pela seguradora, a mesma participou o sinistro ao Tribunal do Trabalho;
4.-Em consequência, foi fixada por sentença, uma IPP de 21,43%, com IPATH, desde 07/11/2016;
5.-À data, o autor auferia a retribuição anual de 10.482,56 Euros;
6.-Tendo a seguradora atribuído alta ao trabalhador em 07/11/2016, este deslocou-se aos serviços da medicina do trabalho da ré, em 14/11/2016, que o consideraram inapto;
7.-Porque o autor não conseguia desempenhar as suas funções de vigilante, e porque os serviços da medicina do trabalho o consideraram apto condicional, entrou de baixa pelo SNS, até 03/08/2020;
8.-Por decisão judicial de 09-06-2020, foi fixada ao autor uma IPATH para o trabalho habitual de vigilante;
9.-O A. compareceu numa reunião na R., em 10/08/2020, na qual lhe foi transmitido que o seu contrato de trabalho cessava por caducidade, tendo a ré tentado entregar a carta em “mão própria”, mas que o autor se recusou a receber, em termos que constam de fls. 31 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
10.-À data da comunicação de caducidade do contrato feito pela ré ao autor não existia ainda o parecer do IEFP acerca dos postos ou funções compatíveis com a incapacidade do autor;
11.-A Ré é uma sociedade comercial, sob a forma de sociedade anónima, que se dedica à prestação de serviços de segurança privada, estando habilitada para a prestação desses serviços pelo Alvará n.º 37, alíneas A, B, C e D do MAI;
12.-Conforme resulta do Anexo I do Contrato Coletivo entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e outra e o STAD - Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 38, de 15 de outubro de 2017, alvo da Portaria de Extensão n.º 356/2017 de 16 de novembro, o trabalhador com a categoria de Vigilante “é o trabalhador que presta serviços de vigilância, prevenção e segurança em instalações industriais, comerciais e outras, públicas ou particulares, para as proteger contra incên-dios, inundações, roubos e outras anomalias, faz rondas periódicas para inspecionar as áreas sujeitas à sua vigilância e regista a sua passagem nos postos de controlo, para provar que fez as rondas nas horas prescritas, controla e anota o movimento de pessoas, veículos ou mercadorias, de acordo com as instruções recebidas";
13.-O A. vinha a exercer as suas funções no parque logístico (…)
14.-No âmbito do processo de Acidentes de Trabalho foram emitidas as fichas de aptidão para o trabalho que constam de fls. 29 vº e 43 vº e, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
15.-Na estrutura da R. existem vários departamentos, sendo que o que tem maior representatividade é o Departamento de Operações de Vigilância, do qual o A. fazia parte, e onde não pode voltar a exercer funções de vigilante em virtude da sua condição física;
16.-Existe ainda o Departamento de Guarda e Tratamento de Valores, departa-mento no qual os trabalhadores procedem ao recebimento, contagem e tratamento de valores, o que exige que os trabalhadores exerçam as suas funções maioritariamente em pé, bem como exige alguma robustez física, designadamente para receber os valores;
17.-Existe ainda na R. o Departamento de Operações de Transporte de Valores, onde o esforço físico é bastante significativo, sendo que estes trabalhadores manuseiam, transportam e carregam valores, bem como conduzem os meios de transporte apropriados;
18.-O Departamento Técnico da R. é constituído por técnicos relacionados com os sistemas de alarme, composto por apenas 1% dos trabalhadores, e que claramente exige firmeza física inerente às funções de um técnico;
19.-O Departamento de Segurança representa menos de 1% dos trabalhadores da R., e é composto sobretudo por cargos de chefia, aos quais é inerente uma especial relação de confiança;
20.-Por fim, o departamento que integra a “estrutura”, isto é, o apoio aos demais departamentos, onde se inserem os trabalhadores com categoria de administrativo, comerciais de vendas, contabilista, advogados e diretores, que na sua totalidade representam 2% dos trabalhadores da R.;
21.-A R. não possui qualquer vaga em nenhum departamento, senão para vigilante;
22.-A R. não contratou qualquer pessoa senão para substituir uma gravidez de risco, tendo ido buscar um trabalhador que estava noutro departamento.
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De Direito

Exarou-se no acórdão de 12.07.2017, no proc. n.º 397/16.0T8VPV.L1, relatado pelo ora relator:
"A questão resume-se a saber se a inobservância do disposto no art.º 161 da LAT torna ilícita a cessação do contrato
Dispõe este art.º 161.º, sob a epigrafe “Impossibilidade de assegurar ocupação compatível”, que:

1— Quando o empregador declare a impossibilidade de assegurar ocupação e função compatível com o estado do trabalhador, a situação deve ser avaliada e confirmada pelo serviço público competente na área do emprego e formação profissional nos termos previstos no presente capítulo.
2— Se o serviço público competente na área do emprego e formação profissional concluir pela viabilidade da ocupação de um posto de trabalho na empresa ao serviço da qual ocorreu o acidente de trabalho ou foi contraída a doença profissional, o empregador deve colocar o trabalhador em ocupação e função compatíveis, sugerindo-lhe, se for caso disso, que solicite ao centro de emprego da área geográfica do local de trabalho os apoios previstos no artigo anterior.
3— Caso o serviço público competente na área do emprego e formação profissional conclua pela impossibilidade da ocupação de um posto de trabalho na empresa ao serviço da qual ocorreu o acidente de trabalho ou foi contraída a doença profissional, solicita a intervenção do centro de emprego da área geográfica da residência do trabalhador, no sentido de o apoiar a encontrar soluções alternativas com vista à sua reabilitação e reintegração profissional”.

(...) O A. insurge-se contra a sentença (...) limitando-se a esgrimir que a comunicação à autoridade administrativa é obrigatória, logo trata-se de formalidades essenciais, (e) o seu incumprimento torna ilícita a cessação.

Há aqui um salto epistemológico de todo infundado. Porque é que o tal incumprimento há de tornar ilícita a cessação, isto é, porque é que uma falta de comunicação a uma entidade administrativa se reflete, para não dizer mesmo é sancionada, com uma invalidade no plano do negócio jurídico bilateral (o contrato de trabalho) existente entre autor e réu? (...)

A primeira nota que se extrai do regime legal é que em lado algum a lei comina o incumprimento desta norma com a ilicitude da cessação, ao contrário do que ocorre noutros casos em que a falta de cumprimento de certas formalidades torna a cessação um despedimento ilícito (a título de exemplo cfr. os art.º 343/a, 344/1, 345/1, do CT, em que a falta de uma comunicação afasta a caducidade; e 381 a 385, que indicam os casos de ilicitude do despedimento por iniciativa do empregador). Isto deve bastar para nos pôr de sobreaviso: não é qualquer incumprimento que é causa de ilicitude do despedimento, mas aquelas que a lei considera suficientemente graves para deverem ter tal sanção, o que não acontece aqui.

Parece que o recorrente se impressionou com o facto de não encontrar bem evidenciada a sanção correspondente à violação do preceito. Isso não basta, porém, para uma consequência tão gravosa, já que diversas normas têm garantias diferentes, desde coimas a reacções de natureza processual (alterar ou dificultar a prova a cargo do infrator). E nem a relevância da norma na protecção do sinistrado impõe conclusão diversa: continua a ser o empregador quem tem de provar que o trabalhador está incapacitado para o trabalho habitual e que não tem outro posto de trabalho que lhe possa dar. E a R. provou-o nos autos.

Aliás, seria até porventura desproporcionado que um empregador com um único trabalhador, entretanto incapacitado, e sem mais postos de trabalho, fosse sancionado com as reacções correspondentes ao despedimento ilícito por declarar, de boa fé, a caducidade do contrato esquecendo a prévia comunicação (...)".

Estas considerações mantêm-se válidas.

Também o acórdão da Relação de Évora de 26.3.2015, aliás citado no supra referido acórdão, dizia, pertinentemente, e em termos que se acompanham, que "I-A declaração de caducidade do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva do trabalhador prestar o seu trabalho, devido a doença profissional, não está dependente de qualquer procedimento prévio, mormente a obtenção do parecer a que alude o artigo 161º da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro. II-Na eventualidade da empregadora fazer cessar o vínculo laboral com fundamento na caducidade do contrato de trabalho originada pela impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalho, só tem que alegar e demonstrar a verificação do facto jurídico strictu sensu gerador da invocada caducidade, nos termos previstos pelo artigo 342º, nº1 do Código Civil", mais se referindo, em sede de fundamentação, relativamente ao art.º 161, que "A previsão deste normativo  insere-se no capítulo da “Reabilitação e Reintegração profissional”, do regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, respeitando a medidas que devem ser tomadas no âmbito do direito de reparação consagrado neste regime, para minimizar as consequências derivadas da ocorrência de um acidente de trabalho ou da circunstância do trabalhador ter contraído doença devido ao exercício da sua profissão. As medidas previstas neste capítulo, mormente a consagrada na disposição legal citada não constitui uma condição sine qua non para que a empregadora possa invocar a verificação da situação contemplada pela alínea b) do artigo 343º do Código do Trabalho, como razão para a caducidade do contrato. Na eventualidade da empregadora fazer cessar o vínculo laboral com fundamento na caducidade do contrato de trabalho originada pela impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalho, só tem que alegar e demonstrar a verificação do facto jurídico strictu sensu gerador da invocada caducidade, nos termos previstos pelo artigo 342º, nº1 do Código Civil".
*

Há que notar, ainda, que o contrato pode cessar tecnicamente por uma de 4 formas, como o CT, na versão originária, deixava muito claro no art.º 384: caducidade, revogação, resolução e denuncia (hoje o art.º 340 distingue nas al. c. a g. situações que se reconduzem à mesma forma, a resolução).

Se o segundo e o terceiro dependem totalmente da vontade (a revogação da vontade das duas partes e a resolução de uma, englobando o despedimento), e a denúncia de per si se prende ainda com a vontade de uma parte, à qual é permitido produzir só por si o fim do vinculo (como na cessação do contrato no período experimental ou através de abandono), a caducidade reconduz-se a uma forma de extinção automática do contrato com fundamento num evento a que a lei atribui esse efeito, findando, pois, ipso iure, sem necessidade de nenhuma manifestação de vontade das partes. Prende-se, basicamente, com a morte do vínculo, o que é especialmente claro na al. b) do art.º 343 do Código do Trabalho (ainda que, nos demais casos, o vínculo não tenha necessariamente de findar ou possa ser renovado, e a cessação possa carecer ainda de um ato de denúncia, como na situação da al. a.). O contrato termina, de todo o modo, sem que a causa da cessação assente na vontade das partes.

Ora, se se entender que o parecer confirmativo há-de ser prévio à declaração de caducidade e à cessação do contrato, e que a sua falta afeta a própria eficácia e licitude da caducidade, afigura-se-nos que se defende, afinal, a existência de causa de cessação ipso iure que depende em parte da vontade do empregador na obtenção prévia de um requisito não previsto na lei geral do trabalho; e que a caducidade, nada tendo à partida a ver com licitude, porquanto ou se verifica tal como decorre da lei ou não, afinal estará sujeita a vícios próprios daquelas causas que dependem da vontade. A falta do parecer ferirá nessa perspetiva a caducidade de invalidade? Ou só de ineficácia? E se há só ineficácia como é que depois redunda mais gravemente em ilicitude (porque a ilicitude, no fundo, reconduz-se à invalidade - neste sentido, por todos, cfr. Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 4ª ed., 429: "assimila-se a ilicitude à invalidade do despedimento, como resulta dos efeitos associados à declaração judicial da ilicitude")? Salvo melhor entendimento não pode ser, já que a cessação suscetível de padecer de ilicitude é a resolução (claro que, por via legislativa, poderia o legislador atribuir natureza de formalidade ou requisito ad substantiam à emissão do parecer; mas tanto quanto se vê não o fez).

Mesmo que se queira argumentar que não há caducidade sem o parecer, não se tratando de vício desta forma de cessação mas simplesmente da sua não verificação, vejamos. Suponhamos que alguém sofre um gravíssimo acidente que o deixa de tal forma mal que se torna evidente que está impossibilitado de voltar a laborar, ao menos naquela área (como por exemplo se sofre amputações de membros imprescindíveis à execução da sua atividade) e o empregador não dispõe de qualquer alternativa que lhe possa proporcionar. Há despedimento (e ilícito) por falta do parecer se este não existir à data de declaração de caducidade, por muito óbvia que seja a sua impossibilidade? Pode acaso o trabalhador ser reintegrado (e, relembre-se, a reintegração é a consequência normal da declaração de ilicitude, art.º 389/1/b, Código do Trabalho)? A nosso ver não pode e não há despedimento. Dir-se-ia: e se for ao contrário, se afinal o sinistro não é grave e o trabalhador está em condições de laborar? Nesse caso ...não há caducidade! Ou seja: não é por aqui, cremos, que o trabalhador ficará prejudicado.

Em suma: a falta de parecer prévio não obsta à verificação da caducidade por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva do sinistrado prestar a sua atividade laboral.
*
*

III–
Pelo exposto, o Tribunal julga improcedente o recurso e confirma a sentença recorrida.
Custas do recurso pelo A..



Lisboa, 14 de julho de 2021


Sérgio Almeida- (relator por vencimento)
Francisca Mendes
Manuela Fialho (vencida)


Declaração de Voto

Voto vencida pelas seguintes razões:

Na base dos autos está uma invocação de caducidade do contrato de trabalho a qual o Apelante reputa de despedimento ilícito.
Fundamenta a sua conclusão na circunstância de, no seu entendimento, ser absolutamente essencial a avaliação pelo serviço da entidade pública competente e posterior confirmação de que inexiste posto ou função compatível de acordo com as incapacidades de que o mesmo padece, para que se possa concluir que existe impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva deste, para prestar o seu trabalho, inserindo-se assim na alínea b) do artigo 343º do Código do Trabalho, a qual se considera uma das causas lícitas para a caducidade do contrato de trabalho. Defende, pois, que a solicitação do parecer do IEFP consta como requisito vinculativo caso o empregador, feita a sua análise à estrutura da empresa, considere que não lhe é possível assegurar uma ocupação e função compatível com o estado do trabalhador, conforme disposto no artigo 161º da LAT. Assim, no referido parecer irá constar a declaração da viabilidade da ocupação do trabalhador num outro posto de trabalho da mesma empresa ou da impossibilidade total de ocupação do trabalhador numa função compatível com o seu estado. Sendo o último caso aplicado, então ainda há lugar à solicitação da intervenção do centro de emprego, pelo empregador, no sentido de apoiar o trabalhador a procurar outras alternativas com vista à sua reabilitação e reintegração profissional. Mais afirma que em momento algum, considerou voltar ao exercício da sua categoria profissional como vigilante, dadas as exigências das funções inerentes ao seu exercício. Não sendo motivo, no entanto, para não reintegrar o Recorrente noutra categoria profissional da empresa, uma vez que também nunca se recusou a tal solução.
A Apelada, por seu turno, defende que a solicitação daquele Parecer não interfere na ocorrência da caducidade do contrato de trabalho. Relativamente à solicitação do pedido de parecer e aos efeitos da sua inexistência, invoca o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-07-2017, no Processo n.º 397/16.0T8VPV.L1- 4, ao determinar que “A falta de comunicação prévia e de obtenção do parecer aludido no artigo 161º da Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro, não torna ilícita a cessação do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva do sinistrado prestar a sua catividade laboral.” Também nesse sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 26-03-2015, no Processo n.º 512/13.6TTBRR.E1, no qual um dos pontos do sumário refere que “A declaração de caducidade do contrato de trabalho por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva do trabalhador prestar o seu trabalho, devido a doença profissional, não está dependente de qualquer procedimento prévio, mormente a obtenção do parecer a que alude o artigo 161º da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro”. Destaca ainda que em nenhuma circunstância o pedido de parecer ao IEFP tem natureza obrigatória e simultaneamente caráter vinculativo.
Como decidir?
Entre as formas de cessação do contrato de trabalho encontra-se a caducidade decorrente de impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalho (Artº 343º/b) do CT).
Em causa nos autos está apenas a necessidade de observância de um procedimento junto do Instituto de Segurança Social e os reflexos da ausência do mesmo na cessação do contrato, porquanto, conforme afirma na sua alegação, em momento algum o Recorrente considerou voltar ao exercício da sua categoria profissional como vigilante, dadas as exigências das funções inerentes ao seu exercício. Não sendo motivo, no entanto, para não reintegrar o Recorrente noutra categoria profissional da empresa, uma vez que o mesmo também nunca se recusou a tal solução.
Conforme é sabido, e lembra Júlio Gomes, a declaração de caducidade abstrai, em geral, de qualquer procedimentalização (Direito do Trabalho, Vol. I, Coimbra Editora, 917) o que torna mais exigente a apreciação da verificação dos pressupostos de que a mesma depende.
Defende, porém, o Recrte. que, por se tratar de caducidade emergente de incapacidade resultante de acidente de trabalho há que observar o que na LAT se consagrou a este propósito.
Milena Rouxinol salienta que não se estabelece qualquer procedimento específico a adotar, pelo que dir-se-ia que a declaração de caducidade navega num espaço de liberdade probatória, admitindo que assim seja mesmo quando a incapacidade decorra de acidente de trabalho ou doença profissional (Revisitando a Caducidade do Contrato de Trabalho, Prontuário de Direito do Trabalho, 2016-II, 150).
Pedro Furtado Martins parece admitir, sem contudo o afirmar claramente, a necessidade de observância de um concreto procedimento nestes casos ao afirmar que “salvo nos casos de impossibilidade para trabalhar derivada de acidentes de trabalho ou doenças profissionais, a lei nada prevê quanto ao modo como deve ser demonstrada a situação de impossibilidade que determina a caducidade do contrato” (Cessação do Contrato de Trabalho, 4ª Edição, Principia, 77). Defende que “os serviços públicos competentes na área do emprego e da formação profissional têm aqui uma intervenção decisiva, cabendo-lhes, entre outras tarefas, esclarecer dúvidas sobre a situação e incapacidade (artigo 159º da Lei 98/20098) e avaliar e confirmar as situações em que o empregador declare a impossibilidade de assegurar ocupação alternativa ao trabalhador (artigo 161º da Lei 98/2009) ” (idem, 75).
Importa, pois, analisar o que a este respeito decorre da Lei dos Acidentes de Trabalho em matéria de reabilitação e reintegração profissional.
Não sem que antes recordemos que o A. sofreu um acidente de trabalho em consequência do qual lhe foi fixada, por sentença, uma IPP de 21,43%, com IPATH, desde 07/11/2016. Em 10/08/2020, foi-lhe transmitido que o seu contrato de trabalho cessava por caducidade.
De acordo com o disposto no Artº 155º da Lei 98/2009 de 4/09 – LAT- o empregador é obrigado a ocupar o trabalhador que, ao seu serviço, sofreu acidente de trabalho ou contraiu doença profissional de que tenha resultado incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, sendo-lhe assegurada formação profissional e adaptação do posto de trabalho.
No Artº 159º desta lei prevê-se a solicitação de parecer de peritos do serviço público competente na área do emprego e formação profissional quando for considerado necessário esclarecer dúvidas sobre as incapacidades.
Este parecer é, porém, como dali emerge, facultativo (nº1 – pode ser solicitado).
E, além disso, o Apelante não revelou dúvidas sobre a sua incapacidade, pelo que o procedimento aqui previsto não tem cabimento no caso concreto.
Diferentemente estabelece o Artº 161º/1 da LAT que quando o empregador declare a impossibilidade de assegurar ocupação e função compatível com o estado do trabalhador, a situação deve ser avaliada e confirmada pelo serviço público competente na área do empego e formação profissional.
A questão que se coloca é a de saber se o parecer – avaliação e confirmação- aqui mencionado é condição de licitude da declaração de caducidade.
A resposta encontramo-la no próprio Artº 161º/2 e 3.
Em presença da declaração do empregador e subsequente avaliação pelo serviço público, pode este sufragar a inviabilidade de manutenção da relação laboral ou não.
Se concluir pela viabilidade da ocupação de um posto de trabalho na empresa, o empregador deve colocar o trabalhador em ocupação e função compatíveis (nº 2); concluindo o serviço público pela impossibilidade de a empresa ocupar o trabalhador, desencadeia um procedimento externo de apoio ao trabalhador (nº 3).
Se assim é, então o parecer confirmativo há-de ser prévio à declaração de caducidade e à própria cessação do contrato, sendo condição de licitude da mesma. Enforma uma prova vinculada da qual o empregador não pode prescindir para consolidar a caducidade do contrato de trabalho.
Só assim se compreende que, em presença do parecer sobre a viabilidade de manutenção do emprego, o empregador deva colocar o trabalhador em ocupação e função compatíveis, o que pode passar por uma modificação contratual suscetível de conferir ao trabalhador apoios estatais.
Significa isto que, sob pena de inutilidade de quanto ali se dispõe e de desvirtuamento do regime garantístico inerente à proteção por acidente de trabalho, o contrato não caduca sem a prévia intervenção do serviço público. O que, aliás, parece ter sido assumido pela própria Apelada quando, na carta em que declara a caducidade do contrato consigna que “irá solicitar ao serviço público competente na área do emprego e formação profissional um parecer sobre a viabilidade da ocupação de um posto de trabalho na empresa”, concluindo que “a presente comunicação… (fica) sujeita à condição resolutiva decorrente do sentido do parecer do serviço público competente na área do emprego e formação profissional que venha a ser emitido…”
Com o que não sufragamos a tese expendida pela Apelada, decorrente dos arestos que cita e, é claro, a tese que fez vencimento.
E, com o devido respeito, a argumentação expendida pelo Ministério Público, quando afirma que não parece que possa entender-se que, por força desta disposição e do Artº 164º, “uma autoridade administrativa possa impor uma sua avaliação às partes interessadas, seja ao empregador, seja ao trabalhador, sem que as mesmas dela possam discordar e, querendo, recorrer aos tribunais” não cabe nesta discussão. Desde lodo porque não é essa a situação em apreciação.
No caso, o que ocorre é exatamente a ausência de parecer e não um parecer do qual se discorda e que, obviamente, poderá vir a ser impugnado em juízo.
Não nos parece que possamos afirmar, sem margem para dúvidas, que o documento reportado no Artº 161º não será indispensável para que opere a caducidade do contrato “desde que se logre demonstrar a impossibilidade para o trabalho habitual e para qualquer outro, mesmo depois de adotadas as devidas medidas de adaptação” porque aquela declaração tem em vista pôr em marcha um processo administrativo tendente a empregar o trabalhador noutro local (Milena Rouxinol, ob. cit.). Desde logo porque o Artº 161º reporta a ocupação de um posto de trabalho na empresa (nº 2).
O que se nos perspetiva em presença do Artº 161º é o dever de avaliação e confirmação pelo serviço público competente da declaração do empregador quando esta vá no sentido da impossibilidade de assegurar ocupação ao trabalhador. Em presença de tal dever, e para que a estipulação faça sentido, a declaração de caducidade não operará sem a confirmação administrativa. Isto sem prejuízo de, mantendo o empregador a sua convicção, recorrer os tribunais para infirmar aquele ato. Tribunais que, munidos de todos os elementos, e na ponderação dos mesmos, terão, é claro, a última palavra.
Assim, julgaria a apelação procedente.
Manuela Fialho