Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4633/08.9YYLSB-A.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: ARRENDAMENTO
RENDAS
TÍTULO EXECUTIVO
DESPEJO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/10/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I-O n.º 2 do art.º 15, da Lei 16/06, de 27/2, versão originária anterior à alteração introduzida em 2012, aqui aplicável, dispunha que o contrato de arrendamento é título executivo para a acção de pagamento de renda quando acompanhado do comprovativo da comunicação ao arrendatário do montante da dívida esta última apenas com o objectivo de obrigar o senhorio a proceder a uma espécie de liquidação aritmética extrajudicial prévia dos montantes em dívida como se entendeu no AcRLxa de 12/12/08 Proc.º 10790/2008-7 Relatado pelo então ilustre Juiz Desembargador Tomé Gomes, comunicação essa a efectivar, nos termos do art.º 9, por carta registada com a/r. E tinha que ser com observância desse formalismo mais solene da carta registada com a/r, não obstante não vir a situação expressamente prevista no n.º 1 do art.º 9 que apenas prevê as situações de cessação dos contrato de arrendamento, actualização de renda e obras, na medida em que a execução para pagamento de quantia certa a partir do contrato de arrendamento e da comunicação da liquidação das rendas em atraso se reveste de suficiente gravidade para justificar essa formalidade.
II-Duvidosa, já, é a conclusão de que ocorre um lacuna legal no que toca ao regime excepcional previsto nos n.ºs 2, 3, 4 do art.º 10 apenas previsto para as hipóteses da devolução das cartas por o destinatário se ter recusado a recebê-las ou não as ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais ou do aviso de recepção ter sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cartas essas que constituam título executivo para despejo nos teremos do art.º 15, actualização da renda nos termos do art.º 34. Na verdade o legislador a propósito do art.º 15 restringiu às hipóteses de despejo e as hipóteses de despejo são as que vêm previstas no n.º 1 do art.º 15, ou sejam as hipóteses da execução para a entrega do arrendado em razão da ocorrência de algum das situações do n.º 1 do art.º 15. É que o n.º 2 prevê a formação de título executivo para “a acção de pagamento de renda” coisa bem distinta de uma acção executiva de despejo que tem um sentido claro que é o da entrega do arrendado e não é crível que o legislador tenha dito o que não quis, pois nos termos do art.º 9 do CCiv presume-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
III-Verdade que as cartas dirigidas ao arrendatário, na falta da indicação em contrário do arrendatário, devem ser remetidas para o local arrendado (art.º 9/2) e que no caso em apreço se situa na Estrada de Benfica e não na Avenida Columbano Bordalo Pinheiro, n.ºs 85 A-B-C que é a sede da Executada. Contudo o art.º 15/2 não exige para a formação do título executivo para pagamento de quantia certa, que a comunicação seja dirigida para o local arrendado, e o local para onde foi enviada a carta não é um local imaginado pelo senhorio é o local da sede da própria arrendatária que muito embora não sendo o local do arrendamento não é um local estranho à actividade da executada que é uma pessoa colectiva, que devendo ser citada pessoalmente como é o objectivo da carta registada com a/r, só ficcionadamente sendo uma pessoa, é citada na sua sede, que corresponde por assim dizer ao seu domicílio profissional, isso resulta do art.º 246/2 e 3 podendo ser a carta assinada pelo legal representante o mencionado Jorge ... ou por um funcionário da associação executada; a executada não diz que não foi um seu funcionário quem assinou o a/r diz que não foi o legal representante o que é absolutamente irrelevante, para se considerar cumprida a comunicação nos termos legais descritos.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I–RELATÓRIO:


Apelante/Executado:...-IGREJA CRISTà                                         Apelado/Exequente:... de NAZARÉ ALVES...
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I.1-Inconformado com a sentença de 23/10/2015(ref.ª 340397362) que julgando improcedentes os embargos de executado suportados na inexistência de título executivo e na excepção peremptória da prescrição das rendas vencidas de 1/9/2012 a 1/12/2012, consequentemente determinou o prosseguimento da execução, dela apelou a embargante executada, em cujas alegações em suma concluem:

a)A Recorrente só foi citada em 17/12/2013, mais de cinco anos após a entrega do requerimento executivo, cfr art.º 3 dos embargos e com a citação após a penhora, não recebeu a cópia do título executivo e dos demais documentos cfr art.º 8 e 9 dos embargos em desconformidade com o disposto nos art.ºs 227 e 551 o que acarreta a nulidade nos termos do art.º 191, n.ºs 1 e 4
b)A recorrente não tem nem nunca teve na sua posse qualquer comunicação sobre o montante das rendas em dívida, cfr art.º 22 dos embargos, a comunicação não obedeceu aos formalismos exarados no art.º 9 do NRAU, pois que tratando-se de comunicar o montante das rendas em dívida e não a cessação do contrato de arrendamento a actualização da renda e obras (n.º 1 do art.º 9 do NRAU), a carta não só tinha de ser remetida para o local arrendado por força do n.º 2 do art.º 9 e não para sede da executada como na verdade foi, como a carta foi assinada por pessoa diferente do destinatário, a recorrente não reconhece, não tem como reconhecer a assinatura aposta no aviso de recepção enquanto associação religiosa é representada pelo seu presidente do Conselho de administração o senhor Jorge Manuel ... ... que assinou o contrato de arrendamento pela arrendatária, mas não é a sua assinatura que consta do a/r de fls. 19 bastando comparar com a do contrato de arrendamento, pelo que não foi assinado pela ... e por força do art.º 10/1/b, 3, e 4 do NRAU tratando-se de carta que integra o título executivo para pagamento de rendas encargos ou despesas ou que possam servir de base ao procedimento especial e despejo, o senhorio deve remeter nova carta registada com a/r decorridos que sejam 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira carta e como o aviso de recepção não foi assinado pela recorrente o recorrido estava obrigado a remeter nova carta com os mesmos formalismos do art.º 9 do NRAU decorridos 30 a 60 dias sobre a data do envio da 1.ª considerando-se a comunicação recebida no 10.º dia posterior ao envio desta última no caso de voltar a ser devolvida, solução interpretativa que decorre da integração analógica da lacuna da lei dos art.ºs 9/1 e 10/1 do NRAU;
c)O recorrido confessa nos seus art.ºs 4 e 16 da contestação dos embargos que o requerimento deu entrada via electrónica dia 26/2/08 e que só juntou a cópia de segurança, o título executivo e os demais documentos no dia 3/3/08, seja seis dias depois de ter apresentado o requerimento executivo ou muito no limite dos 5 dias caso se conte a partir da data da distribuição e 27/2/08 e muito embora a apresentação tenha ocorrido nos 10 dias dos art.ºs 724/4, 725/1/d, 810/6/a e 811/1/b não foi salvaguardado o prazo de 5 dias de ficção do n.º 2 do art.º 323 do CCiv, a apelante só recebeu a citação mais de seis anos a contara da data em que s evenceram as rendas em falta sem que a prescrição se tivesse interrompido, o que significa que o direito de crédito das rendas em falta se encontra prescrito de 1/9/2012 a 1/12/2012, tendo havido incorrecta interpretação e aplicação daquele dispositivo, além do que o exequente foi negligente no andamento do processo pois que entre 27/5/08 e 31/01/2013 o processo esteve absolutamente parado sem que os recorrentes dele tivessem conhecimento por não terem sido citados devendo a instância ter sido interrompida nos termos do art.º 285 do antigo CPC e deserta nos termos do art.º 291 e 287/c .

I.2-Em contra-alegações em suma diz o exequente:
a)O caracter executório do contrato de arrendamento urbano está previsto no artigo 15 do NRAU, para a acção de pagamento de renda, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida, comunicação essa que obedece ao formalismo exarado no art.º 9 do mesmo diploma e deve ser e feita por meio de carta registada com aviso de recepção dirigida ao arrendatário, comunicação essa que não visa demonstrar a constituição da dívida exequenda poie ela decorre do próprio contrato, nem se destina a interpelar o devedor, já que se está perante uma obrigação pecuniária com montante determinado e prazo certo (renda cf art.º 805/2/a do CCiv) destinando-se a obrigar o exequente a proceder à liquidação prévia das rendas em dívida, de forma a conferir um grau de certeza quanto ao montante da dívida exequenda, face à vocação tendencialmente duradoura do contrato de arrendamento e do carácter periódico das rendas, sendo que o título consta do elenco taxativo do art.º 46 do CPC aplicável e nos caso dos autos constam quer o contrato de arrendamento quer os documentos comprovativos da comunicação à arrendatária e aos respectivos fiadores dos montantes das rendas em dívida, acrescidas de 50% a título de indemnização prevista no art.º 1041 do CCiv resultando de fls. 16 e 22 dos autos principais respectivamente que tal comunicação à arrendatária e aos fiadores foi efectuada (conclusões 1 a 8)
b)O requerimento executivo deu entrada em juízo em 27/2/08, a executada/recorrente foi citada em 17/12/2013, o exequente em nada contribuiu para que a citação só se desse quase 6 anos depois, o atraso deveu-se a razões de índole processual, mas a interrupção do prazo prescricional dos 5 anos do art.º 310 deu-se muito tempo antes da efectiva citação dos executados, devendo considerar-se interrompida a prescrição por força do art.º 323/2 do CCiv decorrido o 5.º dia após a entrada em juízo da petição executiva (conclusões 9 a 18).

I.3.-Recebido o recurso foram os autos aos vistos dos Meritíssimos Juízes-adjuntos que nada sugeriram; nada obsta ao conhecimento do mérito do mesmo
I.3.-Questões a resolver:
a)Saber se ocorre a nulidade de citação da executada embargante;
b)Saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação das disposições dos art.ºs15/2 e 9 do NRAU e erro na indagação da norma aplicável que deve ser a do art.º 10/2 do NRAU quanto às comunicações à arrendatária dos montantes de rendas em dívida, quando a carta não veio assinada pela própria executada;
c)Saber se ocorre na decisão recorrida erro de interpretação e de aplicação do art.º 323/2 do CCiv
d)Saber se deveria ter sido declarada deserta a instância executiva por ter estado parada por negligência do Exequente.

II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

II.1.-É do seguinte teor a decisão recorrida

Despacho Saneador.
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo mostra-se isento de nulidades que o invalidem de todo.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
As partes estão devidamente patrocinadas.
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I-Da Inexistência de Título Executivo.
Nos embargos de executado deduzidos, veio a embargante “... Igreja Cristã”invocar a inexistência de título executivo.
Na contestação apresentada, o embargado ... ... sustentou não assistir razão aos embargantes, na medida em que procedeu à junção aos autos de contrato de arrendamento e das comunicações enviadas através de carta registada com aviso de recepção aos executados.

Cumpre apreciar e decidir.

No caso dos autos, o exequente ... ... veio intentar a presente acção executiva, para pagamento de quantia certa (€ 12.500,00), contra “... – Igreja Cristã”, Jorge Manuel ... ... e Christine Frederiek Krale ..., ou seja, executa o montante de rendas vencidas e não pagas, acrescida de 50% a título de indemnização prevista no art. 1041.º do Cód. Civil.

O título executivo que fundamenta a execução de que este é um apenso é precisamente o contrato de arrendamento, junto a fls. 14 e 15, e a comunicação extrajudicial que fez junto da inquilina, que constitui fls. 16 e 19, e junto dos fiadores, que constitui fls. 17 e 20 e fls. 18 e 22, dos autos principais, respectivamente.

Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva – art. 45.º, n.º 1 do Cód. Processo Civil aplicável.

O título executivo constitui pressuposto de carácter formal da acção executiva, destinado a conferir à pretensão substantiva um grau de certeza reputado suficiente para consentir a subsequente agressão patrimonial aos bens do devedor.

O carácter executório do contrato de arrendamento urbano está previsto no art. 15.º do NRAU para duas situações concretas:

1–para obter a entrega do locado, em caso de cessação do contrato de arrendamento por alguma das causas que vêm enunciadas nas als. a) a f) do seu n.º 1, desde que acompanhado pelo documento comprovativo das respectivas causas de cessação;
2–para a acção de pagamento de renda, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida.

Comunicação esta que obedece ao formalismo exarado no art. 9.º do mesmo diploma, e que deve ser feita por meio de carta registada com aviso de recepção, dirigida ao arrendatário.
Em suma, o que se preceitua é a obrigatoriedade deste título complexo ser composto pelo contrato de arrendamento e pelo documento comprovativo da comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida.
Esta exigência do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante das rendas em dívida não tem em vista demonstrar a constituição da dívida exequenda, pois ela decorre do próprio contrato, nem se destina a interpelar o devedor, já que se está perante uma obrigação pecuniária de montante determinado e prazo certo (renda – cfr. art. 805.º, n.º 2, al. a) do Cód. Civil), mas destina-se a obrigar o exequente a proceder à liquidação prévia das rendas em dívida, de forma a conferir um grau de certeza quanto ao montante da dívida exequenda, face à vocação tendencialmente duradoura do contrato de arrendamento e ao carácter periódico das rendas.
Está, pois, em causa um documento a que, por disposição especial, é atribuída força executiva, nos termos previstos na al. d) do n.º 1 do elenco taxativo de títulos executivos constante do art. 46.º do Cód. Processo Civil aplicável.
Sendo o título o instrumento documental de demonstração da obrigação exequenda, fundamento substantivo da execução, a prestação exigida terá de ser a prestação substantiva acertada no título ou, por outras palavras, o objecto de execução deve corresponder ao objecto da obrigação definida no título.
Ora, no caso vertente, e como acima se referiu, foi junta aos autos, como título executivo, quer o contrato de arrendamento (fls. 14 e 15 dos autos principais), quer os documentos comprovativos da comunicação à arrendatária e respectivos fiadores dos montantes das rendas em dívida, acrescidas de 50% a título de indemnização prevista no art.º 1041.º do Cód. Civil (cfr. fls. 16 a 22 dos autos principais).
Concluiu-se, deste modo, que o título executivo reúne os requisitos de exigibilidade, dúvidas não existindo em como a exequente procedeu à junção aos autos de documento(s) provido(s) de força executiva, por a lei lhe(s) conceder tal eficácia, e que, por esse motivo, lhe permite solicitar em Tribunal a tutela executiva, sem necessidade de uma tutela judicial prévia (art. 46.º, n.º 1, al. d) do Cód. Processo Civil).
Não assiste, pois, neste particular, razão à embargante, reunindo o contrato de arrendamento e os documentos comprovativos da comunicação à arrendatária (e igualmente aos fiadores) dos montantes das rendas em dívida, acrescidas de 50% a título de indemnização prevista no art. 1041.º do Cód. Civil, dados à execução, os requisitos necessários para ter força executiva, para servir de fundamento à execução.
Custas pelo incidente a cargo dos executados/embargantes, Jorge ... e Christine ..., fixando-se a taxa de justiça em 1 1 UC – art. 7.º, n.º 4 do RCP.
Notifique.

II–Da excepção peremptória da prescrição das rendas vencidas de
01/09/2012 a 01/12/2012.

Nos embargos de executado por si deduzidos, veio a embargante pedir a extinção, por prescrição, do direito de crédito do pagamento das rendas, vencidas de 01/09/2007 a 01/12/2007, atenta a disciplina consagrada no art. 310.º, al. b) do Cód. Civil, normativo que estatui prescreverem no prazo de 5 (cinco) anos as rendas e alugueres devidos pelo locatário, ainda que pagos por
uma só vez. Para o efeito alega, em síntese, que, não obstante o requerimento executivo tenha dado entrada em tribunal em 26/02/2008, apenas foi citada em 17/12/2013, ou seja, mais de eis
anos a contar da data em que se venceram as rendas em falta.

Contestou o embargado, pugnando pela improcedência da prescrição, com o fundamento de o prazo prescricional se dever considerar interrompido cinco dias após a entrada do requerimento executivo.

Cumpre apreciar e decidir.

Em face do alegado pela embargante, a questão essencial a decidir relativamente à invocada prescrição consiste em saber se, tendo a acção executiva sido instaurada no dia 27 de Fevereiro de 2008 e a executada “... Igreja Cristã”, aqui embargante, citados em Dezembro de 2013  ocorreu ou não a interrupção da prescrição.

O fundamento específico do instituto da prescrição radica na negligência do credor em exercer o seu direito durante um período de tempo razoável e em que seria legítimo presumir que ele o exercesse, se nisso estivesse interessado. Razões de certeza e de segurança nas relações jurídicas conduzem a que a inércia prolongada do titular do direito em exercitá-lo faça presumir que quis renunciar ao direito ou a que se considere que um tal direito já não merece tutela jurídica, libertando o devedor do cumprimento e de possíveis dificuldades probatórias que o decurso do tempo pode acarretar, bastando para tanto invocá-lo como meio de defesa (art. 303.º do Código Civil) - Manuel de Andrade,
Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 1983, pp. 445 e 446.

A prescrição pode interromper-se, sendo uma das causas de interrupção a citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, nos termos do disposto no artigo 322.º, n.º 1 do Código Civil.

Nem sempre, porém, a citação ou a notificação judicial, que visam dar conhecimento à outra parte do exercício judicial do direito pelo seu titular, são prontamente efectuadas, podendo acontecer que venham a ser efectuadas tardiamente por motivos a que o titular do direito é alheio.

Ora, no caso dos autos, segundo os termos do requerimento executivo, o que o exequente reclama é o pagamento de quatro rendas, no valor unitário de € 2.500,00, vencida, cada uma delas, em 01/09/2007, 01/10/2007, 01/11/2007 e 01/12/2007, respectivamente, no montante total de € 10.000,00, acrescido da indemnização a que alude o art. 1041.º, n.º 1 Cód. Civil.

Verifica-se, ainda, que, tendo a petição executiva dado entrada em juízo em 27/02/2008, a executada/embargante “... Igreja Cristã” foi citada em 17/12/2013.

Nos termos do art. 323.º, n.º 2 do Cód. Civil, se a citação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.

Ou seja, só se atende ao momento da citação se a culpa da demora superior a cinco dias for de atribuir ao requerente. Quaisquer outros factores, designadamente que sejam de imputar aos necessários trâmites processuais, não relevam para um juízo de responsabilidade do requerente no facto de a citação não ser feita em cinco dias.

No pressuposto de que a citação se irá efectuar, o legislador ficcionou uma citação decorridos cinco dias sobre a data em que foi requerida para efeitos de interrupção da prescrição, ficção que opera desde que verificados os seguintes requisitos:
-que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à instauração da acção ou da execução;
-que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias;
-que o retardamento da citação não seja imputável ao credor.

O que se verifica nos autos é que o requerimento executivo deu entrada em juízo mais de três anos antes do termo do final do prazo de prescrição (5 anos a contar de 01/09/2007), apenas vindo a embargante a ser citada em Dezembro de 2013.
É inegável que a citação foi muito tardia, considerando a data em que a execução entrou em juízo.
Porém, não se pode considerar imputável ao exequente o retardamento da citação, para o qual em nada contribuiu, tendo-se tal retardamento ficado a dever unicamente a razões de índole processual.
Como tal, operando a interrupção da prescrição nos termos consagrados no art. 323.º, n.º 2 do Cód. Civil, a mesma teve lugar já em momento anterior ao da efectiva citação da embargante e sem que se mostrasse decorrido o citado prazo de prescrição do direito.
Não se verifica, assim, a excepção peremptória aduzida pela embargante no articulado de embargos de executado, que, nesta parte, improcede.
Custas pelo incidente a cargo da executada/embargante, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC – art. 7.º, n.º 4 do RCP.
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Pelo exposto, julgo improcedentes os presentes embargos de executado, e, consequentemente, determino o prosseguimento da execução.
Notifique.
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Lisboa, 23/10/2015.

II.2-Esta ainda certificado que:

... de Nazaré Alves ..., via electrónica apresentou requerimento executivo aos 26/02/08 nos Juízos de Execução do Tribunal de Lisboa contra “...- Igreja Cristã”, Jorge Manuel ... ... e Christine Frederieck Krale ..., indicando à penhora contas de depósito à ordem onde em suma diz que celebrou com a executada ... contrato de arrendamento para fins não habitacionais do cinema (sala de projecção, cabine e bilheteira correspondente a parte da fracção A) e das lojas 11, 12 (parte das fracções B) e C) do prédio urbano sito na Estrada de Benfica, n.º 723-a, Lisboa, inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o art.º 2169 pelo prazo de 10 anos, com início a 1/8/2007, mediante a renda mensal de 2.500,00 euros, encontrando-se em falta aos 13/12/07 4 rendas, no valor de 2.500,00 euros cada, vencidas a 1/09/07 a 1/12/07, no montante de 10.000,00 euros, a que, nos termos do art.º 1041/1 do CCiv acresce a indemnização de 50% seja mais 5.000,00 euros, nessa data foram enviadas cartas registadas com a/r aos executados ...… Jorge Manuel ... e Christine… comunicando o montante das rendas em dívida nos termos do art.º 15/2 do NRAU, o a/r da Igreja ... foi assinado em 17/12/07 vieram devolvidas as cartas remetidas aos executados Jorge Manuel ... ... e Christine Porém as comunicações consideram- se efectuadas nos termos do art.º 10/1/a do NRAU, o contrato de arrendamento acompanhado das referidas comunicações constitui título executivo para a cobrança das rendas mencionadas nas mesmas comunicações nos termos do n.º 2 do art.º 15 do NRAU; em 17/12/07 a executada ... enviou ao exequente um cheque no valor de 2.500,00 euros, destinado a pagar a renda vencida em 1/12/07, mas como ocorreu fora do prazo legal estabelecido pelo n.º 2 do art.º 1041 do CCiv nos termos do art.º 785 do CCiv tal pagamento foi imputado em primeiro lugar à indemnização devida em 1.250,00 euros e o restante por conta da renda, encontrando-se ainda em dívida o montante de 1.250,00 euros desta, estando assim em dívida 12.500,00 euros, tudo conforme fls. 116/119 cujo teor aqui na íntegra se reproduz;
  • - Acompanhou esse requerimento executivo cópia do contrato de arrendamento mencionado acima celebrado aos 17/4/2007 entre ... de Nazaré Alves ... como senhorio, ... Igreja Cristã, “com sede na Avenida Columbano Bordalo Pinheiro, n.º 85-a-b-c em Lisboa representada pelo seu Presidente do Conselho de Administração Jorge Manuel ... ..., abaixo identificado, na qualidade de inquilina”, Jorge Manuel ... ... e mulher Christine Frederiek Krale ... “com domicílio escolhido na Avenida Major Rosa Bastos, n.º 17, em Loures, na qualidade de fiadores” tendo por objecto o arrendamento do Cinema … do prédio sito na Estrada de Benfica, 723-a, em Lisboa…”, tudo conforme documento certificado a fls. 121/122 cujo tero aqui na íntegra se reproduz;
  • - A ilustre advogada Helena Rodrigues, arrogando-se a qualidade de mandatária de ... de Nazaré Alves ..., datada de 13/12/07 dirigiu à Igreja ... na pessoa do seu Presidente do Conselho de Administração Jorge ... e endereçada à Avenida Columbano Bordalo Pinheiro, n.ºs 85-a-b-c carta registada com a/r de teor igual à de fls. 109 cujo teor aqui na íntegra se reproduz cujo a/r foi assinado conforme resulta de fls. 112.

    III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

    III.1.-Conforme resulta do disposto nos art.ºs 660, n.º 2, 664, 684, n.º 3, 685-A, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539).
    III.2.-Não havendo questões de conhecimento oficioso a única questão a apreciar é a que constitui objecto da conclusão de recurso e mencionada em I, supra.

    III.3.-Saber se ocorre a nulidade de citação da executada embargante;
    III.3.1.-A Executada na sua oposição que deduziu à execução alegou a nulidade da citação com os mesmos fundamentos que agora aduz em recurso; sobre essa arguida nulidade a Meritíssima Juíza pronunciou-se aos 14/4/2014, indeferindo a arguição dessa nulidade de citação em suma porque nos termos do art.º 851 (anterior 921) a reclamação dessa nulidade de citação é feita no processo de execução segundo as regras dos incidentes (art.º 292), o que não foi observado, condenando a executada nas custas do incidente, despacho que foi notificado à ilustre advogada da executada aos 15/4/2014, que é susceptível de recurso nos termos dos art.ºs 644/3 e 638. Contudo as razões de indeferimento mantêm-se nenhum erro ocorrendo no despacho recorrido interlocutório que se mantém.

    III.4.-Saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação das disposições dos art.ºs 15/2 e 9 do NRAU e erro na indagação da norma aplicável que deve ser a do art.º 10/2 do NRAU quanto às comunicações à arrendatária dos montantes de rendas em dívida, quando a carta não veio assinada pela própria executada
    III.4.1.-Na oposição a executada alegara que nunca recebera cópia do título executivo, nem dos demais documentos, não tem na sua posse qualquer comunicação sobre o montante das rendas em dívida (art.ºs 8, 9, 22 da oposição); em resposta, a exequente diz que não é verdade que a Embargante não tivesse conhecimento do montante das rendas em dívida pois a comunicação, datada de 13/12/07, foi-lhe enviada em 14/12/07 e o respectivo aviso de recepção foi assinado.
    III.4.2.-O regime jurídico do procedimento especial de despejo (PED) foi aditado à Lei 6/2006 de 27/2 (NRAU) pela Lei 31/2012 de 14/08 em vigor desde 12/11/2012, esta última modificando o regime das comunicações (artsº 9/7 e 10/2 e 5), alguns pontos do 14 NRAU (acção de despejo) e do art.º 930 C e D do CPC (execução para entrega de coisa certa imóvel arrendada),m acrescentou um novo art.º 14-A (título para pagamento de rendas encargos ou despesas), em substituição do anterior 15/2, retirou aos títulos do 15/1 a força executiva, passando a servir de base ao PED em sede de novo art.º 15/2, criou o procedimento especial de despejo nos art.ºs 15 a 15 SD previu um novo balcão Nacional de Arrendamento com competência para tramitar o PED. Acontece que esta alteração legal só surgiu depois da entrada em juízo do requerimento executivo o que ocorreu em 26/2/08 não lhe sendo assim aplicável. Antes dessa reforma de 2012 constituíam título para a execução para entrega do locado a sentença de despejo, conforme e o art.º 14/1 a certidão judicial emitida nos termos do incidente de despejo imediato previsto nos art.ºs 14/4 e 5 e os documentos privados produzidos ao abrigo do art.º 15/1.
    III.4.3.-O n.º 2 do art.º 15, da Lei 16/06, de 27/2, versão originária anterior à alteração introduzida em 2012, aqui aplicável, dispunha que o contrato de arrendamento é título executivo para a acção de pagamento de renda quando acompanhado do comprovativo da comunicação ao arrendatário do montante da dívida esta última apenas com o objectivo de obrigar o senhorio a proceder a uma espécie de liquidação aritmética extrajudicial prévia dos montantes em dívida como se entendeu no AcRLxa de 12/12/08 Proc.º 10790/2008-7 Relatado pelo então ilustre Juiz Desembargador Tomé Gomes, comunicação essa a efectivar, nos termos do art.º 9, por carta registada com a/r. E tinha que ser com observância desse formalismo mais solene da carta registada com a/r, não obstante não vir a situação expressamente prevista no n.º 1 do art.º 9 que apenas prevê as situações de cessação dos contrato de arrendamento, actualização de renda e obras, na medida em que a execução para pagamento de quantia certa a partir do contrato de arrendamento e da comunicação da liquidação das rendas em atraso se reveste de suficiente gravidade para justificar essa formalidade. Duvidosa já é a conclusão de que ocorre um lacuna legal no que toca ao regime excepcional previsto nos n.ºs 2, 3, 4 do art.º 10 apenas previsto para as hipóteses da devolução das cartas por o destinatário se ter recusado a recebê-las ou não as ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais ou do aviso de recepção ter sido assinado por pessoa diferente do destinatário, cartas essas que constituam título executivo para despejo nos termos do art.º 15, actualização da renda nos termos do art.º 34. Na verdade o legislador a propósito do art.º 15 restringiu às hipóteses de despejo e as hipóteses de despejo são as que vêm previstas no n.º 1 do art.º 15, ou sejam as hipóteses da execução para a entrega do arrendado em razão da ocorrência de algum das situações do n.º 1 do art.º 15. É que o n.º 2 prevê a formação de título executivo para “a acção de pagamento de renda” coisa bem distinta de uma acção executiva de despejo que tem um sentido claro que é o da entrega do arrendado e não é crível que o legislador tenha dito o que não quis, pois nos termos do art.º 9 do CCiv presume-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Verdade que as cartas dirigidas ao arrendatário, na falta da indicação em contrário do arrendatário, devem ser remetidas para o local arrendado (art.º 9/2) e que no caso em apreço se situa na Estrada de Benfica e não na Avenida Columbano Bordalo Pinheiro, n.ºs 85 A-B-C que é a sede da Executada. Contudo o art.º 15/2 não exige para a formação do título executivo para pagamento de quantia certa, que a comunicação seja dirigida para o local arrendado, e o local para onde foi enviada a carta não é um local imaginado pelo senhorio é o local da sede da própria arrendatária que muito embora não sendo o local do arrendamento não é um local estranho à actividade da executada que é uma pessoa colectiva, que devendo ser citada pessoalmente como é o objectivo da carta registada com a/r, só ficcionadamente sendo uma pessoa, é citada na sua sede, que corresponde por assim dizer ao seu domicílio profissional, isso resulta do art.º 246/2 e 3 podendo ser a carta assinada pelo legal representante o mencionado Jorge ... ou por um funcionário da associação executada; a executada não diz que não foi um seu funcionário quem assinou o a/r, diz que não foi o legal representante o que é absolutamente irrelevante, para se considerar cumprida a comunicação nos termos legais descritos; improcede também aí a apelação.

    III.5.-Saber se ocorre na decisão recorrida erro de interpretação e de aplicação do art.º 323/2 do CCiv
    III.5.1.-Como bem se diz na decisão recorrida a acção executiva foi proposta em 26/2/08 muito tempo antes do decurso do prazo prescricional dos 5 anos em relação às rendas peticionadas que apenas ocorreria em 2012; a circunstância de a executada ter sido citada em Dezembro de 2013 é alheia ao Exequente, não só porque aparentemente ao que tudo indica por razões processuais o acto da penhora antecedia forçosamente a citação do executado, como porque não resulta que o Exequente tenha tido qualquer culpa na circunstância de a citação não se ter efectivado no 5.º dia posterior à entrada da execução, devendo ter-se por interrompida no 5.º dia após a entrada do requerimento executivo como prescreve o art.º 323/2 do CCiv;

    III.6.-Saber se deveria ter sido declarada deserta a instância executiva por ter estado parada por negligência do Exequente
    III.6.1.-Trata-se de questão nova não apreciada pelo Tribunal recorrido que esta Relação não está obrigada a conhecer oficiosamente e por isso dela não conhecerá.

    IV-DECISÃO:

    Tudo visto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
    Regime da Responsabilidade por Custas: Custas pela Executada que decai e porque decai (art.º 527 1 e2



    Lxa., 10-11-2016



    João Miguel Mourão Vaz Gomes
    Jorge Manuel Leitão Leal
    Ondina Carmo Laves


    [1]Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/6, entrado em vigor a 1/9/2013, atenta a circunstância de a acção, onde corre o presente incidente de quebra de segredo profissional, ter dado entrada e sido distribuída ao 1.º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Almada em 2012, o incidente de quebra do sigilo ter sido suscitado em 12/6/2014, a autuação do incidente em 26/10/2015 e a decisão do incidente ser de 28/09/2015 como resulta dos autos e o disposto no art.º 5/1  do mencionado diploma; ao Código referido pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação
    de origem.

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