Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7525/2007-7
Relator: DINA MONTEIRO
Descritores: CUSTAS
TÍTULO EXECUTIVO
RECLAMAÇÃO DA CONTA
PRECLUSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/30/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I-O título executivo, no que respeita a custas, é um título executivo complexo ou misto constituído pela sentença exequenda e pela operação de liquidação da conta.
II- Por isso, não suscitada a reclamação da conta, preclude o direito de se lhe opor que, assim, não pode ser exercido em sede de oposição à execução por custas salvo verificando-se algum dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença(artigo 814.º do Código de Processo Civil)

(SC)
Decisão Texto Integral:  Acordam os juízes da 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I. RELATÓRIO

O Banco […] deduziu oposição à execução por custas que o Mº Público lhe moveu, relativamente ao pagamento da quantia de € 4.818,59, a título de custas devidas na acção ordinária que correu termos na […] Vara Cível de Lisboa.

Alegou em síntese que cumpriu integralmente a sentença nos termos em que foi condenada, tendo sido notificada da conta final relativa às custas da sua responsabilidade, que pagou. Tendo tido conhecimento de que iriam proceder à penhora de bens na sua sede, procedeu ao depósito da quantia exequenda, no montante de € 5. 294,60 sem que tenha qualquer responsabilidade pelas mesmas, mas apenas com o fim de obstar a tal penhora.

Conclui pela ausência de fundamento para a execução por custas instaurada contra si, pedindo que a execução seja dada sem efeito e que lhe seja restituída a quantia depositada.

     Em contestação, o Mº Público defendeu que a quantia peticionada é devida, por ter resultado de condenação proferida na sentença da […] Vara Cível de Lisboa, identificada nos autos, em que são responsáveis solidários a Ré C.[…], o Réu Banco […] SA (actualmente incorporado no Banco […] ora oponente) e a ali também Ré […] concluindo pela improcedência da oposição.

Foi proferida decisão que considerou a oposição improcedente e, como tal, determinou o seu arquivamento.

     Inconformado, o oponente recorreu desta decisão no âmbito do qual formulou as seguintes conclusões:

1. A sentença proferida pelo Sr. Juiz da […] Vara Cível da comarca de Lisboa, no processo nº […], é bem clara quanto ao processamento das custas – “custas pela Autora e pelas Rés na proporção de vencido” – (art. 446º, nº 1 e 2 do CPC).

     2. A conta de custas não foi elaborada e processada de acordo com a sentença.

     3. Pois, segundo o princípio da causalidade, é responsável pelas custas quem lhe deu causa ou na proporcionalidade do vencido.

     4. No caso em apreço, o banco/recorrente foi vencido no que concerne ao valor da garantia prestada, ou seja, € 24.939,89 e respectivos juros.

     5. Em qualquer caso a responsabilidade solidária do banco/recorrente tem como limite o valor da garantia prestada e respectivos juros.

     6. Por isso, o banco/recorrente, não pode ser responsabilizado por custas, como se a solidariedade abrangesse todo o pedido, mas apenas e tão só até ao limite das suas responsabilidades.

     7. O banco/recorrente só procedeu ao pagamento condicional das custas por forma a evitar ser posto em causa o seu bom nome e a sua imagem, pugnando pela definição da sua responsabilidade, no respeitante às custas em causa.

     Conclui, assim, pela revogação da sentença em apreciação e pela procedência da oposição.

     Foram apresentadas contra alegações pelo Mº Público em que pugnou pela manutenção da sentença proferida.

     O Sr. Juiz de 1ª Instância sustentou a decisão em recurso.

     Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

     II. FACTOS PROVADOS

1. No segmento decisório da sentença referente ao processo que correu termos na […] Vara Cível de Lisboa consta que:

a) A Ré C. […] foi condenada a pagar à A. A quantia de € 180.871,25, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento, à taxa legal que foi de 15% desde a citação até 16/4/99, passou a 10% em 30/9/95 e está fixada em 7% desde 17/4/99, absolvendo-a do mais que era pedido.

b) A Ré C.[…] foi condenada solidariamente com a o Réu Banco […] SA, por força da garantia bancária a pagar à Autora parte da quantia referida em a), ou seja € 24.939,89, acrescida de juros vencidos desde 29/9/94 e vincendos até integral pagamento às referidas taxas.

    

c) A Ré C.[…] foi condenada solidariamente com a Ré seguradora por força dos seguros caução a pagar à Autora parte da quantia referida em a), ou seja € 16.814,26, acrescida de juros de mora vencidos desde 29/9/94 e vincendos até integral pagamento às referidas taxas, absolvendo-a do mais que era pedido;

d) A. e RR. foram condenadas em custas na proporção do vencido.

2. Foi elaborada a conta 9567000144492004, no montante de € 4. 816,59, da responsabilidade solidária da C.[…], do Banco […]  e da seguradora - cf. fls. 36 dos autos de execução;

3. Foi também elaborada a conta n° 956700014502004, no montante de € 774,46, apenas da responsabilidade da E. […] SA;

4. Foi elaborada a conta 956700014512004, no montante de € 1.757,04, só da responsabilidade do Banco […] motivada por incidentes da sua exclusiva responsabilidade - cf. fls. 17 e 37;

5. As partes foram avisadas para reclamar das contas ou para proceder ao pagamento das custas, não o tendo feito - cf. fls. 12;

6. O Banco […] SA procedeu ao pagamento da conta n° 956700014512004, no montante de € 1.757,04, da sua exclusiva responsabilidade - cf. fls. 19 destes autos e 63;

7. A E. […]  procedeu ao pagamento da conta n° 956700014502004, no montante de € 774,46, também da sua exclusiva responsabilidade - cf. fls. 64 destes autos;

8. A conta n° 9567000144492004, no montante de € 4. 816,59, da responsabilidade solidária da C. […], do Banco […] e da seguradora não foi paga até à data da entrada da execução, tendo-o sido, entretanto, a 07.06.2006, pelo Banco […] - cf. fls. 95 a 100 dos autos de execução e fls. 65 destes autos.

     II. FUNDAMENTAÇÃO

     A questão em apreciação na presente oposição à execução cinge-se tão só com o valor a atribuir à elaboração da conta em processo declarativo.

     No presente caso, a conta de custas foi elaborada logo que transitou em julgado a respectiva decisão proferida no processo, em conformidade, aliás, com o disposto no art. 50º do CCJud.

     Esta elaboração da conta deve, pois, reflectir a decisão proferida no que concerne a custas, nos termos do art. 53º/ss do mesmo diploma legal, podendo os interessados, o Mº Público e mesmo oficiosamente o Tribunal, procederem ao pedido e/ou à reforma dessa mesma conta, nos termos do art. 60º do CCJud.

     No presente caso, porém, a conta elaborada pelo Sr. Contador não reflecte a decisão judicial proferida pelo Tribunal de 1ª Instância. Com efeito, estando perante uma acção declarativa de condenação em que foram demandados, em coligação, vários RR., a sentença proferida estabeleceu, também ela, várias condenações parcelares, indicando o respectivo montante e referindo, expressamente, a solidariedade devida por cada grupo de RR. em relação a cada um daqueles montantes.

     Assim, no que se refere ao ora oponente, foi o mesmo condenado, solidariamente com a Ré C. […], na quantia de € 24.939,89 e respectivos juros vencidos desde 29.Setembro.1994 e vincendos até integral pagamento, às taxas legais respectivas, por força da garantia bancária existente. A responsabilidade do oponente quanto a custas era, pois, solidária com a da Ré C. […], mas apenas até ao montante acima indicado.

     O oponente decaiu na totalidade do pedido que contra si foi deduzido, mas a condenação solidária proferida encontra-se delimitada a esse mesmo montante do pedido [no que se refere ao valor da garantia prestada] e não à totalidade do pedido formulado na petição inicial com as inerentes custas devidas pelas várias condenações proferidas no processo, nos termos em que a mesma foi traduzida na elaboração das contas que foram efectuadas.

Ora, o Sr. Contador acabou por não traduzir nas contas elaboradas o teor da sentença proferida e, para além de ter incluído na mesma conta as condenações solidárias de vários RR., em montantes distintos, indicou como valor a saldar o da totalidade do pedido formulado pela A. na acção, por forma a que o ora oponente teria de proceder ao pagamento de custas correspondentes não ao pedido em que foi condenando, mas sim, à totalidade dos pedidos formulados pela A. contra todos os RR., demandados em coligação.

Conclui-se, pois, que assiste total razão ao oponente no que se refere ao plano dos princípios.

Questão distinta é a de se saber se o Tribunal pode, em sede de oposição à execução, conhecer desta questão uma vez que no momento próprio da reclamação da conta, ninguém se pronunciou sobre esta realidade. O facto de as partes terem deixado passar esse momento processual, sem que tenham feito uso da “reclamação da conta”, nos casos em que esta não se encontra em conformidade com a sentença proferida, preclude ou não o respectivo direito de estas, agora em sede de oposição, serem novamente suscitadas e apreciada a questão do erro na elaboração da conta?

A resposta não pode deixar de ser positiva sob pena de se olvidar o sentido do caso julgado então formado e que, como é referido por vários processualistas, transforma “o redondo em quadrado e o quadrado em redondo”.

Com efeito, o momento criado pelo art. 60º do CCJud. traduz-se numa oportunidade concedida aos sujeitos processuais e ao próprio Tribunal de poderem detectar de forma oportuna um erro de direito ou mesmo um lapso material na elaboração da conta. Ultrapassado tal prazo sem que as partes do mesmo façam uso, leva à preclusão de tal apreciação impossibilitando, assim, o seu conhecimento mais tarde, mormente em sede de oposição à execução.

Com efeito, o título executivo para esta execução é não só a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância e transitada em julgado, como a própria operação de liquidação da conta, constituindo-se, assim, como um título executivo complexo ou misto.

Ultrapassada que foi a fase de acertamento da obrigação exequenda, que teve o seu fim com o decurso do prazo para apresentação da reclamação da conta de custas, formou-se o título executivo, ao qual apenas podem ser opostas as situações previstas no art. 814º do CPC sendo certo que aquela que é invocada nesta oposição não tem ali cabimento.

Assim, muito embora assista razão ao oponente, sob o ponto de vista material, a verdade é que tendo o mesmo deixado que a decisão transitasse em julgado, não lhe assiste mais direito, nomeadamente em sede de oposição à execução, para ser reapreciada a questão.

        IV. DECISÃO

     Face ao exposto, julga-se improcedente a Apelação, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.

     Custas pelo Oponente/Executado.

                            Lisboa, 30 de Outubro de 2007


                            Dina Maria Monteiro

                            Luís Espírito Santo

                            Isabel Salgado