Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1345/08.7TVLSB-D.L1-1
Relator: AFONSO HENRIQUE
Descritores: RESTITUIÇÃO PROVISÓRIA DE POSSE
DIREITO DE RETENÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/16/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: - A questão em análise tem a ver com o reconhecimento ou não do alegado direito de retenção pelo empreiteiro em relação ao dono da obra.
- Reconhecido este e verificado que está o esbulho consubstanciado na retirada forçada da posse legitimamente exercida pelas requerentes em relação ao edifício de apartamentos e escritórios, não podemos deixar de concluir que a restituição provisória de posse, é o meio processual correcto para repor o direito violado pela requerente.
- Não estamos perante uma situação de abuso de direito, mas sim na presença de litigância de má fé, designadamente, porque as requerentes quando intentaram o presente procedimento cautelar já sabiam que não tinham a posse do edifício destinado a Hotel, o qual até já estava em funcionamento.
AHCF
Decisão Texto Integral: ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NESTE TRIBUNAL DA
RELAÇÃO DE LISBOA
1 - “C, U Lda” e “C, S SA” vieram requerer o presente procedimento cautelar de restituição provisória da posse, contra: “T, S.A”.
Pedindo que: - Seja ordenada a restituição a favor das requerentes da posse plena da obra edificada no lote de terreno propriedade da requerida sita na Rua Engenheiro Vieira da Silva, Lisboa.
Alega, para tanto e em síntese, que:
- As requerentes dedicam-se, com intuito lucrativo, à actividade de construção civil e obras públicas, sendo detentoras do Alvará de Construção classe 5, número 23412 e classe 9, número 4670, respectivamente;
- No e para o exercício da sua actividade, as requerentes, em regime de consórcio, celebraram com a Requerida, em 1 de Março de 2006, um contrato de empreitada cujo objecto consistia na realização, por parte das ora requerentes, de todos os trabalhos de construção civil inerentes e necessários à edificação de dois prédios no lote de terreno propriedade da requerida sito na Rua Eng.º Vieira da Silva, 2 a 6, tornejando para a Rua Almirante Barrosos, 62 a 66, Lisboa, pelo preço global de € 6.850.000,00 prédios esses que são “fisicamente” independentes e separados entre si, correspondendo um deles a um Hotel e o outro a um edifício de habitação multifamiliar;
- A consignação daquela empreitada efectivou-se no mesmo dia da celebração do aduzido contrato, tendo nessa data sido entregue às requerentes o lote de terreno supra mencionado por forma a que aquelas Requerentes pudessem dar início à execução dos respectivos trabalhos;
- As requerentes iniciaram a execução dos aduzidos trabalhos no dia seguinte àquele, isto é, no dia 2 de Março de 2006;
- No âmbito da execução do referido contrato de empreitada, a primeira requerente emitiu e entregou à requerida as facturas correspondentes aos trabalhos executados nos meses subsequentes, os quais respeitam ao período compreendido entre o mês de Abril de 2006 e Janeiro de 2008, inclusive;
- Deste modo, e em concretização ao acima expendido, a primeira requerente emitiu e entregou à requerida, que as recebeu na data inserta nas mesmas, as facturas que identifica relativas aos trabalhos contratuais executados pelas Requerentes na empreitada supra mencionada;
- A primeira requerente emitiu e entregou à requerida, que as recebeu na data inserta nas mesmas, as facturas que identifica, correspondentes aos trabalhos a mais executados pelas requerentes naquela empreitada a pedido daquela;
- Nos termos do referido contrato, as facturas emitidas pelas requerentes deveriam ser liquidadas pela requerida no prazo máximo de sessenta dias após a recepção das mesmas por parte daquela requerida;
- Até à presente data, e não obstante as datas dos respectivos vencimentos já se mostrarem largamente ultrapassadas, a requerida ainda não pagou às requerentes, como devia, as facturas que identifica relativas a trabalhos contratuais e a trabalhos a mais executados naquela empreitada, no valor global de € 2.602.488,19, IVA já incluído;
- Apesar da requerida ter aceite e reconhecido a exactidão das facturas supra mencionadas e a obrigação de as satisfazer, ainda não logrou pagar às ora requerentes, como devia, o montante total constante das mesmas, pese embora as sucessivas interpelações efectuadas para o efeito;
- As ora requerentes decidiram suspender a execução da empreitada mencionada em 01.02.2008, tendo disso dado conta à requerida;
- As requerentes exerceram ainda naquela data o direito de retenção sobre os edifícios em causa até pagamento integral dos valores em dívida;
- O contrato de empreitada em análise, mormente a sua cláusula 23.4, 3ª parte, a contrario, prescreve que assistirá às ora requerentes o direito de retenção da obra se o dono da obra se atrasar no pagamento de uma factura em mais de sessenta dias contados desde a data do respectivo vencimento;
- A requerida, por intermédio do seu administrador único, Senhor Joaquim Justino, no passado dia 02.04.2008, pelas 21 horas, apresentou-se na obra com 3 elementos da empresa de segurança “Securitas”, por forma a proceder à ocupação do edifício de habitação, tendo sido esse seu desiderato tolhido pela intervenção do guarda contratado pelas Requerentes para proceder à segurança e manutenção da retenção da obra, o qual se encontrava no interior do referido edifício, mormente no seu hall de entrada;
- Horas mais tarde, precisamente, por volta da 01 hora da madrugada do dia 03.04.2008, aquele guarda necessitou de se deslocar às instalações sanitárias que se encontram no exterior da obra;
- Quando o guarda regressou à obra, verificou que a fechadura principal da porta de entrada daquele edifício havia sido arrombada e substituída por outra;
- O dito guarda ainda tentou entrar no edifício de habitação, por forma, a retomar o seu trabalho, tendo sido impedido de o fazer por dois elementos cuja veste permitia vislumbrar que trabalhavam para a empresa de segurança “Securitas”.
- Acresce que, na manhã daquele dia 03.04.2008, por volta das 08h00, o encarregado da obra da primeira requerente, senhor José Pinto, procurou igualmente entrar na obra, tendo sido a sua entrada imediatamente barrada por elementos de segurança contratados pela requerida, quando o mesmo se identificou como encarregado da C U”;
- Face àquele circunstancialismo, o dito encarregado ainda tentou forçar a sua entrada, tentativa essa que se revelou infrutífera uma vez que o referido encarregado foi ameaçado e empurrado pelos seguranças a cargo da Requerida, para o exterior da obra;
- No dia seguinte (04.04.2008), dois elementos pertencentes à primeira requerente, Eng.º N o Eng.º D, deslocaram-se à obra na companhia de um agente da Polícia de Segurança Pública, tendo ficado comprovado nessa altura perante a aduzida autoridade policial que a requerida não permitia que qualquer elemento pertencente às ora requerentes entrasse na obra.

Procedeu-se à realização de Audiência, com observância do legal formalismo, tendo-se fixado a matéria de facto pela forma que consta do despacho proferido a fls. 117 e seguintes dos autos.

E foi proferida a competente sentençaparte decisória -:
“-…-
Decisão:

- Por todo o exposto e por se considerarem verificados os respectivos requisitos, procede o presente procedimento cautelar e, consequentemente, ordena-se a restituição a favor das requerentes da posse plena da obra edificada no lote de terreno propriedade da requerida sita na Rua Engº Vieira da Silva, nºs 2 a 6, tornejando para a Rua Almirante Barroso, em Lisboa.
Custas pelas requerentes, a atender na acção final (cfr. artº 453º, do CPC).
Notifique.

Solicite ao Sr. Solicitador de execução o cumprimento do determinado.

Oportunamente, cite a requerida, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 385º, nº 6 e 388º, ambos do CPC.
-…-”
A requerida, “T, SA” veio deduzir oposição - cfr. fls. 201 e seguintes dos autos -, nos termos do disposto no artº388º, nº 1 b) do CPC ao presente procedimento cautelar de restituição provisória da posse decretada por decisão proferida em 03.07.2008 e constante a fls. 123 a 132 dos autos, alegando, para tanto e em síntese, que:

- As requerentes não detinham a posse quer do hotel quer do bloco de apartamentos;
- As requerentes haviam entregue a obra objecto do contrato de empreitada no que se refere ao hotel;
- As requerentes abandonaram voluntariamente a obra em 02.02.2008 no que se refere ao prédio de habitação;
- A requerida resolveu o contrato de empreitada e comunicou tal resolução às requerentes, o que determinou a perda do direito de posse sobre a obra por parte das requerentes;
- O hotel, denominado “F Hotel”, passou a funcionar em Dezembro de 2007;
- O bloco de apartamento, à data da dedução do presente procedimento cautelar, encontrava-se em fase de acabamentos pela requerida;
- O comportamento das requerentes configura litigância de má fé;
- O comportamento das requerentes nos presentes autos configura abuso de direito.

Termina o seu articulado de oposição, pedindo:
1 - Seja considerado que o comportamento das requerentes integra abuso de direito;
2 - Seja revogada inteiramente a decisão proferida a fls. 132 dos autos, e em consequência, seja o procedimento cautelar de restituição de posse inteiramente improcedente, com as legais consequências;
3 - Sejam as requerentes condenadas como litigantes de má fé em multa e indemnização a favor da requerida.

Perante a referida oposição foi exarada a seguinte sentença – parte decisória -:
“-…-
Decisão:
- Assim e pelos fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente a presente oposição à providência cautelar decretada por decisão proferida a fls. 123 a 132 dos autos e, em consequência, ordena-se o imediato levantamento da restituição provisória da posse a favor das requerentes sobre o edifício do hotel decretado nestes autos, mantendo-se o demais decidido.
Mais, julga-se procedente o incidente de litigância de má fé suscitado pela requerida e, em consequência, condenam-se as requerentes na multa correspondente a 4 (quatro) Uc’s e na indemnização correspondente ao valor dos preparos realizados nos presentes autos pela requerida.
Custas pelas requerentes e pela requerida, na proporção de ½ para cada uma.
Custas do incidente de litigância de má fé pelas requerentes, fixando-se em 2 (duas) UC’s a taxa de justiça
-…-”

A requerida T veio interpor recurso desta sentença, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir de imediato, em separado e com efeito meramente devolutivo.

E fundamentou o respectivo recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
- Em face do antes referido (“A” e “B” do relatório) e, nos termos do disposto no artº712º n1 a) e b) do CPC, deverá aditar-se à matéria de facto provada:
A) – Que os requerentes e aqui apelantes retiraram todos os seus materiais e equipamentos da obra;
B) – Que a porta da loja com o nº da Rua Almirante Barroso na qual foi substituído o canhão, se encontra aberto
- Tal como se expôs na questão “F”, tendo em vista o pedido que consta de fls. 18, da decisão de fls.132 e a execução de fls. 173, a decisão complementar ora sub judice na parte que ordenou e manteve a entrega às Requerentes do bloco de habitação é nula em face do disposto no nº 1 do art.°661º e alínea e), nº1 do artº668º do CPC dado ter incidido sobre pedido substancialmente diferente daquilo que foi pedido pela parte.
- Considerando a questão mencionado em “D” e “E”, entende-se que tendo em vista que as Requerentes pretenderam assegurar um direito de crédito em discussão, o procedimento cautelar típico seria o de arresto caso se verificassem os legais pressupostos e não o de restituição provisória de posse que tem outra finalidade diferente de garantia puro e simples de um crédito, designadamente direitos fundamentais como a habitação.
- A que acresce ainda, tal como se referiu e demonstrou no relatório, no caso, não se verificam os pressupostos legais deste procedimento cautelar:
a) - As requerentes não detinham a posse do bloco de habitação por haverem abandonado a obra (veja-se o doc. de fls.66/67 e prova testemunhal produzida);
b) - Por terem voluntariamente acordado com a Apelante que seria esta concluir os trabalhos e a debitar as custos para posterior acerto de contas, funcionando aqui o abuso do direito o que se refere o artº334° do CC para, por si só, obstar ao exercício ilegítimo do direito invocado.
c) - Que, no caso, tal como se demonstrou em "H", não houve qualquer esbulho quanto mais violento;
d) - Sendo certo que a substituição do canhão da fechadura da porta, ocorreu na ausência do vigilante do local e após o Apelada ter resolvido o contrato de empreitada com as Apeladas.
- Tal como se alegou em “F”, no caso verifica-se justo fundamento para que a Apelante invoque a excepção contemplada no artº428º do CC tendo em vista os factos e fundamentos acima demonstrados, sendo esse aliás o sentido das decisões jurisprudenciais mencionadas e que se aplica inteiramente aos presentes autos.
- Quanto à ma fé processual a que se referiu em “J”, entende-se que a recorrida decisão viola claramente o sentido e alcance da norma prevista no artº457º do CPC, na medida em que, tendo as Apeladas litigado de má fé, tal como decidido, deverão suportar em sede de indemnização contra parte, o valor dos honorários que esta teve de suportar, no caso fixados em €2.500,00 acrescido de IVA.
-Tendo em vista o disposto no artº693°B do CPC, o Apelante para instruir o presente recurso, requer a junção de 6 documentas, os quais constam aliás dos autos principais e que se tornaram necessários por torça do conteúdo da decisão recorrida.
- A recorrida decisão proferida, no entendimento da Apelante, viola as seguintes disposições legais: artigos 8º nº1, 9º nº3, 334º e 428, todos do CC; artigos 156º nº1, 393º, 394º a contrario, 653º nº2, 661º, 668º nº1 e 659º nºs2 e 3, todos do CPC.
Em face do que fica dito requer-se que:
a) - Em face das conclusões acima se considere que a recorrida decisão proferida padece dos vícios que a apelante lhe apontou quer no relatório quer nas conclusões e, em consequência;
b) - Seja inteiramente revogada a decisão proferida, julgando-se totalmente improcedente o procedimento cautelar requerido e decidido, com as legais consequências;
c) - Em sede de litigância de má fé sejam as requerentes condenados na indemnização à Apelante do valor dos honorários que esta pagou ao seu mandatário, no montante de €2.500,00 a que acresce o IVA à taxa legal.

Também as requerentes impugnaram aquela última sentença, recurso esse que foi admitido como sendo de apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo.

E fundamentou o respectivo recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
- Entendem as ora Apelantes que dos factos carreados para os autos bem como da prova produzida nas audiências de julgamento, não resultou minimamente indiciado, antes pelo contrário, que as ora recorrentes tenham ocultado qualquer facto ao tribunal cujo conteúdo não podiam ignorar.
- Ademais, dos depoimentos prestados na audiência de julgamento da matéria de facto alegada no requerimento inicial de providência cautelar, resultou objectivamente que as recorrentes não entregaram o hotel à recorrida Apelado.
- Aliás, tal entrega teria de ser titulada, tal como contratualmente estabelecido, por um auto de recepção provisório,
- Auto esse que inexiste porque jamais foi celebrado entre as recorrentes e a recorrida.
- Acresce que, o matéria relativa à entrega do hotel encontra-se devidamente impugnada em sede dos autos principais, na medida em que as ora recorrentes refutam terminantemente que algum dia tenham entregue o hotel à recorrida.
- Por outro lado, os depoimentos prestados em sede de julgamento da matéria alegado no requerimento inicial, foram todos convergentes no sentido de que o edifício do hotel da recorrida já se encontrava em funcionamento antes do data da suspensão da obra por parte das recorrentes, ainda que contra o vontade das recorrentes.
- Assim sendo, não se vislumbra como é que a Meritíssima Juíza a quo pode considerar na sentença recorrida que tal factualidade se mostrava desconhecida e que tal desconhecimento acarretou que tivesse ordenado inicialmente a restituição provisória da posse a favor das ora recorrentes sobre o edifício do hotel.
- Aliás, a factualidade que a Meritíssima Juíza a quo assevera que foi ocultada pelas ora recorrentes, foi, isso sim, devidamente esclarecida a instâncias do Mandatário das recorrentes por ocasião do julgamento da matéria de facto contida no requerimento
- Circunstancialismo esse que, como está bom de ver, se fosse intenção das ora recorrentes sonegar, não teria sido persistentemente indagado às testemunhas que prestaram depoimento naquela audiência,
- É, pois, indiscutível que as ora recorrentes sempre colaboraram no esclarecimento da verdade.
- Foram pois e em suma violados os artigos 653º nº2, 659º nºs 2 e 3 e 456º nº2 a contrario, todos do CPC, o que impõe necessariamente a revogação do doutamente sentenciado, na parte relativa à condenação dos ora recorrentes como litigantes de má fé.
Termos em que concedendo-se provimento à apelação e revogando-se a douta sentença, na parte supra referida, se fará inteira e sã Justiça.

Contra-alegaram (em relação ao recurso interposto pela T) as requerentes, Construtora S, SA e C Udra, Lda., formulando as seguintes CONCLUSÕES:
- Entendem as Apeladas que face aos argumentos supro expostos, a douta sentença recorrido não merece qualquer reparo a respeito da matéria recorrida.

- Com efeito, mau grado o julgamento dos factos alegados na oposição, mantiveram-se indiciariamente provados os factos que atestam que as Apelados mantinham a posse do edifício de apartamentos que construíram.
- Posse essa que se corporizava no facto das Apeladas terem no interior daquela obra, em regime de permanência, uma equipa de segurança que tinha por Incumbência proceder à vigilância daquela obra, guardar os materiais e ferramentas que as Apeladas mantinham na obra assim como zelar pela manutenção da retenção exercida pelas Apeladas.
- Asserção esta que é sufragado não só pelos depoimentos prestados no âmbito da audiência de julgamento dos factos alegados no requerimento.
- Mas também pelos depoimentos prestados no julgamento da matéria de facto alegado na oposição, nomeadamente, pelas testemunhas….
- Não tendo a Apelante logrado provar o contrário.
- Ademais, resulta ainda indiciariamente provada que as Apeladas foram esbulhadas de formo violenta pela Apelante na sua posse,
- Esbulho violento esse que se perpetrou não só através da mudança, à revelia das ora recorridas, do canhão da fechadura da poda que dava acesso à obra que corresponda ao prédio de apartamentos, obstruindo o Apelante, dessa forma, que as ora recorridas e os seus funcionários e / ou trabalhadores acedessem ao interior daquela obra.
- Mas também através da coacção moral proveniente da superioridade numérica das pessoas das esbulhadores e uma posterior intimação por parte da Apelante contra elementos pertencentes às Apeladas.
- Acresce que, não colhe a alegação da Apelante de que aquela porta se encontrava aberta no momento em que a mesma procedeu à mudança do canhão da fechadura.
- É que, tal invocação colide frontalmente com o depoimento prestado em audiência de julgamento pelo testemunha, segurança que se encontrava naquela obra à dato dos factos, e que actualmente trabalha paro a Apelante.
- O qual afirmou peremptoriamente que a porta em questão se encontrava fechada quando se deu o sua saída momentânea para ir à casa de banho que se situava fora daquela obra.
- Ademais, os restantes depoimentos prestados pelas testemunhas intervenientes nos factos supra enunciados, são, como resulta expresso no corpo das presentes contra - alegações, absolutamente contraditórios.
- Pois, se por um lado, a testemunha M assevera que estava sozinho no momento em que procedeu à mudança do canhão da fechadura, a testemunha J afirma, por seu turno, que estava com M naquele momento.
- Ademais, as Apeladas jamais abandonaram a obra, antes suspenderam a execução da mesma, porquanto, a dívida da Apelante, relativa aos trabalhos executados pelas Apeladas, ascendia a mais de € 2.600.000,00,
- Tendo as Apeladas dado, disso, conhecimento à Apelante, muita antes da Apelante ter decidido resolver unilateralmente a contrato de empreitada que as unia.
- Não se verifica ainda qualquer nulidade na decisão recorrida, na medida em que, tendo as recorridas requerido a restituição provisória da posse das obra que é composta por dais edifícios independentes e separados (hotel e edifício de apartamentos).
- Ao sentenciar a Meritíssima Juíza a quo pela manutenção da restituição provisória da posse quanto ao edifício de apartamentos, não se verifica minimamente uma condenação em objecto diverso do que se requereu.
- Acresce ainda referir que a Apelante não logrou fazer prova de um só requisito do qual depende a aplicação do artigo 428º do Código Civil, pelo que não pode esta invocar qualquer excepção de não cumprimento.
- Por último, sublinhe-se ainda que o recurso à presente medida cautelar não enferma de qualquer equívoco pois que constitui jurisprudência pacífica que o empreiteiro goza do direito de retenção relativamente ao prédio ou obra realizada, enquanto o dono da obra não pague o preço devido por aquela.
Termos em que, negando-se provimento à Apelação e mantendo-se o douto sentença recorrido, se fará inteira e sã JUSTIÇA.
#

2 - Foram colhidos os necessários vistos e proferido o competente acórdão do qual veio a recorrente “T, S.A” reclamar para a Conferência, alegando, em resumo que:
- O acórdão em causa não se pronunciou sobre todas as questões levantadas, as quais se fossem tidas em conta levariam a outra decisão.

Dispensados os vistos e realizada a Conferência concluiu-se não ser de atender a reclamação em apreço, porquanto:
- Ao contrário do doutamente alegado pela recorrente, julgam ter conhecido todas as questões relevantes para a boa decisão da providência cautelar em apreço, sendo pacífico jurisprudencialmente que só sobre estas deve o respectivo Tribunal pronunciar-se;
- Por outro lado e como a própria recorrente reconhece, a factualidade apurada não permite que se equacione a invocada excepção de não cumprimento prevista no artº428º do CC;
- Acresce que e sem embargo do muito respeito que as partes nos merecem, está reservado constitucionalmente aos Tribunais, devido à sua independência, valorar a prova apresentada e decidir sobre a factualidade provada e não provada com a garantia legalmente estabelecida neste particular da dupla jurisdição – artº712º do CPC -.
- Finalmente, pensamos não se verificarem os pressupostos da também alegada inconstitucionalidade, observado que foi o direito de recurso da recorrente quer quanto à questão de facto quer quanto ao direito aplicável ao caso em análise que, devido à natureza que tem de procedimento cautelar, se circunscreve à existência, ou não, dos requisitos que presidem á mesma, ficando reservado para a respectiva acção a propor, o definitivo apuramento dos factos e a solução jurídica final.
Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação / 1ª secção em não atender a presente reclamação e em manter o antes decidido com base nos fundamentos de facto e de direito anteriormente aduzidos, e que a seguir se reproduzem, não sem antes se delimitar o objecto do litígio.
#
3 - APRECIANDO E DECIDINDO
Thema decidendum:
- A requerida veio recorrer quer quanto à matéria de facto dada como assente quer quanto ao direito aplicado, concretamente e respectivamente, pretende que:
a) - Sejam aditados novos factos aos antes dados como assentes.
b) - E, concluindo-se pela não veracidade do alegado pelas requerentes, se revogue o decidido in totum, condenando-se ainda os requerentes na indemnização pedida pela sua litigância de má fé.
– Por sua vez, as requerentes, pugnam pela manutenção do decidido e revogação da sua condenação como litigantes de má fé.
#
I - Apuraram-se os seguintes FACTOS:
A) - Inicialmente e indiciariamente, provou-se que:
1- As requerentes dedicam-se, com intuito lucrativo, à actividade de construção civil e obras públicas, sendo detentoras do Alvará de Construção classe 5, número 23412 e classe 9, número 4670, respectivamente, juntos aos autos e cujo teor se dá por reproduzido.
2- No e para o exercício da sua actividade, as requerentes, em regime de consórcio, subscreveram com a requerida, em 1 de Março de 2006, o instrumento particular denominado “Contrato de Empreitada”, cuja cópia consta a fls. 25 e ss. dos autos e cujo teor se dá por reproduzido, cujo objecto consistia na realização, por parte das requerentes, de todos os trabalhos de construção civil inerentes e necessários à edificação de dois prédios no lote de terreno propriedade da requerida sito na Rua, 2 a 6, tornejando para a Rua Almirante Barrosos, Lisboa, pelo preço global de € 6.850.000,00.
3- Os referidos prédios são “fisicamente” independentes e separados entre si, correspondendo um deles a um Hotel e o outro a um edifício de habitação multifamiliar;
4- A consignação daquela empreitada efectivou-se no mesmo dia da celebração do aduzido contrato, tendo nessa data sido entregue às requerentes o lote de terreno supra mencionado por forma a que aquelas Requerentes pudessem dar início à execução dos respectivos trabalhos.
5- As requerentes iniciaram a execução dos aduzidos trabalhos no dia seguinte àquele, isto é, no dia 2 de Março de 2006.
6- No âmbito da execução do referido contrato de empreitada, a primeira requerente emitiu e entregou à requerida as facturas correspondentes aos trabalhos executados nos meses subsequentes, os quais respeitam ao período compreendido entre o mês de Abril de 2006 e Janeiro de 2008, inclusive.
7- A primeira requerente emitiu e entregou à requerida, que as recebeu na data inserta nas mesmas, as seguintes facturas relativas aos trabalhos contratuais executados pelas requerentes na empreitada supra mencionada:

NúmeroValor factura c/ IvaDataDataData
facturaFacturavencimentorecebimento
29/2006242.110,5930-Abr-0629-Jun-0630-Jun-06
43/2006347.864,4931-Mai-0630-Jul-062-Ago-06
48/2006273.510,1530-Jun-0629-Ago-065-Set-06
59/2006390.334,5431-Jul-0629-Set-063-Out-06
62/2006278.576,9231-Ago-0630-Out-067-Nov-06
72/2006284.753,0930-Set-0629-Nov-065-Dez-06
91/2006286.875,2531-Out-0630-Dez-062-Jan-07
111/2006391.110,5430-Nov-0629-Jan-075-Fev-07
125/2006419.549,8831-Dez-0601-Mar-079-Mar-07
007/2007361.051,5731-Jan-0701-Abr-079-Abr-07
015/2007224.883,4928-Fev-0729-Abr-078-Mai-07
020/2007374.907,2331-Mar-0730-Mai-074-Jun-07
031/2007363.984,0530-Abr-0729-Jun-075-Jul-07
041/2007387.684,7231-Mai-0730-Jul-076-Ago-07
055/2007352.386,7530-Jun-0729-Ago-0714-Set-07
072/2007789.890,1431-Jul-0729-Set-073-Out-07
03/2007-165.763,5631-Ago-0731-Ago-07
080/2007616.618,9731-Ago-0730-Out-07 EM DÍVIDA
103/2007620.465,9431-Out-0730-Dez-07 EM DÍVIDA
117/2007250.086,2230-Nov-0729-Jan-08 EM DÍVIDA
137/2007110.496,3631-Dez-0729-Fev-08 EM DÍVIDA
014/200835.830,4614-Mar-0813-Mai-08PENDENTE VENC.

8- A primeira requerente emitiu e entregou à requerida, que as recebeu na data inserta nas mesmas, as seguintes facturas correspondentes aos trabalhos a mais executados pelas requerentes naquela empreitada a pedido daquela:

NúmeroValor factura c/ Iva DataDataData
facturaFacturaVencimentoRecebimento
63/200627.114,8831-Ago-0630-Out-067-Nov-06
73/20062.350,6230-Set-0629-Nov-06
01/2007-2.350,6231-Jan-0731-Jan-07
008/200727.631,0231-Jan-0701-Abr-079-Abr-07
016/200738.677,3428-Fev-0729-Abr-078-Mai-07
021/2007140.209,6731-Mar-0730-Mai-074-Jun-07
032/200788.657,7030-Abr-0729-Jun-075-Jul-07
042/200713.466,0031-Mai-0730-Jul-076-Ago-07
056/2007179.481,5130-Jun-0729-Ago-0714-Set-07
073/2007135.491,8631-Jul-0729-Set-073-Out-07
04/2007-90.001,3531-Ago-0731-Ago-07
081/2007346.098,3431-Ago-0730-Out-07EM DÍVIDA
104/2007234.937,5031-Out-0730-Dez-07EM DÍVIDA
118/2007200.203,1230-Nov-0729-Jan-08EM DÍVIDA
138/2007223.581,7431-Dez-0729-Fev-08EM DÍVIDA

9- Nos termos acordados entre requerentes e requerida, as facturas emitidas pelas requerentes deveriam ser liquidadas pela requerida no prazo máximo de sessenta dias após a recepção das mesmas por parte daquela requerida.
10- A requerida não pagou às requerentes, nem na data do seu vencimento nem posteriormente, como devia, as seguintes facturas relativas a trabalhos contratuais e a trabalhos a mais executados naquela empreitada:
Factura n.º 080/2007, datada de 31.08.2007, no montante de € 616.618,97, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 30.10.2007;
Factura n.º 081/2007, datada de 31.08.2007, no montante de € 346.098,34, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 30.10.2007;
Factura n.º 103/2007, datada de 31.10.2007, no montante de € 620.465,94, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 30.12.2007;
Factura n.º 104/2007, datada de 31.10.2007, no montante de € 234.937,50, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 30.12.2007;
Factura n.º 117/2007, datada de 30.11.2007, no montante de € 250.086,22, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 29.01.2008;
Factura n.º 118/2007, datada de 30.11.2007, no montante de € 200.203,12, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 29.01.2008;
Factura n.º 137/2007, datada de 31.12.2007, no montante de € 110.496,36, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 29.02.2008;
Factura n.º 138/2007, datada de 31.12.2007, no montante de € 223.581,74, Iva incluído, cujo vencimento ocorreu em 29.02.2008, (cfr. documentos n.ºs 5 a 12 que igualmente se juntam), tudo perfazendo a quantia global de € 2.602.488,19, Iva já incluído.
11- As requerentes, por diversas vezes, interpelaram a requerida para proceder ao pagamento das quantias em dívida.
12 – As requerentes decidiram suspender a execução da empreitada mencionada em 01.02.2008, tendo disso comunicado à requerida.
13- No referido “Contrato de Empreitada” as partes estipularam sob a Cláusula 23.4, “Havendo rescisão de contrato e por solicitação do primeiro outorgante, deverá a segunda outorgante retirar do local dos trabalhos, todos os equipamentos, maquinaria e pessoal e levantar o estaleiro no prazo máximo de 08 dias úteis, (…), renunciando a qualquer direito de retenção, excepto se o dono da obra se atrasar no pagamento de uma factura em mais de sessenta dias contados do respectivo vencimento.”
14- As requerentes mantiveram equipamentos, máquinas e algum pessoal nos edifícios em causa.
15- A requerida, por intermédio do seu administrador único, Senhor, em dia que não foi possível apurar de Abril, de 2008 pelas 21 horas, apresentou-se na obra com três elementos da empresa de segurança “Securitas”, por forma a proceder à ocupação do edifício de habitação, tendo sido esse seu desiderato tolhido pela intervenção do guarda contratado pelas requerentes para proceder à segurança e manutenção da retenção da obra, o qual se encontrava no interior do referido edifício, mormente no seu hall de entrada.
16- Horas mais tarde, precisamente por volta da 01 hora da madrugada do dia seguinte, aquele guarda necessitou de se deslocar às instalações sanitárias que se encontram no exterior da obra, e quando regressou à obra, aquele guarda verificou que a fechadura principal da porta de entrada daquele edifício havia sido arrombada e substituída por outra.
17- O identificado guarda ainda tentou entrar no edifício de habitação de forma a retomar o seu trabalho, tendo sido impedido de o fazer por dois elementos cuja veste permitia identificar que trabalhavam para a empresa de segurança “Securitas.”
18- Na obra também se encontravam o administrador da requerida, Senhor Joaquim Justino, o senhor M, elemento designado pela requerida para proceder à fiscalização daquela empreitada e outras pessoas;
19- Acresce que, na manhã daquele dia, por volta das 08h00, o encarregado da obra da primeira requerente, senhor J, procurou igualmente entrar na obra, tendo sido a sua entrada imediatamente barrada por elementos de segurança contratados pela requerida, quando o mesmo se identificou como encarregado da “C U”;

20- O identificado encarregado da requerente ainda tentou forçar a sua entrada, tentativa essa que se revelou infrutífera uma vez que o referido encarregado foi impedido pelos seguranças a cargo da requerida;
21- No dia seguinte, dois elementos pertencentes à primeira requerente, Eng.º e o Eng.º D, deslocaram-se à obra na companhia de um agente da Polícia de Segurança Pública, tendo comprovado perante a autoridade policial que a requerida não permitia que qualquer elemento pertencente às requerentes entrasse na obra.

B) - Após a dedução de oposição por parte da requerida, apurou-se também indiciariamente que:
1- No instrumento particular subscrito pelas requerentes e requerida em 01 de Março de 2006, denominado Contrato de Empreitada, cuja cópia consta a fls. 25 e ss. dos autos, e cujo teor se dá por reproduzido, consta, para além do mais, sob a Cláusula 6.1: A primeira outorgante fará a consignação da obra até ao dia 01 de Março de 2006 e a segundo obriga-se a iniciar os trabalhos objecto do presente contrato no dia seguinte ao da consignação (…). 6.2: A segunda outorgante é responsável pela conclusão do edifício, de acordo com os projectos e sem vícios, defeitos e irregularidades, no prazo máximo de 14 (catorze) meses de calendário, após a consignação dos trabalhos. 6.3: A segunda outorgante obriga-se a cumprir o prazo global e os prazos parciais vinculativos constantes do programa de trabalhos.”
2- Após a data de 30.04.2007, as requerentes efectuaram entregas parciais da obra à requerida.
3- As requerentes entregaram à requerida, o edifício do hotel, em Dezembro de 2007, bem como as caves de parqueamento automóvel do hotel.
4- No edifício do hotel, toda a zona de restauração explorada pela “Saldanha Mar, Lda.” foi entregue pelas requerentes à requerida em data anterior a Dezembro de 2007, uma vez que era necessário equipar e preparar os estabelecimentos para o início da laboração.
5- A constituição da sociedade “S, Lda.” já estava prevista para explorar, desde 15 de Dezembro de 2007, toda a parte de restauração quer dos dois restaurantes, bar, room service do hotel e todos os espaços do hotel onde se celebram eventos sociais.
6- A requerida apontou às requerentes defeitos e vícios de construção no edifício do hotel;
7- Requerentes e requerida subscreveram o instrumento particular cuja cópia consta a fls. 292 dos autos, e cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “Em relação ao contrato com data de 1 de Março de 2006, para a construção de um hotel e de um edifício de Habitação localizados num lote de terreno sito em Lisboa na Rua Eng.º Vieira da Silva, tornejando para a Rua Almirante Barrosos, em que se concordava um prazo para execução da obra de 14 meses e que devido a vários factores que impediram o normal desenvolvimento dos trabalhos contratuais bem como as alterações solicitadas ao longo da empreitada, estabelecem-se novas datas para a conclusão da mesma:
Hotel:
Piso 0 a 6 – Termina 15 de Setembro de 2007, (…);
Piso 7 – Termina 15 de Setembro de 2007, (…);
Piso (-1) – Termina 30 de Setembro;
Restaurante do peixe (S) – Termina 15 de Setembro caso (…);
Pátios piso 0 e piso 1 – Termina 30 de Setembro de 2007. (…);
Habitação:
Piso 0 – Termina dia 30 de Setembro, excepto (…);
Piso 1 a 4 – Termina dia 30 de Setembro;
Piso 5 e piso 6 – Termina dia 15 de Outubro caso a Lareira, bases de duche e bancadas das instalações sanitárias, fiquem definias até ao dia 23 de Agosto;
Piso 7 – Sem data possível para reinício dos trabalhos. Aguarda-se novo projecto;
Piso 8 – Fica concluído até ao dia 30 de Setembro excepto (…).
As datas apresentadas, só serão possíveis no caso do dono da obra se responsabilizar pela aprovação dos trabalhos a mais pendentes, bem como da resolução das duvidas ou esclarecimentos necessários em tempo útil, devendo responder no prazo máximo de 24 horas.”
8- A requerida comunicou às requerentes, e estas receberam, o documento datado de 24.08.2007, constante a fls. 669 dos autos principais, cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “ (…) É do conhecimento de todos, a necessidade premente da Ta, S.A em abrir o Hotel ao público. Esta necessidade existe, em virtude dos compromissos – com datas de abertura já assumidos com diversos operadores turísticos que, sucessivamente, têm sido adiados, como o consequente desgaste de imagem que em nada dignifica uma unidade hoteleira nova, motivado por se ter estabelecido prazos que não foram cumpridos. A T, S.A vem por este meio dar conhecimento que vai – mais uma vez, comprometer-se com clientes numa data de abertura do Hotel, baseando-se nos prazos apresentados no supra mencionado plano, que caso não seja cumprido acarretará graves prejuízo não só financeiros, mas também na degradação de imagem que dificilmente poderão ser reparados. Certo de que compreenderão a situação, a T, S.A apela e conta com o empenho, profissionalismo e sentido de responsabilidade que a C U, Ldª já demonstrou ter, para levar a bom termo este projecto, donde todos sairemos dignificados.”
9- O hotel enquadrava-se no conceito “Hotel D” e o bloco de apartamentos no conceito de luxo.
10- A requerida tem desenvolvido a fase de acabamentos da obra.
11- A partir de 26 de Dezembro de 2007 o hotel teve efectiva ocupação por clientes.
12- A requerida elaborou e apresentou às requerentes os documentos denominados “Reparações a efectuar pela T no Hotel para debitar na conta corrente da U”, cuja cópia consta a fls. 308 a 310 dos autos, e cujo teor se dá por reproduzido.
13- As requerentes enviaram à requerida, e esta recebeu, a carta datada de 21.01.2008, cuja cópia consta a fls. 64/65 dos autos principais e cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “ (…) Ora o atraso verificado nos pagamentos causa, naturalmente, prejuízos severos nos signatários, que se vêem obrigados, caso não procedam à regularização da dívida vencida nos próximos 7 dias, a suspender a execução dos trabalhos nos conjugados termos da cláusula 19ª, nº 4 do contrato e artº185º, nº 2 c) do DL 59/99 de 02 de Março. Tal suspensão acarreta todas as legais consequências nomeadamente em termos de licenciamento do edifício em causa.”
14- A requerida e as requerentes realizaram várias reuniões, nomeadamente no restaurante situado no hotel e denominado “S” com vista ao acordo, porquanto as requeridas pretendiam o pagamento e a requerida pretendia a rectificação dos defeitos e vícios que apontava na obra.
15- A requerida pretendeu abrir o hotel no Verão de 2007;
16- A requerida enviou às requerentes, e estas receberam, a carta datada de 25.03.2008, cuja cópia consta a fls. 297/298 dos autos, e cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “Na qualidade de dona da obra, ao abrigo do disposto na clausula 23ª do contrato de empreitada celebrado com V. Exas. e com a Construtora S, S.A., em 1 de Março de 2006, pela presente resolvemos o contrato de empreitada celebrado.”
- O fundamento contratual da resolução unilateral que ora fazemos tem por base, designadamente o ponto 23.2 e 23.3 do contrato celebrado.
- Na verdade, tal como referíamos na nossa notificação de 23 de Janeiro de 2008, ali invocamos a seguinte factualidade que, por actual, se mantém: a) No dia 1 de Março de 2006, celebramos o contrato de empreitada para a construção de um hotel; b) Que V. Exas. em “consórcio” com a sociedade “S S.A.”, assumiram a obrigação contratual de realização da obra contratada, nos prazos previstos na clausula “sexta”; c) Que, tal prazo contratual estabelecia que a obra contratada seria entregue à dona da obra no prazo de 14 meses a contar da consignação dos trabalhos; d) Que, para a “dona da obra”, a data de entrega da obra contratada era essencial; e) Que, decorridos que estão mais de 18 meses desde a data da adjudicação da obra, a mesma ainda não tem data designada para ser recepcionada na sua globalidade, tendo nomeadamente em vista que V. Exas. entregaram parcialmente o hotel em 23 de Dezembro de 2007, embora com obras por concluir e com graves vícios de obra para corrigir, o que não se verificou mesmo antes de V. Exas. terem suspendido a execução do contrato. (…).
Em face do exposto:
a) Resolvemos o contrato celebrado, com justa causa, prevista no contrato.
b) Deverão V. Sas no prazo máximo de oito dias, proceder à retirada de quaisquer equipamentos e materiais que possuam no local, tal como previsto no contrato.
Mais informamos que a resolução do contrato que ora fazemos não prejudica quer a aplicação das multas contratuais bem como a rectificação dos autos de medição a que se refere a cláusula oitava do contrato e bem assim o acervo dos valores a que se refere a clausula 23.ª, designadamente o ponto 23.6 do contrato de empreitada. (…).”
17 - A requerida mandou proceder à substituição da fechadura da porta de entrada do prédio de habitação da Rua Almirante Barroso.
18- O Sr. Engº não esteve presente no momento da troca do canhão da fechadura, mas foi ele, como administrador da requerida, a dar instruções quanto à substituição do canhão da fechadura da porta de entrada do nº.62 do prédio;
19- Os elementos de segurança da requerida informaram o vigilante das requerentes, Sr. V, quando o mesmo se apresentou, de que não poderia voltar a entrar naquela loja;
20 - A requerida mandou elaborar uma auditoria externa, para apurar o estado da obra;
21 - A requerida enviou às requerentes, e estas receberam, a carta datada de 14.04.2008, cuja cópia consta a fls. 300/301 dos autos, e cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “ (…). No caso vertente, nos termos da cláusula 7ª, foram aplicadas multas no valor global de € 1.148.346,64 reduzidas para o valor de € 1.027.500$00 (…); Tal como referimos a V. Exas. na reunião efectuada, mandamos fazer o levantamento dos vícios materiais da obra que se encontram identificados no documento 2 e que perfaz o valor estimado de € 1.684.641,27; (…). Considerando a resolução do contrato com justa causa, tal como referimos na reunião celebrada, não temos interesse em manter a garantia bancária a qual devolvemos. (…)”
22- A requerida contratou pessoal para o hotel ao longo de 2007.
#

II - Do conhecimento, propriamente dito, dos recursos
A) - Da questão de facto:
Pretende a requerida que sejam aditados à matéria de facto provada os seguintes factos:
– Que os requerentes e aqui apelantes retiraram todos os seus materiais e equipamentos da obra;
– Que a porta da loja com o nº da Rua Almirante Barroso na qual foi substituído o canhão, se encontra aberta.

Nos termos dos artºs 685ºA, 685ºB e 712º do CPC e ouvidos os testemunhos gravados no CD/cassetes junto aos autos, constatamos que:

Que dizer?
Valorando a prova testemunhal acima transcrita por nós bem como os documentos que sustentaram os factos acima dados como provados, concluímos como o Tribunal a quo.
Ao contrário do alegado pela requerida, em sede de recurso, não há dúvida de que as requerentes apesar da suspensão da execução da obra, permaneceram no edifício destinado a apartamentos e escritórios e daí só saíram contra a sua vontade e nas circunstâncias acima relatadas, nomeadamente, pela testemunha V.

Tudo visto, improcede o recurso interposto pela requerida e que visava a modificação da matéria de facto dada como assente.
#
B) - Do Direito:
- Do recurso (apelação) da requerida:
A recorrente/requerida, alude no seu recurso, a errada forma de processo usado pelas requerentes e caucionado pelo Tribunal mas sem razão.

Tal como é objecto de desenvolvida fundamentação na sentença recorrida, a questão que se punha era de reconhecimento ou não do alegado direito de retenção pelo empreiteiro em relação ao dono da obra.

Reconhecido este e verificado que está o esbulho consubstanciado na retirada forçada da posse legitimamente exercida pelas requerentes em relação ao edifício de apartamentos e escritórios, não podemos deixar de concluir que a restituição provisória de posse, é o meio processual correcto para repor o direito violado pela requerente.

Também concordamos como o decidido no sentido de que não estamos perante uma situação de abuso de direito, mas sim na presença de litigância de má fé, designadamente, porque as requerentes quando intentaram o presente procedimento cautelar já sabiam que não tinham a posse do edifício destinado a Hotel, o qual até já estava em funcionamento.

Afastamos, igualmente, a condenação das requerentes numa indemnização igual aos honorários despendidos pela requerida, desde logo, pela natureza do contrato que está na base de tais honorários, o mandato judicial, livremente estabelecido entre as partes e o advogado por elas escolhido, relação contratual esta alheia à causa de pedir em discussão.

Dito isto, subscrevemos os seguintes fundamentos das impugnadas decisões:

“-…-
Os procedimentos cautelares constituem medidas judiciais preventivas e urgentes com a finalidade de evitar o periculum in mora, ou seja, o perigo de que a morosidade própria de uma normal acção judicial acabe por inviabilizar, na prática, o direito de que o requerente da providência se arroga.
No que concerne ao procedimento cautelar de restituição provisória da posse, importa considerar o disposto no artº1279º do Código Civil que prescreve: “Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o possuidor que for esbulhado com violência tem o direito a ser restituído provisoriamente à sua posse, sem audiência do esbulhador”.
Do que se deixa dito teremos que concluir que a restituição provisória constitui um meio de defesa da posse, ao serviço do possuidor, contra actos de esbulho violento.
Por sua vez, em perfeita sintonia com aquele dispositivo legal, dispõe o artº393º do Código Processo Civil: “No caso de esbulho violento, pode o possuidor pedir que seja restituída provisoriamente à sua posse, alegando os factos que constituem a posse, o esbulho e a violência”. E dispõe o artº394º do mesmo diploma legal: “Se o juiz reconhecer, pelo exame das provas, que o requerente tinha a posse e foi esbulhado dela violentamente, ordenará a restituição, sem citação nem audiência do esbulhador”
Vejamos, pois e desde já, se as requerentes poderão ser consideradas possuidoras de modo a poderem fazer uso deste meio de restituição da posse.
O devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados (cfr. artº754º do CC).
O direito de retenção, direito real de garantia, consiste, assim, na faculdade de uma pessoa reter ou não restituir uma coisa alheia, que possui ou detém, até ser pago o que lhe é devido, por causa dessa coisa, pelo respectivo proprietário.
Embora se tenha já discutido se, no âmbito do contrato de empreitada, o empreiteiro gozava desse direito relativamente ao prédio ou obra realizada, enquanto o dono da obra não pagasse o preço devido por aquela, quer a doutrina, quer a jurisprudência maioritária, têm vindo a reconhecer esse direito ao empreiteiro, nos termos do preceito mencionado. Tem ainda sido reconhecido ao empreiteiro que, não obstante do disposto no artº758º do diploma citado resultar, por via da remissão para as disposições que regem o penhor, que no caso de retenção de coisas móveis, o retentor pode fazer uso dos meios possessórios se for indevidamente desapossado da coisa, mesmo pelo seu próprio dono - cfr. artº670º a), do CC - e tem-se igualmente entendido que da mesma faculdade goza o retentor de coisa imóvel, desde que verificado o circunstancialismo estabelecido no citado artº754º, do CC: licitude da detenção da coisa; reciprocidade de prestações; e conexão substancial entre a coisa retida e o crédito do autor da retenção.
Ora, face aos factos indiciariamente dados como provados, nada obsta a que seja provisoriamente reconhecido às requerentes/empreiteiras o direito de retenção sobre a obra/edifícios em causa, nos termos do citado artº754º, do CC, já que foram executados trabalhos acordados e a mais, e que, facturados, não foram pagos no momento devido.
Provado indiciariamente, tanto quanto é exigível no âmbito de um procedimento cautelar, que as requerentes gozavam do direito de retenção sobre os edifícios em causa, cabe apreciar se se verificam os requisitos legalmente impostos para o decretamento da providência pedida.
Da conjugação das citadas disposições legais, resulta que a procedência do pedido cautelar de restituição provisória da posse, depende da alegação e prova dos seguintes requisitos cumulativos: a posse; o esbulho; e a violência.
Assim, atendendo ao disposto no referido artº1279º, do CC, ou à norma adjectiva do artº393º, do CPC, a medida de restituição provisória da posse e o correspondente procedimento têm o perímetro definido pelas situações qualificáveis como de esbulho violento de bem possuído pelo requerente. Daqui resulta que se, em vez da prática de actos de esbulho, o requerido pautar o seu comportamento por simples ameaças de intromissão na esfera de actuação do possuidor ou por actos configurados como de mera turbação, ou se o esbulho não puder qualificar-se como violento, já não será a restituição provisória o procedimento a idóneo (isto é, não é o meio adequado para regularizar a situação), mas sim aquela que, enquadrada no procedimento cautelar comum, abarque a situação sujeita a perigo de lesão grave dificilmente reparávelAbrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, 6 – Procedimentos Cautelares Especificados, p. 26. - cfr. art.395º do CC -.
Importa analisar cada um daqueles requisitos.
A nossa lei civil acolheu a concepção subjectiva do conceito de posse, como resulta, de forma clara e inequívoca, do conteúdo do artº1251º do CC: “Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real”. E do artº1253º, do CC: “São havidos como detentores ou possuidores precários; a) os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiário do direito; b) os que simplesmente se aproveitam da tolerância do titular do direito; c) os representantes ou mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que possuem em nome de outrem”.
O corpus (elemento material) consiste no domínio de facto sobre a coisa, traduzido no exercício efectivo de poderes materiais sobre ela ou na possibilidade física desse exercício.
O animus (elemento psicológico) consiste na intenção de exercer sobre a coisa, como titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto, isto é, aos actos praticados.
No que concerne ao requisito do esbulho, este verifica-se sempre que alguém é privado, total ou parcialmente, contra a sua vontade, do exercício dos poderes de facto correspondente a um direito, em que a posse se traduz, ou da possibilidade de os continuar a exercerNeste sentido, Henrique Mesquita, in obra referida, p. 126; o citado Ac. da RE de 03/07/74 e o citado Ac. da RE de 15/01/81.---.
Deve realçar-se que o esbulho abarca os actos que impliquem a perda da posse, ao passo que os actos de turbação, embora situados para além das simples ameaças dirigidas ao possuidor, não assumem proporções que impeçam a sua conservaçãoAbrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, 6 – Procedimentos Cautelares Especificados, p. 42.----.
Quanto ao requisito violência, há que ter em consideração que para os estritos efeitos da restituição provisória da posse se exige a prova de comportamentos do requerido pautados pela violência.
Acerca do conteúdo deste conceito, Abrantes Geraldes dá-nos conta de que «Persistem na doutrina e na jurisprudência fundamentalmente duas respostas: 1ª - A violência relevante deve ser necessariamente exercida contra a pessoa do possuidor; 2ª - Basta a violência exercida sobre a coisa, designadamente quando esteja ligada de algum modo à pessoa do esbulhado ou quando dela resulte uma situação de constrangimento físico ou moral»In Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, 6 – Procedimentos Cautelares Especificados, p. 45.----.
E refere o mesmo Autor que «a primeira das teses referenciadas tem subjacente a prevalência de juízos lógico-formais que, aplicados aos casos da vida real, determinam, com frequência, resultados irrazoáveis e inaceitáveis... Ora, sendo o esbulho uma das formas através das quais se pode adquirir a posse, a sua qualificação como violento deve ser o resultado da aplicação do artº1261º do CC, com o que somos transportados, por expressa vontade do legislador, para o disposto no artº255º do CC, norma que integra na actuação violenta tanto aquela que se dirige directamente à pessoa do declaratário (leia-se, do possuidor), como a que é feita através do ataque aos seus bens»In Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, 6 – Procedimentos Cautelares Especificados, p. 44 e 45.----.
Na verdade, uma vez que os artºs1279º do CC e 393º e 394º do CPC não consagram qualquer definição de «esbulho violento», há que recorrer ao disposto no art. 1261º do CC: “Considera-se violenta a posse quando, para obtê-la o possuidor usou de coacção física, ou de coacção moral nos termos do art. 255º do CC». E, por seu turno, estabelece o artº255º, nº 2 do mesmo código: «A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro».
-…-
Vejamos, agora, se se mantêm os restantes requisitos legalmente impostos para o decretamento da providência ordenada, isto é, a posse, o esbulho e a violência.
Atenta a factualidade indiciariamente provada, no que concerne ao articulado oposição, conclui-se que a requerida, mesmo numa perspectiva de sumaria cognicio, logrou fazer prova de que as requerentes, ao procederem à entrega voluntária à requerida, em Dezembro de 2007, do edifício do hotel, perderam a posse sobre o identificado prédio.
Contudo, no que concerne ao edifício de apartamento, e salvo o devido respeito por opinião em contrário, não se afigura que as requerentes tenham perdido a posse sobre o mesmo, não só porque não logrou provar-se que as requerentes tenham removido daquela obra todos os materiais e pessoal, como também a resolução do contrato pela requerida, apenas após as requerentes terem comunicado a suspensão dos trabalhos até obtenção do pagamento das facturas, não poderá determinar o bloqueio do direito de retenção conferido legalmente às requerentes.
De acordo com a matéria de facto dada como indiciariamente provada, resulta que também se mantém o acto de esbulho consistente na mudança da fechadura (ou do canhão da fechadura) da porta de acesso à obra, no que concerne ao prédio de apartamentos, o que impede as requerentes de acederem à obra, bem como a violência consubstanciada na mudança da fechadura à revelia das requerentes e nos actos de obstrução de entrada das requerentes e seus trabalhadores na identificada obra.
Alegou, ainda, a requerida que o comportamento das requerentes consubstancia abuso de direito, porquanto omitiram ao Tribunal factos essenciais que, se fossem conhecidos, levariam a outra decisão, nomeadamente porque omitiram que haviam voluntariamente entregue a obra do hotel à requerida, tendo esta passado a explorar o mesmo.
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, o abuso de direito verifica-se quando o seu titular o exerce em desconformidade, designadamente excedendo os limites impostos da boa fé.
Ora, na situação descrita pela requerida não estamos perante um abuso de direito, mas perante litigância de má fé, razão pela qual e sem necessidade de outros considerando, teremos que considerar que a alegada excepção de abuso de direito improcede.
Do que se deixa exposto teremos que concluir que os requisitos de que depende o decretamento da providência cautelar de restituição provisória da posse no que concerne ao bloco de apartamentos mantêm-se inalterados.
Contudo, os requisitos de que depende o decretamento da providência cautelar de restituição provisória da posse no que concerne ao edifício do hotel alteraram-se, razão pela qual, por não se verificar o requisito da posse pelas requerentes sobre tal edifício, não há justificação para a manutenção da providência decretada relativamente a tal edifício.
-…-”
Pelo exposto, improcede o recurso interposto pela requerida.
#

– Do recurso (apelação) das requerentes:
Neste seu recurso, as requerentes, como se disse, pugnam pela revogação do decidido quanto há sua condenação como litigante de má fé.

Contudo, tendo em conta os factos dados como provados e que foram reapreciados por este Tribunal de Recurso não podemos deixar de acompanhar, uma vez mais, o teor da recorrida decisão, neste particular, e onde se escreve o que se segue:

-…-
Estabelece o artº456º do CPC:
«1. Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.
2. Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão...».

Na versão anterior do Código Processo Civil, entendia-se que a condenação por litigância de má fé pressupunha a existência do dolo, quer substancial directo, quer substancial indirecto ou instrumental, não sendo suficiente a sustentação de teses controvertidas na Doutrina, nem sequer a indagação e interpretação das regras de direito mesmo quando especiosamente feitas. Assim, somente a lide dolosa pressupunha a má fé e não também a lide errada, ainda que ousada, se promovida por quem estava honestamente convencido da razão e da verdade pelo que, quando os autos apenas revelavam que a parte defendia convictamente a sua posição, sem que, em tal actuação, alterasse conscientemente a verdade dos factos ou fizesse do processo um uso manifestamente reprovável, não haveria litigância de má fé.
Porém, com a revisão do Código Processo Civil e a actual redacção do preceito supra citado, passaram a ser punidas, como litigância de má fé, não só as condutas dolosas, mas também as gravemente negligentes.
-…-
Quanto ao âmbito de aplicação das situações agora retratadas como de litigância gravemente negligente ou culposa, na falta de meios auxiliares de interpretação da norma extraídos do próprio diploma, a par dos seus antecedentes históricos e da delimitação dos conceitos de litigância dolosa e de litigância culposa que a doutrina e a jurisprudência foram elaborando, mostra-se adequado e ajustado o recurso suplementar a outros campos do sistema jurídico, a fim de neles encontrar linhas de rumo que ajudem o intérprete nesta primeira fase de aplicação da nova redacção do preceito em causa.
Por outro lado, assinala-se que o preceito em análise trata a má fé sobre dois prismas: a má fé material, que abrange os casos de dedução de pedido ou de oposição cuja falta de fundamento não ignorava ou não devia desconhecer, a alteração da verdade dos factos ou a omissão de factos essenciais e relevantes para a decisão da causa; e a má fé instrumental, que se refere ao uso reprovável do processo ou dos meios processuais, para conseguir um fim ilegal, para impedir a descoberta da verdade, para entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Analisando a conduta processual das requerentes nos presentes autos em face do teor do pedido formulado e, designadamente, dos factos dados, agora, como indiciariamente provados, nomeadamente na parte em que se apurou que as requerentes voluntariamente haviam entregue a obra respeitante ao hotel, perdendo, assim, a posse sobre a mesma, resulta que as requerentes praticaram actos que consubstanciam uma litigância de má fé.
Está, portanto, demonstrado que ao deduzir o pedido do modo como o fez, as requerentes omitiram factos de que não podia ignorar, sendo certo que o fizeram, pelo menos, fazendo uso reprovável dos meios processuais.
Consequentemente, justifica-se a condenação das requerentes como litigantes de má fé, nos termos do art. 456º do CPC e, por via disso, deverão aquelas ser condenadas numa multa cujo valor que se nos afigura adequado é o de 4 (quatro) Uc’s (art. 102º, al. a) do Código das Custas Judiciais).
A tal multa acrescerá uma indemnização, que entendemos adequada e proporcional, correspondente ao reembolso das despesas que a má fé do litigante obrigou à requerida, incluindo-se, apenas, os preparos realizados nos presentes autos.
Posto isto, cumpre fixar a indemnização devida em quantia certa, sendo certo que a mesma é fixada com prudente arbítrio e de acordo com o que parecer razoável e com os elementos carreados para os autos, sem necessidade de elementos de prova irrefutável.
De acordo com os elementos carreados para os autos, afigura-se-nos adequado fixar a indemnização na quantia correspondente ao valor dos preparos realizados nos presentes autos pela requerida.
-…-”
Pelo que fica dito, improcede também o recurso deduzido pelas requerentes.

DECISÃO
- Assim e pelos fundamentos acima explicitados (a que acresce o não atendimento da reclamação da requerida “T” para a Conferência – vide supra ponto 3), os Juízes desta Relação / 1ª secção acordam em julgar improcedentes os recursos interpostos quer pela requerida quer pelas requerentes e consequentemente, mantêm o decidido pelo Tribunal a quo.

Custas pelas apelantes, em relação aos respectivos recursos.
Lisboa, 16-7-09
Afonso Henrique Cabral Ferreira (relator)
Rui Torres Vouga
Maria do Rosário Barbosa