Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | OLINDO GERALDES | ||
Descritores: | ALIMENTOS A FILHO MAIOR ALIMENTOS PROVISÓRIOS PROVIDÊNCIA CAUTELAR TRIBUNAL DE FAMÍLIA COMPETÊNCIA MATERIAL | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/29/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Sumário: | I- É admissível o procedimento cautelar de alimentos provisórios, constante do art. 399.º do CPC, para acudir à situação de necessidade urgente de alimentos a filho maior. II- O tribunal de família é materialmente competente para conhecer dos alimentos provisórios, ainda que a acção de alimentos tenha sido proposta na conservatória do registo civil, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 5.º do DL n.º 272/2001, de 13 de Outubro. ( Da responsabilidade do Relator ) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO A , solteiro, maior, instaurou, em 12 de Julho de 2011, no 3.º Juízo de Família e Menores da Comarca de Lisboa, contra B , procedimento cautelar de alimentos provisórios, pedindo que, a esse título, fosse fixada a quantia mensal de € 500,00. Para tanto, alegou, em breve síntese, ser filho do Requerido e ainda não ter terminado a sua formação escolar/profissional, carecendo de alimentos, que o Requerido está em condições de poder prestar. Liminarmente, foi então proferido despacho nos termos do qual, julgando-se procedente a excepção de incompetência do tribunal, em razão da matéria, se absolveu o Requerido da instância. Inconformado com tal despacho, recorreu o Requerente, que, tendo alegado, formulou essencialmente as seguintes conclusões: a) O Tribunal a quo é o competente para a apreciação do procedimento cautelar de alimentos provisórios a filho maior. b) Com a publicação do DL n.º 272/2001, de 13 de Outubro (com as alterações decorrentes do DL n.º 324/2007, de 28 de Setembro, e da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro), o legislador, ao transferir para as Conservatórias do Registo Civil a competência para o procedimento relativo a pedido de alimentos para filhos maiores, não teve por fim inviabilizar a fixação de alimentos provisórios. c) Nos termos do n.º 1 do art. 399.º do CPC, para que possa ser requerida providência cautelar de fixação de alimentos provisórios apenas se exige que o interessado tenha proposto ou vá propor acção em que, principal ou acessoriamente, peça a prestação de alimentos. d) Tal acção pode ser o procedimento que corre termos na Conservatória, que aí será resolvido em caso de acordo ou remetido ao Tribunal, não sendo obtido o acordo, caso em que se procederá à apensação da providência cautelar à acção de alimentos. e) A decisão recorrida violou, entre outras, as normas conjugadas dos artigos 399.º, n.º 1, e 1412.º, n.º 1, do CPC, 1880.º, 2003.º, 2009.º, n.º 1, alínea c), do Código Civil. Pretende, com o seu provimento, a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que determine o prosseguimento dos autos no Tribunal recorrido. Não há contra-alegações. Cumpre, desde já, apreciar e decidir. Neste recurso, está em discussão apenas a competência material do tribunal de família para conhecer do procedimento cautelar de alimentos provisórios instaurado por filho maior. II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Descrita a dinâmica processual relevante, importa então conhecer do objecto do recurso, definido pelas respectivas conclusões, e cuja questão jurídica emergente acaba de ser especificada. A decisão recorrida declarou a incompetência material do Tribunal, para conhecer do pedido de alimentos provisórios, com o fundamento de que a competência para conhecer dos alimentos a filhos maiores cabe, em regra, às conservatórias do registo civil, considerando ainda que a revogação parcial do art. 1412.º do Código de Processo Civil (CPC) inviabiliza o recurso à providência cautelar de alimentos provisórios. É indiscutível que a competência para conhecer dos alimentos a filhos maiores ou emancipados está atribuída, por regra, às conservatórias do registo civil, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 5.º do DL n.º 272/2001, de 13 de Outubro, inserindo-se a respectiva pretensão num procedimento tendente à formação de acordo das partes. Na verdade, a transferência da competência material neste âmbito, como noutros relativos a relações familiares, que antes cabia exclusivamente aos tribunais judiciais, foi justificada, no preâmbulo do referido diploma legal, apenas “na estrita medida em que se verifique ser a vontade das partes conciliável”, privilegiando-se assim o acordo como forma de solução, reconhecido que, na maioria dos casos, os respectivos processos não consubstanciam “verdadeiros litígios”. Sob esta perspectiva, evidencia-se que não foi propósito do legislador limitar os meios jurisdicionais ao dispor dos interessados, mas apenas o de transferir a competência material nos casos em que era possível proceder à composição do interesse do titular pelas próprias partes. Por efeito do disposto no art. 1412.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), que sobre os alimentos a filhos maiores remete para o regime previsto para os menores (art. 186.º e seguintes da Organização Tutelar de Menores (OTM)), é possível a fixação de alimentos, a título provisório, nos termos do disposto no art. 157.º da OTM., quando na conferência não se chegue a acordo e as necessidades do interessado o justifiquem, nomeadamente numa situação caracterizada como de urgente. Ora, no caso de ter sido deduzido o procedimento para alimentos a filho maior na conservatória do registo civil, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 5.º do DL n.º 272/2001, não é possível a fixação de alimentos, a título provisório, por estes consubstanciarem uma situação de desacordo das partes, contrária ao fim do respectivo procedimento processual. Podendo a duração de tal procedimento vir a chocar com a necessidade urgente dos alimentos, não pode o interessado ser privado de um meio jurisdicional próprio para atender a tal urgência. Nesse caso, devido à existência do procedimento na conservatória do registo civil e não podendo, por isso, instaurar-se o processo previsto no art. 1412.º do CPC, é admissível o uso do procedimento cautelar de alimentos provisórios, constante do art. 399.º do CPC, para acudir à situação de necessidade urgente de alimentos. Neste sentido, decidiu o Tribunal da Relação do Porto, nomeadamente nos acórdãos de 26 de Outubro de 2009 (processo n.º 1038/09.8TMPRT.P1) e 7 de Janeiro de 2010 (processo n.º 1741/09.2TMLSB.P1), ambos acessíveis em www.dgsi.pt. O procedimento cautelar, dependente do processo instaurado na conservatória do registo civil, será depois apensado a este, quando remetido a tribunal, nos termos do art. 8.º do DL n.º 272/2001, o que sucede havendo oposição e constatada a impossibilidade de acordo das partes. No caso presente, como se alega nos autos, foi instaurado o processo na conservatória do registo civil para a fixação dos alimentos ao abrigo do disposto no art. 1880.º do Código Civil (CC) e foi deduzida oposição, mas sem que tivesse sido já constatada a impossibilidade de acordo, a qual, no entanto, se afigura como altamente provável, dada a situação de litígio que tem vindo a opor as partes, como se alude também nos autos, pelo que o processo, mais cedo ou mais tarde, será remetido ao tribunal de família, com competência material para conhecer do pedido. Nestas condições, tendo sido alegada a urgência dos alimentos, podia ter sido deduzido o procedimento cautelar de alimentos provisórios, sendo para o efeito materialmente competente o tribunal de família, já que continua a ter competência para fixar os alimentos devidos a filhos maiores a que se refere o art. 1880.º do CC, designadamente no processo proposto antes na conservatória do registo civil. Por isso, não há fundamento legal para se declarar a incompetência do tribunal em razão da matéria, motivo pelo qual não pode subsistir o despacho recorrido que a declarou, o que impõe a sua revogação, com a substituição por outro, que dê seguimento ao processo, desde que diferente fundamento não obste ao seu prosseguimento. 2.2. Em conclusão, pode extrair-se de mais relevante: I. É admissível o procedimento cautelar de alimentos provisórios, constante do art. 399.º do CPC, para acudir à situação de necessidade urgente de alimentos a filho maior. II. O tribunal de família é materialmente competente para conhecer dos alimentos provisórios, ainda que a acção de alimentos tenha sido proposta na conservatória do registo civil, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 5.º do DL n.º 272/2001, de 13 de Outubro. 2.3. Não tendo as partes dado causa ao recurso, não havendo vencimento e quem do recurso tire proveito, não há lugar ao pagamento de custas – art. 446.º, n.º 1, do CPC. III – DECISÃO Pelo exposto, decide-se: Conceder provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro, para prosseguimento do processo, se a tal nada de diferente obstar. Lisboa, 29 de Setembro de 2011 Olindo dos Santos Geraldes Fátima Galante Manuel José Aguiar Pereira |