Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1130/15.0T8BRR.L1-4
Relator: CELINA NÓBREGA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
PRESTAÇÕES
MODO DE CÁLCULO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/13/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: Para o cálculo das prestações devidas por acidente de trabalho, o conceito de retribuição mensal a que alude o nº 2 do artigo 71º da LAT integra as prestações pagas pelo empregador ao trabalhador com carácter de regularidade, que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, cabendo ao empregador provar que essas atribuições patrimoniais tiveram esse destino, sob pena de serem consideradas retribuição.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
Relatório
Na sequência da não conciliação veio o Sinistrado, AAA, residente no (…), intentar contra XXX S.A., posteriormente denominada BBB, S.A., com sede na (…) Lisboa e CCC, Lda, com sede na (…), acção especial emergente de acidente de trabalho pedindo:
- a fixação de uma IPATH de 25.532 %;
-a condenação das Rés no pagamento da pensão anual a apurar com base na retribuição anual de €12.510,00;
- a condenação da Ré empregadora nos montantes decorrentes da parte do vencimento não transferida a determinar, vencidos, decorrentes de IT´s, no valor de €12.610,40 e na pensão devida por IPATH, a contar da data em que era devido o pagamento acrescido de juros de mora, bem como nos montantes vincendos da pensão por IP, com as actualizações legais, acrescidos dos respectivos juros de mora;
- a condenação das RR a pagar o subsídio de elevada incapacidade, no valor de €5.700,00 (€475,00x 12);
-tudo, acrescido de juros de mora, vencidos a contar da data em que as Rés não procederam ao pagamento das pensões devidas, bem como vincendas.
Invocou para tanto, em resumo, que:
- Nasceu no dia 07.2.1958;
- Trabalhava para a Ré CCC, Lda, desde 24 de Junho de 2014, desempenhando as funções de Motorista de Pesados;
- No dia 05.07.2014, foi vítima de um acidente de trabalho que consistiu em lhe ter caído um combi sobre a perna direita quando descarregava o camião, sendo que as partes estão de acordo com a caracterização deste evento;
- Em consequência do acidente de trabalho sofreu lesões que lhe determinaram incapacidades permanentes e uma incapacidade absoluta para o trabalho habitual, pois sendo motorista de pesados já não pode executar os movimentos necessários ao desempenho dessa profissão;
- Auferia o vencimento mensal de €555,00 x 14, subsídio de almoço no valor de 120,00€ mensais e outros no valor de €285,00 mensais, o que totalizava a retribuição anual de €12.510,00; e
- A empregadora transferiu para a Ré seguradora a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho pelo valor de €10.517,04, sendo com base nesse valor que esta vem procedendo ao pagamento de ITA e IPP.
Requereu, ainda, a fixação de pensão provisória e a realização de Junta Médica.
Citadas, ambas as Rés contestaram invocando em síntese:
A Ré seguradora:
- O valor transferido para a seguradora quanto ao vencimento do Sinistrado é de €10.517,04;
- Não aceita a incapacidade atribuída ao Sinistrado pelo Perito Médico do Tribunal;
- Não aceita os períodos de incapacidade posteriores a 11.03.2015, data da alta;
- O Sinistrado não padece de IPATH, nem tal lhe foi arbitrado pelo Perito Médico, não existindo qualquer impedimento ao exercício da sua profissão; e
- Não há qualquer estribo para o Sinistrado peticionar uma pensão provisória.
Pediu, a final, que a acção seja julgada improcedente com as devidas consequências e requereu a realização de exame por junta médica, apresentando quesitos.
A Ré empregadora:
-À data do acidente tinha a sua responsabilidade transferida para a seguradora até ao limite de €10.517,04, valor da retribuição do Sinistrado, pelo que nada lhe deve;
- Impugna a afirmação do Sinistrado de que a título de “outros” auferia a quantia de €285,00; e
- Não aceita a IPP atribuída no exame médico, pelo que também requer que o Sinistrado seja submetido a Junta Médica;
-Conclui pedindo que a acção seja julgada improcedente e absolvida do pedido.
Foi proferido despacho que fixou uma pensão provisória ao Sinistrado.
Foi proferido despacho saneador que fixou os factos assentes e organizou a base instrutória, bem como ordenou o desdobramento do processo nos termos do artigo 131º n.º 1, al. e) do CPT.
Procedeu-se ao julgamento.
Após, foi elaborada a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo:
“ Com fundamento no exposto, julgando a acção procedente:
1.Fixo em 21,29856% a IPP de que padece o Sinistrado AAA, em consequência do acidente de trabalho objecto dos presentes autos, desde 18.11.2015.
2. Condeno a Entidade Seguradora BBB, S.A., a pagar ao sinistrado o capital de remição, correspondente a 68% da pensão anual de €2.301,20, no valor de €1.564,82 (mil quinhentos e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), com efeitos a partir de 19 de Novembro de 2015, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada, desde essa data até integral e efectivo pagamento;
3. Condeno a Entidade Empregadora, CCC, Lda, a pagar ao sinistrado o capital de remição correspondente a 32% da pensão anual de €2.301,20, no valor de €736,38 /setecentos e trinta e seis euros e trinta e oito cêntimos), com efeitos a partir de 19 de Novembro de 2015, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada, desde essa data até integral e efectivo pagamento;
4. Condeno a Entidade Seguradora BBB, S.A., a pagar ao sinistrado a quantia de €5.288,16 (cinco mil duzentos e oitenta e oito euros e dezasseis cêntimos) correspondente a 68% da indemnização fixada ao sinistrado por ITA no valor de €7.776,70, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada, desde o último dia de cada mês em que era devido o pagamento até integral e efectivo pagamento;
5. Condeno a Entidade Empregadora CCC, Lda, a pagar ao sinistrado a quantia de €2.488,54 (dois mil quatrocentos e oitenta e oito euros e cinquenta e quatro cêntimos) correspondente a 32% da indemnização fixada ao sinistrado por ITA, no valor de €7.776,70, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada, desde o último dia de cada mês em que era devido o pagamento até efectivo e integral pagamento;
6. Condeno a Entidade Seguradora BBB, S.A., a pagar o valor de €30,00 (trinta euros), a título de despesas com transportes do sinistrado e ainda todas as quantias médicas e medicamentosas que o sinistrado comprove junto da seguradora serem devidas em função do sinistro.
Nos termos do art.120º n.º1 do C.P.Trabalho, fixa-se o valor da causa no correspondente à soma das reservas matemáticas da pensão, acrescido da quantia devida a título de indemnização por ITA e das despesas com transportes.
Custas pela Entidade Seguradora e pela Entidade Empregadora na proporção de 68% para a primeira e 32% para a segunda.
Sem custas no que concerne à remição.
Registe e notifique.
Proceda-se, oportunamente, ao cálculo do capital de remição (art.149º do CPT).”
Inconformada com a sentença, a Ré empregadora recorreu formulando as seguintes conclusões:
(…)
Não consta dos autos que tenham sido apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido na espécie, modo de subida e efeito adequados.
Neste Tribunal, a Exm.ª Srª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da sentença ser confirmada
  Notificadas as partes do mencionado parecer, respondeu o Autor, invocando que a sentença aplicou e muito bem o n.º1 do artigo 71º da LAT e que não merece qualquer reparo.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Objecto do recurso
Sendo pacífico que o âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608º nº 2 do CPC), nos presentes autos a única questão a decidir consiste em saber se o Tribunal a quo errou ao contabilizar na retribuição anual do Sinistrado, para efeitos do cálculo da pensão e das indemnizações por ITA, as ajudas de custo e o trabalho suplementar (Sábados, Domingos e Feriados).
Fundamentação de facto
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1- O A. nasceu em 07-02-1958.
2- O A. iniciou a sua actividade, desempenhando as funções de Motorista de Pesados para a 2ª R. CCC Lda., em 24 de Junho de 2014.
3- No dia 05 de Julho de 2014 o A., no exercício das suas funções ao serviço da 2ª R., estava a descarregar o camião quando lhe caiu uma combi sobre a perna direita.
4- Do evento descrito em 3) resultou fractura-luxação exposta do tornozelo direito, com fractura do maléolo externo.
5- O A. recebeu primeiros socorros e tratamentos no Hospital (…)  donde foi transferido para o Hospital (…), onde foi operado.
6- O A. continuou em tratamento nos serviços clínicos da seguradora até 10.03.2015.
7- O A. auferia anualmente:
a) Vencimento base: € 555,00 x 14 meses = € 7.770,00
b) Subsídio de refeição: € 120,00 x 11 meses = € 1.320,00.
8- O A. auferiu em Junho de 2014 a quantia de €58,50 a título de ajudas de custo nacionais e a quantia de €27,75 de subsídio atinente a Sábados, Domingos e Feriados.
9- O A auferiu em Julho de 2014 a quantia de €39,00 a título de ajudas de custo nacionais e a quantia de €27,75 de subsídio atinente a Sábados, Domingos e Feriados.
10- O valor transferido para a seguradora quanto ao vencimento do Sinistrado é de €10.517,04 (dez mil, quinhentos e dezassete euros e quatro cêntimos).
11- À data do evento descrito em 3), a 2.ª Ré tinha a sua responsabilidade transferida para a 1.ª Ré, através da apólice n.º00000948926, na modalidade de prémio variável até ao limite de €10.517,04.
12- O A. verbaliza dores no pé direito, dificuldade na marcha e em conduzir.
13- Ao exame objectivo apresenta limitação dos movimentos de flexão, extensão, inversão e versão.
14- As sequelas indicadas em 13) determinaram ao A. uma IPP de 21,29856% sem IPATH.
15- A consolidação médico-legal das lesões ocorreu em 18-11-2015.
16- O A. esteve com incapacidade temporária absoluta no período temporal compreendido entre 11 de Março de 2015 e 18 de Novembro de 2015.
17- Na tentativa de conciliação realizada em 4 de Abril de 2016, o A. reclamou o pagamento da quantia de €30,00 de despesas com transportes e a R. Seguradora aceitou pagar tal quantia.
18- O trabalho de motorista de pesados implica carga e movimentos das pernas para carregar e descarregar camiões e guiar.
Fundamentação de direito
Apreciemos, então, se o Tribunal a quo errou ao contabilizar na retribuição anual do Sinistrado, para efeitos do cálculo da pensão e das indemnizações por ITA, as ajudas de custo e o trabalho suplementar (Sábados, Domingos e Feriados).
Após considerar que, face à data do acidente, 5 de Julho de 2014, aplicam-se à presente acção as disposições constantes do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02, o qual entrou em vigor em 17 de Fevereiro de 2009 e o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais, aprovado pela Lei n.º 98/2009, de 04/09, que as partes reconheceram estarem perante um típico acidente de trabalho, considerar que o Autor esteve com incapacidade temporária absoluta no período temporal compreendido entre 11/3/2015 e 18/11/2015, fixando-se nesta última data a consolidação médico-legal das lesões do Autor, considerar que no Apenso A foi fixada ao Autor uma IPP de 21,29856, sem IPATH, desde 18-11- 2015 (data da alta) e que esta incapacidade contempla já o factor de bonificação de 1,5 em razão da idade, questões que mereceram a concordância das partes, no que respeita ao valor da retribuição anual do Autor para efeitos do cálculo da pensão e das indemnizações por ITA, pronunciou-se a sentença recorrida nos seguintes termos:
Quanto ao montante da pensão a que o A. tem direito, cumpre fixar o valor da retribuição anual do A. para, em função da mesma proceder ao cálculo da Indemnização por ITA e da pensão a que o A. tem direito, isto porque, nos termos do disposto no art.º 71º n.º 1 da Lei 98/2009, a indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios (n.º 2 do mesmo preceito).
Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de Férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade (n.º 3 do mesmo preceito).
No caso dos autos, resulta desde logo da alegação da 2ª R. vertida no art.º 6º da contestação que a mesma qualificou como retribuição, atento o seu carácter de regularidade, quer as ajudas de custo que pagava ao A., quer os sábados, domingos e feriados (trabalho suplementar), estando descriminadas ambas as rubricas nos recibos de vencimento do A. de fls. 58 e 59.
O que resulta, de igual forma, da análise de tais recibos é que enquanto as ajudas de custo não têm valor fixo (já que para o mesmo período temporal de 6 dias, a R. pagou ao A. no mês de Junho de 2014 a quantia de €58,50 e no mês de Julho pagou a quantia de €39,00), a retribuição por trabalho suplementar tem valor fixo (em ambos os meses a 2ª R. pagou ao A. a quantia mensal de €27,75).
Em conformidade, e considerando que as ajudas de custo e o trabalho suplementar devem ser contabilizados na retribuição anual do A., com base na qual serão fixadas a indemnização por ITA e a pensão, temos que para a retribuição variável (ajudas de custo), a mesma terá que ser calculada nos termos previstos no art.º 261 n.º 3 do CT, ou seja, para determinar o valor da retribuição variável, quando não seja aplicável o respectivo critério, considera-se a média dos montantes das prestações correspondentes aos últimos 12 meses, ou ao tempo de execução de contrato que tenha durado menos tempo.
Em conformidade, o valor anual das ajudas de custo a atender para o efeito da quantificação da retribuição anual do A. é o valor de €4.680,00 calculado nos seguintes termos: [(58,50 : 6 x 30) + (39,00 : 6 x 30) : 2] x 12.
Já o valor anual do trabalho suplementar, porque fixo, corresponde à quantia de €1.665,00, calculada da seguinte forma: (27,75 : 6 x 30) x 12.
Do exposto resulta que o A. auferia anualmente a quantia de €15.435,00, calculada nos seguintes termos:
Vencimento base: €555,00 x 14 = €7.770,00
Subsídio de refeição: €120,00 x 11 = €1.320,00
Outros (Sábados, Domingos, Feriados e Ajudas de Custo): €6.345,00.
Por conseguinte, auferindo o A. uma retribuição anual de €15.435,00, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 3º, 7º, 8º, 10º, 23º, 25º, 48º/2 e 3c), 50º, 71º, 72º, 73º e 75º da Lei nº98/2009, é-lhe devido, por força da IPP 21,29856% de que é portador, o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €2.301,20 [€15.435,00 x 0,7 x 0,2129856], com efeitos a partir de 19-11-2015 (dia seguinte à alta).
É ainda devida ao Sinistrado, nos termos dos arts. 3º, 7º, 8º, 10º, 23º, 48º, n.º1 e 3d), 50º, 71º, 72º, e 73º, Lei nº98/2009, por força da ITA de 11 de Março de 2015 a 18 de Novembro de 2015, a quantia de €7.776,70 [(€15.435,00 : 365) x 0,70 x 117dias + (€15.435,00 : 365) x 0,75 x 136dias].
Considerando que, de acordo com a factualidade provada à data do acidente a 2.ª Ré tinha a sua responsabilidade transferida para a 1.ª Ré, através da apólice n.º00000948926, na modalidade de prémio variável até ao limite de €10.517,04, é a 2ª R. responsável pelo pagamento ao A. da indemnização e da pensão em função da percentagem da retribuição não transferida, de acordo com o preceituado no art.º 79º n.ºs 4 e 5 da Lei 98/2009.
A proporção da responsabilidade de cada uma das RR. corresponde a 68% para a R. Seguradora e 32% para a R. Entidade Empregadora.
A tais quantias acrescem juros de mora desde a data de vencimento das obrigações, até integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada – art. 135º do C.P.Trabalho e arts. 50º/1 e 75º/1 da Lei nº98/2009, e Port. nº291/2003, 08/04.”
Insurge-se a Recorrente contra o entendimento do Tribunal a quo sustentando, em resumo, que o trabalho prestado em sábados domingos e feriados e o valor correspondente às ajudas de custo, não se incluem no conceito de retribuição base e que, por esse motivo, o Tribunal a quo deveria ter apurado se os montantes correspondentes aos mesmos correspondem a prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, ao trabalhador, o que não sucedeu, que o trabalho suplementar realizado em dias de descanso semanal, sábados domingos e feriados, quer pela sua natureza, quer pelas limitações legais decorrentes do número de horas em que é permitido, reveste um carácter extraordinário, uma vez que executado fora do horário de trabalho, não representa a sua retribuição normal para efeitos de cálculo de indemnização e o mesmo sucede quanto ao valor pago a título de ajudas de custo, incumbia ao Tribunal a quo, apurar de acordo com o seu prudente arbítrio, se o valor correspondente ao trabalho prestado em sábados domingos e feriados, revestia carácter de regularidade, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados, a categoria profissional do sinistrado e os usos, uma vez que não era possível apurar a média das retribuições auferidas pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente e o mesmo raciocínio teria de ser feito no que respeita ao valor pago ao sinistrado a título de ajudas de custo, pois o pagamento das mesmas justifica-se por estar relacionado com despesas ou encargos que o trabalhador tem de suportar por causa do seu trabalho e, portanto, em favor da entidade patronal, tendo natureza compensatória e não remuneratória, razão pela qual, só excepcionalmente tais prestações revestirão carácter retributivo, mas para o efeito torna-se necessário que excedam as despesas normais, o Tribunal a quo, não poderia assumir que a Ré Entidade Empregadora iria infringir a lei, praticando uma contraordenação grave, só para alcançar a conclusão de que o trabalho suplementar realizado pelo Autor naquele período de tempo específico se iria repetir em todos os dias de descanso semanal, o trabalho suplementar em causa respeita ao trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriados, (sábados, domingos e feriados) e assim sendo o Tribunal a quo, ao efectuar o cálculo nos termos em que o fez, (27.75:6x30) x 12, está a presumir que o sinistrado, nos dez meses seguintes iria trabalhar por mês, cinco dias de descanso semanal e a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, nem sequer permite concluir que iria ser realizado trabalho suplementar nos referidos dias ao longo da relação laboral e que o valor pago a título de ajudas de custo integram o conceito de retribuição.
Vejamos:
No caso, trata-se de saber se as prestações por trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados (trabalho suplementar) e as denominadas ajudas de custo, devem ser contabilizadas na retribuição anual do sinistrado para efeitos do cálculo da pensão e das indemnizações por ITA.
Ora, tendo o acidente dos autos ocorrido no dia 5 de Julho de 2014, como bem entendeu a sentença recorrida, é-lhe aplicável a Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro (LAT) que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2010 (cfr.art.188º), bem como o Código do Trabalho aprovado pela Lei nº7/2009, de 12 de Fevereiro, que entrou em vigor no dia 17 do mesmo mês e ano.
Dispõe o artigo 258º do CT/2009:
1- Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do trabalho.
2- A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3- Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
(…).” 
Por seu turno, determina a al.a) do nº 1 do artigo 260º do CT que “ Não se consideram retribuição, as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador.”
Por sua banda, o artigo 71º da LAT, que corresponde ao anterior artigo 26 º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, sobre o cálculo das prestações devidas por acidente de trabalho dispõe do seguinte modo:
“1- A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
2- Entende-se por retribuição mensal, todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
3- Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
(…)”.
Sobre o conceito de retribuição anual a que alude esta norma escreve-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.03.2014, in www.dgsi.pt, cujo entendimento temos perfilhado: “1. Da conjugação do n.º2 do artigo 71º da nova LAT e do artigo 258º do Código do Trabalho, resulta que o conceito de retribuição, para efeitos de acidente de trabalho, alarga-se a todas as prestações recebidas com carácter de regularidade, mesmo que estas, face à lei geral, não revistam natureza retributiva, e desde que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
(…)”.
Também sobre o conceito de retribuição a atender e versando sobre as ajudas de custo, afirma-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.11.2009, in www.dgsi.pt, que, embora se reporte ao artigo 26º da anterior LAT, mantém actualidade:“1. Nos termos do art. 26 nº3 da Lei dos Acidentes de Trabalho entende-se por retribuição tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
2. Têm a característica de custos aleatórios as importâncias que, apesar de pagas regularmente, se destinam a satisfazer despesas feitas ou a fazer pelo trabalhador por razões ligadas à prestação de trabalho, representando apenas o reembolso delas e não um efectivo acréscimo de rendimento do trabalho. Englobam-se nesta categoria as ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte e abonos de instalação e outros equivalentes, como se refere no art. 260º nº1 do Código do Trabalho de 2003.
3. Segundo o art. 249º nº3 do Código do Trabalho de 2003 até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador, pelo que cabe ao empregador fazer prova de que as quantias que paga mensalmente ao trabalhador, a título de ajudas de custo, constituem verdadeiras ajudas de custo, ou seja, que se destinam a ressarcir o trabalhador de despesas efectuadas ao serviço ou no interesse da empresa.”
Ainda com interesse, veja-se o Acórdão deste Tribunal e Secção de 08.09.2010, igual pesquisa, segundo o qual “I - Ao mandar atender no cálculo das indemnizações e pensões por acidente de trabalho a “todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”, o nº 3 do art. 26.º da LAT/97, acaba por remeter para o critério constante do art. 249.º do Cód. Trab., que associa três aspectos: a obrigatoriedade do pagamento, fundamentada normativa ou contratualmente; a co-respectividade com a efectiva prestação do trabalho e a regularidade e periodicidade do pagamento.
II - Cabe à entidade empregadora, nos termos dos arts. 344.º, nº 1 e 350.º, nº 1 do Cód. Civil, provar que a atribuição patrimonial por ela feita ao trabalhador reveste a natureza de ajudas de custo, sob pena de não lhe aproveitar a previsão do art. 260.º do Cód. Trab. e de valer a presunção do nº 3 do art. 249.º do Cód. Trab. de que se está perante prestação com natureza retributiva.
III – Tal ónus não fica satisfeito se apenas se prova que determinadas quantias eram processadas nos recibos de vencimento a título de ajudas de custo, uma vez que daí não resulta que tivessem efectivamente essa natureza - os recibos de vencimento não fazem prova plena da veracidade das declarações neles emitidas pelo empregador e também não existe qualquer presunção legal nesse sentido.
IV - Não estando provada a causa concreta dos pagamentos referidos como “ajudas de custo”, cai-se, por isso, na previsão do nº 3 do art. 26.º da LAT97, por força da presunção, não ilidida pela entidade empregadora, do nº 3 do art. 249.º do Cód. Trab., sendo, por isso, de considerar, que tais verbas entram na noção de retribuição auferida pelo trabalhador e, consequentemente, no cálculo das prestações infortunísticas a que este tem direito”.
Mais recentemente veja-se, ainda, o Acórdão deste Tribunal e Secção de 9.5.2018, in www.dgsi.pt, em cujo sumário se escreve:
I – A LAT de 2009 deixou de fazer remissão para os critérios da retribuição da lei geral, mas continua a conferir especial atenção ao elemento da regularidade no pagamento.
II – E exceptua do conceito as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, pois que não se traduzem num ganho efectivo para o trabalhador.
III – Cabe ao empregador o ónus de alegar e provar a natureza compensatória de custos aleatórios dos valores regularmente pagos, como facto impeditivo do direito do sinistrado.”
Em suma, podemos assentar que, face ao disposto no nº 2 do artigo 71º da LAT e do artigo 258º do CT/2009, para efeitos de acidente de trabalho, integram o conceito de retribuição mensal todas as prestações pagas pelo empregador ao trabalhador com carácter de regularidade, que não se destinem a compensar custos aleatórios, cabendo ao empregador provar que as atribuições patrimoniais feitas ao trabalhador, a título de ajudas de custo, constituem verdadeiras despesas feitas ao serviço do empregador ou da empresa, sob pena de, não o fazendo, não ser aplicável o disposto no artigo 260º do CT e operar a presunção a que alude o nº 3 do artigo 258º do mesmo Código, devendo, assim, tais prestações ser consideradas como integrando a retribuição.
Dito de outra forma, para o cálculo das prestações devidas por acidente de trabalho, o conceito de retribuição mensal a que alude o nº 2 do artigo 71º da LAT integra as prestações pagas pelo empregador ao trabalhador com carácter de regularidade, que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, cabendo ao empregador provar que essas atribuições patrimoniais tiveram esse destino, sob pena de serem consideradas retribuição.
Regressando ao caso, constatamos que ficou provado que: o Autor iniciou as suas funções de Motorista de Pesados para a 2ª Ré CCC, Lda, em 24 de Junho de 2014 (ponto 2 dos factos provados); o Autor auferia anualmente: a) Vencimento base:€555,00 x 14 meses = €7770,00; b) Subsídio de refeição:€120,00 x 11 meses = €1.320,00 (ponto 7 dos factos provados); O Autor auferiu em Junho de 2014 a quantia de €58,50 a título de ajudas de custo nacionais e a quantia de €27,75 de subsídio atinente a Sábados, Domingos e Feriados (ponto 8 dos factos provados); O autor auferiu em Julho de 2014 a quantia de €39,00, a título de ajudas de custo nacionais e a quantia de €27,75 de subsídio atinente a Sábados, Domingos e Feriados (ponto 9 dos factos provados); e o valor transferido para a Seguradora quanto ao vencimento do Sinistrado é de €10.517,04 (ponto 10 dos factos provados.
Ora, quanto às prestações pagas ao Sinistrado por ter trabalhado aos Sábados, Domingos e Feriados (trabalho suplementar), não logrou a Empregadora provar que o seu pagamento teve uma causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho, ou que se destinava a compensar o sinistrado por custos aleatórios, donde aquelas quantias consideram-se integrando a retribuição do Sinistrado.
Mais, a Ré empregadora não provou que o trabalho aos Sábados Domingos e Feriados foi meramente esporádico, sabendo-se, sim, que foi prestado no mês de Junho e de Julho de 2014, meses em que o Sinistrado trabalhou para a Ré antes do acidente.
Por outro lado e no que respeita às ajudas de custo, também ressalta que a Recorrente não provou a causa concreta desses pagamentos. Ou seja, não provou a Recorrente que tais montantes foram pagos, apenas e tão só, para compensar o Sinistrado por despesas efectuadas com deslocações, ou por despesas feitas ao seu serviço, ou seja, por custos aleatórios.
E não o tendo feito, torna-se inaplicável ao caso o disposto no artigo 260º do CT/2009, pelo que, face ao disposto nos artigos 258º nº 3 do CT/2009 e 71º nº 2 da LAT, tais atribuições patrimoniais deverão ser consideradas retribuição e integrar o cálculo das indemnizações e da pensão, como entendeu a sentença recorrida.
Acresce que, como também refere a sentença recorrida, “ resulta desde logo da alegação da 2ª R. vertida no art.º 6º da contestação que a mesma qualificou como retribuição, atento o seu carácter de regularidade, quer as ajudas de custo que pagava ao A., quer os sábados, domingos e feriados (trabalho suplementar), estando descriminadas ambas as rubricas nos recibos de vencimento do A. de fls. 58 e 59.”
Mas a Recorrente ainda sustenta que incumbia ao Tribunal a quo apurar de acordo com o seu prudente arbítrio, se o valor do trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como as ajudas de custo revestiam carácter de regularidade, uma vez que não era possível apurar a média das retribuições auferidas no período de um ano anterior ao acidente.
Ora, uma vez que ficou provado que o Autor foi admitido na Ré no dia 24 de Junho de 2014 e que o acidente ocorreu no dia 5 de Julho de 2014, isto é, 12 dias após ter sido admitido na Ré, obviamente que, no caso, a regularidade a que aludem os nºs 2 e 3 do artigo 71º da LAT não poderá ser aferida à luz do entendimento que vem sendo defendido pela jurisprudência para outros casos, no sentido de que é regular a prestação paga nos onze meses de actividade do ano.
Com efeito, no caso, a regularidade das ditas prestações decorre da simples circunstância de que foram pagas em todos os meses em que o Sinistrado trabalhou para a Ré, isto é, no mês da admissão e no mês em que ocorreu o acidente de trabalho; e para este efeito, mais não é exigível.
Assim, tendo o Sinistrado auferido montantes a título de ajudas de custo e de trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados, quer em Junho, quer em Julho, é de concluir que essas prestações revestem carácter de regularidade, incumbindo à Ré empregadora provar que se tratou de uma situação meramente ocasional, o que não sucedeu.
 E a tal também não obsta o facto de as prestações não terem sempre o mesmo valor, como sucede com as ajudas de custo, que em Julho de 2014 foram em valor inferior às auferidas no mês anterior.
Por fim, salvo o devido respeito, não se compreende a afirmação da Recorrente relativamente às ajudas de custo quando afirma que “o Tribunal a quo, ao efectuar o cálculo nos termos em que o fez, (27.75:6x30) x 12, está a presumir que o sinistrado, nos dez meses seguintes iria trabalhar por mês, cinco dias de descanso semanal”, sendo certo que o Tribunal a quo limitou-se a determinar o valor da retribuição variável nos termos do nº 3 do artigo 261º do CT.
Por fim, uma vez que a Recorrente não pôs em causa os cálculos efectuados pelo Tribunal a quo a fim de obter as prestações devidas ao Sinistrado (pensão e indemnização por Incapacidades Temporárias), não aceitando apenas que as ajudas de custo e o trabalho suplementar devam integrar aqueles cálculos, entendimento que não merece provimento, deverá a apelação ser julgada improcedente em toda a sua extensão, confirmando-se a sentença recorrida.
Considerando o disposto no artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC, as custas são da responsabilidade da Recorrente.Decisão
Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal e Secção em julgar a apelação improcedente e confirmam a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2019

Maria Celina de Jesus de Nóbrega
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Maria Paula Moreira Sá Fernandes