Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JORGE LEAL | ||
Descritores: | APENSAÇÃO DE PROCESSOS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/15/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | PROVIDO | ||
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Sumário: | Se o requerimento de apensação de dois processos ao abrigo do disposto no artigo 275º do Código de Processo Civil for indeferido porque o estado do processo ou outra razão especial torna inconveniente a apensação (nº 1, parte final, do art.º 275º) e entretanto esse obstáculo for removido ou deixar de se verificar, nada obstará a que a pretensão de apensação, atendendo aliás às vantagens de economia processual que o preceito tem em vista, seja de novo reapreciada. (JL) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO 1. Em 03.7.2002 M intentou na comarca de Amadora acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra I, D, A e R. Alegou que no dia 12.12.1999 um seu automóvel (com a matrícula JN) foi alvo de colisão por parte de um motociclo (com a matrícula MB) que era conduzido pelo Réu R, que o fazia no interesse e sob as ordens do Réu A. Este alegadamente havia adquirido o motociclo ao Réu D, em cujo nome, porém, o motociclo ainda estava registado. A responsabilidade civil automóvel decorrente da utilização do motociclo não estava transferida para qualquer seguradora. O acidente deveu-se a culpa exclusiva do Réu R. O A. terminou pedindo que os Réus sejam condenados a pagarem-lhe a quantia de € 5 454,23, a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros legais. 2. A acção foi distribuída ao 3º Juízo Cível da comarca da Amadora, com o nº 3. Todos os RR. contestaram, tendo o Réu R alegado que o acidente em causa se deveu a culpa exclusiva do condutor do veículo de matrícula JN, R, que actuava por ordem e no interesse do Autor. O Réu R concluiu pela sua absolvição do pedido. 4. Em 24.10.2002 o referido Réu R propôs na comarca da Amadora acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Companhia de Seguros, S.A., Fundo de Garantia Automóvel, M e R. O aí A. alegou que em virtude do acidente supra descrito, imputável a culpa exclusiva do R. R, sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais por cujo ressarcimento é responsável a 1ª Ré, para quem o dono do veículo de matrícula JN, o 3º Réu, havia transferido a respectiva responsabilidade civil automóvel. Subsidiariamente, para o caso de ficar demonstrado, conforme alega a seguradora, que o contrato de seguro não se encontrava válido à data do acidente, demanda os 2º a 4º RR., que serão solidariamente responsáveis pelo pagamento da quantia de € 156 513,43 e respectivos juros, valor em que liquida a indemnização. 5. A acção em causa foi distribuída ao 1º Juízo Cível da comarca de Amadora, com o nº . 6. Em 16.12.2003 o R. R requereu, no processo nº pendente no 3º Juízo Cível da Amadora, que o processo , pendente no 1º Juízo Cível da Amadora, fosse apenso àqueles autos, na medida em que a causa de pedir de um e outro processo eram o mesmo acidente de viação e que os processos se encontravam na fase prévia à condensação, pelo que se verificavam todos os pressupostos do artigo 275º do Código de Processo Civil. 7. Em 11.02.2005 o Sr. Juiz titular do processo nº , em virtude de a forma desse processo ser a sumária e a da outra acção ter a forma ordinária, decidiu-se pela apensação do processo nº à acção nº ordenando a sua remessa para o efeito. 8. A Sr.ª Juíza do 1º Juízo, após considerar que nos termos do artigo 275º, nº 3, do Código de Processo Civil, a apensação lhe deveria ser requerida, que dadas as fases processuais em que os autos se encontravam era inconveniente a apensação e que o despacho do juiz do 3º Juízo não tinha transitado em julgado por falta de notificação do Ministério Público, declarou-se incompetente para conhecer da acção nº e determinou a sua desapensação e remessa após trânsito ao 3º Juízo Cível. 9. O A. Rui Jorge agravou desse despacho e em 02.3.2006 a Relação de Lisboa julgou o recurso improcedente, mantendo o despacho recorrido. 10. Posteriormente, em data não documentada nestes autos de recurso, o A. Rui Jorge requereu, no processo nº , pendente no 1º Juízo Cível da comarca da Amadora, a apensação do processo nº , do 3º Juízo daquele tribunal, ao processo . 11. Em 15.11.2006 o Mmº juiz do 1º Juízo Cível proferiu o seguinte despacho: “(…) Por despacho de fls 217, proferido já no 1º juízo, foi determinada a desapensação do processo nº e a sua devolução ao 3º juízo. Tal despacho foi objecto de recurso e veio a ser confirmado por Acórdão da Relação de Lisboa de fls. 249. Ora, já tendo sido requerida a apensação e já se tendo o tribunal pronunciado no sentido de que a mesma não deve ser determinada não pode novamente a mesma parte vir requerer, ainda que agora no processo do 1º juízo, que se proceda à apensação. Face ao exposto, indefiro o pedido de apensação formulado a fls 235.” 12. O A. R agravou deste despacho, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: a) A decisão sobre a apensação ou não de acções depende de critérios de oportunidade e de conveniência, os quais variam ao longo do normal desenrolar dos processos. b) Por essa razão, a decisão que em determinado momento indefira a apensação por a considerar inoportuna ou inconveniente não faz caso julgado, podendo a mesma apensação ser ordenada posteriormente desde que se verifiquem os requisitos de oportunidade e de conveniência. c) No caso concreto, o facto jurídico que serve de causa de pedir a ambas as acções é o mesmo, pelo que sempre seria admissível a coligação de AA. ou de RR. ou a dedução de pedido reconvencional em qualquer das acções. d) Ambas as acções se encontram em fase de instrução e, portanto, na mesma fase processual. e) O interesse principal a salvaguardar com a apensação de acções é o da certeza ou segurança jurídicas, no sentido de não serem produzidas decisões diferentes sobre os mesmos factos, pelo que é oportuno e conveniente apensar as acções, consabido que se encontram ambas em fase de instrução. f) Foram violadas as normas dos arts. 30°, 274°, 275° e 672° do C.P.C. O agravante termina pedindo que o despacho recorrido seja revogado e substituído por decisão que ordene a apensação das acções. 13. O tribunal a quo sustentou a decisão recorrida. 14. Não houve contra-alegações. 15. Foram colhidos os vistos legais. II - FUNDAMENTAÇÃO 1. As questões a apreciar neste recurso são as seguintes: se existe caso julgado quanto à pretendida apensação; se, no caso de resposta negativa a essa questão, se se verificam os pressupostos da apensação requerida. 2. Além do já supra descrito no Relatório, haverá que atentar no seguinte circunstancialismo: 2.1. No supra referido acórdão de 02.3.2006 a Relação de Lisboa manteve o despacho recorrido com base, essencialmente e com relevo para estes autos, na seguinte fundamentação: a) Ambas as acções poderiam e deveriam ter sido apensas, já que na altura em que tal foi requerido pelo agravante, ambas se encontravam na mesma fase, ou seja, em nenhuma delas havia ainda sido proferido despacho saneador; b) Porém, a acção nº , do 1º Juízo Cível, teve um desenvolvimento mais célere, atingindo, entretanto, a fase de instrução e julgamento, desconhecendo-se o seu estado actual, podendo até, inclusive, ter sido ali proferida sentença; c) Por seu turno a acção nº , do 3º Juízo Cível, ainda não tem despacho saneador. 2.2. Em 16.12.2004 o processo nº , do 1º Juízo Cível, aguardava relatório médico realizado ao autor pelo IML, com vista à resposta à matéria dos artigos 10º a 15º A e 19º da base instrutória do despacho saneador. 2.3. Actualmente o referido processo nº , do 1º Juízo Cível, continua a aguardar o relatório médico supra referido em 2.2.. 2.4. O processo nº , do 3º Juízo Cível, encontra-se a aguardar a tramitação de recurso de agravo interposto pelo aí Réu R, a que foi atribuído modo de subida imediata, em separado e com efeito devolutivo, após o que, conforme despacho proferido em 22.01.2007, os autos deverão ser concluídos a fim de ser designada data de julgamento. 3. O Direito 3.1. Primeira questão (caso julgado) A excepção de caso julgado tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (nº 2 do artigo 497º do Código de Processo Civil). Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumprir-se-á a que passou em julgado em primeiro lugar (nº 1 do art.º 675º do Código de Processo Civil). O mesmo princípio se aplica à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual (nº 2 do artigo 675º do Código de Processo Civil). Porém, e conforme princípio expresso a respeito da sentença, o caso julgado contém-se dentro dos precisos limites e termos em que se julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique (art.º 673º do Código de Processo Civil). Igualmente, ao nível de despachos respeitantes à relação processual, se o requerimento de apensação de dois processos ao abrigo do disposto no artigo 275º do Código de Processo Civil for indeferido porque o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação (nº 1, parte final, do art.º 275º) e entretanto esse obstáculo for removido ou deixar de se verificar, nada obstará a que a pretensão de apensação, atendendo aliás às vantagens de economia processual que o preceito tem em vista (cfr., por todos, Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado, volume 1º, Coimbra Editora, 1999, pág. 492), seja de novo reapreciada. Conclui-se que a decisão já anteriormente proferida sobre a apensação dos dois processos não obsta à dedução e apreciação de nova pretensão, baseada na alteração das circunstâncias que motivaram a decisão anterior. 3.2. Segunda questão (pressupostos da apensação) Tal como foi expressamente ajuizado pelo 3º Juízo Cível e por esta Relação e, implicitamente, pelo 1º Juízo Cível, entre ambas as acções existe um nexo que permite, desde que a tal não obstem outros pressupostos, a apensação dos dois processos. Desde logo, o pedido deduzido pelo A. R no processo pendente no 1º Juízo Cível podia ser formulado em reconvenção no processo intentado no 3º Juízo Cível (artigos 274º nº 2 alínea a) e 275º nº 1 do Código de Processo Civil). Por outro lado, todos esses tribunais aceitam que a apensação, a ocorrer, deveria fazer-se ao processo nº , do 1º Juízo Cível, uma vez que, tendo este processo a forma ordinária, o correspondente julgamento caberá ou ao tribunal colectivo, com intervenção dos juízes do círculo da Amadora, ou em singular, a um dos juízos do círculo (artigos 646º nº 1 e nº 5 do Código de Processo Civil, 105º nº 2 e 107º nº 1 alínea a) da LOFTJ) – assim se aplicando o princípio que subjaz ao disposto na parte final do nº 2 do artigo 275º do Código de Processo Civil, nos termos do qual se alguma das causas pender em tribunal de círculo, a ela apensar-se-á as que corram em tribunal singular. Resta verificar se o estado dos processos ou outra razão especial torna inconveniente a apensação (nº 1 do artigo 275 do Código de Processo Civil). Ora, constata-se que, decorridos quase três anos, o processo nº , do 1º Juízo Cível, continua a aguardar a realização de uma perícia (exame médico ao Autor), enquanto o processo nº , do 3º Juízo Cível, encontra-se na iminência da realização da audiência de julgamento. Ou seja, este último processo “ultrapassou” aquele, justificando-se a aplicação à situação actual das considerações que motivaram a improcedência da primeira iniciativa de apensação formalizada pelo ora agravante. III - DECISÃO Pelo exposto, julga-se o agravo improcedente e consequentemente mantém-se a decisão recorrida. Custas pelo agravante, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia. Lisboa, 15.11.2007 Jorge Leal Nelson Borges Carneiro Américo Marcelino |