Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8950/2007-2
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: SUBSTITUIÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/24/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: AGRAVO PROVIDO E ANULADO O PROCESSADO
Sumário: I - O artigo 715º do CPCivil, ao prever a regra da substituição ao Tribunal recorrido, pressupõe que o processo, sem embargo da nulidade cometida, contém todos os elementos para decidir.
II - Se por via da nulidade, isso não acontecer, vg, por existir matéria controvertida não considerada pelo Tribunal recorrido, o Tribunal de recurso não deverá conhecer do mérito da causa, apenas lhe sendo licito anular a sentença.
(APB)
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA


I J, intentou acção declarativa com processo ordinário contra BANCO (…), SA, pedindo a condenação deste no pagamento da quatia de € 50.149, 33, acrescida dos juros à taxa legal desde a citação e até integral pagamento, montante este devido a titulo de indemnização pelos danos materiais e morais causados com a sua actuação que considera como de má fé. alegando para tanto e em síntese que é co titular com sua mulher de uma conta na agência de Loures do BANCO e a certa altura sem qualquer justificação o Réu apreendeu-lhe o cartão de crédito e não obstante o Autor oferecesse garantias reais o Réu recusou-lhe o cartão de crédito e deixou de imprimir e de lhe entregar os módulos de cheque para que este pudesse movimentar normalmente a sua conta sem que alguma vez o Réu tenha rescindido a convenção do uso de cheque com qualquer dos titulares da conta em causa, tendo com tal comportamento estrangulado financeiramente o Autor.

O Réu contestou a acção, tendo junto documentos com aquele articulado e concluindo pela sua improcedência e condenação do Autor como litigante de má fé.

O Autor, na sequência da contestação veio impugnar os documentos juntos e responder ao pedido de condenação como litigante de má fé, resposta essa que o Tribunal interpretou como sendo «réplica», inadmissivel in casu, e ordenou o seu desentranhamento, por despacho de fls 172, do qual, inconformado recorreu o Autor, recurso esse que veio posteriormente a ser admitido por via da reclamação interposta por aquele, já que, o despacho de fls 188 não havia admitido tal recurso, porque entendeu tratar-se de um despacho de mero expediente (sem embargo de tal recurso já ter sido objecto de admissão pelo despacho de fls 283, veio a ser objecto de novo recebimento a fls 506).


Em sede de recurso de Agravo, apresentou o Autor as seguintes conclusões:
- A adição de documentos, em articulado derradeiro, comporta a sua notifi­cação à parte contrária nos termos do art° 526° e para os efeitos previstos nos art° 544° e seguintes, se não houver lugar ao procedimento previsto no art° 543°, todos estes do C.P.C.;
- Por conseguinte resultam violados tais dispositivos na douta decisão aqui sindicada;
- Toda a matéria consubstanciadora de litigância de má-fé de uma das partes carece de defesa, ao abrigo dos Imperativos constitucionais constantes nos Art° 20°, n.°1, 4 e 5 e art° 26°, n.° 1, ambos da Constituição da República Portuguesa transpostos para o principio geral de direito, designado, e bem, como contraditório;
- Tanto assim que lhe cabe sempre recurso, ainda que este, segundo o valor pudesse ser inadmissível, como repercutido no n.° 3 do art° 467° do C.P.C.;
- Imperativos constitucionais e dispositivos legais violados com a inadmissão da defesa do aqui agravante;
- Assim, a decisão recorrida carece de desagravo, de ser revogada e substi­tuída por outra que admita a defesa integral do agravante quer em matéria de impugnação documental, quer no que concerne à sua defesa da acusa­ção de litigar de má-fé ;
- Com todas as legais consequências no decurso da causa sub judice e neces­sária decisão judicial, se esta tiver lugar antes da superior determinação aqui requerida;
- Sob pena de violação dos imperativos constitucionais supra referidos, que aqui se argui para os legais efeitos.

Foram apresentadas contra alegações e não obstante tivesse sido ordenada a subida do recurso, em separado, e com efeito devolutivo, o mesmo ficou retido nos autos.

A final foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, da qual, inconformado recorreu o Autor, apresentando as seguintes conclusões:
- O tribunal efectuou uma errada interpretação da vasta prova documental carreada aos autos, não atendendo sequer à maioria desses documentos, como vem expresso em sede de fundamentação às respostas inquisitórias, desateis­dimento este que viola claramente o dever do tribunal “(…) tomar em consideração todas as provas produzidas (..)” emergente, com carácter imperati­vo, do art 515° do C.P.C..
- Por outro lado, na apreciação e valoração da prova atendida não se tiveram em atenção as relevantes e indispensáveis regras da experiência comum do normal e abstracto cidadão, o que se imporia in casu por se estar perante um litígio entre com uma instituição bancária, sujeita a especiais deveres de sigilo e, por isso, com particular dificuldade na prova testemunhal.
- É assim que merece critica, respeitosa, mas severa, a solução encontrada para as respostas dadas a alguns dos quesitos, contrariadas pela prova documental constante nos autos e, nalguns casos, complementada pelos depoimentos tes­temunhais, sempre sem olvidar as referidas regras da experiência comum.
- Assim, e desde logo, mostra-se em falta a alínea acrescentada com a matéria pretendida pelo Réu em consequência da reclamação que apresentou, o que foi deferida no ponto 6 do despacho de 19.11.04.
- E a resposta ao Q. 2° terá que ser alterada para provado, pois do documento de fls. 28, devidamente conectado com a certidão de fls. 306 a 308 e a matéria assente na alínea F), resulta prova bastante de que o recorrente ofereceu um imóvel como garantia real a um novo crédito que solicitou ao recorrido.
- Já a matéria do Q. 4° deve também ela ser dada como assente por provada in totum, pois que a confissão do recorrido expressa a artigo 22° da sua douta contestação, a matéria assente sob a alínea D) e o teor do documento emitido pelo Banco de Portugal, a fls. 38 dos autos, o impõe.
- Outrossim, no que respeita ao Q. 5° pois que resulta insofismável as dificulda­des criadas pelo recorrido ao recorrente com a apreensão do cartão de débito e da recusa em entregar cheques, e os consequentes prejuízos, através do teor das declarações fiscais de fls. 29 e 40, confirmadas pela certidão fiscal de fls. 340 a 344 e pelos testemunhos de M, F e M T, bem como das mais elementares regras da experiência comum
- Também a resposta ao Q. 6° não poderá deixar de ser integralmente positiva por via da vasta prova emergente da certidão judicial de fls. 349, onde se encontra a petição de execução hipotecária com data de entrada em juízo coin­cidente com a ordem de pagamento constante no fax de fls. 63 e do depósito provado com o talão respectivo a fls. 62 e lançado no extracto de conta a fls. 64 e 65, estando as negociações, que precederam e decorriam, provadas a fls. 28 e 29, conjunto probatório que não foi considerado na sentença ora criticada.
- Já a resposta dada ao Q. 7° se mostra também incompleta no que tange à fina­lidade do crédito hipotecário sub judice pois que o teor dos documentos de fls. 16 a 21, 48, 49 e 52 demonstram à saciedade que ele se destinava a financiar a aquisição de um outro prédio sito em Evora.
- Também o Q. 10º merece resposta afirmativa pela simples verificação das datas dos documentos de fls. 207 a 222, onde se constata um início das irregu­laridades com cheques em 1999.06.04 até 1999.08.04, mostrando-se a fls. 139 o lançamento do preço do último livro de cheques entregue pelo recorrido ao recorrente em cumprimento do contrato que os unia e não fora rescindido.
- Por outro lado, não pode também deixar de ser positiva a resposta a dar aos Q. 11° e 12º porquanto os prejuízos patrimoniais emergentes das dificuldades criadas pelo recorrido ao recorrente com a apreensão do cartão de débito e da recusa em entregar cheques se alcançam não só das mais básicas regras de
experiência comum e dos depoimentos das testemunhas de M T, A, e F, como, principalmente e no que tange ao quantum, do teor das declarações fiscais de fls. 29 e 40, e da certidão fiscal de fls. 340 a 344.
- E a matéria dos Q. 13° e 14° outra sorte não poderá ter que a resposta provado uma vez que a obtenção dos valores em dívida ao credor hipotecário, o aqui recorrido, era factor essencial para a formação do preço de venda do imóvel, sendo que da comparação dos documentos de fls. 30, 41 a 45 e 226, este no seu item "H. GARANTIAS" e os depoimentos de A e C, resulta que sendo o valor venal do Imóvel superior comportaria um preço mais elevado se o recorrente tivesse a noção, precisa e rigorosa, de quanto iria despender com o distrate da hipoteca, valores esses que o recorrido adulterou na informação prestada.
- Sem poderem restar dúvidas quanto ao mal estar e mesmo conflito latente entre litigantes judiciais, mesmo se cônjuges, especialmente se cônjuges, resultante da pendência de acção judicial entre eles, de conhecimento genera­lizado, estando essa pendência judicial e as suas razões devidamente provadas pelos documentos de fls. 46 a 51 verso e 348 a 351 e bem assim do teor dos depoimentos das testemunha A e da própria C, pelo que aos Q. 15° e 16° se impõe uma resposta positiva.
- Ao aplicar o direito o tribunal deixa expresso na sentença recorrida que as cláusulas contratuais que, unilateralmente e por mera adesão do consumi-dor, confiram a uma parte o direito de pôr termo a um contrato sem pré-aviso e sem justificação, excepto em caso de justa causa fundada não numa qualquer razão, mas numa razão séria, são nulas por via do disposto nos art° 19°, alínea 1), e 22 alínea i), do Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, na redacção vigente. Não obstante veio a julgar em sentido contrário quer no que concerne ao clausulado respeitante ao cartão de débito quer no que tange às condições contratuais da conta de depósitos
- Pois que se são nulas, como são de facto, a apreensão do aludido cartão de crédito é ilegal, ainda mais que sem qualquer aviso nem justificação, já que é temporalmente anterior aos incidentes registados com os cheques na conta do recorrente.
- A decisão assim tomada contra o direito trazido à fundamentação conforma nulidade processual prevista no art° 668°, n° 1, alínea c), do Código de Pro­cesso Civil, que aqui expressamente argui para todos os efeitos legais.
- É nula é também a sentença, por omissão de pronuncia relativa à matéria ver-tida no art° 29° da P.1 (art° 668° n° 1 al. d) do C.P.C.).
- E outrossim quanto à matéria do quesito 9° provada, a qual, não obstante, não mereceu decisão em consonância tal como foi pedido na acção, nulidades que aqui se argúem para os devidos e legais efeitos.
- Para além disto, sem conceder, verifica-se então que também a falta de impressão e entrega ao recorrente de módulos de impressos de cheque é ilegal porquanto não emerge de rescisão válida segundo os parâmetros do Decreto-Lei n° 454/91, de 28 de Dezembro, na redacção actualizada.
- Pois que se é certo que a convenção do cheque está, inicialmente, no momento da contratação, na disponibilidade do banqueiro, celebrada esta a sua rescisão só pode ocorrer unilateralmente por parte deste nos casos previstos no referido diploma legal ou com a resolução do contrato de depósito bancário.
- Para a rescisão legalmente estabelecida toma-se necessário que o emitente do cheque não regularize a situação criada com a sua emissão sem fundos suficientes no prazo de 30 dias após a notificação que a instituição bancária saca-da lhe tem que fazer para esse efeito, como resulta pacífico da leitura dos dis­positivos do art° 1.0, n° 2, e 1°-A, n° 1, do citado Decreto-Lei e da vasta juris­prudência existente sobre esta matéria.
- Ora está provado na parte final do Q 3°, e até por confissão do recorrido, que o recorrente regularizou no prazo e modo legalmente estipulados todos os che­ques que haviam sido pagos ou devolvidos, logo não podia e não pode haver lugar a qualquer rescisão da convenção do uso do cheque.
- Como, por mera remissão aos documentos que instruem a prova dos autos, está demonstrado que a conta foi encerrada apenas em Julho de 2002 e a últi­ma entrega de livro de cheques ocorreu em 21 de Maio de 1999, tendo as irre­gularidades ocorrido entre 4 de Junho e 4 de Agosto desse mesmo ano.
- Inexistem, pois, razões com sustentação legal para a rescisão da aludida con­venção do uso do cheque, sendo qualquer outra interpretação das citadas nor­mas dos art° 1°, n° 2, e 1°-A, n° 1, do DL 454/91 e demais normativos correla­tivos, é inconstitucional por violação dos imperativos dos art° 20.°, n° 1, 26° n° 1, 60°, n° 1, 62°, n° 1, 202°, n° 2, e 203° da Constituição da República Portu­guesa, o que aqui se argúi expressamente ad cautelam, considerando-se correcta a que emana das conclusões supra e correspondentes alegações que aqui se têm por integralmente reproduzidas.
- Como ilegal e usurária é a contabilização e exigência das quantias em dívida respeitantes ao crédito hipotecário liquidado, onde se mostra exigida e paga uma quantia que em 16 meses obteve um acréscimo de 47% sobre os valores comunicados pelo recorrido ao recorrente, causando-lhe prejuízo patrimonial avultado.
- Para além de que fiscalmente resultam também prejuízos e ilegalidades ao não ter sido entregue ao recorrente qualquer recibo mencionando o valor cobrado por tal liquidação hipotecária, à revelia de todas as obrigações legais, designa­damente a do n° 1 do art° 787° do Código Civil, cuja interpretação diversa aqui se acautela arguindo a sua inconstitucionalidade, por violação dos art° 20° n° 1, 62°, n° 1, 202°, n° 2, e 203°, todos da Lei Fundamental, tendo-se por correcta a que obriga qualquer credor a dar quitação de todas as quantias recebidas para liquidação do seu crédito.
- Ao que acresce a injustificada falta de devolução do saldo de € 303,21 existen­te na conta quando do seu fecho.
- Situações que, no seu conjunto e concomitância, causaram prejuízos patrzmo­nialmente vultosos e moralmente gravosos, como resulta das mais elementares regras da experiência comum e estão comprovados documental e testemu­nhalmente nos autos, carecendo de tutela judicial segundo os ditames dos art° 483°, n° 1, 484°, 485°, n° 2, e 486° do Código Civil, cuja interpretação diferen­te viola as regras constitucionais dos art° 20°, n° 1, 26°, n° 1, 60°, n° 1, 62°, n°1, 202°, n° 2, e 203 o que vai invocado cautelarmente para todos os efeitos da lei, tendo-se por correcta a leitura que conduz ao ressarcimento dos danos patrimoniais e morais causados com as atitudes culposas e ilegais do recorri-do, conforme o alegado e concluído no antecedente.
- Razões que impõem a revogação da douta sentença assim criticada e sua subs­tituição por outra, superior, que adegúe a factualidade provada ao acervo documental e testemunhal produzido nos autos, aplicando o direito em con­formidade e, em consequência, condenando o banco recorrido a devolver as quantias ilegalmente extorquidas ao recorrente e a indemniza-lo pelos danos morais e patrimoniais provados em quantias a arbitrar sabiamente por este venerando tribunal.
- Está em falta a alínea acrescentada com a matéria pretendida pelo R. em consequência da reclamação que apresentou, o que foi deferida no ponto 6 do despacho de 19.11.04.
- Consideram-se incorrectamente julgados os factos contidos nas respostas dadas aos quesitos 2°, 4° a 6°, 8° e 10° a 14° da Base Instruto­ria.
- Impõem solução diversa de um modo geral todos os documentos, mas em especial os de fis. 16 a 21, 28 a 30, 32 a 41, 43 a 52, 62 a 65, 95 a 144, 207 a 222 e 226, segundoa aplicação detalhada em cada um dos itens alegatórios; todas as certidões juntas aos autos, mas especialmente as de fls. 306 a 308, 340 a 344 e 348 a 351; as regras da experiência comum do normal e abstracto cidadão; uma correcta apreciação e valoração dos depoimentos prestados em audiência pelas seguintes testemunhas:
M T - cassete n° 1, lado A e B;
A - cassete n° 1, lado B e cassete n° 2, lado A;
M - cassete n° 2, lado A;
C - cassete n° 2, lados A e B e cassete n° 3, lado A;
F - cassete n° 3, lado B e cassete n° 4, lado A;
sendo que as indicações de suporte se reportam ao que está registado na acta de fls. 368 a 379.

Não foram apresentadas contra alegações.

II A sentença sob recurso deu como assentes os seguintes factos:
- O A. é co titular com a sua mulher C, desde 1995.5.10, de uma conta de depósitos na agência de Loures do Banco R, identificada com o n° (….).
- Conta bancária na qual, ao longo dos tempos o A. veio fazendo aplicações financeiras, descontos comerciais e crédito de vários tipos.
- Movimentando tal conta com recurso a cheques e cartão de crédito.
- Em 1998 o A. encontrou dificuldades em solver compromissos de tesouraria e foram apresentados a saque na conta supra referida alguns cheques que se encontravam emitidos e entregues em promessa" de pagamento.
- A R. apreendeu o cartão de débito que permitia ao A. ter acesso imediato ao saldo da sua conta para o necessário controlo da mesma.
- A R. veio a recusar ao A. um crédito que aquele lhe solicitara em Fevereiro de 2000.
- A execução instaurada pelo R. contra o A. encontra-se finda por inutilidade superveniente.
- Provado o que consta do doc n° 8 junto aos autos a fls. 23 e da clausula 17 do verso do mesmo documento - multibanco contrato de adesão.
Ou seja :- «Ao BANCO é reservado o direito de reter o cartão cm caso de utilização abusiva, indevida ou irregular pelo titular ou terceiro e, sempre que o julgue conveniente por razões de segurança à luz das presentes condições gerais e demais legislação aplicável assumindo o titular todas as responsabilidades e encargos daí decorrentes salvo se existirem ou forem ap/esentados factos justificativos ou provas comprovativas que ilibem dessas responsabilidades.».
- Até certa altura o R. deixou imprimir e entregar ao A. módulos de cheques porque a A regularizava a conta no prazo exigido no banco.
- A R. veio entretanto a instaurar acção de execução contra o aqui A .
- Dão-se aqui por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais os conteúdos dos documentos juntos com a PI de flis. 13 a 30 assim como, o doc n° 4 a fls. 144 dos autos em que o BANCO a 28 Janeiro de 2002 comunica ao A. que o valor em divida calculado até à data de 5.2.02 é de 29.880,57 € a que acresceu o montante de 483,75 € respeitantes ao documento de distrate da hipoteca em causa que seria entregue contra a entrega de um cheque visado no montante global de 30.319, 32 €.
- O BANCO enviou ao A. o seguinte documento – comunicação datada de 26 de Setembro de 2000 --De acordo com o solicitado no vosso fax, informamos que o montante em divida à data de 4.1.2000 e até 4.10.2000 é no total de 4.123.0894800.
- Dão-se aqui também por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais os documentos juntos aos autos a fls 32, 34 e 35.
- O R. não emitiu quitação das quantias recebida para distrate da hipoteca referida.
- Por mais de uma vez o R. viu-se obrigado a comunicar ao A. que em virtude da emissão de cheques sem provisão, seria forçado a rescindir a convenção de uso de cheque.
- Em 1998 o A. encontrou dificuldades em solver compromissos de tesouraria.
- A conta de depósitos à ordem referida na alínea A da matéria assente, apresentava um persistente saldo devedor nos meses de Junho, Julho e Agosto de 1999.
- O R. não efectuou o pagamento de 4.123.089$00.


Questão prévia da eventual ilegitimidade passiva do Autor/ Agravante e Apelante nos presentes autos por se poder entender estar-se perante um litisconsórcio necessário o que levaria à absolvição da instância do Réu, por aquele se encontrar a litigar desacompanhado do respectivo cônjuge, igualmente co-titular da conta.

Ouvidas as partes, apenas o Réu, Agravado e Apelado nos autos veio responder, pela negativa, já que a conta em causa é solidária e não conjunta.

Tem razão o Réu/Recorrido, pois sendo a conta solidária, o que decorre do documento de fls 145, o que ora melhor se verifica e confirma, o litisconsórcio é voluntário, tendo aplicação o preceituado no normativo inserto no artigo 27º, nº1 e 2 do CPCivil e não o artigo 28º como previamente e sem razão, diga-se, se tinha aventado.

Inexiste, desta feita, qualquer ilegitimidade activa que comprometa a apreciação do mérito da causa.

1.Do Agravo interlocutório.

O Autor veio interpor recurso do despacho de fls 172 que lhe não admitiu a resposta apresentada aos documentos juntos com a Réplica, bem como ao pedido de condenação como litigante de má fé, aí formulado pelo Réu uma vez que na sua tese a adição de documentos, em articulado derradeiro, comporta a sua notifi­cação à parte contrária nos termos do artigo 526° e para os efeitos previstos nos artigo 544° e seguintes, se não houver lugar ao procedimento previsto no artigo 543°, todos estes do CPCivil para além de que toda a matéria consubstanciadora de litigância de má-fé de uma das partes carece de defesa, ao abrigo dos Imperativos constitucionais constantes nos artigos 20°, n.°1, 4 e 5 e art° 26°, n.° 1, ambos da Constituição da República Portuguesa transpostos para o principio geral de direito, designado, e bem, como contraditório.

Efectivamente, não se pode deixar de dar razão total neste conspectu ao Autor/Agravante, já que o requerimento apresentado que fazia fls 159 a 168, e que se encontra junto por linha na contracapa do 1º volume dos autos, se não se pudesse considerar como réplica, mas antes como pronúncia sobre os documentos juntos pelo Réu aquando da apresentação da sua contestação, resposta ao pedido de condenação como litigante de má fé imputado por aquele ao Autor e ainda a formulação por este, de um contra pedido de condenação daquele como litigante de má fé, era-lhe licito fazer naquele momento, nos termos dos artigos 544º, 3º, nº3 e 456º do CPCivil do CPCivil.

Daqui deflui, numa primeira apreciação que o despacho que ordenou o desentranhamento daquela peça, foi proferido, sem qualquer fundamento legal e em manifesta violação dos normativos supra enunciados, e portanto sempre deveria ser substituído por outro que o admitisse.

Aqui chegados, e tendo em atenção o disposto no normativo inserto no artigo 715º do CPCivil, sempre se poderia equacionar se não seria possivel a este Tribunal substituir-se ao Tribunal recorrido, na prolacção daquele despacho.

Até se poderia defender essa posição se a impugnação dos documentos e a resposta ao pedido de litigância de má fé e respectivo contra pedido, fosse a única questão posta em termos de análise da problemática que nos é suscitada.

Todavia, a tese defendida pelo Autor em sede de petição Inicial e constitui a sua causa petendi, fundada além do mais nos artigos 7º a 10º, 13º e 23º a 27º da Petição Inicial, não foi meramente impugnada pelo Réu, como concluiu o Tribunal recorrido, mas antes objecto de uma verdadeira defesa por excepção, vg, a matéria alegada nos artigos 7º a 17º, 20º a 24º, 32º, 37º, 43º e 50º a 53º, da contestação (já que se tratam de factos impeditivos do direito que o Autor se arroga: a Ré não se limita a uma mera impugnação, aceita ter procedido à revogação da convenção de cheque e que apreendeu o cartão de débito, mas devido a um determinado comportamento do Autor, maxime, o de emitir cheques de montante que teria de ser obrigatoriamente satisfeito por aquela, sendo certo que a conta deste se encontrava desprovisionada), matéria esta que inexplicavelmenter não foi levada à base instrutória, tendo em atenção o preceituado no normativo inserto no artigo 511º, nº1 do CPCivil, sendo certo que, se o Réu lograr provar tal matéria, em sede de audiência de discussão e julgamento, ter-se-á de concluir que o Autor está a litigar de má fé.

São todas estas perplexidades ao nível da factualidade emanente dos articulados a qual se mostra deficiente e até obscura, que se impõe a anulação do processado a partir do despacho de fls 172.

II Destarte, dá-se provimento ao Agravo, devendo o Tribunal recorrido substituir o despacho de fls 172, segunda parte, por outro que ordene a junção da resposta cujo desentranhamento foi ordenado e que se encontra junta na contracapa, anulando-se os termos subsequentes que dependem de tal despacho, maxime a base instrutória a qual deverá ter em conta os elementos fácticos alegados pelo Réu na sua contestação, bem como a sentença proferida, devendo ser repetido o julgamento em conformidade com o novo despacho que seleccionar a matéria de facto, tendo em atenção o que se expôs supra.

Custas do Agravo pelo Réu/Agravado e no mais pela parte vencida a final.

Lisboa, 24 de Abril de 2008


(Ana Paula Boularot)


(Lúcia de Sousa)


(Luciano Farinha Alves)