Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4569/2007-7
Relator: MARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Descritores: NULIDADE PROCESSUAL
NOTIFICAÇÃO
OMISSÃO
MINISTÉRIO PÚBLICO
TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO
DIVÓRCIO LITIGIOSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/24/2007
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I- Não é por via de recurso, mas por invocação de nulidade (artigos 201º e 205.º do Código de Processo Civil), que o Ministério Público deve suscitar a questão da omissão de notificação do despacho que designa data para a tentativa de conciliação em acção de divórcio litigioso, posteriormente convolada para divórcio por mútuo consentimento, tendo em vista a sua audição sobre o acordo alcançado entre as partes em matéria de regulação do exercício do poder paternal relativamente aos filhos menores do casal, relembrando-se o brocardo “ das decisões recorre-se, contra as nulidades reclama-se”
II- E sempre se imporia que o acordo quanto ao exercício do poder paternal fosse questionado, pois, não o sendo, jamais se estaria face a nulidade que se pudesse considerar susceptível de influir no exame ou na decisão da causa (artigo 201º, parte final, do Código de Processo Civil)

(SC)
Decisão Texto Integral: 1. Nos presentes autos de divórcio, no dia designado para a realização da tentativa de conciliação as partes anunciaram pretender convolar o divórcio para mútuo consentimento, tendo ditado para a acta os acordos a que alude o art. 1419º, nº1, do CPC, designadamente o relativo ao exercício do poder paternal.

2. Seguidamente o M.mo Juiz, fez consignar que «não havia Ministério Público disponível, apesar das diligências efectuadas» e proferiu sentença que homologou os acordos e decretou o divórcio.

3. Notificado da sentença, veio o Ministério Público requerer que o M.mo Juiz esclarecesse: (a) a razão de ser de não o ter notificado nem chamado para a tentativa de conciliação, de ter agendado aquele acto para uma data que, de acordo com a distribuição de agendas, estava reservada para outro juiz do mesmo Tribunal; (b) quais as concretas diligências efectuadas para providenciar pela substituição do requerente.

4. Entretanto, sem aguardar pela prolação de despacho sobre o seu requerimento[1], aquele Digno Magistrado veio interpor recurso de apelação da sentença, na parte em que homologou o acordo sobre o exercício do poder paternal.

Nas suas alegações, em conclusão, diz:

Em acção de divórcio litigioso, posteriormente convolada para divórcio por mútuo consentimento, é obrigatória a audição do Ministério Público sobre o acordo alcançado entre as partes em matéria de regulação do exercício do poder paternal relativo aos filhos menores do casal;

Nos termos do art. 334° n° 3 do C.P.C., o Ministério Público deveria ter sido notificado do despacho que designa data para a tentativa de conciliação onde o sobredito acordo foi alcançado;

Não tendo tal notificação sido ordenada nem tendo ocorrido, foi cometida nulidade processual;

Não tendo o Ministério Público estado representado na dita tentativa de conciliação, nem tendo o Tribunal assegurado tal representação, providenciando pela substituição do único magistrado do Ministério Público que exerce funções no Tribunal a quo (no momento reconhecidamente impedido noutra diligência judicial), não podia ter sido proferida sentença homologatória do dito acordo;

Consequentemente, a sentença recorrida é nula.

5. O recurso é o próprio assim como o regime de subida e o efeito atribuído. Dada a sua simplicidade, cumpre apreciar e decidir da questão suscitada no agravo, nos termos do art. 705º, do C.P.C., sendo certo que nada obsta ao conhecimento do seu objecto e inexistem quaisquer outras questões prévias de que cumpra conhecer.
 
6. Em primeiro lugar, importa distinguir muito claramente as nulidades da sentença das nulidades de processo.

Na verdade, o seu regime processual é distinto: as nulidades das decisões (revistam ou não a natureza de sentença) são as taxativamente indicadas no art. 668º, nº1, do CPC e devem ser arguidas, de harmonia com o disposto nos nºs 2 e 3, deste preceito, ora no tribunal que proferiu a decisão, ora, por via do recurso, no tribunal ad quem.

Por seu turno, as nulidades de processo estão sujeitas ao regime de arguição previsto nos arts. 193º a 200º, 202 a 204º, do CPC (nulidades típicas ou principais) e nos arts. 201º e 205º (nulidades atípicas ou secundárias).

No caso concreto, estar-se-ia no âmbito de uma nulidade processual (omissão de uma formalidade que a lei prescreva), e portanto sujeita ao regime previsto no art. 201º, do CPC, devendo ser arguida perante o próprio tribunal, no prazo previsto no art. 205º, do CPC.

Acontece que o Ministério Público não arguiu a invocada nulidade nos termos e prazo a que aludem os citados preceitos legais. Nem se diga que o fez através do requerimento de fls. 22, pois, como decorre do seu teor e, particularmente da parte final, o que se pretendia com a sua apresentação era um «esclarecimento» sobre a actuação do tribunal.

Assim, nos termos das disposições atrás citadas, não tendo sido oportunamente arguida, é de considerar sanada a invocada nulidade.

Acresce que, e decisivamente:

Como preceitua o art. 201º, do CPC, as omissões só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou decisão da causa.

Ora, no caso concreto, não foi posto em causa o acordo quanto ao exercício do poder paternal, pelo que ficou por demonstrar que a irregularidade cometida (a omissão de notificação, bem como a realização da tentativa e homologação do acordo, sem a presença e audição do MºPº) influiu no exame ou decisão da causa. Desta forma, não poderia nunca dar-se por verificada a existência da sobredita nulidade.

7. Em face do exposto, negando provimento ao recurso, decide confirmar-se a sentença recorrida.

Sem custas, por delas estar isento o recorrente.

Lisboa, 24 de Maio de 2007

(Maria do Rosário Morgado)


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1.Efectivamente, o M.Mo Juiz, à data da interposição do recurso, apenas havia proferido despacho mandando notificar as partes da apresentação do mencionado requerimento pelo MP.