Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | ISABEL FONSECA | ||
| Descritores: | CRÉDITOS LABORAIS EMPRESA GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS LOCAL DE TRABALHO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/28/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | Sumário (da responsabilidade da relatora – art. 663.º n.º7 do CPC) 1. A propósito da abrangência do privilégio imobiliário especial previsto no artigo 333.º, n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho partilha-se a orientação, mais lata, no sentido de que esse privilégio incide sobre qualquer imóvel que integre o património do empregador, desde que afeto à sua atividade empresarial, à qual os trabalhadores estão funcionalmente ligados, e não apenas sobre o(s) prédio(s) onde, em concreto, o trabalhador exerce funções e correspondente, especificamente, ao seu “local de trabalho” (art.º 193.º do Código do Trabalho); efetivamente, o que releva para essa aferição é que o trabalhador está inserido numa estrutura ou organização económica em que os recursos humanos e materiais se conexionam tendo em vista a realização do objeto social, não relevando de forma significativa que o local de trabalho esteja centrado nos escritórios da empresa, na fábrica, no estaleiro ou nos prédios onde se situam os armazéns… , enfim, a enunciação pode ser variadíssima consoante as caraterísticas da empresa e o respetivo escopo social, por um lado, e as funções exercidas pelo trabalhador, por outro, sendo, aliás, em função das especificidades do caso que se apresenta ao julgador que a questão deve ser equacionada. 2. A conclusão de que determinado imóvel está afeto à atividade da empresa tem de estar suportada em elementos objetivos, não sendo suficiente para assim concluir a mera constatação da titularidade do direito de propriedade sobre tal imóvel 3. Apurando-se os seguintes elementos, deve concluir-se que a atividade do trabalhador era exercida de forma integrada na respetiva unidade empresarial, da qual o imóvel fazia parte e à qual estava afeto: - A insolvente tinha como objeto a “indústria de transportes em camionetas de carga”, tendo aliás sido apreendidos diversos veículos; - O único imóvel apreendido tem as caraterísticas apontadas, mais precisamente, é constituído por um edifício de rés-do-chão - armazém - e 1º andar - escritório, constituindo a sede da insolvente, indicando o AI que era nesse local que a insolvente “exercia a sua atividade”, sem que qualquer credor questione essa asserção; - O credor/apelante exerceu para a empresa as funções de motorista, implicando, necessariamente a deslocação nas áreas abrangidas pelos transportes realizados pela empresa insolvente, logo, um local de trabalho com a amplitude correspondente. 4. A circunstância de, na reclamação apresentada (art. 129.º, n.º1 do CIRE), o trabalhador nada aludir quanto ao local onde exercia as suas funções nem, com referência ao aludido imóvel, ter convocado o referido privilégio imobiliário especial, não obsta, em face dos demais elementos que resultam dos autos, ponderando a globalidade do processo de insolvência e atento o princípio da aquisição processual (art. 413.º do CPC), que o tribunal não possa/deva atender aos mesmos procedendo ao juízo valorativo sobre a questão que se lhe colocava – graduação dos créditos – em função dessa realidade, sendo o tribunal é livre no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3 do CPC). | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa I. RELATÓRIO Ação Processo de insolvência (apenso de verificação do passivo). Devedora/insolvente Intertráfego TIR – Transportes Rodoviários, Limitada, declarada insolvente por sentença proferida em 11-02-2020, transitada em julgado. Credor reclamante/apelante LP apresentou reclamação de créditos perante o administrador da insolvência, peticionando como segue: “Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis requerer-se a V. Ex.a se digne, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 129. do C.I.R.E., reconhecer os créditos da reclamante, à data, de € 15 809,55 (quinze mil oitocentos e nove euros e cinquenta e cinco cêntimos), seguindo-se a ulterior tramitação da lei até final” Alega, em síntese, que o reclamante e a insolvente celebraram um contrato de trabalho em 21 de junho de 2004, tendo o reclamante exercido as suas funções por conta e ordem da insolvente, com o nível e categoria profissional de motorista de pesados, contrato que cessou em 12 de março de 2020. Nessas circunstâncias, “[r]esultante do referido contrato, e, à presente data, são seus os seguintes créditos, os quais reclama: A) Créditos vencidos, no valor global de € 15 809,55, referentes a: a) Férias referentes ao ano 2019, vencidas em OI de Janeiro de 2020, no valor de € 988,90; b) Subsídio de férias referente ao ano 2019, vencido em 01 de Janeiro de 2020, no valor de € 1 348,60; c) Parte proporcional de férias não gozadas, no valor de € 89,90; d) Parte proporcional de subsídio de férias, no valor de € 248,58; e) Parte proporcional de subsídio de Natal, no valor de € 154,43. B) Pré-aviso da cessação do contrato de trabalho em falta (75 dias), no valor de € 3 371,25. C) Dias de trabalho prestado no mês de Março de 2020 (12 dias), no valor de € 539,40. D) Partes proporcionais vincendas, correspondentes às férias, ao subsídio de férias e ao subsídio de Natal, desde a data da falta de pagamento até integral pagamento. E) Compensação, atento o início do contrato de trabalho (Junho de 2004) e a presente data, no valor de € 9 068,49. 6.º Pelo exposto, resulta que o reclamante é titular de créditos, nos termos e condições constantes do antecedente art. 5. , alíneas A), B), C), D) e E), acrescidos dos juros legais vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento”. Juntou com a reclamação um documento, a saber, cópia alusiva a um recibo de vencimento relativo ao mês de fevereiro de 2020. Administrador da insolvência O administrador da insolvência apresentou a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do art. 129.º do CIRE [ [1] ]. Quanto ao crédito reclamado por LP (credor n.º 67), considerou o mesmo como reconhecido, pelo valor de 15 809.55€, indicando, em sede de “garantias” tratar-se de crédito “privilegiado” nos termos do “Art.º 333 do Código do Trabalho e art.º 748 do Código Civil” e, sob a epígrafe “fundamentos” tratar-se de “créditos laborais”. Notificado na sequência do despacho de 23-11-2022 [ [2] ], o AI apresentou requerimento com o seguinte teor: “(…) notificado para o efeito, vem expor o seguinte: // 1. Antes de mais, vem o aqui signatário juntar cópia da reclamação de créditos do credor LP. // - Cfr. Documento que se junta como doc. 1, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais. // 2. Na mesma, verificamos que o credor reclamou € 15.809,55, a título de créditos laborais, juntando para o efeito documentação comprovativa. // 3. Valor esse que foi aceite, e devidamente reconhecido na lista de créditos reconhecidos, elaborada nos termos do artigo 129.º do CIRE (posição nº 67). // 4. Ora, conforme indicado na aludida lista, o crédito encontra-se revestido de privilégio nos termos do art.º 333 do Código do Trabalho e art.º 748 do Código Civil. // 5. Certo é que a sociedade insolvente apenas era proprietária do imóvel prédio urbano, composto por edifício de rés-do-chão – armazém – e 1º andar – escritório, sito em Aveiras de Cima, descrito na CRP de Azambuja sob o número 1793 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3361, da freguesia de Aveiras de Cima, concelho de Azambuja, distrito de Lisboa. // 6. O aludido imóvel, onde exercia a sua atividade, foi apreendido e vendido no âmbito do presente processo de insolvência. // 7. Nessa senda, e salvo melhor entendimento, o credor LP, é detentor de um crédito laboral revestido de privilégio imobiliário especial sobre o imóvel em causa, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 333.º do Código do Trabalho. // P.E.D.” Sentença Em 12-07-2022 foi proferida sentença com o seguinte segmento dispositivo: “IV. Face ao exposto, nos termos dos art. 130.º, n.º 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, homologo a lista de créditos reconhecidos, rectificada sob a referência 10226027, apresentada pelo sr. administrador da insolvência, com as alterações que se seguem, e, consequentemente, julgo verificados créditos ali e assim descritos: - Reconhecimento do crédito do Sr. Administrador de Insolvência como crédito comum e não como crédito privilegiado, porquanto o mesmo não tem natureza laboral não gozando, por isso, do privilégio a que alude o art. 333 do Código do Trabalho; - Reconhecimento do crédito de W.A.G. Issuing, AS, no valor de € 25.006,94, como crédito comum.” E, em sede de graduação de créditos: “VI. Pelo exposto, graduo os créditos sobre a insolvente Intertráfego TIR – Transportes Rodoviários, Limitada, para serem pagos da seguinte forma: A) Sobre o produto da venda do Prédio urbano composto por edifício de rés-do-chão - armazém - e 1º andar - escritório, sito na 1ª Travessa 1º de Abril, n.º 31, Aveiras de Cima 2050-183 Aveiras de Cima, descrito na Conservatória do Registo Predial de Azambuja sob o n.º 3361 da freguesia de Aveiras de Cima e descrito na matriz predial urbana com o art. 1997: - em primeiro lugar, os créditos de Caixa Geral de Depósitos, S.A., na parte e na medida em que se encontram garantidos por hipoteca; - em segundo lugar, rateadamente, se a massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral, os créditos da Autoridade Tributária e do Instituto da Segurança Social IP, na parte em que gozam de privilégio imobiliário geral; - em terceiro lugar, rateadamente, os créditos comuns, se o produto da venda for insuficiente para a respectiva satisfação integral; - os créditos subordinados serão pagos após pagamento integral dos créditos comuns; - o crédito sob condição será pago nos termos dos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * B) Sobre o produto da venda dos veículos automóveis com responsabilidade por pagamento de IUC: - em primeiro lugar, o crédito da Autoridade Tributária por IUC na parte e na medida em que goza de privilégio mobiliário especial; - em segundo lugar, rateadamente, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral, os créditos reclamados por (…)LP, (…) e Fundo de Garantia Salarial, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em terceiro lugar, rateadamente, se a massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral, os créditos da Autoridade Tributária e do Instituto da Segurança Social IP, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em quarto lugar, rateadamente, os créditos comuns, se o produto da venda for insuficiente para a respectiva satisfação integral; - os créditos subordinados serão pagos após pagamento integral dos créditos comuns; - o crédito sob condição será pago nos termos dos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * C) Sobre o produto da venda de 2480 acções representativas do capital da Lisgarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A.: - em primeiro lugar, os créditos de Lisgarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A. garantidos por penhor, até ao limite do valor das referidas garantias sobre os bens/direitos sobre os quais incidem e de acordo com a ordem da constituição do penhor; - em segundo lugar, rateadamente, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral, os créditos reclamados por (…) LP, (…) e Fundo de Garantia Salarial, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em terceiro lugar, rateadamente, se a massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral, os créditos da Autoridade Tributária e do Instituto da Segurança Social IP, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em quarto lugar, rateadamente, os créditos comuns, se o produto da venda for insuficiente para a respectiva satisfação integral; - os créditos subordinados serão pagos após pagamento integral dos créditos comuns; - o crédito sob condição será pago nos termos dos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * D) Sobre o produto da venda dos bens e direitos apreendidos e a apreender para a massa insolvente: - em primeiro lugar, rateadamente, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral, os créditos reclamados por (…)LP, (…) e Fundo de Garantia Salarial, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em segundo lugar, rateadamente, se a massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral, os créditos da Autoridade Tributária e do Instituto da Segurança Social IP, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - em terceiro lugar, rateadamente, os créditos comuns, se o produto da venda for insuficiente para a respectiva satisfação integral; - os créditos subordinados serão pagos após pagamento integral dos créditos comuns; - o crédito sob condição será pago nos termos dos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * As dívidas da massa insolvente (art. 51.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas), saem precípuas na devida proporção do produto da venda de cada bem nos termos do art. 172.º, n.ºs 1 e 2, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * Nos termos do disposto no art. 303.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a actividade processual relativa à verificação e graduação de créditos, quando as custas devam ficar a cargo da massa, não é objecto de tributação autónoma. Assim, não há lugar a custas. * Registe e Notifique”. Recurso Não se conformando, LP apelou, formulando as seguintes conclusões: “a) O objeto do presente recurso cinge-se aos pontos V) e VI) da douta sentença proferida que entendeu não dever o crédito reconhecido ao Recorrente, gozar de privilégio imobiliário especial sobre o bem imóvel da Insolvente no qual prestava a sua atividade; b) O ora Recorrente apresentou reclamação de créditos, na qual se identificou como trabalhador da Insolvente (e como tal foi reconhecido), sendo que o crédito ora reclamado, apresentado ao Ex.mo Administrador de Insolvência goza de privilégio mobiliário geral e especial sobre o bem imóvel da Insolvente no qual o ora recorrente prestava a sua actividade; c) O Sr. Administrador da Insolvência, na lista de créditos reconhecidos reconheceu o crédito do ora recorrente como crédito com privilégio imobiliário especial a ser graduado antes do crédito referido no artigo 748º do Código Civil; d) O crédito ora reclamado, apresentado ao Ex.mo Administrador de Insolvência goza de privilégio mobiliário geral e especial sobre o bem imóvel da Insolvente no qual o ora recorrente prestava a sua actividade. e) O Recorrente não omitiu na verdadeira aceção da palavra, a garantia de que gozava o seu crédito; f) Da reclamação de créditos apresentada pelo ora Recorrente conclui-se, de imediato, que o mesma trabalhava num imóvel da insolvente. g) Não era obrigado, naquela fase, a identificar qual o bem imóvel no qual prestava a sua atividade por referência ao auto de arrolamento porque o auto de arrolamento apenas foi publicitado posteriormente à data limite de reclamação de créditos. h) De qualquer forma, o ora Recorrente alegou desde logo que trabalhava num imóvel da Insolvente e que o seu crédito gozava de privilégio creditório imobiliário especial sobre o mesmo. i) O imóvel indicado na verba nº 1 do auto de arrolamento era o único no qual a Insolvente prosseguia a sua atividade e no qual os trabalhadores laboravam. j) Na específica e particular situação dos autos, em que, desde logo, a reclamação de créditos não pode isolar-se completamente de todo o processo global de liquidação universal em que se insere e de que faz parte, deve considerar-se processualmente adquirido (apesar de não expressamente alegado na petição de reclamação) o facto consubstanciado em que o único imóvel onde laborava a insolvente era o correspondente à «verba nº1» do auto de arrolamento e, assim sendo, facilmente se alcança, ao menos por presunção natural, que as funções da Recorrente só podiam ter sido exercitadas no único edifício onde laborava a entidade empregadora, o que naturalmente conduziria à verificação dos pressupostos do invocado privilégio creditório e à especificação, embora alcançada por via indireta, do imóvel sobre que incidia a dita garantia real. k) Não tendo decido pelo reconhecimento que o crédito da mesma não goza de privilégio creditório imobiliário especial, violou a douta sentença o disposto nos artigos 47º, nº4, alínea a), 136º, nº4 e 5 do CIRE e 333º, nº1, alínea b) do Código do Trabalho. PELO EXPOSTO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER PROVIDO, REVOGANDO-SE A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE CONSIDERE O SUPRA EXPLANADO, CONFERINDO PRIVILÉGIO CREDITÓRIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL AO CRÉDITO DO RECORRENTE, COM AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS. ASSIM, SE FAZENDO JUSTIÇA!” Não foram apresentadas contra-alegações. Cumpre apreciar. II. FUNDAMENTOS DE FACTO Relevam para a decisão as vicissitudes processuais supra indicadas e ainda a seguinte factualidade que se dá por assente ponderando os elementos documentais constantes do processo e que não foram objeto de impugnação, bem como o que decorre dos apensos A (processo especial de revitalização), nomeadamente a certidão da Conservatória do Registo Comercial e D (apenso de apreensão de bens) [ [3] ]: 1. Por requerimento de 28-07-2020 que deu início a este apenso, o AI juntou o “auto de arrolamento e apreensão dos bens que integram a massa insolvente”, bem como certidões do registo predial e do registo automóvel, datando o auto de 24-03-2020, aí se identificando sob a verba número 1 o bem imóvel aludido na sentença. 2. Foram apreendidos para a massa insolvente os seguintes bens: - Imóvel: Prédio urbano composto por edifício de rés-do-chão - armazém - e 1º andar - escritório, sito na 1ª Travessa 1º de Abril, n.º 31, Aveiras de Cima 2050-183 Aveiras de Cima, descrito na Conservatória do Registo Predial de Azambuja sob o n.º 3361 da freguesia de Aveiras de Cima e descrito na matriz predial urbana com o art. 1997 (verba número 1); - Móveis: equipamentos, mobiliário, informática e meios de movimentação de cargas; - Móveis sujeitos a registo: veículo ligeiro de mercadorias da marca "FORD", designação "COURIER TURBO", matrícula "16-57-MI; veículo pesado de mercadorias da marca "MITSUBISHI", modelo "CANTER (FE659H6SL)", designação "CANTER HD DI-D TURBO", matrícula "29-07-UE"; veículo tractor de mercadorias da marca "VOLVO", modelo "FH 12-36 (4X2)TRACTOR L2H2 AIR", designação "FH 12 420", matrícula "62-16-UL"; veículo trator de mercadorias da marca "VOLVO", modelo "FH 38 (4X2)TRACTOR L2H2 AIR", designação "FH 480 EURO 4", matrícula "91-DH-45"; Um semi-reboque de carga da marca "KOEGEL", modelo "SNC024", matrícula "L-192019"; semi-reboque de carga da marca "KRONE", modelo "SD27EL", matrícula "P-98967"; semi-reboque de carga da marca "KOGEL", modelo "SFHB24P100/1130", matrícula "L-179182"; semi-reboque de carga da marca "FISA SALOMON", modelo "FSR 3CL (FS3E)", ano fabrico "1999", matrícula "L-145584"; e semi-reboque de carga da marca "SCHMITZ", modelo "SCS", matrícula "AV52965"; - 2480 ações representativas do capital da Agrogarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A.; - Saldo bancário. 3. O apelante foi trabalhador da Insolvente, exercendo as funções de motorista de pesados [ [4] ]. 4. A insolvente tinha a sede no imóvel identificado supra em 2. 5. A insolvente tinha como objeto a “indústria de transportes em camionetas de carga”. III. FUNDAMENTOS DE DIREITO 1. Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635.º e 639.º do CPC – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito – art.º 5.º, n.º 3 do CPC. No caso, impõe-se apreciar, com referência ao produto da venda da verba n.º 1, se o crédito do trabalhador apelante deve ser graduado em primeiro lugar, antes do crédito da Caixa Geral de Depósitos, como propugna o apelante, ou se deve manter-se a graduação feita na decisão recorrida. 2. A primeira instância procedeu à graduação dos créditos, na parte que ora interessa, fundamentando como segue: “(…) No caso concreto, e de acordo com a lista homologada, temos créditos garantidos, privilegiados, comuns, subordinados e sob condição. Assim, - Os créditos reclamados por Autoridade Tributária, na parte em que gozam de privilégio mobiliário especial por IUC relativamente a veículos apreendidos a que se reporta, deverá ser graduado em primeiro lugar, quanto a estes; - Os créditos garantidos reclamados por Caixa Geral de Depósitos, S.A. devem ser graduados em primeiro lugar para o imóvel que garante os seus créditos, nos termos do art. 686.º, n.º 1, do Código Civil, na medida e na parte em que é garantido pela hipoteca que incide sobre o imóvel apreendido nos autos e segundo a prioridade do registo; - Os créditos garantidos por penhor, de Lisgarante, Sociedade de Garantia Mútua, S.A., que incidem sobre acções serão pagos pelo produto destas (art. 666.º e seguintes do Código Civil); - Os créditos reclamados por (…) LP, (…), e Fundo de Garantia Salarial, na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral, deverão ser graduados em segundo lugar quanto aos bens que garantem por IUC e penhor e em primeiro lugar quanto aos demais bens apreendidos ou a apreender nos autos, nos termos do art. 333.º, n.º 1 al.a) e n.º 2, al. a) do Código do Trabalho, prevalecendo sobre os demais créditos com privilégio mobiliário geral, gozando os créditos do Fundo de garantia Salarial de igual privilégio que os dos trabalhadores nos termos do art. 4.º do DL 59/2015, de 21.04, e serão pagos na proporção respectiva, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral na parte em que gozam de privilégio mobiliário geral; - Os créditos reclamados por Autoridade Tributária, por IRS, IRC, IVA e multimpostos, e Instituto da Segurança Social IP, deverão ser graduados em terceiro lugar quanto aos bens que garantem por IUC e penhor e em segundo lugar quanto aos demais bens apreendidos ou a apreender nos autos, na parte em que gozam de privilégio mobiliário e - Os créditos reclamados por Autoridade Tributária, por IRS, IRC, IVA e multiimpostos, e Instituto da Segurança Social IP, deverão ser graduados em terceiro lugar quanto aos bens que garantem por IUC e penhor e em segundo lugar quanto aos demais bens apreendidos ou a apreender nos autos, na parte em que gozam de privilégio mobiliário e imobiliário geral, e serão pagos na proporção respectiva, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral; - os créditos comuns são graduados em quarto lugar quanto aos bens que garantem por IUC e penhor e em terceiro lugar quanto aos demais bens apreendidos ou a apreender nos autos serão pagos na proporção respectiva, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral (arts. 47.º, n.º 4, al. c), e 176.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas); - os créditos subordinados deverão ser graduados depois dos créditos comuns e será pago apenas após pagamento integral destes (arts. 48.º e 177.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas); - os créditos sob condição serão pagos em observância do disposto nos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas” (destaque nosso). Como resulta da fundamentação assim exposta, a primeira instância não cuidou de precisar a situação dos trabalhadores da insolvente quanto aos créditos salariais indicados pelo AI e que não foram objeto de impugnação, tendo por referência o único imóvel apreendido para a massa insolvente e que constituía a sede da empresa, o que, obviamente, se impunha, atento o teor da lista apresentada pelo AI, que não foi objeto de impugnação nessa parte. Concretizando, reconhecendo o AI, genericamente, na lista apresentada nos termos do art. 129.º do CIRE, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem, que o crédito reclamado pelo apelante, no valor de 15 809.55€, gozava de “garantias”, tratando-se de crédito “privilegiado” nos termos do “Art.º 333 do Código do Trabalho e art.º 748 do Código Civil” e, sob a epígrafe “fundamentos” indicando tratar-se de “créditos laborais”, sem qualquer outra precisão, era imperioso que o tribunal, sabendo estarem em causa créditos laborais – como sabia – e que tinha sido apreendido um imóvel à insolvente, constituindo a sua sede – como igualmente sabia –, tivesse equacionado, em tempo oportuno, antes da prolação da sentença, a questão da graduação do crédito em face do disposto no art. 333.º do Cód. do Trabalho [ [5] ] e uma vez que se tipificam aí dois tipos de privilégios, a saber, o privilégio mobiliário geral previsto na alínea a) do número 1 do preceito e o privilégio imobiliário especial a que alude a alínea b) do número 1 do mesmo artigo. Isto é, não procedendo o AI à distinção que se impunha tinha a Juiz, no condicionalismo que o processo evidenciava, que convocar o AI a prestar os esclarecimentos necessários, desde logo convidando-o à junção das reclamações de créditos apresentadas, em face do princípio do inquisitório (art. 411.º do CPC, aplicável ex vi do disposto no art. 17.º, n.º 1) [ [6] ] e da própria tramitação estabelecida nos arts. 136.º e 137.º, sendo que o tribunal é livre no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3 do CPC). Assim não aconteceu, tendo a 1.ª instância incorrido em erro de julgamento que, obviamente, não é passível de ser corrigido por via do mecanismo da retificação previsto no art. 614.º do CPC, mas apenas por via da reforma ou do recurso (cfr., o art. 616.º do CPC). Vejamos. Apreciando da fundamentação exposta no recurso, com vista à graduação do crédito do apelante, relativamente ao imóvel identificado sob a verba nº 1, temos que não se discute o fundamento do crédito (créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação e cessação), sendo que nenhum interveniente processual questionou, por via de impugnação, a factualidade invocada pelo AI e a indicação (genérica) de que se trata de crédito “privilegiado”. Para essa aferição releva, desde logo, a caraterização que emerge da respetiva identificação, a saber, que se trata de imóvel, propriedade da insolvente, com edifício de rés-do-chão - armazém - e 1º andar - escritório, constituindo a sede da insolvente, que tinha como objeto a “indústria de transportes em camionetas de carga”, tendo aliás sido apreendidos diversos veículos, indicando o AI que era nesse local que a insolvente “exercia a sua atividade” – cfr. o requerimento aludido no relatório –, sem que qualquer credor questione essa asserção, nomeadamente o credor hipotecário (CGD). Relativamente ao credor em causa, LP, não se discute o tipo de funções que exerceu para a empresa (motorista), implicando, necessariamente a deslocação nas áreas abrangidas pelos transportes realizados pela empresa insolvente – logo, um local de trabalho com a amplitude correspondente –, o que não significa que possa considerar-se que essa prestação do trabalhador exclui a sua ligação funcional ao imóvel apreendido. Ao invés, deve entender-se, atenta a natureza e caraterística das funções respetivas, que a atividade era exercida de forma integrada na respetiva unidade empresarial, da qual o imóvel fazia parte e à qual estava afeto. Saliente-se que o patamar de exigência para essa subsunção não se basta com a constatação de que o imóvel pertence à insolvente e integra o seu património, impondo-se a comprovação do destino respetivo e a ligação funcional ao trabalhador, pressuposto que se aceita. Neste contexto, impunha-se a conclusão de que o imóvel descrito sob a verba nº 1 do auto de apreensão constitui um “bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua actividade” (art. 333.º, nº1, alínea b) do Cód. do Trabalho), conclusão que encontra a sua ratio, na orientação mais ampla que vem sendo seguida a propósito do privilégio imobiliário especial previsto no referido artigo, no sentido de que esse privilégio incide sobre qualquer imóvel que integre o património do empregador afeto à sua atividade empresarial. Como se escreveu no acórdão desta Relação de 28-02-2023 a propósito da abrangência do privilégio imobiliário especial previsto no artigo 333.º, n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho, partilha-se a orientação, mais lata, no sentido de que esse privilégio incide sobre qualquer imóvel que integre o património do empregador, desde que afeto à sua atividade empresarial, à qual os trabalhadores estão funcionalmente ligados, e não apenas sobre o(s) prédio(s) onde, em concreto, o trabalhador exerce funções e correspondente, especificamente, ao seu “local de trabalho” (art.º 193.º do Código do Trabalho); efetivamente, o que releva para essa aferição é que o trabalhador está inserido numa estrutura ou organização económica em que os recursos humanos e materiais se conexionam tendo em vista a realização do objeto social, não relevando de forma significativa que o local de trabalho esteja centrado nos escritórios da empresa, na fábrica, no estaleiro ou nos prédios onde se situam os armazéns… , enfim, a enunciação pode ser variadíssima consoante as caraterísticas da empresa e o respetivo escopo social, por um lado, e as funções exercidas pelo trabalhador, por outro, sendo, aliás, em função das especificidades do caso que se apresenta ao julgador que a questão deve ser equacionada [ [7] ]. Incumbindo aos credores, trabalhadores, o ónus de alegação e prova da factualidade pertinente, suporte da subsunção jurídica pretendida (art. 342.º, nº1 do CPC) e não aos demais intervenientes processuais, nomeadamente aos demais credores, o ónus de prova do facto contrário, o certo é que, no caso, pelas razões apontadas entende-se estar suficientemente demonstrada a ligação desse imóvel ao objeto da sociedade insolvente. “A norma do nº1, al. b), do art. 333º do CT, pretendendo atribuir uma especial proteção aos créditos salariais, não se concilia com um injustificado tratamento diferenciado dos trabalhadores de uma mesma empresa, em função da atividade profissional de cada um e do local onde a exercem. Por outras palavras, quando a lei diz que o privilégio imobiliário incide sobre o “imóvel do empregador” no qual o trabalhador preste a sua atividade, está a referir-se à ligação funcional do trabalhador a determinado estabelecimento ou unidade produtiva e não propriamente à localização física do seu posto de trabalho” [ [8] ] [ [9] ] [ [10] ]. Na reclamação apresentada, o trabalhador nada aludiu quanto ao local onde exercia as suas funções nem, com referência ao aludido imóvel, convocou o referido privilégio imobiliário especial, limitando-se a alegar, em rigor, a factualidade alusiva ao contrato de trabalho celebrado, funções exercidas e remuneração auferida. O que não obsta, atentos os demais elementos que resultam dos autos, ponderando a globalidade do processo de insolvência e atento o princípio da aquisição processual (art. 413.º do CPC) que o tribunal não possa/deva atender aos mesmos procedendo ao juízo valorativo sobre a questão que se lhe colocava – graduação dos créditos – em função dessa realidade [ [11] ]. Nos termos do art. 140.º, n.º 2 “a graduação é geral para os bens da massa insolvente e é especial para os bens a que respeitem direitos reais de garantia e privilégios creditórios”, pelo que se impõe reformular a graduação feita tendo por objeto o referido imóvel, de forma a graduar o crédito do trabalhador apelante (e apenas deste), que goza de privilégio imobiliário especial sobre o referido imóvel, em 1.º lugar, com vista a que seja pago com prevalência relativamente ao crédito da CGD. Efetivamente, relativamente aos demais credores (trabalhadores e FGS), a sentença recorrida mostra-se estabilizada, uma vez que não foi objeto de impugnação, sendo que nenhum outro interveniente processual (salvo o AI e a CGD, no condicionalismo evidenciado no despacho proferido por esta Relação em 07-09-2025), notificado da sentença de graduação de créditos e/ou do recurso interposto, requereu ou disse no processo o que quer que fosse (cfr. o art. 634.º do CPC). * Pelo exposto, julgando procedente a apelação, decide-se alterar a sentença recorrida nos seguintes termos: 1.Julga-se que o crédito do credor apelante LP, beneficia de privilégio imobiliário especial relativamente à verba número 1, correspondente ao prédio urbano composto por edifício de rés-do-chão - armazém - e 1º andar - escritório, sito na 1ª Travessa 1º de Abril, n.º 31, Aveiras de Cima 2050-183 Aveiras de Cima, descrito na Conservatória do Registo Predial de Azambuja sob o n.º 3361 da freguesia de Aveiras de Cima e descrito na matriz predial urbana com o art. 1997; 2. Consequentemente, decide-se que relativamente ao produto da venda de tal bem a graduação de créditos passa a ser a seguinte: - Em primeiro lugar, o crédito reclamado por LP; - Em segundo lugar, os créditos de Caixa Geral de Depósitos, S.A., na parte e na medida em que se encontram garantidos por hipoteca; - Em terceiro lugar, rateadamente, se a massa for insuficiente para a respectiva satisfação integral, os créditos da Autoridade Tributária e do Instituto da Segurança Social IP, na parte em que gozam de privilégio imobiliário geral; - Em quarto, rateadamente, os créditos comuns, se o produto da venda for insuficiente para a respetiva satisfação integral; - Os créditos subordinados serão pagos após pagamento integral dos créditos comuns; - O crédito sob condição será pago nos termos dos arts. 94.º e 181.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Sem custas, considerando que o apelante obteve ganho de causa (art. 527.º, n.º 1 do CPC) e nenhum interveniente processual deduziu oposição à sua pretensão. Notifique. 2025-10-28 Isabel Fonseca Susana Santos Silva Elisabete Assunção _______________________________________________________ [1] Lista apresentada em 06-11-2020 (Ref.ª 10226027), que acompanhou o requerimento com o seguinte teor: “(…) nomeado administrador da Insolvência nos autos à margem identificados, em que é declarada Insolvente INTERTRÁFEGO TIR - TRANSPORTES RODOVIÁRIOS, LIMITADA, notificado para o efeito, vem, nos termos do artigo 129.º do CIRE, apresentar Relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, devidamente rectificada”, sendo que é a esta lista que o tribunal de 1.ª instância se reporta na decisão recorrida. [2] Despacho proferido depois da prolação da sentença e do recurso subsequente, com o seguinte teor, sendo que a referência indicada se reporta ao recurso interposto: “Referência 12629971: Antes de mais, notifique o Sr. Administrador de Insolvência para que esclareça, considerando que em lado nenhum indica que o credor goza deste privilégio especial (garantia) sobre o imóvel. Deverá ainda, juntar aos autos, a reclamação de créditos deste credor para apreciação”. [3] Tendo-se enunciado na sentença recorrida, expressamente, os bens objeto de apreensão. [4] No apenso A, a insolvente apresentou o “[m]apa de pessoal” (art. 24.º, n.º1, alínea a) do CIRE), identificando o ora apelante e indicando que o mesmo tem a “[c]ategoria profissional: Motorista de pesados”. [5] Artigo 333.º Privilégios creditórios 1 - Os créditos do trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação gozam dos seguintes privilégios creditórios: a) Privilégio mobiliário geral; b) Privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua actividade. 2 - A graduação dos créditos faz-se pela ordem seguinte: a) O crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes de crédito referido no n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil; b) O crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes de crédito referido no artigo 748.º do Código Civil e de crédito relativo a contribuição para a segurança social. [6] O princípio do inquisitório no âmbito do CIRE (art. 11.º) tem um conteúdo mais amplo daquele que decorre do art.411.º da lei processual civil, como decorre do confronto entre os dois preceitos, mas aquele só tem aplicação ao processo (principal) de insolvência, embargos e incidente de qualificação. [7] Processo: 177/10.7TYLSB-AV.L1-1 (Relator: Isabel Fonseca), acessível in www.dgsi.pt., como todos os demais arestos aqui referidos. [8] Acórdão do STJ de 27-11-2019, processo: 7553/15.7T8VIS-G.C1.S2 (Relator: Assunção Raimundo). Cfr. ainda o ac. do STJ de 05-04-2022, processo: 850/13.8TBTVD-F.L1.S1 (Relator: Graça Amaral), assim sumariado: “I - O privilégio imobiliário especial previsto no art. 333.º, n.º 1, al. b), do CT, abrange os imóveis da entidade patronal que integram a organização produtiva a que os trabalhadores pertencem em termos de ligação funcional, a qual não se reconduz à localização física onde é exercida a actividade laboral. // II - A ligação funcional dos imóveis com os trabalhadores visada pelo preceito reporta-se à actividade produtiva da entidade patronal. Nesta perspectiva, ficam arredados do privilégio creditório imobiliário os imóveis pertencentes à entidade empregadora que não estejam, de qualquer forma, adstritos a essa actividade produtiva onde o trabalhador se encontra inserido. // III - O destino visado pela insolvente para num seu terreno rústico serem construídas as novas instalações da empresa não assume relevância para a caracterização do referido elo funcional com os trabalhadores, se não for demonstrada a ligação do terreno à actividade da empresa, designadamente por nele terem sido apreendidos bens da insolvente, por ter ficado apurado que os seus trabalhadores tinham nele desempenhado qualquer actividade laboral (na construção das instalações) e/ou que servisse de apoio à respectiva actividade empresarial. // IV - Fora do âmbito do art. 333.º, n.º 1, al. b), do CT, encontram-se os prédios rústicos da insolvente onde, em tempos, funcionou a sua fundição, uma vez que, arredados da respectiva organização produtiva, foi quebrada a indispensável ligação funcional laboral. // V - Encontra-se igualmente excluído da previsão do citado preceito o terreno rústico contíguo aos imóveis onde a insolvente tinha as suas instalações, por não ter sido demonstrado que o mesmo estava, por qualquer forma (que não a mera localização) ligado à actividade produtiva da empresa”. [9] A este propósito, cfr. o acórdão do TRL 09-03-2021, processo: 158/13.9TYLSB- U. L1-1 (Relator: Fátima Reis Silva). Apreciando em concreto de hipótese em que o trabalhador exercia as funções de motorista, cfr. o acórdão do TRE de 30-05-2019, processo: 1014/15.1T8STR-C.E1 (Relator: Rui Machado e Moura), em que se considerou como segue: “[o]ra, dos arestos acima transcritos, resulta claro que acaba por se revelar indiferente que o trabalhador exerça funções num determinado imóvel, pois o que releva, efectivamente, para efeitos de privilégio imobiliário, é que esse imóvel esteja afecto à actividade desenvolvida pela empresa. // Assim, e voltando novamente ao caso dos presentes autos, constata-se que os trabalhadores, aqui recorrentes, não obstante trabalharem no exterior, na condução dos veículos que transportavam betão para as obras, era nas instalações do imóvel apreendido nos autos que aqueles, nomeadamente, se apresentavam para trabalhar e eram efectuadas as revisões e reparações dos veículos pesados que os mesmos conduziam, ou seja, o imóvel em causa estava, na verdade, afecto a toda a actividade empresarial da sociedade insolvente”. [10] Ainda, no sentido que se propugna, o acórdão do TRL de 11.05.2021, processo: 157/08.2TYLSB.L1-1 (Relator: Manuela Espadaneira Lopes), assim sumariado: “1– Na graduação de créditos em processo de insolvência, atento o disposto no artº 140º, nº2, do CIRE, a graduação é geral para os bens da massa insolvente e é especial para os bens a que respeitem direitos reais de garantia e privilégios creditórios.// 2– O privilégio imobiliário especial previsto no art. 377º, nº1, b), do C. Trabalho de 2003 – actualmente artº 333º nº1, al. b) do CT aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12/2 - incide sobre todos os imóveis do empregador que estejam afectos à actividade desenvolvida pela respectiva entidade patronal, independentemente da localização efectiva do posto de trabalho do trabalhador e da concreta função por ele exercida naquela organização. // 3– No apenso de reclamação de créditos em processo de insolvência não é aplicável o disposto no art. 11º do CIRE. No entanto, por força do princípio da aquisição processual plasmado no artº 413º do C.P.Civil, aplicável ex vi do artº 17º, nº1, do CIRE, o tribunal na sentença de verificação e graduação de créditos deverá tomar em consideração os factos que se encontrem provados, tenham ou não emanado da parte que os devia produzir. // 4– Uma fracção autónoma que foi originariamente locada pela entidade patronal insolvente com vista a ser afecta à respectiva actividade comercial e que consta do recibo do vencimento do trabalhador como correspondendo ao domicílio da referida entidade patronal, não pode deixar de ser considerada como fazendo parte da estrutura estável da organização produtiva e comercial da entidade patronal e, como tal, relativamente ao produto da venda da mesma, deverá o crédito do trabalhador gozar de privilégio imobiliário especial nos termos dos normativos aludidos em 1”. [11] Lê-se no acórdão do STJ de 23-01-2014, processo: 1938/06.7TBCTB-E.C1.S1 (Relator: Lopes do Rego), numa situação em que se analisava questão alusiva à graduação de créditos de trabalhador no âmbito da verificação do passivo: “Aliás, bem vistas as coisas, o que a entidade recorrente parece, em última análise, pretender é que se atribuísse um efeito irremediavelmente preclusivo à circunstância de os trabalhadores, no próprio requerimento de reclamação de créditos, não terem logo especificado que prestavam serviço num determinado imóvel, comprometendo irremediavelmente tal omissão a viabilidade da respectiva pretensão, sem que fosse possível que este facto viesse a ser ulteriormente adquirido para o processo. // Considera-se que tal tese – formalista e desproporcionadamente preclusiva - não pode, porém, proceder, já que, por um lado, não teria na devida conta a peculiar natureza do processo de insolvência ( e a consequente possibilidade de se considerarem processualmente adquiridos factos que, embora não expressamente alegados pela parte em certo requerimento, possam resultar da globalidade do processo de liquidação universal do património do insolvente, por nele estarem retratados ou documentados - cfr. Ac. de 22/10/09, proferido pelo STJ no P. 605/04.0TJVNF-A.S1) e o reforço do princípio da inquisitoriedade que resulta da norma contida no art. 11º do CIRE ; e, por outro lado, não se compaginaria sequer com as regras vigentes no domínio do actual processo civil – e com a atenuação das rígidas preclusões que vigoravam anteriormente à reforma de 1995/96 - permitindo há muito a norma que constava do art. 264º, nº3, do CPC ( que corresponde ao actual art. 5º do Código vigente) a aquisição processual de factos que ( sendo substantivamente relevantes, por condicionarem decisivamente a procedência da pretensão deduzida) se devam qualificar como concretizadores ou complementares do núcleo essencial da causa de pedir invocada”. |