Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | HIGINA CASTELO | ||
Descritores: | TERCEIROS REGISTO HIPOTECA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/06/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. Considerando a restrita noção legal de terceiros para efeitos de registo (os que adquiriram de um autor comum direitos incompatíveis entre si), os factos sujeitos a registo, mas não registados têm uma eficácia geral muito ampla, que largamente ultrapassa a mera invocabilidade entre as próprias partes ou seus herdeiros. II. Tendo A dado em pagamento a B o prédio 1, onerado com hipoteca até ao valor de x para garantia de pagamento da dívida de A para com C, se, ulteriormente, A consegue registar a anexação ao prédio 1 (já propriedade de B, mas ainda não registada) do prédio 2, passando a mesma hipoteca, até ao mesmo valor e para garantia do mesmo crédito, a incidir sobre os dois prédios, essa anexação não aumenta a responsabilidade do prédio 1. III. Mantendo-se a hipoteca que incidia sobre o prédio 1 inalterada no seu valor máximo e nas obrigações cujo cumprimento garante, a anexação do prédio 2 não é incompatível com a anterior dação em cumprimento do prédio 1. IV. C, beneficiário da hipoteca, com a referida anexação, não adquiriu nenhum direito sobre o prédio 1 dado em cumprimento a B (já onerado com a hipoteca) que não tivesse antes da dação. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | I. Relatório A – SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA., autora neste processo em que são réus (1) B, LDA., (2) C e D, (3) BANCO, S.A., (4) G, (5) J, (6) K, e (7) L, notificada da sentença absolutória, proferida em 30/01/2023, e com ela não se conformando, interpôs o presente recurso. A compreensão do litígio e do objeto do recurso impõe um pequeno excurso pelos autos: A – SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA., intentou a presente ação declarativa de condenação, contra 1. B, LDA., com sede em Ponta Delgada, 2. C e D, casados entre si, 3. BANCO, S.A., 4. G, 5. J, 6. K, e 7. L, pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada, e que, em consequência: - Seja declarada nula e sem nenhum efeito a escritura de anexação e reforço de hipoteca celebrada em 30.12.2014; - Sejam declarados nulos e sem efeitos os registos relativos à escritura de anexação e reforço de garantia e o registo resultante da anexação de imóveis, e que se proceda ao cancelamento oficioso desses registos junto do Instituto de Registo e Notariado, IP; - Sejam os Réus condenados no pagamento da quantia de €10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais. Para tanto e em síntese, alegou que: - A Autora é uma sociedade comercial que tem por objeto o comércio, importação e venda de reagentes, equipamentos e testes de diagnóstico médico e produtos para investigação. - A 1ª Ré é uma sociedade que se dedica à representação de farmacêuticas e parafarmácias, fundamentalmente na Região Autónoma dos Açores. - Em 29.11.2005, a B, Lda. celebrou, com o BANCO um Contrato de Financiamento no valor global de €6.000.000, com prazo de 4383 dias, a ser reembolsado em 144 prestações, mensais e sucessivas, cada uma no valor de €51.087,22. - Para garantia do reembolso das obrigações assumidas naquele Contrato de Financiamento pela 1ª Ré, foi constituída, entre outras garantias, hipoteca voluntária, no valor máximo de €7.181.760,00 sobre o prédio n.º ...04 da freguesia de Ponta Delgada. - Em 24.12.2014, foi celebrado um contrato de dação em cumprimento pelo qual a B, Lda. deu em pagamento à autora o referido imóvel, para pagamento parcial da dívida de várias sociedades do Grupo B para com a autora, no valor global de €2.170.030,85, acrescidos de juros e despesas. - Quando o referido prédio lhe foi entregue, a autora tinha conhecimento de que o mesmo se encontrava onerado por uma hipoteca voluntária. - Em 30.12.2014, seis dias depois de celebrado o contrato de dação em cumprimento, foi celebrada uma escritura de anexação e reforço de garantia hipotecária entre o BANCO (3º Réu) e a sociedade B, Lda. (1ª Ré), pela qual estas duas entidades acordaram anexar ao prédio n.º ...04 (dias antes dado em dação à Autora), o prédio n.º ...54, prédio esse dado em reforço de hipoteca no âmbito do contrato de financiamento acima referido. - Este facto foi mantido oculto da Autora e do Grupo A em geral, seja pela 1ª Ré, seja pelos 2º e 3º Réus. - Assim, fraudulentamente tentaram que o prédio que já era da Autora respondesse pelas dívidas do Grupo B constituídas ao abrigo da escritura de reforço de hipoteca, ao invés de essa hipoteca sobre o bem da Autora apenas responder pela dívida originária, nos termos da hipoteca que a A conhecia quando adquiriu o prédio por dação. - Tratou-se, pois, de uma habilidade burocrática (ardil doloso) dos Réus para disporem sobre coisa alheia e uns concederem (1º e 2ºs Réus) e outra obter (3ª Ré) uma hipoteca executável sobre um valor global de dívida que incluísse o reforço de hipoteca, que não apenas sobre dívidas autónomas e distintas entre si, para tal recorrendo a um artifício registral, que tinha como efeito implicar que a Autora fosse executada sobre o bem que recebeu em dação, por um valor de dívida superior àquela pela qual responde a hipoteca concedida inicialmente. Obtida nos autos a informação de que quer a 1.ª Ré (B, Lda.), quer os 2.º Réus (C e D), se encontram insolventes, estando os respetivos processos a correr termos (n.ºs 01/15.5T8PDL e 02/15.1T8PDL), com vista à liquidação da massa insolvente, tendo em mente que o prédio em causa não se encontra apreendido para as respetivas massas insolventes, foi julgada extinta a instância quanto ao terceiro pedido (pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais) formulado contra os Réus B, Lda., C e D, nos termos do disposto no artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil. Citados, os 1.º e 2.º Réus não contestaram a ação. Os 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º contestaram, alegando desconhecimento da dação em cumprimento entre a Autora e a 1.º Ré, e que a Autora apenas ratificou a gestão da dação em cumprimento em 28.07.2015, ou seja, após a escritura da anexação e de reforço de hipoteca, pelo que vigora o princípio da prioridade de registos, prevalecendo o que foi inscrito em primeiro lugar. Findos os articulados, foi dispensada a realização de audiência prévia e foi proferido despacho saneador no qual foi conhecida a exceção levantada pelos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Réus, que sustentavam a existência de causa prejudicial da presenta ação face ao Processo Executivo n.º 03/19.6T8PDL, indeferindo-a. Após audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e, em conformidade, absolveu os Réus de todos os pedidos formulados. A autora não se conformou e recorreu, concluindo as suas alegações de recurso da seguinte forma: «A. O presente Recurso Ordinário de Apelação vem interposto da Sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, em 30.01.2023, que julgou totalmente improcedente a presente Ação intentada pela Recorrente, por alegada inexistência de prova quanto à má-fé do Recorrido BANCO traduzida no conhecimento das negociações relativas à dação em cumprimento que se encontrava a ser preparada a favor da Recorrente, e consequente conluio na celebração de escritura de anexação e reforço de garantia e registo prévio, como forma de inviabilizar aquele negócio e lograr um benéfico do Recorrido BANCO face aos demais credores da Recorrida B, Lda. (…) D. Em concreto, demonstrou-se que, mal andou o douto Tribunal a quo a dar como provados os factos n.º 25 a 30, e como não provados os factos descritos nas alíneas a) a h), quando estes é que deveriam ter sido julgados como provados e aqueles como não provados, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 662.º, do CPC, E. Aos quais sempre deveriam acrescer os Fatos aditados pela aqui Recorrente, sob os números 11) a 14), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 640.º, n.º 1 alíneas a) a c), e n.º 2, alínea a), do CPC. F. Ou seja, que deveria ter sido dado como provado – e não foi – que 1) em 09.05.2014, o Sr. H deu conhecimento das negociações com Recorrente a terceiros, designadamente aos Bancos Garantes da dívida do Grupo B, nos quais se incluía o aqui Recorrido BANCO, G. Pois que tal resulta claro do teor do Documento n.º 1, junto ao Requerimento da Recorrente em 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391, como se demonstrou supra; H. Mais deveria ter sido dado como provado – e não foi – que 2) entre 18.05.2014, 19.05.2014, e 23.05.2014, a Recorrente trocou correspondência com o H e o Mandatário do Grupo B relativamente à documentação necessária à celebração da Dação em Cumprimento, e que estes últimos se comprometeram a enviar as Declarações das Sociedades do Grupo B proprietárias dos imóveis objeto de Dação e das Instituições Bancárias com hipotecas sobre esses imóveis – entre eles o aqui Recorrido BANCO – a prestarem o seu consentimento à alienação dos mesmos nos termos acordados entre as Partes, I. Pois que tal resulta claro do teor do Documento n.º 2, junto ao Requerimento da Recorrente de 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391, como se demonstrou supra; J. Mais deveria ter sido dado como provado – e não foi – que 3) em 31.10.2014, a Recorrida Sociedade B, Lda. enviou uma missiva ao Recorrido BANCO com o assunto “Financiamento B SGPS SA / Reestruturação Grupo B”, a requerer mais crédito e a informar da que será efetuada uma operação de venda de alguns imóveis como dação em pagamento com opção de recompra à Recorrente, K. Pois que isso resulta claro do Documento n.º 3, junto ao Requerimento da Recorrente de 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391, como se demonstrou supra; L. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 4) em 01.12.2014, o Recorrido BANCO procurou saber junto do Exmo. Sr. Dr. Notário que viria a ser responsável pela certificação da escritura de anexação e reforço, como salvaguardar a sua posição “enquanto credor hipotecário, designadamente no que diz respeito à verdadeira incidência da hipoteca em apreço” em caso de anexação dos prédios ...04 e ...54, M. Isso resulta claro do teor do Documento n.º 4, em anexo ao Documento n.º 1, junto ao Requerimento da Recorrente de 22.10.2021, com a Ref.ª 4341791, e depoimento prestado Sr. Notário em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06, como se demonstrou supra; N. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 5) em 15.12.2014, o prédio ...55 já se encontrava provisoriamente inscrito na matriz sob o artigo P...44, com Modelo Um do IMI, rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada, O. Pois que isso resulta claro do teor do Documento junto ao Requerimento apresentado pelo Sr. Notário em 02.11.2021, com a Ref.ª 4365818, e depoimento prestado pelo mesmo em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06, como se demonstrou supra; P. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 6) em 24.12.2014, aquando da celebração da dação em cumprimento com a Recorrente do prédio ...04, em regime de gestão de negócios foi omitindo aquela inscrição provisória do prédio ...55, resultante da anexação daquele prédio ...04 e do prédio ...54, Q. Pois que isso resultou claro do depoimento das Testemunha do Dr. H, Dr. N e Dr. M, como se demonstrou supra. R. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 7) em 29.12.2014, a Recorrida Sociedade B, Lda. regista com caracter de urgência a propriedade do imóvel ...54, adquirido em 18.12.1998 (cf. prova junta pelo Sr. Notário); S. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 8) em a escritura de anexação de imóveis não era necessária para o reforço de hipoteca que o Recorrido BANCO desejava obter, pois que, se bastava com a constituição de garantia sobre o novo bem não existindo necessidade de o anexar ao primeiro bem dado em garantia, T. Pois que isso resultou claro do depoimento do depoimento prestado pelo Sr. Notário em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06, como se demonstrou supra; U. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 9) a ideia de anexação dos imóveis para efeitos de reforço de garantia partiu do Recorrido BANCO, e foi transmitida como sendo obrigatória e conatural da anterior Hipoteca, V. Pois que isso resultou claro do depoimento do depoimento prestado Sr. H em sede de em sede de audiência realizada em 25.10.2021, min. 00:23:57 a 00:45:21, como se demonstrou supra; W. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 10) em 17.03.2017, o Legal Representante do Recorrido BANCO, ANS, foi notificado pelo Sr. Administrador de Insolvência, do Requerimento apresentado pela Recorrente a justificar os contornos da Dação em Cumprimento, ainda que aquele previamente notificado os Mandatários do BANCO constituídos nos autos, e ainda que este não tivesse ainda sido nomeado Presidente da Comissão de Credores, o que só veio a ocorrer em 20.03.2017, X. Pois que isso resulta claro do documento intitulado “e-mail – recibos”, remetido pelo Sr. Administrador de Insolvência notificado por Ofício datado de 23.02.2022, fls. 1 a 135; Y. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 11) o Recorrido BANCO na qualidade de Presidente da Comissão de Credores aprovou o orçamento para a instauração da ação de resolução do negócio da Recorrente sem desvendar o seu conflito de interesses, Z. Pois que isso também resultou claro do documento intitulado “e-mail – recibos”, remetido pelo Sr. Administrador de Insolvência notificado por Ofício datado de 23.02.2022, fls. 1 a 135; AA. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 12) o Recorrido BANCO procedeu à avaliação do imóvel em causa e deu instruções sobre a sua venda ao Sr. Administrador de Insolvência, quando já conhecia dos contornos da Dação em Cumprimento a favor da Recorrente, BB. Pois que isso resulta claro do teor de fls. 277 e 285, do Documento n.º 1 e fls.1 a 3, do Documento n.º 2, daquela documentação, e resultou também claro do depoimento do Dr. ANS prestado em sede de audiência de julgamento realizada em 02.09.2022, e dos depoimentos do Sr. Administrador de Insolvência e da sua anterior funcionária, a Sra. Sofia, prestados em sede de audiência de julgamento realizada em 14.11.2022. CC. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 13) o Recorrido BANCO não procurou reverter o seu negócio, não obstante conhecer a decisão a determinar a validade da Dação em Cumprimento proferida no Proc. n.º 01/15.5T8PDL-Q e sua eficácia retroativa à data da sua celebração (24.12.2014), i.e., em data anterior à celebração do seu negócio. DD. Mais deveria ter sido dado com o provado – e não foi – que 14) o negócio de anexação e reforço de garantia dos Recorridos B e C e Recorrido BANCO colocava e colocou este último numa posição mais favorável que aos demais credores, pois que garantiu mais crédito garantido, EE. Tendo tal facto resultado provado do depoimento do Sr. Administrador de Insolvência prestado em sede de audiência realizada em 14.11.2022, min. 00:10:50 a 00:18:27. FF. Por conseguinte, dos factos relatados, sua sequência cronológica e prova que sustenta, resulta que o Recorrido BANCO quando conhecedor da intenção de celebração da mesma (pelo menos desde Maio de 2014, com maior certeza após a receção da missiva de 31.10.2014), exigiu em Novembro de 2014 a anexação e o reforço das suas garantias, através do reforço da sua Hipoteca já constituída sobre o prédio ...04 (que sabia vir a ser objeto de dação) mediante anexação deste ao prédio ...54 e consequente extensão daquela hipoteca a este prédio, GG. Tendo por efeito desejado a inviabilização do negócio da Recorrente com as sociedades do Grupo B, HH. Pois que, nenhum fundamento e/u “interesse específico das Partes” poderia existir para fazer depender o reforço da garantia desejada da anexação daqueles dois prédios, quando, como se provou, o mesmo poderia apenas incidir sob o prédio ...54, sem colidir com o direito de propriedade da Autora. II. Isto é, em caso de execução, o aqui Recorrido BANCO poderia sempre executar a referida hipoteca sobre aqueles imóveis isoladamente, não existindo, como se disse, qualquer necessidade de aqueles se encontrarem anexados num único prédio. JJ. De facto, o Recorrido BANCO não logrou provar nos autos um qualquer “interesse legítimo” de/na anexação dos dois imóveis para efeitos do reforço de hipoteca, tendo-se recusado a juntar aos autos cópia da resposta do Sr. Notário à dúvida colocada pela sua Mandatária onde esta procurava saber já em procura saber, já em 01.12.2014, como salvaguardar a posição do Recorrido BANCO “enquanto credor hipotecário, designadamente no que diz respeito à verdadeira incidência da hipoteca em apreço”. KK. Mais resulta provado que os Recorridos B e C e BANCO omitiram da Recorrente as negociações levadas a cabo para a anexação dos prédios em causa, tendo esta sido celebrada já após a celebração da Dação em Pagamento que era condição vital para a Recorrente não prosseguir com as Ações Executivas já instauradas contra as Sociedades do Grupo B e contra o Réu C que se obrigou igualmente a título pessoal nos Acordos de 2012 e 2013. LL. Tendo resultado ainda provado que o Recorrido BANCO procurou sempre omitir a sua responsabilidade de/na celebração de tal escritura, nada tendo feito para reverter o negócio em causa, antes indo adiante e obtendo proveito da anexação desse artigo com outro, levando ao registo de hipoteca sobre um novo artigo resultante da anexação de ambos, de modo a, na prática, beneficiar de uma hipoteca única, desprezando que tal fosse ato sobre propriedade de terceiro (a aqui Recorrente). MM. Logrando, também assim, um benefício ilegítimo face aos demais credores daquela Sociedade, pois que, o imóvel com o n.º ...54 nunca chegou a integrar a lista de bens da massa insolvente da mesma, já que o Exmo. Sr. Administrador de Insolvência apenas tomou por referência o novo prédio ...55 (Verba 37), julgando-o (também em claro erro) da exclusiva propriedade da ora Recorrente aquando da prolação de Sentença a julgar improcedente a ação de resolução da dação em cumprimento em beneficio da massa insolvente (Processo n.º 01/15.5T8PDL-Q). NN. Tal tentativa de obtenção de benefício ilegítimo face por parte do Recorrido BANCO face aos demais credores, encontra-se desde logo evidenciado na prova carreada aos autos do Processo de Insolvência, de onde resulta que o Sr. Administrador de Insolvência deu conhecimento direto ao Representante Legal do BANCO (ainda que este se encontrasse representado por Mandatário) das diligências no sentido da averiguação dos termos e condições de realização dos negócios e da resposta da Recorrente, em data anterior à Assembleia de constituição da Comissão de Credores onde o aqui Recorrido BANCO foi nomeado como Presidente da Comissão de Credores, OO. E de onde resulta que o Recorrido BANCO votou favoravelmente à instauração da Ação de Resolução da Dação e procedeu à avaliação do imóvel e deu indicações para a sua venda, sem dar conhecimento do seu claro conflito de interesses em causa. PP. Tal comportamento, por si só, é suficientemente indiciador da clara má-fé e do interesse que o Recorrido BANCO, desde o primeiro momento, teve na manutenção do seu negócio de Anexação e Reforço de Hipoteca, em detrimento do negócio de dação em cumprimento celebrado entre a Sociedade B, Lda., e a Recorrente, QQ. Pois que, esse terá sido, desde o início, o objetivo primordial que deu lugar a toda esta ilegalidade. RR. Termos em que, tal negócio deve ser julgado nulo nos termos e para os efeitos da aplicação conjugada dos artigos 715.º e 812.º, aplicável ex vi do artigo 939, do Código Civil, por se tratar de oneração de bem alheio por intermédio de anexação e reforço de hipoteca; SS. E/ou nulo por se tratar de negócio impossível nos termos do artigo 280.º, do Código Civil, por ter incidido sobre objeto legalmente impossível em face da ausência de poderes de alienação e oneração sobre o imóvel; TT. E/ou nulo por se tratar de negócio contrário à lei, porquanto contrário às normas imperativas ínsitas nos artigos 715.º e 1305.º, do Código Civil. UU. Não se podendo considerar – ao contrário do decidido pelo douto Tribunal a quo – em claro erro de julgamento – o Recorrido BANCO como um terceiro de boa-fé para efeitos da proteção conferida pelo regime de aquisição tabular nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 e 4, do artigo 5.º, do CRP, por este não poder ser considerado como terceiro de boa-fé de direito incompatível, atenta, precisamente, toda a prova quanto ao seu prévio conhecimento. VV. Termos em que, deve a Sentença recorrida ser revogada por evidente erro de julgamento de/na apreciação da matéria de facto e da matéria de direito, nos termos e com os fundamentos expostos nas presentes alegações, e, em consequência, ser declarada nula e sem nenhum efeito a escritura de anexação e reforço de hipoteca celebrada em 30.12.2014, e bem assim, declarados nulos e sem nenhuns efeitos os registos relativos à escritura de anexação e reforço de garantia e o registo resultante da anexação de imóveis, também ele nulo, com notificação oficiosa do Instituto de Registo e Notariado, IP, para proceder ao cancelamento desses registos. WW. Em consequência, deve ainda ser julgado procedente o pedido de condenação dos Recorridos no pagamento de indemnização à Recorrente, a título de responsabilidade civil extracontratual, XX. Pois que resultou também provado que a conduta dos Recorridos foi contrária ao direito, em clara violação do direito de propriedade da Recorrente (cf. artigo 1305º do CC) e numa evidente prática de atos que implicam um negócio nulo (cf. artigos 892.º, 280.º, n.º 1 e 294.º, todos do CC) em detrimento dos direitos e interesses da Recorrente, que com isso sofreu danos/prejuízos derivados da indisponibilidade do prédio e danos/prejuízos na sua imagem, conforme depoimento prestado pelo Sr. Dr. N, YY. Termos em que, deve a Sentença recorrida ser também revogada nesta matéria, julgando-se procedente, por provado, o pedido de condenação dos Recorridos no pagamento da quantia de €10.000,00 (dez mil euros), ou ser o seu quantum relegado para incidente de liquidação de Sentença. nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2, do artigo 609.º, do CPC. ZZ. Por conseguinte, e nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7, do artigo 6.º, do Regulamento das Custas Processuais, e atendendo à ponderação entre custo/utilidade do serviço que efetivamente foi prestado à Recorrente pelo sistema público de Administração da Justiça, deve a Recorrente ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atenta a simplicidade decisória dos mesmos, bem como atendendo à conduta positiva de cooperação da Recorrente em juízo, que sempre foi pautada pela adequação, normalidade, lealdade, boa-fé e colaboração para com a Parte contrária e o Tribunal, não tendo dado azo à prática de quaisquer atos dilatórios destinados a protelar no tempo a realização da justiça, não merecendo qualquer censura. AAA. Nestes termos, desde já se requer, que seja reformada a Sentença recorrida e que douto Tribunal a quo se digne a dispensar a totalidade do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pela Recorrente, nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP. Termos em que deve o presente Recurso Jurisdicional ser julgado totalmente procedente, por provado, por relação aos Erros de Julgamento da matéria de Facto e de Direito assacados à Sentença recorrida, devendo esta ser revogada, nos termos e com os fundamentos supra expostos e substituída por Acórdão prolatado por V. Exas. que julgue, a final, a presente Ação totalmente procedente, com a consequente declaração de nulidade, e sem nenhum efeito, a escritura de anexação e reforço de hipoteca celebrada em 30.12.2014, nos termos e com os fundamentos supra expostos, E, consequentemente, Serem declarados nulos e sem nenhuns efeitos os registos relativos à escritura de anexação e reforço de garantia e o registo resultante da anexação de imóveis, também ele nulo, requerendo-se a que este douto Tribunal oficie o Instituto de Registo e Notariado, I.P., para proceder ao cancelamento desses registos; Mais devem os Recorridos condenados no pagamento da quantia de €10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, ou ser o seu quantum relegado para ulterior incidente de liquidação de sentença, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 609.º, do CPC. Em qualquer dos casos, deve a Recorrente, ser dispensada do pagamento, na sua totalidade, do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, com os fundamentos supra expostos. Assim se fazendo a costuma JUSTIÇA!» Os 3.º a 7.º réus contra-alegaram, pronunciando-se pela confirmação da sentença recorrida. Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito. Objeto do recurso Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (artigos 635.º, 637.º, n.º 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes questões: a) A matéria de facto deve ser alterada, nomeadamente, no sentido da existência de má-fé da 1.ª e do 3.º réus no negócio constante da escritura celebrada em 30/12/2014, intitulada de «anexação e reforço de garantia hipotecária»? b) Na positiva, o direito dita uma decisão diferente da alcançada em 1.ª instância? II. Fundamentação de facto Estão provados os seguintes factos, que correspondem àqueles que foram considerados provados em 1.ª instância, com as alterações (11, 28 e 30), aditamentos (6-A, 6-B, 8-A) e exclusões (25, 26 e 27) efetuados por nós, com os fundamentos abaixo explanados em III.1.: 1. A Autora é uma sociedade comercial que tem por objeto o comércio, importação e venda de reagentes, equipamentos e testes de diagnóstico médico e produtos para investigação. 2. A Ré B, Lda. era uma sociedade que fazia parte do Grupo B que se dedicava à representação de farmacêuticas e parafarmácias, fundamentalmente na Região Autónoma dos Açores. 3. Em 28.07.1997, a B, Lda. adquiriu o prédio registado na Conservatória de Registo Predial sob o n.º ...04 (ap. 18, de 1997.07.28). 4. Em 24.11.2005, foi registada hipoteca voluntária a favor de Banco, S.A. sobre o prédio registado na Conservatória de Registo Predial sob o nº ...04. 5. Em 29.11.2005, a B, Lda. celebrou, com o BANCO um Contrato de Financiamento designado por CLS n.º 105495271, no valor global de €6.000.000.00 (seis milhões de euros), com prazo de 4383 (quatro mil trezentos e oitenta e três) dias, a ser reembolsado em 144 (cento e quarente e quatro) prestações, mensais e sucessivas, cada uma no valor de €51.087,22 (cinquenta e um mil e oitenta e sete euros e vinte e dois cêntimos), vencendo-se a última prestação em 29.11.2017. 6. Para garantia do reembolso das obrigações assumidas naquele Contrato de Financiamento pela B, Lda. foram constituídas as seguintes garantias: i) entrega da Livrança n.º 500873631044089007 subscrita pela sociedade B, Lda., avalizada por C e D; ii) Hipoteca Voluntária, inscrita na Ap. 83 de 24.11.2005, no valor máximo de € 7.181.760,00 sobre o prédio n.º ...04 da freguesia de Ponta Delgada; e iii) Hipoteca Voluntária, sobre o prédio n.º 515 da freguesia de Ponta Delgada. 6-A. Em finais de 2014, mas antes de 15 de dezembro, a Dra. J do BANCO abordou H e C dando conta de que faltava um artigo matricial na escritura de hipoteca de 2005 que impendia sobre o imóvel da sede, descrito na CRP sob o n.º ...04 e inscrito na matriz sob o art.º ...95: faltava o art.º ...82, que por escritura de 1998 tinha sido comprado e anexado ao art.º ...95 (...04 da CRP); seria, então, necessário fazer uma retificação a essa escritura, de forma a incluir também o art.º ...82 [aditado pelos motivos infra explicados em III.1.2.]. 6-B. Em 15/12/2014, foi rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada o Modelo 1 do IMI, para inscrição na matriz predial urbana de um prédio novo, composto pelos artigos matriciais urbanos ...95 (descrito na CRP de Ponta Delgada com o n.º ...04) e ...82 (à data, omisso na CRP, mas que viria a ser descrito sob o n.º ...54), ao qual foi atribuído o art.º (provisório) P-...44, e que corresponde ao prédio que, em 31/12/2014, viria a ser descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o n.º ...55 [aditado pelos motivos infra explicados em III.1.2.]. 7. Em 24.12.2014, foi celebrado um contrato de Dação em Cumprimento (dação “pro solvendo”) entre a Autora, e a sociedade B, Lda., na qual consta: “Primeiro outorgante: B, Lda. Segundo outorgante: Quimac – ARW – Construção Civil e Atividades Imobiliárias, Lda. Terceiro outorgante: A, Lda. (…) D) Houve incumprimento em ambos os acordos, a sociedade A, Lda. instaurou processos judiciais contra as referidas sociedades, e C, os quais tramitam como processos executivos junto do Tribunal Judicial de Ponta Delgada, Proc.º nº 04/14.7TBPDL (execução ordinária) com o valor de 836.838,30€ relativamente ao incumprimento do “Acordo de 2012” e Proc.º nº 05/14.3TBPDL (execução ordinária) com o valor de 1.333.192,55€ relativamente ao incumprimento do “Acordo de 2013”. e) Pretendem as partes gestidas na presente escritura proceder à regulação dos termos de liquidação parcial da dívida existente e que corresponde à soma dos valores peticionados nos dois processos referidos no ponto anterior, no valor global de 2.170.030,85€, acrescidos de juros de mora à taxa legal e custos melhor definidos nos termos a seguir regulados. (…) Cláusula 9ª (…) 2. As gestidas do Primeiro e segundo outorgante reconhecem-se ainda devedoras da gestida do terceiro outorgante pelo valor referente ao somatório dos diferenciais entre o valor patrimonial tributável à data da outorga da presente e o valor de mercado dos imóveis dados em cumprimento conforme avaliação que as partes conhecem e aceitam que é de 165.977,30€. Este valor acrescerá à dívida indicada na Cláusula 1, nº 1. Que assim, nos termos do artigo 840.º do Código Civil e para cumprimento parcial da dívida das sociedades e de C e esposa, na qualidade de devedores solidários da dívida relativa ao “acordo de 2013”, como referidos no considerando B) e constante do nº 1 da cláusula 1ª acima: A sociedade B, Lda. para cumprimento do valor de 808.090,00 dá à gestida do terceiro outorgante: i. o prédio urbano (…) sito na freguesia de S. Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponta Delgada sob o nº ...04 (…), inscrito na matriz sob o artigo ...95, com o valor patrimonial de 806.500,00€ a que se atribui igual valor; ii. o prédio rústico (…) sito na freguesia de S. José, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponta Delgada sob o nº ...39 (…), inscrito na matriz sob o artigo ...63, com o valor patrimonial de 1.590,00€ a que se atribui igual valor. (…) Pelo terceiro outorgante foi dito que aceita esta dação em cumprimento nos termos exarados. (…)” 8. A dação em cumprimento foi outorgada por H, filho de C e D, tendo aquele outorgado o contrato em gestão de negócios, em representação da sociedade B, Lda., que a essa data era detida e gerida por C e D e cujo contrato de dação foi celebrado com o conhecimento e por vontade dessa 1ª Ré. 8-A. Em 24/12/2014, aquando da celebração da dação em cumprimento à ora autora do prédio descrito na CRP com o n.º ...04 (art.º matricial ...95), foi omitida a inscrição na matriz do art.º (provisório) P-...44, para anexação daquele com o art.º matricial ...82 (então omisso, mas a que viria a corresponder o n.º ...54 na CPR), e que ulteriormente viria a ser descrito e registado na CRP com o n.º ...55. [aditado pelos motivos infra explicados em III.1.2.]. 9. Quando o prédio urbano (…) sito na freguesia de S. Sebastião, concelho de Ponta Delgada, descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponta Delgada sob o nº ...04 (…), inscrito na matriz sob o artigo ...95, lhe foi entregue, a Autora tinha conhecimento de que o mesmo se encontrava onerado por uma hipoteca voluntária, inscrita na Ap. 83 de 24.11.2005, registada na sequência do contrato de financiamento celebrado em 2005 entre a sociedade B, Lda. e o BANCO, facto que aceitou expressamente para fins de celebração da escritura de dação. 10. Essa escritura de dação serviria para habilitar a Autora com uma forma de pagamento parcial das dívidas do Grupo B, assim lhe permitindo continuar a fornecer bens ao Grupo B, no quadro da distribuição que essa fazia junto das unidades de saúde públicas da Região Autónoma dos Açores, tendo o Grupo A sido o único grupo farmacêutico – acredita-se – a “dar a mão” ao Grupo B no momento de aflição financeira deste, pois que todos os demais cortaram-lhe fornecimentos, quando este começou a entrar em incumprimento com o dever de pagamento à indústria farmacêutica, cujos produtos representava ou comercializava na Região Autónoma dos Açores. 11. Em 29/12/2014, B, Lda. requer na CRP de Ponta Delgada o registo do seu direito de propriedade sobre o imóvel inscrito na matriz urbana sob o art.º ...82, por si adquirido por escritura de 18/12/1998, requerimento que dá lugar à criação do n.º ...54 da freguesia de São Sebastião, na CRP de Ponta Delgada (Açores) [alterado pelos motivos infra explicados em III.1.2.]. 12. Em 30.12.2014, foi celebrada uma escritura de anexação e reforço de garantia hipotecária entre o BANCO (3º Réu) e a sociedade B, Lda. (1ª Ré), pela qual estas duas entidades acordaram anexar ao prédio n.º ...04, o prédio n.º ...54. 13. Nessa escritura os Réus C e D (2ºs Réus), em representação da sociedade B, Lda. (1ª Ré), declararam, expressamente: “Que a sociedade, sua representada, é dona e legítima possuidora dos seguintes dois prédios”: - Prédio urbano n.º ...04 da freguesia de São Sebastião, Ponta Delgada, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...95; - Prédio urbano n.º ...54 da freguesia de São Sebastião, Ponta Delgada, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...82. Mais declararam, nessa escritura de anexação, o seguinte: “Que, estes prédios são contíguos, e tendo sido já pedida a sua anexação a nível matricial, que deu origem ao artigo P...44 da dita freguesia de Matriz, pela presente, a sua representada para efeitos registrais, ANEXA os referidos dois prédios de que é proprietária (…)” Ficou ainda a constar: “Que, no entanto, tendo em vista esta ANEXAÇÃO, para que a mesma possa ser efetuada, tendo em conta que apenas um dos prédios objeto da presente anexação se encontra hipotecado, e que a mesma só é possível desde que a referida hipoteca, a favor do BANCO, S.A., abranja igualmente o prédio não hipotecado, como ato prévio da anexação, em nome da sociedade sua representada, REFORÇA, o objeto que foi dado em garantia de hipoteca ao dito Banco, no sentido desta garantia abranger igualmente o prédio não hipotecado, isto é, a hipoteca que recai sobre o prédio urbano descrito sob o número …04, da freguesia de São Sebastião passa a englobar igualmente o prédio urbano descrito sob o número …54, da mesma freguesia e desta forma podem então proceder à ANEXAÇÃO.” 14. Este facto – anexação dos dois prédios, por via da escritura de reforço da hipoteca dada através do artigo que resultasse da anexação – foi mantido oculto da Autora e do Grupo A em geral, seja pela 1ª Ré, seja pelos 2.º, embora os 1º e 2ºs Réus bem soubessem e tivessem plena consciência que o que acabavam de celebrar em 30.12.2014 implicaria uma incompatibilidade com o que os 1º e 2ª Réus celebraram com a Autora em 24.12.2014. 15. Os 1º e 2º Réus também omitiram factos à Conservatória do Registo Predial, pois que nunca a essa esclareceram que um dos prédios a anexar, na data em que a anexação foi feita, já pertencia a terceiro. 16. A 1ª Ré bem sabia e desejava a anexação na data da outorga de tal escritura, sendo de sua vontade esclarecida obter uma anexação sobre prédio que havia sido previamente dado em cumprimento à Autora. 17. Em 31.12.2014, foi registada hipoteca referente ao prédio n.º ...54, da qual consta: reforço da hipoteca como garantia deste prédio, registada pela apresentação 83 de 24.11.2005 do prédio ...04/São Sebastião. Esta inscrição é referente ao prédio ...54/São Sebastião. 18. Em 31.12.2014 foi determinado, por virtude da anexação acordada em escritura pública, entre a sociedade B, Lda. e o BANCO, que a anexação do n.º ...04 e o n.º ...54, resultassem num único novo número, o n.º ...55, sobre o qual passou a incidir a hipoteca do BANCO, com supressão registral da menção à hipoteca sobre o n.º ...04. [A palavra «número» e a sua abreviatura «n.º» constantes deste facto foram acrescentadas por nós, em substituição do termo «artigo». A originária referência a «artigo» ter-se-á ficado a dever a mero lapso de escrita, pois não estão neste facto referidos artigos (matriciais), mas números de descrição na CRP] 19. Em 09.01.2015, Cartório Notarial R remeteu a Cartório Notarial a cargo de Gonçalo Rodrigo Barreiros documento do qual consta Assunto: averbamento de ratificação; para efeitos de averbamento comunico a V. Ex.cia que, por instrumento de ratificação outorgado pelas sociedades Quimac – ARW Construção Civil e atividades imobiliárias (…) e B, Lda. (…) referente ao corrente ano, foi ratificada a gestão de negócios exercida por H (…) em nome das referidas sociedades, no vosso Cartório Notarial na escritura lavrada no Livro de Notas para escrituras diversas nº 59, iniciada a fls. 37, dando a mesma como inteiramente eficaz. 20. Em 16.07.2015, a Autora registou a aquisição por dação em cumprimento do prédio registado na Conservatória de Registo Predial sob o nº ...04 (AP. 916 de 2015/07/16, da qual consta “A inscrição incide apenas sobre o prédio correspondente à descrição ...04, entretanto inutilizada”, convertida em registo definitivo pela AP. 492 de 2015/08/04. 21. Em 28.07.2015, a Autora A, Ldª ratificou a dação em cumprimento celebrada em 24.12.2014. 22. Tendo sido entregues com a promoção do registo junto da Conservatória do Registo Predial, como título justificativo a escritura celebrada em 24.12.2014 e os dois instrumentos de ratificação. 23. A autora não deu autorização para a realização da escritura de anexação e reforço de garantia hipotecária e respetivo registo. 24. Em 27.09.2017, foi registada a declaração de insolvência da B, Lda. no prédio registado na Conservatória de Registo Predial sob o nº ...55, registo do qual consta: data da sentença: 20.04.2016; Trânsito: 23.05.2016. 25. [Excluído pelos motivos constantes de III.1.4.] 26. [Excluído pelos motivos constantes de III.1.4.] 27. [Excluído pelos motivos constantes de III.1.4.] 28. O Réu BANCO celebrou em 30/12/2014 com a 1ª Ré a escritura intitulada «anexação e reforço de garantia hipotecária» para que a hipoteca constituída em 2005 sobre o imóvel da sede (art.º matricial urbano ...95, CRP ...04) passasse a abranger o prédio das traseiras (art.º matricial urbano ...82) que, por escritura de 18/12/1998, foi adquirido pela 1.ª ré, escritura na qual consta também a sua anexação, «para ampliação do seu logradouro, ao prédio urbano que lhe é contíguo ou confinante pelo lado poente, qual seja, o sito na Rua S, n.º … e descrito na dita conservatória sob o número …04» [Alterado pelos motivos constantes de III.1.4.]. 29. Consta expressamente da escritura de anexação e reforço de hipoteca (de 30/12/2014) que a anexação dos prédios apenas poderá ser efetuada “desde que a referida hipoteca a favor do BANCO abranja igualmente o prédio não hipotecado…”. 30. O imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82, e que tinha sido anexado ao art.º matricial urbano ...95 (descrito na CRP sob o n.º ...04) por escritura de 18/12/1998, constante também como objeto de anexação na escritura de 30/12/2014, era um terreno situado nas traseiras do imóvel da sede que servia de parque de estacionamento e sem qualquer acesso por outro prédio confinante [Alterado pelos motivos constantes de III.1.4.]. III. Apreciação do mérito do recurso 1. Da alteração da decisão de facto pretendida pela recorrente A autora e recorrente impugna a decisão da matéria de facto quanto aos factos provados n.ºs 25 a 30 (que pretende que passem a não provados) e aos factos não provados nas alíneas a) a h) (que requer que sejam considerados provados), pugnando, ainda, pelo aditamento ao elenco de factos provados das afirmações enumeradas de 1) a 14) no artigo 145.º das alegações de recurso. 1.1. Considerações gerais sobre os ónus de quem impugna a matéria de facto e a reapreciação da prova pela Relação O recorrente pode impugnar a decisão sobre a matéria de facto, conquanto observe as regras contidas no artigo 640.º do CPC. Segundo elas, e sob pena de rejeição do respetivo recurso, o recorrente deve especificar: a) os pontos da matéria de facto de que discorda; b) os meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida; e, c) a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (artigo 640.º, n.º 1, do CPC). No que respeita à indicação dos meios probatórios, quando os que sejam invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (artigo 640.º, n.º 2, do CPC). Das aludidas especificações, os pontos da matéria de facto de que o recorrente discorda têm de constar necessariamente das conclusões, dado que estas servem para delimitar o objeto do recurso, cfr. artigos 639.º e 635.º, n.º 4, do CPC (assim tem sido interpretado, v.g., Ac. STJ de 21/04/2016, proc. 449/10.0TTVFR.P2.S1, relatado por Ana Luísa Geraldes); as demais especificações podem ficar apenas no corpo das alegações. A recorrente cumpriu os indicados ónus, pelo que reapreciaremos a prova, com vista a reavaliar os pontos da matéria de facto impugnados. Sobre a formação da convicção em 2.ª instância, lembramos que as únicas restrições que a lei impõe à reapreciação da prova pela Relação são as que resultam do artigo 640.º do CPC: a reapreciação está limitada a determinados aspetos da matéria de facto dos quais o recorrente discorda e implicará a reanálise de elementos probatórios dos quais o recorrente entende resultar outra solução. Fora destas balizas, o CPC confere aos tribunais de 2.ª instância poderes-deveres semelhantes aos dos tribunais de 1.ª instância no que concerne à criação da convicção pela livre apreciação da prova. Tanto significa que os juízes desembargadores apreciam livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão (assim se lê no artigo 607.º, n.º 5, do CPC). Escrevem Pires de Lima e Antunes Varela, citando Ac. do STJ de 30/12/1977 (BMJ 271/185), que prova livre não quer dizer prova arbitrária, «mas prova apreciada pelo juiz segundo a sua experiência, a sua prudência, o seu bom senso, com inteira liberdade, sem estar vinculado ou adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais» (Código Civil Anotado, I, 4.ª ed., Coimbra Editora, 1987, p. 340). A liberdade de apreciação, que existe para os meios de prova em geral (sem prejuízo dos casos de prova tarifada que a lei prevê) tem de gerar a «convicção». O juiz atinge a «convicção» quando está seguro de que o facto ocorreu, não (necessariamente) por uma certeza absoluta, mas porque para si – após a sua análise crítica das provas produzidas, considerando a sua validade, consistência e coerência, concatenando-as umas com as outras, e ponderando todas e cada uma delas com os dados da lógica e da probabilística –, é (praticamente) certo que assim sucedeu. Relembre-se que a provas têm por função a demonstração da realidade dos factos – artigo 341.º do CC. Não atingindo a convicção, o juiz terá de decidir em desfavor da parte onerada com a prova do facto (concordando-se nesta matéria com Teixeira de Sousa, no Comentário ao Ac. RG 19/9/2019, proc. 3018/18.3T8BRG.G1, acessível em https://blogippc.blogspot.com/2019/10/jurisprudencia-2019-100.html). Saber quem tem o ónus de provar cada facto ou conjunto de factos alcança-se pela correspondência entre eles, concretamente situados, e as regras de direito probatório material contidas nos artigos 342.º e ss. do CC. Havendo dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova, o juiz decidirá contra a parte a quem o facto aproveita – artigo 414.º do CPC. Perante as regras positivadas no CPC, e sem prejuízo do seccionamento do objeto da reapreciação por via do disposto no artigo 640.º do CPC, os tribunais da Relação devem proceder à efetiva reapreciação da prova produzida (nomeadamente dos meios de prova indicados no recurso, mas também de outros disponíveis e que entendam relevantes) da mesma forma – em consonância com os mesmos parâmetros legais – que o faz o juiz de 1.ª instância (neste sentido, v.g., Ac. STJ de 11/02/2016, proc. 907/13.5TBPTG.E1.S1, relatado por Abrantes Geraldes, Ac. STJ de 10/12/2015, proc. 2367/12.9TTLSB.L1.S1, relatado por Melo Lima, e, à luz do anterior Código, o Ac. STJ de 14/02/2012, proc. 6283/09.3TBBRG.G1.S1, relatado por Alves Velho). Ou seja, o objeto da apreciação em 2.ª instância é a prova produzida (tal como em 1.ª instância) e não a apreciação que a 1.ª instância fez dessa prova. Não obstante, terá a Relação de ter em conta que, no que à prova pessoal respeita, o objeto da sua reapreciação não é exatamente o mesmo que aquele de que a 1.ª instância dispôs, pois trata-se apenas de uma gravação áudio, onde necessariamente se perde tudo o que é apreensível por outros sentidos além da audição. Esta circunstância inultrapassável (ainda que melhorável com recurso a outras tecnologias de reprodução) pode e deve ser ponderada na reapreciação que, em 2.ª instância, se faz da prova, o que não significa uma menorização do poder de livre apreciação da prova, mas apenas mais um dado a considerar nessa apreciação. As alterações à matéria de facto requeridas pela recorrente têm por objetivo que se dê como provado o conhecimento prévio pelo recorrido BANCO da celebração entre a recorrente e a sociedade B, Lda. da dação em cumprimento do prédio descrito na CRP de Ponta Delgada sob o n.º ...04. Os factos que a recorrente pretende ver aditados e que relacionou de 1) a 14) no artigo 145.º das alegações de recurso são factos instrumentais tendentes à prova dos não provados a) a h) e à eliminação dos provados 25 a 30. Vamos começar por aqueles. 1.2. Das frases 1) a 14), constantes do artigo 145.º das alegações de recurso, que a recorrente pretende aditar aos factos provados Vejamos ponto por ponto (os negritos/sublinhados foram acrescentados por nós, sem necessária correspondência com os originais): «1) Em 09.05.2014, H deu conhecimento das negociações com Recorrente a terceiros, designadamente aos Bancos Garantes da dívida do Grupo B, nos quais se incluía o aqui Recorrido BANCO (cf. Documento n.º 1, junto ao Requerimento da Recorrente em 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391).» O documento n.º 1 junto aos autos em 19/04/2022, com a referência 4607391, admitido por despacho de 26/05/2022, contém os emails em seguida colocados por ordem cronológica: i. um email enviado em 09/05/2014, 12:52 horas, de H para «Dr. Q», ora advogado da recorrente, com o seguinte texto: «Conforme nossa última reunião, venho por este meio solicitar a sua conformação, relativamente à resolução do processo A»; e, ii. um email de resposta da mesma data às 19:10 horas, com o texto: «Agradeço o seu email e como falado entendemos que conversações em curso apresentam um estado desenvolvido e perspetivam uma solução que esperamos seja alcançada e não vemos inconveniente que, perante terceiros e de modo reservado, deem conhecimento que estamos em fase negocial. Indicamos que, conforme nossos princípios negociais, a existência de conversações não representa – e queremos deixar este ponto claro – qualquer garantia de solução final». Nestes documentos não há qualquer intervenção de outras pessoas além das referidas, nomeadamente não há intervenção do BANCO. «2) Entre 18.05.2014, 19.05.2014, e 23.05.2014, a Recorrente trocou correspondência com o Sr. H e o Mandatário do Grupo B relativamente à documentação necessária à celebração da Dação em Cumprimento, e que estes últimos se comprometeram a enviar as Declarações das Sociedades do Grupo B proprietárias dos imóveis objeto de Dação e das Instituições Bancárias com hipotecas sobre esses imóveis – entre eles o aqui Recorrido BANCO – a prestarem o seu consentimento à alienação dos mesmos nos termos acordados entre as Partes (cf. Documento n.º 2, junto ao Requerimento da Recorrente de 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391).» O documento n.º 2 junto aos autos em 19/04/2022, com a referência 4607391, admitido por despacho de 26/05/2022, contém os emails em seguida colocados por ordem cronológica: i. um email de 17/05/2014, 3:56 PM, de Q (ora advogado da recorrente) para H, com conhecimento a dois endereços @A.com, um @aamm.pt (ora advogados da recorrente A), e um quarto para mca@caeadvogados.pt (pelo teor, advogado a assessorar H ou o grupo B), com o seguinte teor: «Por referência ao assunto em epígrafe e conforme solicitado, procedemos à confirmação, pela presente de que existe um acordo de princípio entre o Grupo A e o Grupo B para uma operação se pretende culmine, a breve trecho, num acordo que permita a extinção dos processos judiciais em curso. Na medida em que a presente comunicação recebeu o assentimento do Grupo A na passada reunião, vai a mesma com o conhecimento dos Exmºs Srs. Drs. M (H, Lda.) e N (A, Lda.)»; ii. um email de 18/05/2014, 16:24, resposta de mca@caeadvogados.pt ao email imediatamente acima transcrito, com o seguinte teor: «Muito agradeço o email recebido e nessa conformidade solicito que me sejam remetidas na 2ª feira as minutas das declarações necessárias das entidades envolvidas do Grupo B, bem como o teor geral das declarações dos bancos garantes para se organizarem as competentes escrituras. Com vista a essa formalização também necessitávamos da indicação dos documentos necessários para a instrução dos atos notariais, sem prejuízo de os mesmos poderem ser objeto imediatamente de contrato promessa para mais rápido levantamento de algumas penhoras que, em má hora, recaíram sobre elementos do património de B e que estão, por sua vez, comprometidos com operação de refinanciamento de importância vital para o relançamento de toda a atividade do Grupo B, nomeadamente restabelecendo as duradouras e fortes relações comerciais com a A que se pretendem normalizadas com toda a possível brevidade». iii. um email de 19/05/2014, 4:58 PM, de Q para mca@caeadvogados.pt, com conhecimento a dois endereços @grupoB.co, outros dois @A.com, e um @aamm.pt, com o teor: «Na sequência da reuniões realizadas entre a “H, Lda.” e a “A, Sociedade Unipessoal, Lda.” e o Grupo B (…) em 14.05.14 e 15.05.14, e tendo em vista a compilação da documentação indispensável à celebração dos contratos de dação em cumprimento entre as aludidas sociedades, vimos pelo presente enviar em anexo uma Checklist dos documentos necessários para o efeito referentes aos bens imóveis que serão objeto de “dação”, com a indicação daqueles para cuja obtenção agradecemos desde já a s/ colaboração (documentos assinalados com um “X”), a saber: (…)» iv. um email de 23/05/2014, 17:05, de mca@caeadvogados.pt para Q com o seguinte teor: «Confirmei hoje a informação de que estão a ser recolhidos os documentos solicitados e que nos serão enviados a partir de 2ª feira, embora o IGESPAR só dê resposta a partir de 4ª feira. Agradecia o envio da Checklist noutro formato pois entra em conflito com o nosso word, não permitindo que nele se trabalhe. Finalmente agradecia que fosse indicada a entidade a favor de quem serão feitas as aquisições pois algumas declarações bancárias exigem prévia autorização da transação». Nesta troca de emails não há qualquer intervenção do BANCO ou de outras entidades bancárias, nem alusão a declarações das instituições bancárias com hipotecas sobre esses imóveis. Há, sim, uma alusão a bancos garantes (que dão uma garantia), que é o oposto de banco garantido (que tem uma garantia a seu favor). «3) Em 31.10.2014, a Recorrida Sociedade B, Lda. enviou uma missiva ao Recorrido BANCO com o assunto “Financiamento B SGPS SA / Reestruturação Grupo B”, a requerer mais crédito e a informar da que será efetuada uma operação de venda de alguns imoveis como dação em pagamento com opção de recompra à Recorrente (cf. Documento n.º 3, junto ao Requerimento da Recorrente de 19.04.2022, com a Ref.ª 4607391).» O documento n.º 3 junto aos autos em 19/04/2022, com a referência 4607391, admitido por despacho de 26/05/2022, contém uma carta do diretor geral da B, Lda. para o BANCO, com o assunto «Financiamento B SGPS SA / Reestruturação Grupo B», cujo único § relacionado com o negócio com a A é o seguinte: «Temos tido algumas respostas por parte da banca, no entanto têm-nos questionado relativamente à resolução de processos que o Grupo tem tido durante o ano de 2014, nomeadamente da X SA e H. Relativamente à X SA (…). Em relação à H, até final do mês de novembro será efetuada uma operação de venda de alguns imóveis como dação em pagamento com opção de recompra, os imóveis em causa são alguns que fazem parte do cabaz de imóveis da operação que o Grupo fez recentemente com a CEMAH (Caixa Económica da Misericórdia de Angra do Heroísmo)». Resulta claro que há neste texto apenas a referência a uma futura dação e uma referência genérica a imóveis, sem qualquer especificação daquele que veio a ser objeto da dação. «4) Em 01.12.2014, o Recorrido BANCO procurou saber junto do Exmo. Sr. Dr. Notário que viria a ser responsável pela certificação da escritura de anexação e reforço, como salvaguardar a sua posição “enquanto credor hipotecário, designadamente no que diz respeito à verdadeira incidência da hipoteca em apreço” em caso de anexação dos prédios ...04 e ...54 (cf. Documento n.º 4, em anexo ao Documento n.º 1, junto ao Requerimento da Recorrente de 22.10.2021, com a Ref.ª 4341791, e depoimento prestado pelo mesmo em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06).» O documento n.º 4 anexo ao documento n.º 1 junto aos autos em 22/10/2021, com a referência 4341791, contém um email de 01/12/2014, 11:47 horas, enviado de aa@Banco.pt, com o seguinte conteúdo: «Exmo. Senhor Dr. R, «Distinto Notário de Ponta Delgada «Na sequência do contato telefónico havido há momentos, venho pelo presente solicitar a colaboração e atenção de V.Ex.ª para o seguinte: «Por escritura datada de 29 de Novembro de 2005, outorgada no Cartório de V.Ex.ª., a sociedade "B, Lda." constituiu hipoteca a favor do Banco, S.A. sobre dois prédios, entre os quais o prédio urbano situado em Pontal Delgada (Matriz) Rua do S, n.º …, com a superfície coberta de 327,67 m2 e superfície descoberta de 151,40 m2, descrito na CRP de Ponta Delgada sob o número ...04 e inscrito na matriz sob o artigo ...95, hipoteca essa registada sob a AP. 83 de 2005/11/24. «Entretanto, fomos recentemente confrontados com a existência de uma escritura de "Justificação e Venda" outorgada em data anterior à da aludida hipoteca (18/12/1998), mediante a qual, por incorporação, se adicionou um lote de terreno à área descoberta do prédio em apreço (com inscrição matricial própria (!) - vide escritura a folhas 98), declarando se que o prédio passaria a ter a seguinte configuração: «"edifício sito na Rua do S, n.ºs …, destinado a comércio e escritório, de cave, rés do chão, primeiro e segundo andar e falsa (sótão) com a superfície coberta de 327,60 m2 e logradouro de 521,40 m2 (correspondente ao adicionamento dos ditos trezentos e setenta m2 com 151,40 m2). «Essa escritura, segundo me parece, nunca foi levada a registo. «A questão que coloco é a seguinte: «Bastará fazer uma atualização da descrição / composição do imóvel, com base na escritura de "Justificação e Venda" para que constem as áreas corretas (área descoberta - 521,40 m2), passando o Banco a beneficiar de hipoteca sobre a verdadeira área do imóvel ou será necessário fazer alguma alteração /retificação da hipoteca já que do clausulado da mesma consta a seguinte menção quanto às áreas do imóvel - " ... (que aqui se fixam como corretas), ...". «Qual será, assim, a melhor metodologia a adotar por forma a que o Banco fique devidamente salvaguardado, enquanto credor hipotecário, designadamente no que diz respeito à verdadeira incidência e objeto da hipoteca em apreço. «Grata pela atenção e urgência que puder dispensar à resolução do presente assunto, apresento-lhe os meus melhores cumprimentos. «AA «Advogada» Ainda no documento n.º 4, a seguir ao email, consta: a caderneta predial urbana do art.º ...82; a escritura de hipoteca de 29/11/2005 incidente sobre o prédio descrito na CRP sob o n.º ...04 e na matriz predial urbana sob o art.º ...95; a certidão predial do n.º ...04; a escritura de justificação e venda de 18/12/1998 incidente sobre o prédio inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82, e da qual consta, na folha 4: «Que em nome da sociedade que representam aceitam a venda do dito terreno, o qual pela presente escritura anexam para ampliação do seu logradouro, ao prédio urbano que lhe é contíguo ou confinante pelo lado poente qual seja, o sito na Rua do S, n.º … e descrito na dita conservatória sob o número …04 (…)». Confrontando o email de 1 de dezembro de 2014, vindo de transcrever, claramente se percebe que o seu conteúdo não é o que a recorrente afirma na alínea 4). Nomeadamente, resulta claramente do email que não estava em vista nessa altura uma escritura a realizar, nem uma futura anexação dos prédios ...04 e ...54; o que se perguntava era qual a abrangência da hipoteca que recaía sobre o ...04, uma vez que se tinha sabido havia pouco que esse ...04 já tinha anexado, desde 1998, um outro prédio (que pelos documentos que se seguem e acima descritos sabemos que era o art.º urbano ...82). «5) Em 15.12.2014, o prédio ...55 já se encontrava provisoriamente inscrito na matriz sob o artigo P...44, com Modelo Um do IMI, rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada (cf. Documento junto ao Requerimento apresentado pelo Sr. Notário em 02.11.2021, com a Ref.ª 4365818, e depoimento prestado pelo mesmo em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06).» Está provado pelos competentes documentos autênticos que, em 15/12/2014, foi rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada com Modelo 1 do IMI, para inscrição na matriz predial urbana de um prédio novo, composto pelos artigos matriciais urbanos ...95 e ...82, ao qual foi atribuído o art.º (provisório) P...44, e que corresponde ao prédio que, em 31/12/2014, viria a ser descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada (Açores) sob o n.º ...55. Como passamos a demonstrar, e ao contrário do pretendido pela autora, nenhuma má-fé se indicia da sucessão de atos a seguir descritos com base nos documentos notariais, registrais e matriciais juntos aos autos: - Em 18/12/1998, é celebrada uma escritura de justificação e venda, na qual foi justificante e vendedora MCM, que através do seu representante no ato declarou que «se arroga com exclusão de outrem como dona e legítima possuidora, de trezentos e setenta metros quadrados de terreno destinados a construção urbana, que constitui o prédio em nome dela inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Matriz, desta cidade e concelho de Ponta Delgada, no artigo ...82 (…) ainda não descrito na Conservatória do Registo Predial deste concelho e assim, sem registo de aquisição a favor da invocada proprietária. «Que a justificante entrou na posse deste prédio há mais de trinta anos, por doação não reduzida a escrito que lhe fora feita por Rolando Viveiros, residente que foi nesta cidade. «Que desde que iniciou a posse e até hoje tem exercido de forma ininterrupta e ostensivamente, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição ou contestação de quem pudesse ter interesse em controvertê-la os poderes próprios dos donos, dando-lhe o destino que sempre entendeu, pagando por ele as devidas contribuições e taxas, pelo que reclamando para si uma posse pacífica, continua e pública, o dá por adquirido por USUCAPIÃO, que expressamente aqui invoca para efeitos da sua inscrição no registo Predial, nos termos de transmissão que seguida e concomitantemente vai titular», tendo os demais outorgantes confirmado a veracidade das declarações. - Pela mesma escritura de 1998, a outorgante Clotilde Moreira vendeu o mesmo imóvel a B, Lda., que o comprou, declarando os seus representantes que «em nome da sociedade que representam aceitam a venda do dito terreno, o qual pela presente escritura anexam para ampliação do seu logradouro, ao prédio urbano que lhe é contíguo ou confinante pelo lado poente qual seja, o sito na Rua do S, n.º … e descrito na dita conservatória sob o número …04 (…)». - O imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82, a aquisição do mesmo imóvel pela B, Lda. e a anexação do mesmo imóvel ao imóvel confinante descrito na CRP sob o n.º ...04 (art.º matricial urbano ...95) não foram registadas antes de dezembro de 2014. - Por escritura de 29/11/2005, a B, Lda. constituiu a favor do BANCO uma hipoteca sobre o prédio descrito na CRP sob o n.º ...04 (art.º matricial urbano ...95), sem que dessa escritura constasse o art.º urbano ...82. - Em 2014, o BANCO toma conhecimento da escritura de 1998 pela qual tinha sido feita a anexação do art.º urbano ...82 ao art.º urbano ...95 (confinante com o primeiro), tendo o BANCO solicitado informação ao Notário de como proceder para acautelar a hipoteca que tinha sobre o último (conforme email de 01/12/2014, acima transcrito); - Por essa altura (e valemo-nos aqui do depoimento de H, filho de C e D, que depôs com toda a lisura, de forma esclarecedora, com riqueza de pormenores diferenciados, recordando e não recordando de forma realista, lógica em função do tempo decorrido, tendo convencido da veracidade do seu depoimento, ouvido nas sessões de 25/10/2021 e 13/12/2021), o BANCO (Dra. J) abordou a testemunha e o seu pai dando conta de que faltava um artigo na escritura de hipoteca de 2005 e que era necessário fazer uma retificação a essa escritura. É nesta sequência que é realizada a escritura de 30/12/2014. O que lhes foi explicado é que na escritura de 2005 tinha ficada de parte aquela parcela e que por isso era necessário o reforço de garantia. A testemunha em causa disse espontaneamente na primeira sessão do depoimento que “sempre tinha pensado que tudo aquilo estivesse na operação de 2005”, afinal os imóveis tinham sido anexados por escritura de 1998). - Em 15/12/2014, foi rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada com Modelo 1 do IMI, para inscrição na matriz predial urbana de um prédio novo, composto pelos artigos matriciais urbanos ...95 e ...82, ao qual foi atribuído o art.º (provisório) P...44. - Em 29/12/2014, foi descrito na CRP de Ponta Delgada, sob o n.º ...54 o imóvel inscrito na matriz urbana sob o art.º ...82, e aí inscrita a aquisição desse imóvel pela B, Lda. a MCM, que tinha sido realizada pela escritura de 18/12/1998. - Em 30/12/2014, por escritura com o título «Anexação e reforço de garantia hipotecária», B, Lda., representada por C e D, declarou ser dona e legítima possuidora dos prédios descritos na CRP de Ponta Delgada sob os n.ºs ...04 e ...54 (correspondentes, respetivamente, aos artigos matriciais urbanos ...95 e ...82); que sobre o primeiro recai «uma hipoteca a favor do Banco, S.A., registada através da inscrição de vinte e quatro de Novembro de dois mil e cinco, a que corresponde a apresentação número oitenta e três e seu averbamento de conversão em definitivo, outorgada neste Cartório por escritura de "Hipoteca", celebrada no dia vinte e nove de Novembro de dois mil e cinco, lavrada a folhas vinte e três e seguintes do Livro de Notas para escrituras diversas número "Vinte e um-A"»; que os dois prédios são contíguos e, tendo já sido pedida a sua anexação a nível matricial, que deu origem ao artigo P...44 da dita freguesia de Matriz, pela presente, «para efeitos registrais», ANEXA os referidos dois prédios de que é proprietária, formando um único prédio urbano. - Relembramos que, apesar de a escritura de 30/12/2014 se intitular de «Anexação e reforço de garantia hipotecária», na realidade a anexação entre os dois prédios urbanos – artigos matriciais ...95 e ...82 – já tinha sido realizada pela escritura, intitulada «de justificação e venda», celebrada 18/12/1998. De acrescentar que, como foi dito por todas as testemunhas que se referiram ao assunto, o artigo matricial ...95 (CRP ...04) era a sede da empresa e o anexado artigo matricial ...82 era um logradouro contíguo que servia de estacionamento. É, portanto, lógico que, quando em finais de 2014 advogada local do BANCO aborda os 2.ºs réus e o filho H dizendo que falta um artigo na escritura de 2005 e que era precisa uma retificação para que a hipoteca abrangesse o tal artigo, ninguém tivesse dado relevância ao caso. - Em 31/12/2014, o novo prédio resultante da anexação é descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada (Açores) sob o n.º ...55. A testemunha R, que depôs de forma serena, desinteressada e, tanto quanto se pode afirmar, verdadeira, nada disse que contrarie os factos acabados de descrever. Acrescenta-se, pelo exposto, o seguinte: Em 15/12/2014, foi rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada o Modelo 1 do IMI, para inscrição na matriz predial urbana de um prédio novo, composto pelos artigos matriciais urbanos ...95 (descrito na CRP de Ponta Delgada com o n.º ...04) e ...82 (à data, omisso na CRP, mas que viria a ser descrito sob o n.º ...54), ao qual foi atribuído o art.º (provisório) P-...44, e que corresponde ao prédio que, em 31/12/2014, viria a ser descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o n.º ...55. «6) Em 24.12.2014, aquando da celebração da dação em cumprimento com a Recorrente do prédio ...04, em regime de gestão de negócios foi omitindo aquela inscrição provisória do prédio ...55, resultante da anexação daquele prédio ...04 e do prédio ...54 (cf. Prova Testemunhal do Dr. H, Dr. N e Dr. M).» De dizer que em 24/12/2014, ainda não existia o registo (CRP) do prédio ...55, que só foi feita em 31/12/2014; nem sequer do ...54, que apenas foi feita em 29/12/2014. É verdade que foi omitida a inscrição na matriz do P-...44, resultante dos artigos matriciais ...82 (que ulteriormente seria descrito e registado na CRP com o n.º ...54) e ...95 (que ulteriormente viria a ser descrito e registado na CRP com o n.º...55); isso mesmo foi admitido pela testemunha H que subscreveu essa escritura em gestão de negócios; mas aparentemente sem qualquer má intenção, pelas circunstâncias já explicadas e que se voltam a sumariar: a aquisição do art.º ...82 e a sua anexação ao art.º ...95 foram feitas por escritura de 1998, embora não tivessem sido levadas a registo, e o que lhes foi dito pelo BANCO é que, na escritura de hipoteca de 2014, que recaía sobre o art.º ...95 (CRP ...04), o art.º ...82 não se encontrava, pelo que seria necessário retificar essa escritura para passar a abranger o art.º ...82. Portanto, a escritura dita de anexação e reforço de garantia hipotecária, realizada em 30/12/2014, teria provavelmente apenas esse intuito. Acrescenta-se, portanto: Em 24/12/2014, aquando da celebração da dação em cumprimento à ora autora do prédio descrito na CRP com o n.º ...04 (art.º matricial ...95), foi omitida a inscrição na matriz do art.º (provisório) P-...44, para anexação daquele com o art.º matricial ...82 (então omisso, mas a que viria a corresponder o n.º ...54 na CPR), e que ulteriormente viria a ser descrito e registado na CRP com o n.º ...55. «7) Em 29.12.2014, a Recorrida Sociedade B, Lda. regista com caracter de urgência a propriedade do imóvel ...54, adquirido em 18.12.1998 (cf. Prova junta pelo Sr. Notário).» É verdade, como acima afirmámos, que em 29/12/2014, a B, Lda. regista a propriedade do imóvel inscrito na matriz urbana sob o art.º ...82, por si adquirido em 18/12/1998, e que fica registado como o n.º ...54 na CRP de Ponta Delgada. No requerimento deste registo, feito por Il. Advogada, foi pedida urgência (fls. 226 dos autos); e, da parte do impresso do pedido de registo destinada a preencher pelos serviços, consta a menção manuscrita «c/ urgência» (fls. 223 dos autos) – documentos juntos na audiência de 13/12/2021. Este facto é contraditório com o facto provado 11, tal como consignado em 1.ª instância, na medida em que nesse se afirmava que o prédio registado na CRP sob o n.º ...54 tinha sido adquirido em 29/12/2014, quando tal prédio foi adquirido pela escritura de 1998. Assim, substitui-se o facto 11 pelo seguinte: Em 29/12/2014, B, Lda. requer na CRP de Ponta Delgada o registo do seu direito de propriedade sobre o imóvel inscrito na matriz urbana sob o art.º ...82, por si adquirido por escritura de 18/12/1998, requerimento que dá lugar à criação do n.º ...54 da freguesia de São Sebastião, na CRP de Ponta Delgada (Açores). «8) A escritura de anexação de imóveis não era necessária para o reforço de hipoteca que o Recorrido BANCO desejava obter, pois que, se bastava com a constituição de garantia sobre o novo bem não existindo necessidade de o anexar ao primeiro bem dado em garantia (cf. depoimento prestado pelo mesmo em sede de audiência realizada em 13.12.2021, min. 00:09:51 a 00:23:06).» Esta é uma apreciação jurídica e, além do mais, como temos explicado, assente num dado distorcido. A anexação entre os dois prédios estava feita pela escritura de 1998. Em termos de anexação, a escritura de 30/12/2014 nada acrescenta. O registo predial da aquisição do art.º matricial urbano ...82 e o registo da anexação é que só foram efetuados no final de 2014. A escritura de 30/12/2014 teve apenas como efeito prático que a hipoteca passasse a recair também sobre o antigo art.º ...82. De acrescentar que nessa escritura não houve sequer aumento do valor máximo da hipoteca. O imóvel que lhe foi dado em pagamento estava onerado por uma hipoteca para garantia do pagamento de dívida ao BANCO, como bem sabia; por isso, na execução que lhe foi movida pelo BANCO foi decidido que esse imóvel responderia pela dita dívida, e foi na medida dessa oneração que respondeu – Ac. do TRL de 03/03/2022, proc. 03/19.6T8PDL-A.L1-6, que confirmou aquela que já tinha sido a decisão da primeira instância; e Ac. do STJ de 06/12/2022, proc. 03/19.6T8PDL-A.L1.S1, de julgou improcedente o recurso de revista. «9) A ideia de anexação dos imóveis para efeitos de reforço de garantia partiu do Recorrido BANCO, e foi transmitida como sendo obrigatória e conatural da anterior Hipoteca (cf. depoimento prestado pelo Sr. H em sede de audiência realizada em 25.10.2021, min. 00:23:57 a 00:45:21).» O que se terá passado, como acima exposto, e de acordo com o citado depoimento de H, é que em finais de 2014, seguramente antes de 15 de dezembro, a Dra. J do BANCO abordou H, bem como o seu pai, C, dando conta de que faltava um artigo na escritura de hipoteca de 2005 e que era necessário fazer uma retificação a essa escritura. O que lhes foi explicado é que na escritura de 2005 tinha ficada de parte aquela parcela (art.º ...82), adquirida e anexada pela escritura de 1998, e que por isso era necessário o reforço de garantia. Acrescenta-se aos provados o seguinte: Em finais de 2014, mas antes de 15 de dezembro, a Dra. J do BANCO abordou H e C dando conta de que faltava um artigo matricial na escritura de hipoteca de 2005 que impendia sobre o imóvel da sede, descrito na CRP sob o n.º ...04 e inscrito na matriz sob o art.º ...95: faltava o art.º ...82, que por escritura de 1998 tinha sido comprado e anexado ao art.º ...95 (...04 da CRP); seria, então, necessário fazer uma retificação a essa escritura, de forma a incluir também o art.º ...82. «10) Em 17.03.2017, o Legal Representante do Recorrido BANCO, ANS, foi notificado pelo Sr. Administrador de Insolvência, do Requerimento apresentado pela Recorrente a justificar os contornos da Dação em Cumprimento, ainda que aquele previamente notificado os Mandatários do BANCO constituídos nos autos, e ainda que este não tivesse ainda sido nomeado Presidente da Comissão de Credores, o que só veio a ocorrer em 20.03.2017 (cf. “e-mail – recibos”, remetido pelo Sr. Administrador de Insolvência notificado por ofício datado de 23.02.2022, fls. 1 a 135).» «11) O Recorrido BANCO na qualidade de Presidente da Comissão de Credores aprovou o orçamento para a instauração da ação de resolução do negócio da Recorrente sem desvendar o seu conflito de interesses (cf. “e-mail – recibos”, remetido pelo Sr. Administrador de Insolvência notificado por Ofício datado de 23.02.2022, fls. 1 a 135). «12) O Recorrido BANCO procedeu à avaliação do imóvel em causa e deu instruções sobre a sua venda ao Sr. Administrador de Insolvência, quando já conhecia dos contornos da Dação em Cumprimento a favor da Recorrente (cf. fls. 277 e 285, do Documento n.º 1 e fls.1 a 3, do Documento n.º 2, daquela documentação, e Pois que isso resulta claro do teor de fls. 277 e 285, do Documento n.º 1 e fls.1 a 3, do Documento n.º 2, daquela documentação, e resultou também claro do depoimento do Dr. ANS prestado em sede de audiência de julgamento realizada em 02.09.2022, e dos depoimentos do Sr. Administrador de Insolvência e da sua anterior funcionária, a Sra. Sofia, prestados em sede de audiência de julgamento realizada em 14.11.2022). «13) O Recorrido BANCO não procurou reverter o seu negócio, não obstante conhecer a decisão a determinar a validade da Dação em Cumprimento proferida no Proc. n.º 01/15.5T8PDL-Q e sua eficácia retroativa à data da sua celebração (24.12.2014), i.e., em data anterior à celebração do seu negócio.» Os factos 10) a 13) descrevem comportamentos do recorrido BANCO, ocorridos três anos após a escritura que a autora defende ser nula. De tais possíveis comportamentos nada se pode inferir sobre a eventual má-fé do mesmo BANCO aquando da escritura de reforço de hipoteca, três anos antes. As afirmações das alíneas 10) a 13) são irrelevantes para a causa de pedir e procedência do pedido. «14) O negócio de anexação e reforço de garantia dos Recorridos B e C e Recorrido BANCO colocava e colocou este último numa posição mais favorável que aos demais credores, pois que garantiu mais crédito garantido (cf. depoimento prestado pelo Sr. Administrador de Insolvência, em sede de audiência realizada em 14.11.2022, min. 00:10:50 a 00:18:27).» Não é claro o que a recorrente pretende dizer com esta frase. Se pretende dizer que, com a escritura de reforço de hipoteca de 30/12/2014, foram abrangidas outras dívidas além das garantidas pela hipoteca constituída em 29/11/2005 é falso. Nenhumas outras dívidas foram constituídas ou garantidas pela escritura de 30/12/2014. Basta lê-la. Se pretende dizer que as dívidas garantidas pela hipoteca de 30/12/2014 passaram a ter um imóvel de maiores dimensões a garanti-las, é certo e óbvio, mas irrelevante para o desfecho desta causa. Porquanto acima exposto, e concluindo: i. Indefere-se o requerido quanto aos factos das alíneas 1) a 4), 8) e 10) a 14); ii. Defere-se o requerido quanto aos factos das alíneas 5), 6), 7) e 9), acrescentando quatro factos com os seguintes textos, que são colocados por ordem cronológica nos factos provados: 6-B. Em 15/12/2014, foi rececionado no Serviço de Finanças de Ponta Delgada o Modelo 1 do IMI, para inscrição na matriz predial urbana de um prédio novo, composto pelos artigos matriciais urbanos ...95 (descrito na CRP de Ponta Delgada com o n.º ...04) e ...82 (à data, omisso na CRP, mas que viria a ser descrito sob o n.º ...54), ao qual foi atribuído o art.º (provisório) P-...44, e que corresponde ao prédio que, em 31/12/2014, viria a ser descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o n.º ...55. 8-A. Em 24/12/2014, aquando da celebração da dação em cumprimento à ora autora do prédio descrito na CRP com o n.º ...04 (art.º matricial ...95), foi omitida a inscrição na matriz do art.º (provisório) P-...44, para anexação daquele com o art.º matricial ...82 (então omisso, mas a que viria a corresponder o n.º ...54 na CPR), e que ulteriormente viria a ser descrito e registado na CRP com o n.º ...55. 11. Em 29/12/2014, B, Lda. requer na CRP de Ponta Delgada o registo do seu direito de propriedade sobre o imóvel inscrito na matriz urbana sob o art.º ...82, por si adquirido por escritura de 18/12/1998, requerimento que dá lugar à criação do n.º ...54 da freguesia de São Sebastião, na CRP de Ponta Delgada (Açores). 6-A. Em finais de 2014, mas antes de 15 de dezembro, a Dra. J do BANCO abordou H e C dando conta de que faltava um artigo matricial na escritura de hipoteca de 2005 que impendia sobre o imóvel da sede, descrito na CRP sob o n.º ...04 e inscrito na matriz sob o art.º ...95: faltava o art.º ...82, que por escritura de 1998 tinha sido comprado e anexado ao art.º ...95 (...04 da CRP); seria, então, necessário fazer uma retificação a essa escritura, de forma a incluir também o art.º ...82. 1.3. Dos factos não provados a) a h) que a recorrente pretende que se considerem provados Como factos não provados, o tribunal a quo consignou: a) O 3.º Réu ocultou da Autora e do Grupo A em geral a anexação dos dois prédios, por via da escritura e reforço da hipoteca dada através do artigo que resultasse da anexação. b) O 3º Réu não fez tal revelação, quando contactou e negociou diretamente com a Autora a tentativa de distrate de hipoteca, que havia promovido complementarmente ao reforço da hipoteca a anexação de prédios conjuntamente com os 1º e 2.º Réus. c) De modo a fraudulentamente, os 3.º, 2.º, 4.º, 5.º e 6.º Réus tentarem que o prédio que já era da Autora respondesse pelas dívidas do Grupo B constituídas ao abrigo da escritura de reforço de hipoteca, ao invés de essa hipoteca sobre o bem da Autora apenas responder pela dívida originária, nos termos da hipoteca que a A conhecia quando adquiriu o prédio por dação. d) Os 3.º, 2.º, 4.º, 5.º e 6.º Réus conluiados, sempre omitiram do Grupo A e da Autora em particular, que desenvolveram uma atuação composta por uma escritura de reforço de hipoteca e anexação de prédios (um já dado em hipoteca e outro resultante do reforço), de modo a conseguirem que esse prédio único resultante da anexação respondesse por todas as dívidas do Grupo B ao 3º Réu. e) Quando bem sabiam que a anexação seria impossível por ter havido dação do prédio em favor da Autora em data anterior à anexação e reforço de hipoteca, com o que a mesma não poderia ser feita sem a autorização da Autora, que nunca a deu. f) O 3º Réu omitiu factos à Conservatória do Registo Predial, pois que nunca a essa esclareceu que um dos prédios a anexar, na data em que a anexação foi feita, já pertencia a terceiro. g) A 3ª Ré bem sabia e desejava a anexação na data da outorga de tal escritura, sendo de sua vontade esclarecida obter uma anexação sobre prédio que havia sido previamente dado em cumprimento à Autora, h) Os 3.º, 2.º, 4.º, 5.º e 6.º Réus estavam coordenados para a implementação de uma metodologia que incluísse o reforço de hipoteca como passo prévio à anexação, de modo que o conjunto dos dois passos e a sua sequência, como expressam, permitisse o efeito desejado de que ambos os prédios anexos sob um único novo número matricial e realidade registral, respondesse pelo valor agregado constante da hipoteca inicial e do valor aditado pelo reforço de hipoteca. Apreciemos, ponto por ponto: No que respeita aos factos não provados a) e b), assim devem manter-se. A recorrente assenta a sua pretensão em contrário nos documentos n.ºs 1, 2 e 3 juntos com o requerimento de 19/04/2022 (Ref.ª 4607391), e no documento n.º 4 em anexo ao documento n.º 1, junto com o requerimento da recorrente de 22/10/2021 (Ref.ª 4341791). Remetemos aqui para o explicado sobre o conteúdo desses documentos, nos §§ de 1.2. a propósito das frases 1) a 4) do artigo 145.º das alegações de recurso. O BANCO não terá comunicado à autora a escritura de 30/12/2014, mas não há prova de que tal tenha constituído uma “ocultação”, com intenção malévola. A afirmação da alínea c) é, claramente, não provada, pois o prédio dado em pagamento à autora sempre responderia pelas dívidas do Grupo B a que se reporta a escritura de constituição de hipoteca de 29/11/2005 e nenhumas outras dívidas foram constituídas ao abrigo da escritura de reforço de hipoteca de 30/12/2014. Basta ler a escritura de 30/12/2014 para se perceber. O facto não provado d) deve manter-se como tal, nenhuma prova tendo sido feita de qualquer conluio ou sequer de intenção individual de prejudicar a autora. Remete-se para o explicado em 1.2. a propósito das alíneas 1) a 4) do artigo 145.º das alegações da recorrente. A conclusão do facto não provado e) assim se deve manter, pois o que nos parece mais certo da prova produzida é que: o BANCO não sabia da dação em pagamento; e os réus B, Lda. e seus gerentes não tinham consciência de que o reforço da hipoteca de 2005 com o logradouro que sempre viram como anexo do prédio hipotecado (assim o decidiram na escritura de 1998) nenhum prejuízo traria à autora. Repare-se que não houve acréscimo das dívidas pelas quais o imóvel dado em pagamento respondia. À partida, o facto de haver mais imóvel a responder por elas seria até benéfico para o dono do imóvel hipotecado em 2005. Os factos não provados f) e g) assim se mantêm, não havendo, como já explicado, provas no sentido do conhecimento pelo BANCO da dação em pagamento à autora. Igualmente bem considerado o não provado h), porquanto se disse nos precedentes parágrafos. 1.4. Dos factos provados 25 a 30 que a recorrente pretende que passem a não provados Vejamos, finalmente, os factos provados n.ºs 25 a 30, que a recorrente pretende que se considerem não provados: 25. O BANCO, quando outorgou a escritura de anexação e reforço de garantia hipotecária, desconhecia por completo a intenção da aqui Autora de receber em dação, para cumprimento de créditos, digam-se “comuns”, o imóvel em causa. 26. Os 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Réus, aquando da celebração da escritura de reforço de hipoteca apenas tinham conhecimento de que o imóvel era propriedade da 1ª Ré, pois era esse o nome que figurava na Conservatória do Registo Predial como proprietário do imóvel. 27. Sendo que os 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Réus não sabiam, nem tinham como saber, que havia sido celebrada a escritura de dação em cumprimento. 28. O Réu BANCO apenas celebrou o que tinha acordado com a 1ª Ré, ou seja, uma escritura de anexação de dois imóveis que eram propriedade desta e o reforço de hipoteca para que a hipoteca anteriormente registada passasse a abranger o prédio que, entretanto, também foi adquirido por esta. 29. Consta expressamente da escritura de anexação e reforço de hipoteca que a anexação dos prédios apenas poderá ser efetuada “desde que a referida hipoteca a favor do BANCO abranja igualmente o prédio não hipotecado…”. 30. O imóvel a anexar era um mero terreno situado nas traseiras do imóvel que servia de parque de estacionamento e sem qualquer acesso por outro prédio confinante. Comecemos pelo último, o facto 30: O imóvel “a anexar” (mais objetivamente seria «o imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82, e que tinha sido anexado ao art.º matricial urbano ...95, descrito na CRP sob o n.º ...04, por escritura de 1998») era um mero terreno situado nas traseiras do imóvel (sede da B, art.º ...95, CRP n.º ...04 ) que servia de parque de estacionamento e sem qualquer acesso por outro prédio confinante. Isto foi afirmado por todas as testemunhas que ao tema se referiram, e pode ser confirmado com ajuda do Google Maps (vista aérea por camadas e street view da Rua do S, abrangendo os n.ºs …, Ponta Delgada). O facto 29 afirma apenas que consta da escritura de 30/12/2014 uma dada frase, o que se confirma pela leitura da respetiva escritura. No facto 28 há algo que está claramente errado: o advérbio, «entretanto». É que está indubitavelmente provado que o imóvel das traseiras, “a anexar” (o inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82), foi adquirido pela 1.ª ré por escritura pública de 1998, logo, muito antes da escritura de constituição de hipoteca sobre o imóvel da sede, de 2005. A prova dos factos 25 a 27 é irrelevante para o desfecho da causa. O que relevaria seria a prova do contrário, que não se fez. Se é certo que não se provou que o BANCO, quando outorgou a escritura de 30/12/2014, conhecesse a intenção da autora de receber em dação o imóvel em causa, nem que os 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º Réus, aquando da celebração da mesma escritura soubessem que o imóvel da sede tinha sido dado em pagamento, parece-nos que a prova produzida também não é suficientemente forte para que se dêem como provados os factos 25 a 27. Por isso se excluem do elenco dos factos provados. A este propósito, trazem-se à colação mais um par de notas. A primeira, para referir que apenas o BANCO beneficiaria com o registo da anexação de mais um imóvel ao imóvel sobre o qual tinha hipoteca, passando esta a abranger dois imóveis (ou um mais valioso); e foi, de facto, o BANCO que suscitou a questão junto da B. A segunda, para lembrar que o valor extraprocessual das provas produzidas (que podem ser sempre objeto de apreciação noutro processo) não se confunde com os factos que no primeiro foram tidos como assentes, pois, estes não adquirem valor de caso julgado quando são autonomizados da respetiva decisão judicial. Na sentença proferida em sede de embargos de execução, em que era embargado o BANCO e embargante a A, Soc. Unip., S.A., foram considerados provados factos próximos dos constantes dos n.ºs 25 a 27 (v. certidão, junta com as contra-alegações de recurso, do acórdão proferido no processo 03/19.6T8PDL-A.L1), que ora excluímos. Os factos 28 e 30, porquanto acima dito, passam a ter a seguinte redação: 28. O Réu BANCO celebrou em 30/12/2014 com a 1ª Ré a escritura intitulada «anexação e reforço de garantia hipotecária» para que a hipoteca constituída em 2005 sobre o imóvel da sede (art.º matricial urbano ...95, CRP ...04) passasse a abranger o prédio das traseiras (art.º matricial urbano ...82) que, por escritura de 18/12/1998, foi adquirido pela 1.ª ré, escritura na qual consta também a sua anexação, «para ampliação do seu logradouro, ao prédio urbano que lhe é contíguo ou confinante pelo lado poente, qual seja, o sito na Rua do S, n.º … e descrito na dita conservatória sob o número …04». 30. O imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...82, e que tinha sido anexado ao art.º matricial urbano ...95 (descrito na CRP sob o n.º ...04) por escritura de 18/12/1998, constante também como objeto de anexação na escritura de 30/12/2014, era um terreno situado nas traseiras do imóvel da sede que servia de parque de estacionamento e sem qualquer acesso por outro prédio confinante. 2. Correspondência entre os factos e o direito Os pedidos que permanecem no presente recurso são de declaração de nulidade da escritura de anexação e reforço de hipoteca celebrada em 30/12/2014 e de cancelamento dos respetivos registos. A autora fundamenta a sua pretensão sobretudo na seguinte construção (v. artigos 19.º e 20.º da p.i., 18.º e 35.º das alegações de recurso): - os réus, fraudulentamente, tentaram que o prédio que já era da autora respondesse pelas dívidas do Grupo B constituídas ao abrigo da escritura de reforço de hipoteca, ao invés de essa hipoteca sobre o bem da Autora apenas responder pela dívida originária, nos termos da hipoteca que a A conhecia quando adquiriu o prédio por dação; - a escritura de “anexação” e reforço de hipoteca tratou-se de uma habilidade burocrática (ardil doloso) dos réus para disporem sobre coisa alheia e uns concederem (1º e 2ºs Réus) e outra obter (3ª Ré) uma hipoteca executável sobre um valor global de dívida que incluísse o reforço de hipoteca, que não apenas sobre dívidas autónomas e distintas entre si, para tal recorrendo a um artifício registral, que tinha como efeito implicar que a autora fosse executada sobre o bem que recebeu em dação, por um valor de dívida superior àquela pela qual responde a hipoteca concedida inicialmente. Ora, os factos envolvidos nestas fases não se provaram e não são verdadeiros na medida em que: - a hipoteca que onerava o prédio n.º ...04 desde a escritura 2005, manteve-se com os mesmos limites na escritura de 30/12/2014; - o facto de se anexar mais imóvel ao n.º ...04 e de a hipoteca passa a abranger também esse acrescento, apenas teria a virtualidade de beneficiar, tornar mais leve, a oneração do n.º ...04; - aquando (e antes) da escritura de dação, a autora conhecia exatamente essa hipoteca (a hipoteca é por definição um negócio registado) sabendo que o imóvel lhe estava a ser dado em pagamento com esse ónus; - por isso foi executada e decaiu definitivamente nos embargos e no recurso (proc. 03/19.6T8PDL-A); - os réus, objetivamente, na escritura de 30/12/2014, reafirmaram uma anexação entre dois prédios que tinha sido feita na escritura de 18/12/1998; - de facto, o imóvel art.º matricial ...82 sempre tinha sido um apêndice do art.º matricial ...95 (CRP ...04), mais não sendo, de facto, que um parqueamento descoberto nas traseiras deste último e ao qual se acedia por este último. É claro que, tendo dado em pagamento o prédio n.º ...04, a 1.ª e os 2.ºs réus não deviam ter efetivado a anexação, ou, pelo menos, não o deviam ter feito sem chamar a autora ao negócio. Tendo assim procedido, das duas uma, ou se entende que o imóvel dado em pagamento foi melhorado pelo dador após a dação e é todo ele da autora, ou se entende que a anexação é ineficaz em relação à autora, que se mantém dona (apenas) do prédio n.º ...04 (pelo menos, enquanto este não for vendido na execução para pagamento da dívida garantida pela hipoteca). Nos termos do disposto no artigo 892.º do CC, é nula a venda de bens alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para a realizar (embora o vendedor não possa opor a nulidade ao comprador de boa fé, assim como não pode opô-la ao vendedor de boa fé o comprador doloso). Esta norma da nulidade aplica-se aos outros contratos onerosos pelos quais se alienem bens ou se estabeleçam encargos sobre eles (artigo 939.º do CC). A escritura de 30/12/2014 não operou a venda de um bem alheio (situação prevista no artigo 892.º do Código Civil). O prédio descrito na CRP sob o n.º ...04 continuou a pertencer à autora que, inclusivamente, veio a registar a sua aquisição. Conforme consta do facto 20 (alicerçado na certidão da CRP de Ponta Delgada n.º ...55/20141231-freguesia de São Sebastião, junta a fls. 343-345 dos autos, que faz parte do doc. 5 junto com a contestação), em 16/07/2015, a autora registou a aquisição por dação em cumprimento (AP. 916 de 2015/07/16, da qual consta “A inscrição incide apenas sobre o prédio correspondente à descrição ...04, entretanto inutilizada”, convertida em registo definitivo pela AP. 492 de 2015/08/04). Por outro lado, a escritura de 30/12/2014 também não determinou a hipoteca de um bem alheio (caso ao qual se aplicariam as regras da venda de bens alheios, por força do disposto no artigo 939.º do CC); a hipoteca recaía e continuou a recair, na mesma medida, sobre o bem dado em pagamento à autora (CRP Ponta Delgada, n.º ...04). O facto de se ter formalizado a anexação de mais imóvel ao primeiro, a responder pela mesma dívida, apenas pode aliviar o ónus do bem da autora. O argumentário das partes e, talvez por isso, da sentença perdeu-se em considerações sobre a prioridade do registo relativamente a direitos supostamente contraditórios. Pensamos que sem razão. Como se lê na sentença, a autora, ao celebrar o contrato de dação em cumprimento em 24/12/2014 com a 1.º ré adquiriu a propriedade do imóvel com o n.º ...04, nos termos previstos nos art.ºs 408.º, n.º 1, e 1317.º, al. a), do CC. E é certo, como também aí se lê, que: a aquisição do direito de propriedade sobre imóveis está sujeita a registo, sendo que os factos a este sujeitos só produzem efeitos em relação a terceiros após a data do mesmo (art.ºs 2.º, n.º 1, al. a), e 5.º, n.º 1, do Código do Registo Predial); o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define (art.º 7.º, n.º 1, do CRPredial); e, o direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pela ordem temporal das apresentações correspondentes (art.º 6.º, n.º 1, do mesmo diploma). A estas normas devemos acrescentar que, os factos sujeitos a registo, ainda que não registados, podem ser invocados entre as próprias partes ou seus herdeiros (com exceção os factos constitutivos de hipoteca cuja eficácia, entre as próprias partes, depende da realização do registo) – artigo 4.º do CRPredial. E ainda que, considerando a noção legal restritíssima de terceiros para efeitos de registo (artigo 5.º, n.º 4, do CRPredial – aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si), os factos sujeitos a registo, ainda que não registados, acabam por ter uma eficácia geral muito ampla. Utilizando as palavras de Rui Pinto Duarte, «o sistema português vigente parece resumível nas seguintes palavras: em geral, a eficácia – seja entre as partes, seja nas relações das partes com terceiros, bem como, ainda, nas relações entre terceiros – dos factos sujeitos a registo não depende da efetuação do mesmo; excetuam-se os casos em que duas pessoas adquiram de outra direitos incompatíveis entre si, casos estes em que prevalecerá o direito inscrito em primeiro lugar. No entanto, não é definido com precisão o que é «adquirir» (estarão abrangidas as aquisições judiciais?), nem o que é a «incompatibilidade de direitos» (a propriedade e a penhora são incompatíveis?)» (O Registo Predial, Almedina, 2020, pp. 106-7). Na situação dos autos, não está em causa a violação de qualquer das indicadas normas do CRPredial. O contrato de dação é invocável pela autora, sempre o foi, mesmo antes de o ter registado, perante qualquer das partes nesta ação; perante a 1.ª ré porque era parte no contrato e perante todos os demais uma vez que nenhum deles adquiriu da 1.ª ré um direito incompatível com o da autora. O 3.º réu (BANCO) não adquiriu pela escritura de 30/12/2014 nenhum direito sobre o prédio dado em cumprimento à autora que não tivesse antes da dação. A hipoteca sobre o prédio em causa já existia e não foi reforçada; o reforço da hipoteca advém da junção de mais um prédio e não de um aumento da quantia garantida. O valor até ao qual o imóvel n.º ...04 respondia não se alterou com a escritura de 30/12/2014, a hipoteca estava já registada quando a autora adquiriu e nada nesse aspeto se alterou. Claro que um proprietário que não registou a compra e o beneficiário de uma hipoteca registada podem ser terceiros para efeitos de registo, se tiverem adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si. Foi o que sucedeu no caso do Ac. do STJ de 30/06/2011, proc. 91-G/1990.P1.S1 (Maria dos Prazeres Beleza), citado na sentença; ou nas páginas de Mónica Jardim, também ali citadas. Mas não é o que sucede na situação sub judice: aqui, o 3.º réu não adquiriu com a escritura de 30/12/2014 um direito de hipoteca incompatível com a propriedade da autora adquirida por dação, pois o 3.º réu já era titular dessa hipoteca sobre aquele bem; e a autora adquiriu o bem onerado por essa mesma hipoteca. A dação em pagamento e o consequente direito de propriedade da autora sobre o bem dela objeto, ao contrário do que se afirma na sentença, é oponível ao BANCO. Contudo, a hipoteca que o BANCO tinha sobre o bem objeto da dação manteve-se, continuando o mesmo bem, apesar de a sua titularidade ter transitado da 1.ª ré para a autora, a estar onerado pela mesma hipoteca; hipoteca que é, assim, oponível à autora. Por isso a autora foi executada e decaiu nos embargos, em 1.ª e em 2.ª instâncias. Sumariando, nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC: Considerando a restrita noção legal de terceiros para efeitos de registo (os que adquiriram de um autor comum direitos incompatíveis entre si), os factos sujeitos a registo, mas não registados têm uma eficácia geral muito ampla, que largamente ultrapassa a mera invocabilidade entre as próprias partes ou seus herdeiros. Tendo A dado em pagamento a B o prédio 1, onerado com hipoteca até ao valor de x para garantia de pagamento da dívida de A para com C, se, ulteriormente, A consegue registar a anexação ao prédio 1 (já propriedade de B, mas ainda não registada) do prédio 2, passando a mesma hipoteca, até ao mesmo valor e para garantia do mesmo crédito, a incidir sobre os dois prédios, essa anexação não aumenta a responsabilidade do prédio 1. Mantendo-se a hipoteca que incidia sobre o prédio 1 inalterada no seu valor máximo e nas obrigações cujo cumprimento garante, a anexação do prédio 2 não é incompatível com a anterior dação em cumprimento do prédio 1. C, beneficiário da hipoteca, com a referida anexação, não adquiriu nenhum direito sobre o prédio 1 dado em cumprimento a B (já onerado com a hipoteca) que não tivesse antes da dação. IV. Decisão Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo a sentença recorrida, ainda que com diferente fundamento. Custas pela recorrente, deferindo-se o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, considerando o nível de complexidade da causa, a relação custo/benefício para o recorrente e a boa conduta processual das partes (artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais). Lisboa, 06/07/2023 Higina Castelo António Moreira Paulo Fernandes da Silva |