Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9619/18.2T8LSB.L1-6
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
DEVER DE INFORMAÇÃO
BANCO DE PORTUGAL
RETRANSMISSÃO DA RESPONSABILIDADE
MEDIDA DE RESOLUÇÃO
EMITENTE ORIGINÁRIO
CONHECIMENTO PÚBLICO
DANO DE PRIVAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DO CAPITAL
NEXO DE CAUSALIDADE
VALOR DE CAPITAL
JUROS REMUNERATÓRIOS
JUROS DE MORA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/19/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I. O Banco que intermedia financeiramente a compra de obrigações sem esclarecer o cliente investidor da pessoa do emitente originário dessas obrigações, simultaneamente respondendo que “não tem nada a ver” à pergunta expressa do cliente sobre se o produto tem alguma coisa a ver com Banco alvo de medida de resolução pelo Banco de Portugal, quando o Banco alvo era o emitente originário, presta informação não completa e verdadeira.
II. No quadro da boa fé negocial e em vista, não apenas da formação duma vontade livre e esclarecida, mas duma concreta produção de vontade, cuja liberdade determinativa não é sindicável, a averiguação sobre o cumprimento do dever de informação pelo intermediário financeiro não se limita a verificar uma lista de informação legalmente prevista nos preceitos que densificam o dever de informação, mas faz-se ainda analisando concretamente as informações pedidas e prestadas.
III. Integra o dever de informação a prestar a cliente adquirente, em mercado secundário, dum valor mobiliário, a comunicação sobre o poder do Banco de Portugal de retransmissão da responsabilidade pelo pagamento desse valor duma instituição de transição para a instituição bancária alvo de resolução, emitente originária, ainda que o referido poder incida sobre qualquer activo e passivo transferido para a instituição de transição.
IV. Esse poder do Banco de Portugal não sendo secreto, não era de conhecimento público generalizado, pelo menos dos investidores não qualificados, não resultava concreta e directamente da lei, dependendo da sua expressa consagração e delimitação na deliberação do Banco de Portugal, e podia importar num prejuízo grave e extenso, e excedente a uma normal afectação pelo jogo do mercado, ao património do investidor, cujo respeito e protecção, observados esses limites, se revela fundamental à eficiência do mercado.
V. Não pode entender-se que a revelação deste poder de retransmissão do Banco de Portugal a qualquer cliente que negociasse com a instituição de transição contraria o espírito do legislador quando institui medidas de salvação de instituições financeiras para preservação de riscos sistémicos, porquanto não existe expressa ressalva legislativa a instituir o segredo, a própria deliberação do Banco de Portugal que consagra esse poder não é secreta, a preservação da actividade da instituição resolvida através duma instituição de transição com vista à sua valorização e posterior venda exige a confiança dos clientes, e a instituição de transição tem de funcionar com cumprimento dos deveres que o mesmo legislador colocou ao funcionamento das instituições financeiras, desde logo onerando-as com o cumprimento de deveres de informação.
VI. Não se provando concretamente que a utilização desse poder de retransmissão do Banco de Portugal, nem um ano decorrido sobre a transmissão, era, para a administração da instituição de transição, imprevisível e improvável, não logra esta ilidir a presunção de culpa.
VII. Provando-se apenas que o cliente, se tivesse sabido da existência desse poder do Banco de Portugal, não teria subscrito as obrigações que subscreveu, e provando-se que em função da utilização pelo Banco de Portugal do poder de retransmissão, posterior à subscrição, o cliente não foi reembolsado do capital pago para a subscrição nem dos seus juros remuneratórios, logrou o mesmo cliente, como lhe incumbia, provar o nexo causal da violação ilícita do dever de informação para o dano relativo ao capital, mas já não para os juros remuneratórios.
VIII. Para estabelecer o nexo causal para estes juros remuneratórios (ou mesmo para uma remuneração que pudesse vir a ser apurada em liquidação de sentença) necessário seria alegar e provar um mínimo factual donde se pudesse concluir que o capital seria sempre investido num produto financeiro em sentido lato.
IX. Não se tendo feito tal prova, o dano de privação da disponibilidade do capital corre desde o dia de subscrição das obrigações causada pela informação prestada com violação do dever de informação, sendo devidos juros de mora desde então.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório[1]
A…, nos autos m.id., instaurou a presente acção contra B…, também nos autos m.id., pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de €244.160,00, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva aplicável e contada desde a propositura da presente acção e até integral e efectivo pagamento, com as devidas e legais consequências, sendo: - €200.000,00 pelo reembolso do que entregou ao Réu; - €10.500,00 a título de juros remuneratórios; - €7.500,00 a título de danos não patrimoniais; perfazendo a quantia total de €218.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva contados desde 15 de julho de 2015, que ascendem a € 26.160,00.
Alegou em síntese que em 15 de junho de 2015, deu ordem de compra de duas “Obrigações … 2017”, no valor total de €196.750,00, cujo vencimento ocorreu a 8 de Maio de 2017, sendo que não recebeu qualquer reembolso do valor das mesmas, e que, em face da situação de liquidação do C…, não perspectiva qualquer possibilidade de que o C… venha a efectuar tal reembolso. O Autor não foi informado, ou por qualquer forma avisado, de que existia a possibilidade, mais ou menos remota, mais ou menos verosímil, do BdP operar a retransmissão de activos ou passivos do B…. para o C…; o que veio a fazer, em 29 de dezembro de 2015, sem qualquer indicação ou aviso prévios; o B… omitiu informação e prestou informação falsa ao não informar o A. da possibilidade de retransmissão das Obrigações que vendeu ao A. prevista nas sucessivas deliberações do Banco de Portugal.
A Ré contestou, alegando, em síntese, que o Autor sabia perfeitamente que as obrigações que adquiriu tinham sido emitidas, originalmente, pelo C… e tinham transitado para o Réu no quadro da Medida de Resolução. Não foi nenhum acto do Réu a causa dos prejuízos alegados pelo Autor, mas sim um acto do Banco de Portugal, corporizado na Deliberação do seu Conselho de Administração de 29 de Dezembro de 2015; Os danos sofridos pelo Autor não são, nesta fase, determináveis, por estarem dependentes da conclusão do processo de liquidação do C…, actual devedor das mesmas.
Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador, determinado o objeto do litígio e fixados os temas da prova.
Realizou-se a audiência final, com gravação da prova nela prestada, e seguidamente foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta:
“Pelo exposto, ao abrigo das supra citadas disposições legais: Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente ação e, em consequência:
1. condeno o Réu – (…) - a pagar ao Autor – (…) – a quantia de € 196.750,00 (cento e noventa e seis mil setecentos e cinquenta euros), acrescida de juros remuneratórios vencidos em 08/05/2016 na quantia de € 5.164,68 e em 08/05/2017 na quantia de € 5.164,68, na quantia total de juros remuneratórios de € 10.329,37 (dez mil trezentos e vinte e nove euros e trinta e sete cêntimos) e de juros de mora civis vencidos e vincendos desde a data do vencimento das Obrigações – 08/05/2017 – até integral pagamento;
e 2. absolvo o Réu do mais que era peticionado.
Valor da causa: € 244.160,00.
Custas pelo Réu e pelo Autor na proporção do respetivo decaimento (art.º 527.º, nºs 1 e 2, do C.P.C.)”.
Inconformada, a Ré interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
A. Os depoimentos das testemunhas P… e E… foram utilizados como fundamento de um particular núcleo de factos que se afigurou determinante para a decisão proferida;
B. Porém, a testemunha E… foi clara quanto ao facto de não se recordar do teor da conversa em que as obrigações foram apresentadas ao Recorrido.
C. Quanto a P…, foi perceptível ao longo do seu depoimento uma considerável animosidade contra o Recorrente, sua anterior entidade patronal;
D. Por outro lado, o Recorrido é actualmente seu cliente numa outra instituição bancária, o que a testemunha, quando confrontada com essa pergunta específica, apenas após alguma (estranha) resistência inicial acabou por reconhecer, a partir do minuto 35:20 da gravação com a referência 20130311111959;
E. Caso não se considere que essa circunstância constitui uma situação de manifesto conflito de interesses (facto que, deliberadamente, foi omitido pela testemunha), a mesma obrigaria, pelo menos, a alguma cautela na avaliação do depoimento prestado e na formação da convicção do Tribunal a quo, o que não sucedeu.
F. A matéria dos pontos 18 e 25 foi considerada provada pelo Tribunal a quo, alegadamente, com base nos depoimentos das duas já referidas testemunhas, conjuntamente com o Documento n.º 6 junto com a Petição Inicial (ordem de aquisição das obrigações).
G. Porém, P… não respondeu a uma única questão sobre se sugeriu especificamente o investimento nas obrigações em causa ao Recorrido, antes tendo referido ao longo do seu depoimento, diversas vezes, que se limitou a apresentá-lo, como por exemplo ao minuto 10:36 da gravação com a referência 20130311111959;
H. Já E… não referiu que as obrigações em discussão nos autos foram especificamente sugeridas ou recomendadas ao Recorrido, mas antes meramente apresentadas, inclusivamente em conjunto com todo um leque de outros produtos adequados ao perfil do Recorrido, designadamente ao minuto 01:17:55 da gravação com a referência 20190911095104];
I. Assim, não consta dos autos qualquer prova de que P… tenha sugerido ou recomendado especificamente ao Recorrido a aquisição das obrigações aqui em causa, quando o que resultou da prova produzida foi que esse produto foi meramente apresentado ao Recorrido em conjunto com diversos outros produtos;
J. “Apresentar” é substancialmente diferente de “recomendar” ou de “sugerir”, o que se depreende desde logo, do facto de terem sido apresentados diversos outros produtos, precisamente para que o Recorrido pudesse livremente optar e decidir;
K. Essa distinção é também fundamental no enquadramento do tipo de serviço de intermediação financeira em causa nos presentes autos, e que corresponde somente ao serviço de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem;
L. Também não decorreu da prova que a testemunha P… tenha descrito a compra das obrigações como uma excelente oportunidade de negócio, pura e simplesmente porque nenhuma testemunha o referiu;
M. Por tudo o exposto, nunca poderiam ter-se dado como provados os pontos 18 e 25 nos termos em que o foram, por não ter sido produzida prova nesse sentido e até por ter sido feita prova em sentido diverso;
N. Requerendo-se que V. Exas. alterem a redacção do ponto 18 nos seguintes termos: “E apresentou-lhe, entre outras possibilidades de investimento, a compra de obrigações com a designação comercial (…) 2017 e com o código (…), as quais descreveu como seguras e com boa rentabilidade”;
O. Bem como a redacção do ponto 25 nos seguintes termos: “Em face da informação prestada e das respostas aos esclarecimentos pedidos, o A. deu, no dia 15 de Julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B… 2017, melhor identificadas no facto provado n.º 18, no valor global de 196.750,00€”.
P. O ponto 22 foi considerado provado pelo Tribunal a quo, supostamente, com base no Documento n.º 6 junto com a Petição Inicial e nos depoimentos das já referidas testemunhas;
Q. E… foi clara ao referir que não se recordava do teor exacto da reunião com o Recorrido em que foram apresentadas diversas possibilidades de investimento, nomeadamente ao minuto 00:39 da gravação com a referência 20190911095104;
R. P… não referiu em momento algum do seu depoimento que tivesse garantido o reembolso das obrigações na maturidade, que é, na realidade, aquilo que resulta do ponto 22, nos termos em que foi considerado provado pelo Tribunal a quo;
S. Assim, em face da ausência de prova quanto a essa “garantia”, requer-se que V. Exas. alterem a redacção desse ponto 22 nos seguintes termos: “O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B….”
T. Os pontos 23 e 24 decorrem de uma mesma lógica, segundo a qual, não só o Recorrido alega ter perguntado especificamente sobre o referido “risco de contágio”, como o teria feito de forma insistente, vendo as suas inquietações insistentemente desvalorizadas pelo gestor de conta;
U. P…, ao minuto 45:38 da gravação com a referência 20130311111959, foi perguntado especificamente sobre isso, tendo respondido não se recordar;
V. Mesmo que a resposta tivesse sido afirmativa, da mesma não se poderia extrair a conclusão que o Tribunal a quo extraiu desse depoimento, já que não havia dúvidas, naquela data, de que a entidade emitente e obrigada ao reembolso era o Recorrente;
W. Qualquer informação em sentido diverso seria, essa sim, incorrecta; 
X. Acresce que estava em causa o risco de crédito do Recorrente, que o Recorrido pretendeu correr, mesmo num momento (pós-resolução) em que o Recorrente apresentava um elevado risco, uma vez que o processo de venda do seu capital tinha de estar concluído até 3 agosto de 2016, sob pena de o Recorrente entrar em processo de liquidação nos termos da decisão da Comissão Europeia sobre auxílios de estado;
Y. O próprio Recorrido poderia ter vendido as obrigações, pelo menos a partir de Setembro de 2015, altura em que foi suspenso o processo de venda do Recorrente, o que implicou um aumento substancial do respectivo risco;
Z. Perante o excerto específico transcrito do depoimento e a ausência de qualquer outra prova que sustentasse minimamente o entendimento do Tribunal a quo a esse respeito, impõe-se requerer a V. Exas. que seja revogada a decisão proferida relativamente à matéria constante dos pontos 23 e 24 dos “Factos Provados”, dando-se os mesmos como não provados sob duas novas alíneas d) e e).
AA. O facto não provado c) decorreu do Tema da Prova n.º 10, matéria que o Tribunal a quo considerou não provada porque, segundo entendeu, “os depoimentos das testemunhas L… e PF… afiguraram-se insuficientes para demonstrar tal facto”;
BB. Porém, E… também o fez ao minuto 20:21 da gravação com a referência 20190911095104, não se limitando a transmitir uma qualquer percepção pessoal e própria que tivesse no âmbito das suas funções, mas sim a mensagem que lhes era à data transmitida pelo próprio BdP, assim corroborando o que já resultava dos depoimentos que o Tribunal a quo mencionou como insuficientes;
CC. Seria também relevante que se considerasse a prova documental constante dos autos – designadamente o Documento n.º 1 junto pelo Recorrente com a sua Contestação –, extremamente relevante para demonstrar que o próprio mercado, incluindo a concorrência (o que não se podia ter desconsiderado), poucos meses antes da retransmissão, apresentava estas obrigações como especialmente recomendáveis;
DD. Em face do exposto, requer-se a V. Exas. que seja revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo a propósito do Facto Não Provado c), e que o mesmo seja levado à matéria de facto provada como novo ponto 35;  
EE. O próprio Recorrente, entre Setembro de 2015 e a decisão de retransmissão (29 de Dezembro de 2015), realizou várias operações de recompra de obrigações próprias que vieram a ser retransmitidas e que, à data de hoje, correspondem a um prejuízo superior a € 150.000.000 (cento e cinquenta milhões de euros);
FF. Não se compreende, além da prova testemunhal que foi suficientemente clara a esse respeito, como foi possível o Tribunal a quo ter desconsiderado essa prova documental (Documentos n.ºs 2 e 3, juntos com a Contestação);
GG. A não ser aceitando-se implicitamente que o Recorrente teria recomprado obrigações próprias com o objectivo de ter prejuízos, ficou demonstrado que a decisão de retransmissão das obrigações foi uma absoluta surpresa para o Recorrente, como para o mercado, incluindo os grandes investidores institucionais, aos quais a testemunha L… fez uma esclarecedora referência ao minuto 14:23 da gravação com a referência 20190911141006;
HH. A matéria dos prejuízos que o Recorrente sofreu com o mesmo tipo de operação foi também confirmada pela testemunha PF…, ao minuto 50:30 da gravação com a referência 20190911141006;
II. Assim requer-se a V. Exas. que, de acordo com a prova produzida nos autos e supra mencionada, seja aditado um novo ponto 36 à matéria de facto provada, com o seguinte teor: “Desde Setembro de 2015 até à data da decisão de retransmissão para o C…, o R. realizou diversas operações de recompra de obrigações, as quais, em consequência daquela retransmissão, acarretaram prejuízos superiores a € 150.000.000 (cento e cinquenta milhões de euros), os quais se encontram reclamados no processo de liquidação do C…”;
JJ. Resultou da prova produzida em julgamento que o Recorrido discutiu essa matéria com a testemunha P…, desde logo, no próprio dia 29 de Dezembro de 2015, além de se tratar de matéria que foi tornada pública em 13 de Janeiro de 2016, e de serem factos notórios mesmo em 29 de Dezembro de 2015, data em que os reguladores BdP e CMVM difundiram um comunicado do Recorrente sobre o tema;
KK. Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 324.º, n.º 2, do CVM, o direito alegado nestes autos já se encontrava prescrito desde, pelo menos, 14 de Janeiro de 2018, ou seja, há mais de três meses quando a Petição Inicial foi apresentada;
LL. Como cremos ter ficado demonstrado e detalharemos infra, nunca se podia considerar que, em termos de diligência, a actuação do Recorrente correspondeu a uma negligência grosseira, muito menos a uma situação de dolo;
MM. Vai, assim, a prescrição prevista no artigo 324.º, n.º 2, do CVM, expressamente arguida, para todos os efeitos e com todas as consequências legais;
NN. A informação alegadamente omitida não podia, sequer, considerar-se coberta pelo núcleo essencial do dever de informação, por duas ordens de razões: (i) primeiro, porque a retransmissão não era um risco especial das obrigações em discussão nos autos, mas antes algo que se encontrava genérica e expressamente previsto no RGICSF e na própria medida de resolução; (ii) segundo, por se tratar de um serviço de mera execução de ordens, no qual a intensidade dos deveres de informação que impendem sobre os intermediários financeiros é substancialmente menor;
OO. Não é rigoroso que se afirme que estava em causa um risco especial das obrigações aqui em causa, como fez o Tribunal a quo, porque decorreu da prova produzida nos autos, o risco de retransmissão não era um risco que afectasse especificamente este tipo de passivos, muito menos especificamente o investimento do Recorrido;
PP. Antes afectando a generalidade da actividade do Recorrente, na medida em que podia, em abstracto, afectar qualquer activo ou passivo que tivesse sido transmitido ao Recorrente em 3 de Agosto de 2014, pelo menos até à conclusão, com sucesso, do processo de venda, como veio a suceder;
QQ. Ainda que se considerasse ser um risco relevante que afectasse as obrigações em discussão nos autos, incluindo os depósitos a prazo de qualquer cliente no montante não coberto pelo Fundo de Garantia de Depósitos;
RR. O que se afigura incompatível a ratio de todo o regime jurídico previsto no RGICSF, no qual se sustentou a aplicação da medida de resolução ao C…, designadamente das normas contidas nos seus artigos 145.º-C, n.º 1, alínea a) e 145.º-O, n.º 1, na sua redacção em vigor à data da emissão da ordem de aquisição;
SS. Além disso, por um lado, o Recorrente actuou na prestação de um serviço de mera execução de ordem, e, por outro lado, o investimento em causa nos autos correspondeu a uma aquisição em mercado secundário, i.e., à compra de dívida já emitida, em mercado, a uma contraparte não pré-determinada, ao contrário do que sucede nas subscrições de dívida em mercado primário;
TT. O facto de estarmos perante um serviço de mera execução de ordens por iniciativa do cliente determina que os deveres de informação devem ser ajustados em função da experiência e grau de conhecimento do cliente (artigo 321, n.º 2 do CVM) e também que o Recorrente não tinha sequer que fazer a avaliação da adequação deste instrumento ao cliente;
UU. A mera apresentação de uma carteira de investimentos que o Recorrente tem, em cada momento, disponível para intermediar, não consubstancia, como o Recorrido quis fazer crer, qualquer actividade de consultoria ou aconselhamento ou gestão do seu património;
VV. Independentemente da apresentação prévia dos investimentos à disposição do Recorrido, a actividade de intermediação financeira por parte do Recorrente circunscreveu-se ao serviço de recepção de uma ordem de compra e à sua execução em mercado mediante obtenção de uma oferta em sentido contrário que satisfaça as condições previamente definidas;
WW. Se houver uma recomendação específica relativamente a um concreto instrumento financeiro, é essa recomendação que motiva o interesse do cliente na sua subscrição, com o inerente reforço dos deveres de informação, ao passo que, tratando-se da mera recepção de uma ordem, é o interesse do cliente que impulsiona a operação, em que o intermediário financeiro actua no lado passivo da relação, limitando-se a executar a ordem recebida, mediante o recebimento de uma comissão que, no presente caso, se limitou a €100 (cem euros), como decorreu da prova;
XX. O poder de retransmissão não era uma informação coberta pelo núcleo essencial dos deveres de informação que impendiam sobre o Recorrente no caso, não podendo qualificar-se a sua actuação como ilícita e falhando, portanto, a verificação do primeiro dos pressupostos da responsabilidade civil que lhe vem (mal) imputada pelo Tribunal a quo, requerendo-se a V. Exas. que reconheçam a inexistência dessa responsabilidade, desde logo, com esse fundamento;
YY. O contexto existente à data em que a aquisição teve lugar é mais do que demonstrativo de que, ainda que se considerasse que a possibilidade abstracta de retransmissão estava abrangida por deveres de informação do Recorrente, a verdade é que, do ponto de vista subjectivo, ou seja, no que toca à diligência do Recorrente no caso concreto, numa óptica de probabilidade e previsibilidade, a sua actuação não merece censura;
ZZ. Assim falhando, como sempre se defendeu e deveria ter sido reconhecido, a imputação de qualquer responsabilidade civil ao Recorrente na sua qualidade de intermediário financeiro da operação em discussão nos autos;
AAA. Decorre da prova produzida nos autos que (i) o próprio Recorrente realizou, nos dois meses que precederam a Deliberação de Retransmissão de 29 de Dezembro de 2015, do BdP, diversas operações de recompra de obrigações (aquisições equivalentes à que se encontra em discussão nos autos), as quais foram objecto daquela retransmissão para o C… o que acarretou para o Recorrente um prejuízo de valor superior a € 150.000.000 (cento e cinquenta milhões de euros);
BBB. Decorre também da prova testemunhal que, da interacção com o BdP ao longo do tempo, resultou a convicção, motivada também pelo regulador, de que o perímetro de activos e passivos transmitidos do C… para o Recorrente se encontrava à data consolidado;
CCC. Bem como que não era apenas o Recorrente que tinha essa percepção, mas antes todo o mercado, desde a concorrência (de que é exemplo a recomendação pelo S…) até aos investidores institucionais internacionais que, como se sabe, foram afectados em valor consideráveis e têm hoje pendentes diversas acções em tribunal;
DDD. Por fim, também decorreu da prova produzida que a percepção dos agentes do mercado à data era a de que, mesmo que se verificasse uma qualquer alteração do perímetro, a mesma nunca afectaria as obrigações seniores como aquelas que o Recorrido adquiriu;
EEE. Crê-se, em face de todas essas circunstâncias, não restarem dúvidas de que, para qualquer intermediário financeiro colocado na mesma posição do Recorrente, a percepção era a de que a probabilidade de retransmissão das obrigações em causa nos autos para o C… era nula;
FFF. Aos intermediários financeiros o legislador impõe que prestem a informação que se afigure necessária para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada acerca de um determinado investimento;
GGG. Aquilo que nestes autos se discute – especificamente a propósito da diligência do Recorrente e do pressuposto “culpa” – é se o entendimento de que a questão da retransmissão não era uma informação necessária a uma tomada de decisão naqueles termos, face ao contexto existente à data, é censurável ao Recorrente, sendo a resposta, perante todas as circunstâncias supra descritas que se deixaram devidamente provadas nos autos, obviamente negativa;
HHH. Requer-se a V. Exas. que reconheçam ter sido devidamente ilidida a presunção de culpa a que o Recorrente se encontra sujeito por força do enquadramento legal aplicável e que, em consequência, reconheçam que não se encontra preenchido o pressuposto “culpa” da responsabilidade imputada ao Réu, também por aí excluindo-se essa responsabilidade;
III. A avaliação do nexo de causalidade não deixa nunca de ter subjacente, precisamente, a ideia de uma relação causal entre, por um lado, (i) uma determinada conduta (no caso, de um intermediário financeiro), activa ou omissiva, que se considere ilícita e culposa, e, por outro, (ii) um determinado dano sofrido pelo cliente;
JJJ. Demonstrando-se que o cliente pretendeu proceder ao investimento sujeito a um outro risco de equivalente gravidade e com potenciais consequências igualmente gravosas, pode concluir-se que teria realizado o investimento que estiver em causa, mesmo que a informação que se entenda ter sido omitida (e que havia o dever legal de transmitir) lhe tivesse sido transmitida;
KKK. Ora, o Recorrido alegou nestes autos que não teria adquirido as obrigações se soubesse da possibilidade abstracta de as mesmas serem retransmitidas para o C… pelo BdP, mas sabe-se que adquiriu as obrigações sabendo dos riscos que envolviam o Recorrido, nomeadamente relacionados com um potencial insucesso na conclusão do processo de alienação do seu capital;
LLL. Perante tudo o que se deixou dito, considerando-se o risco que afectava à data as obrigações (relacionado com o processos de venda do Recorrente) e que o Recorrido não coloca em causa que aceitou, tanto que as adquiriu, não devia ter-se entendido existir um nexo de causalidade relevante, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 563.º do Código Civil, entre a informação que se defendeu ter sido omitida pelo Recorrente e os prejuízos que o Recorrido alegou nestes autos, falhando, assim, o preenchimento, também, do pressuposto nexo de causalidade, mais um dos fundamentos da manifesta improcedência dos pedidos formulados nos autos pelo Recorrido;
MMM. Os juros remuneratórios corresponderiam a uma vertente de alegados lucros cessantes, porém com a particularidade de esses lucros, de acordo com a argumentação do Recorrido, não corresponderem uma expectativa legítima;
NNN. O Recorrido reclamava nestes autos alegados danos decorrentes da circunstância de ter adquirido as obrigações, que alega apenas ter adquirido por não saber da existência da possibilidade de retransmissão das mesmas ao C…, e não da circunstância de as mesmas terem sido retransmitidas ao C…;
OOO. Se alega que nunca as teria adquirido e é nessa posição que o Recorrido pretende nestes autos ser colocado por via de uma indemnização, nunca, em caso algum, poderia o mesmo ter a expectativa de receber o pagamento de juros remuneratórios decorrentes de uma titularidade de obrigações por si não pretendida;
PPP. Assim, não se verifica, entre a ilicitude que se aponta à actuação do Recorrente e qualquer prejuízo decorrente da privação de recebimento de juros remuneratórios, um nexo de causalidade juridicamente relevante para os efeitos do artigo 563.º do Código Civil, requerendo-se a V. Exas. que, independentemente do entendimento que tenham relativamente à demais matéria impugnada, reconheçam a inexistência de nexo de causalidade relativamente aos juros remuneratórios, revogando a Sentença recorrida na parte em que condenou o Recorrente no pagamento do valor de €10.329,37.
Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis:
A. Deve proceder a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto pelo Tribunal a quo: (i) alterando-se a redacção dos pontos 18, 22 e 23, e dando-se como não provados os pontos 24, 25 e 27 da matéria de facto provada nos termos requeridos; (ii) dando-se como provada, sob um novo ponto 35, a matéria constante da alínea c) da matéria de facto não provada; e (iii) dando-se como provada, sob um novo ponto 36, a matéria relacionada com a recompra de obrigações pelo Recorrente entre Setembro e Dezembro de 2015.
B. Deve proceder a impugnação da decisão de Direito, reconhecendo-se: (i) Que o direito alegado pelo Recorrido nestes autos se encontrava já prescrito no momento em foi apresentada a Petição Inicial; (ii) Não se encontrar verificado o pressuposto ilicitude nos termos do artigo 312.º, n.º 1, do CVM, por a informação sobre o poder de retransmissão não se encontrar coberta pelo dever de informação do Recorrente;
Caso assim não se entenda: (iii) Não se encontrar verificado o pressuposto culpa – ou, em rigor, considerando-se ilidida a presunção de culpa prevista no artigo 304.º-A, n.º 2, do CVM – da responsabilidade civil imputada ao Recorrente, atendendo à imprevisibilidade do exercício do poder de retransmissão pelo BdP, particularmente em termos que afectassem as obrigações em causa nos autos; e
Em qualquer caso: (iv) Reconhecendo-se inexistir qualquer nexo de causalidade entre a conduta que o Recorrido imputa ao Recorrente e qualifica como ilícita e culposa e os prejuízos alegados pelo Recorrido nestes autos, em particular, aqueles que se alegou serem decorrentes da privação de recebimento de juros remuneratórios vencidos após a retransmissão das obrigações ao C…,
Sendo a Sentença recorrida revogada e absolvendo-se o Recorrente, in totum, do pedido formulado pelo Recorrido, (…)”.
Contra-alegou o Autor, formulando a final as seguintes conclusões:
“1) A bem da clareza da nossa exposição, parece-nos que o Réu, e aqui apelante, quiçá propositadamente, escapa à discussão do ponto essencial dos autos e que parece resultar claro dos articulados do A.: a informação de que seria sempre possível ao Banco de Portugal (adiante BdP) operar a retransmissão de activos e passivos entre o C… e o B… foi ocultada do A. - e hoje, consabidamente, até dos próprios funcionários do B… - este facto constitui um manifesto risco, se atentarmos na circunstância de o C… ser desde Agosto de 2014 uma entidade em liquidação!
2) E não se discuta a probabilidade de ocorrer essa retransmissão - é que a priori não apenas o A. não discute o grau dessa probabilidade como nos parece, com todo o respeito, que o grau de probabilidade de a retransmissão é, para este efeito, totalmente irrelevante!
3) Ao A. cabia o direito de decidir investir na posse de todos os elementos essenciais à sua boa decisão - e entre eles os atinentes ao específico risco de retransmissão da responsabilidade pela emissão ao C….
Vejamos,
4) Dos factos provados 18 e 25:
a. Se é verdade que eram apresentados vários produtos alternativos ao A., não é menos verdade que esse “menu” de investimentos resultava de recomendações ou sugestões do B…., fosse pela rentabilidade de cada um dos produtos ou pela adequação ao perfil de investidor do A. - nem poderia ser de outra forma! Ou seja, o B… claramente sugeria todos e qualquer um dos investimentos que apresentava ao A.
b. Isso mesmo resulta do depoimento da testemunha E… (com sublinhados nossos: E… [01:18:04] [incompreensível] desse produto, dessas obrigações, nunca estive presente só a mostrar essas obrigações. Nós quando mostrávamos oferta mostrávamos sempre um conjunto de oferta, nunca oferta individual. Não fazia parte [incompreensível] e da nossa forma de funcionar dessa equipa.
c. O Banco tinha, portanto, por norma apresentar um leque de produtos ao cliente private - que não corresponderia a todos os produtos disponíveis - pois que nunca ninguém refere isso - mas antes a alguns produtos por si sugeridos ao cliente. E o cliente escolheria um dos produtos sugeridos!
d. A busca literal do B… Réu, no rigor das palavras da testemunha, para ali ver apenas uma apresentação de características de um produto em lugar de uma verdadeira sugestão pretende que nos alheemos desde logo do contexto em que as perguntas são feitas para as respostas que são dadas, e depois da normalidade da relação bancária que a testemunha E… tão bem descreveu.
e. não vemos na prova constante dos autos justificação suficiente para que se altere a decisão sobre a matéria de facto sobre estes concretos factos.
5) do facto provado 22:
a. Não está em causa neste facto qualquer tipo de garantia de reembolso, como o B…-R. pretende fazer crer nas suas alegações. Ao invés o que daqui releva é a atribuição ou convicção de responsabilidade por esse reembolso no final do prazo da emissão - e que ao A. terá sido dito ser do B…-R., como de tanto estavam convencidas as próprias testemunhas.
b. Nesse sentido, disse a testemunha P…: P… [00:13:30] Apresentei este produto ao Sr. …. como sendo obrigações do B... 
Mandatário do Autor [00:13:36] Era o nome delas? Já agora.
P… [00:13:39] ... sobreposição de vozes...
Mandatário do Autor [00:13:39] O nome delas eram “obrigações do B…? 
P… [00:13:41] Claro, acho que não há dúvidas para ninguém. 
Mandatário do Autor [00:13:44] Sim, eu também acho que não, mas é só para esclarecer... portanto, sim senhor, desculpe ter interrompido. 
P… [00:13:48] Eram obrigações de dívida sénior do B…. O B… era uma entidade que tinha sido resolvida, que tinha ficado com parte dos activos [incompreensível] daquilo que era o C…, e que tinham passado a transitar para o B…  já [incompreensível] como foram os depósitos a prazo e as obrigações sénior. Aquelas obrigações eram do B…, era o B… que iria ter que as pagar, e era um banco que estava com todos os problemas daquilo que era de conhecimento público, denunciados, resolvidos, tratados, e nada escondido... e, portanto, teria toda a capacidade para continuar a laborar de forma... até mais normal do que a restante banca.  
Mandatário do Autor [00:14:40] Sim, senhor, portanto, nesse aspecto... corrija-me se eu estiver errado, mas do que acaba de dizer reforçou a segurança do produto? Portanto, o risco de uma obrigação é o risco do balanço do emitente, não é? 
P… [00:14:52] Claro... 
Mandatário do Autor[00:14:54] Portanto, nesse aspecto reforçou a segurança do produto?
P… [00:14:58] Sr. Dr., claro que reforcei, e essas era a mensagem que me era transmitida pela minha hierarquia superior toda, durante estes anos todos. Apenas no [incompreensível]. Não havia espaço para dúvidas de que o assunto do C… era um assunto encerrado. Estávamos com um B…, um novo cartão de contribuinte, um accionista de referência que era o fundo de resolução... e, portanto, nós tínhamos era que ir para a rua fazer o negócio crescer, captar fundos.
(...) Mandatário do Autor [00:17:16] Sim, senhor. [00:17:19] O Sr. A…, têm ideia se pôs alguma dúvida sobre... um esclarecimento, digamos, para ficar esclarecido desta distinção C…, B…, o que é que era... se havia risco C… aqui metido? Quer dizer, fez alguma pergunta, pediu algum esclarecimento? [incompreensível] pedir? Quer dizer, esse tema da distinção entre uma entidade e outra veio à baila, ou não? 
P… [00:17:47] Sr. Dr., eu depois de ler o Auto, e [incompreensível] consciência, e de forma tranquila, aquilo que eu [incompreensível] pode ter acontecido muito provavelmente e [incompreensível] vocês vão percebê-lo. Desde 2014, Agosto de 2014 até, vá, 2019, nós éramos o morto que toda a gente tentava enterrar ainda com sinais de vida. Era natural a concorrência dizer que nós [incompreensível], era natural a comunicação falar mal do B… e do C….  [00:18:18] Era natural esse tipo de perguntas em todas as reuniões que a gente fazia [incompreensível] todas. E aquilo que nós respondíamos, em consciência, e porque era a informação que nos era prestada, é que [incompreensível] hierarquia superior do banco, Ok? Já não era tema, o C… era uma coisa do passado, já era um assunto que estava tratado, resolvido, e nós agora éramos um banco novo, B…, com uma estrutura... com um accionista que era o Fundo de Resolução, com capacidade para a fazer passar por todas as adversidades. Os problemas do C… e B… [incompreensível] já tinham sido identificados, e isso já não é da responsabilidade dos comerciais. A nossa responsabilidade era manter os recursos, manter os clientes contra todas essas notícias todas [incompreensível].
c. Daqui resulta que era claro para o colaborador do Banco que apresentou o produto, e assim o explicou ao cliente - aqui A. - que a responsabilidade pela emissão era do B… e só do B…, tudo fazendo para afastar a latência de qualquer tipo de responsabilidade do C… sobre o reembolso daquela emissão, até como forma de garantir a credibilidade do B… por oposição à instituição C…, objecto de resolução e já em liquidação.
d. Como o mesmo resultaria sempre da normalidade de uma conversa entre duas pessoas em 2015 depois do que foi público da resolução do C….
e. Não merece, pois também qualquer reparo a decisão quanto a este facto.
6) Dos factos provados 23 e 24
a. Novamente não podemos deixar de invocar um básico sentido de normalidade e razoabilidade para a interpretação das palavras das testemunhas sobre este tema. De facto, tendo presente a resolução e toda a situação de incerteza e instabilidade à volta resolução do C… e da criação do B…-R., o único cenário normal é aquele em que um cliente insta e pede garantias e certezas sobre a irrelevância do C… no âmbito de um investimento que esteja a fazer no universo B…. 
b. A este propósito aliás valem as declarações supra transcritas da testemunha P…, como as da testemunha E…:
E… [00:26:54] Duvido que não tenha sido falado. Eu não me consigo lembrar da reunião, foi há muito tempo atrás e, enfim, eu já saí do banco. O que eu posso dizer é que nas reuniões isso era conversa com todos os clientes, infelizmente [incompreensível] não é? Porque toda a gente falava porque estava nas notícias.  Portanto, nós… por duas razões: não só reactivamente porque os clientes nos falavam disso, mas porque era imposição da nossa equipa tínhamos que falar dos riscos, não é? Tinha que se falar dos riscos de todos os investimentos que eles faziam, específicos [incompreensível] investimentos. [incompreensível] obrigações obviamente um dos riscos importantes é o risco de insolvência, seja de um banco, seja de outro sector qualquer.
(Sublinhado nosso)
c. Como é óbvio, todos os clientes, todos, queriam assegurar-se do alheamento do C… de todos os seus investimentos. E este caso não terá sido excepção!
d. Deve, pois manter-se a decisão quanto a este facto.
7) Do aditamento de factos relativos à recompra de Obrigações Próprias pelo Réu
a. Ao contrário do alegado, o Tribunal a quo não desconsiderou estes factos por falta de prova, nomeadamente de elementos contabilísticos ou outros. Desconsiderou-os, por não estarem sequer em discussão, não sendo de todo relevantes para o apuramento da eventual responsabilidade do B…-R. - a falta de elementos contabilísticos a que se refere a sentença tem por referência a previsibilidade ou não da operação de retransmissão da responsabilidade das emissões obrigacionistas, e não a demonstração das eventuais operações de recompra de obrigações.
b. A obrigação de informação de um intermediário financeiro, e o seu grau de imposição, não varia de acordo com a probabilidade que ele próprio atribui à verificação de um risco... o dever de informação ao investidor de riscos especiais dos instrumentos financeiros negociados é, sem mais, uma obrigação absoluta, ou seja, não está sujeita a graduações, e muito menos a exclusões (salvos os casos de investidores institucionais ou profissionais).
c. E esta é a única e verdadeira razão para que não fossem considerados os factos em causa na decisão sobre a matéria de facto!
E ainda que assim se não entendesse,
d. Da prova produzida, se resulta que o B…-R. era titular em Dezembro de 2015 de uma carteira de Obrigações suas, retransmitidas ao C…, não é menos verdade que não resulta já quando e quantas obrigações o R. recomprou tais Obrigações, não estando o Tribunal em condições de poder considerar como provada recompra dessas Obrigações, o período em que terá sucedido e muito menos as quantidades em teria tido lugar!
8) É o Autor surpreendido pela primeira vez nestes autos com a invocação da prescrição ao abrigo no art.º 324º nº 2 do CdVM.
9) Vigora ainda entre nós o princípio da concentração da defesa na contestação, salva a possibilidade de se verificarem factos supervenientes - vide art.º 573º do CPC. Por outro lado, dispõe o art.º 588º nº 2 do mesmo diploma que “dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência”.
10) Os factos agora alegados como sustentando o conhecimento do Autor, eles próprios destroçam a alegada superveniência do conhecimento dos mesmos pelo Banco, e com isso, o próprio B…-R. sustenta a violação da concentração da defesa nos termos supra alegados!
11) Não pode ser de admitir a pretensão agora deduzida pelo B…-R.
12) A disposição do art.º 324º nº 2 do CdVM, por outro lado, obrigaria a que a conduta ilícita do B…-R. lhe fosse imputável apenas a título de negligência.
13)  Mas dos factos que resultam dos autos como provados, e alguns deles, agora sim, públicos e notórios, claramente se retira que a actuação do Banco foi, não apenas culposa, como gravemente culposa - dolosa mesmo!
14) Em causa está a previsão, na deliberação de resolução do C…, - que criou o B…-R. - de cláusula que torna possível, a todo o tempo, a retransmissão de activos ou passivos do B…-R. para o C… e vice-versa. Ou seja, uma possibilidade que onerava especificamente as responsabilidades do B…-R., e portanto, no caso as emissões obrigacionistas por que era então responsável.
15) Esta previsão, constituindo um específico risco - completamente distinto de todo e qualquer risco que incidisse sobre qualquer instrumento de dívida de qualquer outro emitente - foi ocultada, no sentido de nem sequer ter sido informada, até aos colaboradores do B… que negociavam e intermediavam negociação de títulos com clientes. 
16) E diga-se mais, já agora, a propósito da probabilidade de verificação da retransmissão, que ela só teve lugar por necessidades de equilíbrio de capitais do próprio B…-R., ou seja, provável ou não, a verdade é que o BdP entendeu que a retransmissão destas responsabilidades era essencial para a saúde financeira do próprio B…-R., pelo que se haverá alguém que conhecesse da probabilidade de a operação ocorrer era o próprio B…-R.
17)  No âmbito da regulamentação do RGICSF prevêem-se várias instrumentos, figuras e ferramentas jurídicas de que as entidades destinatárias podem lançar mão, o mesmo se aplicando às entidades de supervisão, e entre as quais, no âmbito de medida de resolução de entidade bancária, a possibilidade de retransmissão de activos e passivos entre a entidade resolvida e o Banco de transição - vide art.º 145-Q, nº 4 al. c).
18) Esta é, contudo, uma previsão genérica, cuja aplicabilidade a um processo de resolução depende da verificação de vários pressupostos, nos termos do nº 5 do mesmo artigo, sendo uma delas uma decisão administrativa prévia contida na própria deliberação de resolução. Ou seja, aquilo a que o Recorrente identifica como um risco geral - entenda-se um risco geral de todos os valores mobiliários e Obrigações em particular -, afinal é uma mera possibilidade cuja aplicabilidade depende da verificação cumulativa de vários pressupostos, e desde logo a previsão expressa na deliberação de resolução - que convenhamos não apenas não é lei como não é do conhecimento generalizado.
19) Esta possibilidade de retransmissão, prevista genericamente no RGCISF, apenas se concretiza, e se torna num efectivo risco, se e quando prevista na deliberação de resolução do BdP e se se verificarem as condições supra referidas, mas sempre em qualquer caso apenas se aplica relativamente aos activos e passivos transferidos entre Banco resolvido e Banco de transição! 
20) No caso concreto, era um risco que afectava apenas activos e passivos do Banco-R. enquanto banco de transição, e de nenhum outro! Como não é aplicável a qualquer outro instrumento de dívida de qualquer outro emitente!
21) Aquela possibilidade era, pois, um risco especial daquela concreta entidade emitente, por causa, e só por causa da deliberação de resolução do C…!
22) E a existência deste risco deveria ter sido informada ao A. enquanto investidor em instrumentos de dívida, em cumprimento do disposto no art.º 312º al. e) e 312ºE do CdVM.
23) Tendo violado tais deveres, incorreu o B…-R., na qualidade de intermediário financeiro na prática de conduta ilícita, violadora dos direitos contratuais reconhecidos ao investidor - aqui A.
24) O CdVM, nos seus art.ºs 312º a 312º-G, prevê expressamente um conjunto de deveres de informação a prestar aos investidores, seja relativo ao  contrato de intermediação, seja relativo aos serviços prestados, seja relativo aos instrumentos financeiros objecto de negociação e daqueles serviços!
25) Todo o acervo de informação ali previsto não varia, contudo, entre os diversos serviços de intermediação possíveis. Como não varia consoante a operação seja em mercado primário - de subscrição na emissão - ou em mercado secundário - compra e venda de títulos durante o seu prazo de vigência.
26) Pode variar a adequação da forma de prestação dessa informação de acordo com o concreto grau de conhecimentos do investidor. Mas a informação a prestar nunca é dispensada!
27) O invocado art.º 321º do CdVM aplica-se, não à informação a prestar na prestação de serviços de intermediação financeira, mas antes ao contrato de intermediação financeira propriamente dito, ao abrigo do qual, depois, são prestados todos ou alguns dos serviços elencados no art.º 290º do CdVM.
28) Este contrato de intermediação é aquilo que hoje se designa consensualmente contrato-quadro ou contrato de cobertura, aplicando-se-lhe os art.ºs 321º e seguintes do CdVM. Aos específicos serviços de intermediação prestados, chamam-se, por sua vez, contratos de execução, sendo a estes aplicáveis, os art.ºs 312º a 320º do mesmo diploma.
29)  A possibilidade de retransmissão da responsabilidade pelo reembolso destas obrigações para o C…, por ser um risco especial das Obrigações originalmente C… e transmitidas ao B… (e só destas), deveria ter sido devidamente informado ao A., e não o foi! Como, de resto, foi até ocultado de todos os colaboradores da área comercial! - E aí reside a ilicitude da conduta do B…-R.
30)  A censura subjectiva (culpa) em que se traduz o juízo da culpa, no caso, não incide sobre a retransmissão propriamente dita, ou o seu prévio conhecimento por parte do B…-R., dirige-se apenas e só ao facto de o B…-R. ter omitido informações relevantes no momento da intermediação financeira.
31) A omissão da informação concreta em causa não foi apenas omitida por uma mera negligência do colaborador do Banco que agiu junto do A. 
32)  Ficou demonstrado nestes autos que o Banco nunca sequer informou os seus comerciais, que sabia comunicarem com os clientes, daquela possibilidade de retransmissão de activos e passivos.
33) A não comunicação da cláusula da deliberação que previa aquela possibilidade nunca foi informada, formal ou informalmente, a quem tinha por incumbência vender os produtos financeiros do Banco, claramente a fim de garantir a normalidade de um negócio que, naquelas condições, se conhecidas, seria tudo menos normal!
34) Percebida esta forma de actuar, até internamente na sua estrutura organizativa, logo se percebe igualmente que o grau de censura ao Banco é elevado, e porventura até com carácter de dolo!
35)  Ou seja, o A. não desconhecia os normais riscos inerentes à compra de Obrigações, como poderia até conhecer que o R. era um Banco de transição, e como isso da eventualidade da sua liquidação findo o prazo dessa transição - o que, de resto ficou por demonstrar, mas aqui se admite teoricamente! Mas tendo conhecimento desses riscos, tomou a sua opção de investimento, e tomou-a por causa ou apesar dos ditos riscos!
36)  No caso, o que foi subtraído ao R. foi a possibilidade de sopesar da mesma forma um risco que o Banco não podia ignorar, e que lhe omitiu - e que, por infortúnio de todos, se veio a verificar!
37) Ou seja, a relação causal a estabelecer aqui equiparar-se-á em muito à lógica da essencialidade do erro na decisão de contratar. Ou seja, em primeiro lugar, há que estabelecer que a decisão de contratar do A. foi tomada com base em pressupostos errados, no caso por falta da informação do Banco. Em segundo lugar, que essa decisão de contratar veio a implicar um dano que não surgiria de outra forma, e por fim, que o A., se o B…-R. não tivesse praticado o acto ilícito e culposo de omissão de informação, não teria contratado de qualquer forma.
38)  In casu, todos estes passos resultam claros da matéria de facto provada, e em particular dos factos provados 30 e 31, onde se afirma, para lá de qualquer dúvida, que se o Banco houvesse informado o A. da possibilidade de retransmissão das Obrigações ao C…, aquele nunca teria dado ordem de compra!
39)  Em suma, a causalidade aqui centra-se, não na verificação de um qualquer risco inerente às Obrigações, como parece alegar o B…-R., mas na verificação de um risco que era, dolosamente, desconhecido do A., e que só por isso o A. o sofreu!
40)  Parece-nos, pois, inquestionável a causalidade mecânica estabelecida entre o acto ilícito do B…-R. e o dano do A. Mas parece-nos igualmente clara a adequação, em abstracto, da relação causal entre a omissão de informação sobre uma cláusula de possibilidade retransmissão das obrigações para o C…, e a subscrição enganada de tais títulos por um investidor e o dano por si sofrido pelo óbvio incumprimento da emissão obrigacionista pelo Banco objecto de resolução!
41)  Em suma, a causalidade aqui centra-se, não na verificação de um qualquer risco inerente às Obrigações, como parece alegar o B…-R., mas na verificação de um risco que era, dolosamente, desconhecido do A., e que só por isso o A. o sofreu!
42) Parece-nos, pois, inquestionável a causalidade mecânica estabelecida entre o acto ilícito do B…-R. e o dano do A.
43) Mas parece-nos igualmente clara a adequação, em abstracto, da relação causal entre a omissão de informação sobre uma cláusula de possibilidade retransmissão das obrigações para o C…, e a subscrição enganada de tais títulos por um investidor e o dano por si sofrido pelo óbvio incumprimento da emissão obrigacionista pelo Banco objecto de resolução!
44) Os contratos se prestam à criação de expectativas juridicamente relevantes, ao nível da remuneração e outras garantias, como, não sendo resolvidos, atribuem direitos de crédito que merecem ser tutelados.
45)  A teoria da diferença, resultante do disposto no art.º 562º do Código Civil não implica necessária e automaticamente o retorno à situação patrimonial anterior por diferença com a actual2. (2 vide a este propósito Paulo Mota Pinto, in “INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO E INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO”, em geral, e em particular págs. 818 e seguintes)
46) Implica sim a reposição da situação do lesado num estado em que previsivelmente estaria se acaso o lesante não tivesse praticado o acto danoso - e esta reposição deve, no nosso caso, ter em consideração as vantagens que o lesado sempre tiraria do investimento dos seus fundos monetários, equivalente aos juros remuneratórios.
47)  Ademais, o acto lesivo foi a omissão de informação pelo R. - ora, o dano do A. deve ser medido pelos termos do contrato tais quais anunciados pelo B…-R., ou seja, como se a retransmissão das Obrigações não tivesse ocorrido!
48) No âmbito da responsabilidade contratual, a reposição da diferença obriga a que se pondere não um cenário eventual ou hipotético entre o acto lesivo e o momento actual, mas uma ponderação de uma situação de normalidade se acaso, num cenário normal, os direitos adquiridos contratualmente pelo lesado fossem cumpridos, total ou parcialmente, de acordo com o tal juízo de normalidade, sempre no contexto do concreto ilícito cometido pela entidade lesante!
Subsidiariamente, 
49) De todo o modo, e procedendo a alegação do B…-R., de forma a garantir a protecção do interesse contratual negativo do A., e a reposição patrimonial igual a momento imediatamente anterior à celebração do contrato, então ao valor do capital despendido, pedido e que o R. parece não impugnar, devem-se somar juros de mora a contar desde a data da prática do acto ilícito. Em suma,
50) Por tudo o exposto, não pode proceder a pretensão do B…Recorrente em qualquer um dos seus argumentos, ou com qualquer dos efeitos minimizadores pretendidos por via de recurso.
51) O B…-R. sabia da possibilidade de retransmissão das suas próprias Obrigações ao C… - banco em liquidação -, e ao intermediar operações dessas obrigações junto do A., investidor não-qualificado, apesar de a tanto estar obrigado, não o advertiu dessa possibilidade! 
52) Esse mecanismo de retransmissão veio a ser declarado pelo BdP e com isso as Obrigações não foram reembolsadas, nem paga a respectiva remuneração, encontrando-se o A. lesado no respectivo montante do capital a reembolsar e dos juros não recebidos. A partir da data de vencimento de tais juros e capital, devem ser calculados e contados os respectivos juros de mora à taxa legal supletiva.
53) Devendo por isso ser mantida a decisão recorrida!”.
Posteriormente à interposição do recurso, a recorrente veio juntar aos autos um parecer técnico do Professor Paulo Câmara, em colaboração com a Drª Maria Gabriela Teixeira Duarte, em papel timbrado da sociedade de advogados Sérvulo e Associados, intitulado “Deveres de Informação no âmbito de Serviços de Intermediação Financeira: Delimitação e Responsabilidade Civil”. 
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC - as questões a decidir são:
0) da admissão do parecer junto após a interposição do recurso;
1) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
2) A prescrição do direito invocado pelo Autor;
3) A inexistência de ilicitude nos termos do artigo 312.º, n.º 1, do CVM, por a informação sobre o poder de retransmissão não se encontrar coberta pelo dever de informação do Recorrente e, quando assim se não entenda,
4) A ilisão da presunção de culpa prevista no artigo 304.º-A, n.º 2, do CVM – da responsabilidade civil imputada ao Recorrente, atendendo à imprevisibilidade do exercício do poder de retransmissão pelo BdP, particularmente em termos que afectassem as obrigações em causa nos autos; e finalmente e em qualquer caso,
5) A inexistência de qualquer nexo de causalidade entre a conduta que o Recorrido imputa ao Recorrente e qualifica como ilícita e culposa e os prejuízos alegados pelo Recorrido nestes autos, e em particular,
6) aqueles decorrentes da privação de recebimento de juros remuneratórios vencidos após a retransmissão das obrigações ao C….
III. Matéria de facto
A decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1ª Instância é a seguinte:
“Factos Provados. 
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa, com exclusão da matéria irrelevante ou com teor conclusivo ou de direito:
1. O Autor é empresário do sector de distribuição de bebidas, detendo igualmente participações sociais em várias outras áreas de atividade. (art.º 1º da p.i.)
2. O Autor foi classificado pelo Banco-Réu como investidor não qualificado. (art.ºs 13º e 14º da p.i.)
3. Em 8 de maio de 2014, o Banco C… (adiante designado por C…) emitiu 750.000.000,00€ de Obrigações ordinárias, de tipo sénior, com prazo de vencimento para 8 de maio de 2017, adotando a denominação comercial Obrigações … 2017, com o código …, com o valor nominal de 100.000,00€ cada, e negociadas em mercado regulamentado, na Bolsa de Valores do Luxemburgo. (art.ºs 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º e 21º da p.i.)
4. A referida emissão obrigacionista tinha previsto o seu reembolso a 8 de Maio de 2017. (art.º 23º da p.i.)
5. Por deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 foi constituído o … Réu …. (art.º 24º da p.i.)
6. Tendo sido deliberada a transferência de ativos e passivos do C… para o Banco-R. (art.º 25º da p.i.)
7. A relação de todos os ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais foi estabelecida no Anexo 2 àquela deliberação. (art.º 26º da p.i.)
8. Tudo no âmbito de deliberação de medida de resolução do C…. (art.º 27º da p.i.)
9. Por força de tal deliberação do Banco de Portugal e Anexo 2, a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações da emissão obrigacionista acima referenciada foi transmitida ao B… (adiante designado por B…). (art.º 28º da p.i.)
10. As Obrigações identificadas no facto provado nº 3 passaram a ser apresentadas como se fosse o Banco-Réu a sua entidade emitente e a entidade responsável pelo reembolso do capital investido. (art.ºs 33º e 35º da p.i.)
11. Nos termos da deliberação do Banco de Portugal identificada em 5 e respetivo Anexo 2, esta entidade reservou-se o direito de, a todo o tempo, operar transmissões e retransmissões de ativos, passivos ou elementos patrimoniais entre o C… e o B… (art.º 38.º da p.i.)
12. O que veio a ser confirmado na versão consolidada do texto do Anexo 2 após deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014, que veio a clarificar a primeira deliberação de 3 de agosto de 2014. (art.º 39.º da p.i.)
13. Tendo tal menção ficado a constar do nº 2 do Anexo 2 mencionado no facto anterior nos seguintes termos:
«Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o C… e o B…, SA, ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, nos termos do artigo 145.º H, número 5º» (art.º 40º da p.i.).
14. Em 29 de Dezembro de 2015, o Banco de Portugal, sem qualquer indicação ou aviso prévios, deliberou a retransmissão da responsabilidade pelo cumprimento das obrigações inerentes à emissão acima referenciada para o C… (art.º 41º da p.i.)
15. O A. é cliente do B…, S.A. sendo titular da conta à ordem nº (…) (art.º 47º da p.i.)
16. Sendo o seu gestor de conta P…. (art.º 49º da p.i.)
17. Em 15 de julho de 2015, data entre a deliberação da resolução do C… e a deliberação de retransmissão das Obrigações ao C…, aquele seu gestor de conta P…, juntamente com uma sua colega E…, visitou o A. na sua empresa, (art.º 51.º da p.i.)
18. E sugeriu-lhe a compra de obrigações com a designação comercial B…2017 e com o código (…), por se tratar, segundo afirmou, de uma excelente oportunidade de investimento seguro e com boa rentabilidade. (art.ºs 52.º, 53.º, 54º, 55º e 56º da p.i.)
19. A informação prestada resumiu-se às taxas de remuneração, ao prazo da emissão, à boa cotação dos títulos, à data de 98,37% sobre o par (ou seja, na altura cotados a baixo do par), a liquidez e volatilidade da cotação no mercado, entidade responsável pelo pagamento – B… – e à caracterização geral do instrumento financeiro como conservador e baixo risco, sendo que o nível de risco apresentado era apenas imputável ao próprio B…. (art.ºs 58º e 59º da p.i.)
20. Apresentado o produto, e porque o A. se pretendeu prevenir especificamente de qualquer tipo de confusão com todos os produtos em discussão na sequência da resolução do C…, a única questão que o A. levantou foi se as Obrigações eram do C… ou eram do B…, bem como se haveria alguma hipótese de a responsabilidade pelo pagamento da emissão ser do C… em lugar do B…-R., (art.ºs 60º e 61º da p.i.)
21. Ao que o gestor de conta respondeu que se tratavam de Obrigações B…, que nada tinham a ver com o C… e com as obrigações que tinham ficado com reembolso da responsabilidade deste. (art.º 62º da p.i.)
22. O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R. e que esta emissão não poderia deixar de ser paga (art.ºs 63º e 64.º da p.i.)
23. O A. reiterou as suas preocupações com o eventual “contágio” de (ir)responsabilidade do C… sobre a emissão em causa, (art.º 65º da p.i.)
24. Tendo sido reiteradamente sossegado sobre o seu investimento e afiançada a impossibilidade dessa sua preocupação se concretizar. (art.º 66º da p.i.)
25. Em face da informação prestada, das respostas aos esclarecimentos pedidos, e da recomendação de aquisição feita pelo gestor de conta, o A. deu, no dia 15 de julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B…2017, melhor identificadas no facto provado nº 18, no valor global de 196.750,00€. (artº 68º da p.i.) 
26. O B…-R. nunca informou o Autor de que existia a possibilidade, mais ou menos remota, de o Banco de Portugal operar a retransmissão de ativos ou passivos do B…-R. para o C… (art.º 69º da p.i.)
27. O Autor veio a tomar conhecimento, em data próxima à data do vencimento das obrigações, que estas haviam sido retransmitidas ao C… e que não seriam reembolsadas. (art. 70º da p.i.)
28. O Autor desconhecia os factos provados nºs 11 a 14. (art.º 71º da p.i.)
29. O B…-R. interveio junto do Autor na qualidade de intermediário financeiro. (art.º 74º da p.i.)
30. Se o B…-R. tivesse informado o Autor quanto à possibilidade de retransmissão da responsabilidade pelo reembolso das Obrigações B…2017 para o C…, o Autor nunca teria dado a ordem de compra de tais obrigações. (artºs 95º e 105º da p.i.)
31. O Autor apenas aceitou comprar as Obrigações B…2017 por lhe ter sido assegurado pelo seu gestor de conta do B…-R. que o seu reembolso era exclusiva responsabilidade do B… e que nada tinham a ver com o C…. (art.ºs 110º e 111º da p.i.)
32. As Obrigações em causa tiveram o seu vencimento em 8 de maio de 2017. (art.º 113º da p.i.)
33. O Autor não recebeu qualquer reembolso do valor das Obrigações por si subscritas, nem o valor do capital no valor global de € 196.750,00, nem o valor dos juros remuneratórios. (art.ºs 114º e 119º da p.i.)
34. As Obrigações subscritas conferiam uma remuneração de 2,625% por ano, sempre até ao dia 8 de maio de cada ano até à maturidade. (art.º 118º da p.i.) 
V – Factos Não Provados. 
Não resultou provado, com relevância para a decisão da causa:
a) Que o autor tivesse ficado abatido por se sentir enganado pelo B…-R. (art.º 123º da p.i.)
b) Que o Autor sinta desconfiança e angústia permanentes no trato que diariamente tem na sua atividade profissional com as mais variadas entidades financeiras ou outras. (art.º 126º da p.i.)
c) Que nada fizesse prever para o Réu B…, à data da aquisição das Obrigações pelo Autor, que as mesmas viessem a ser retransmitidas ao C… por decisão do Banco de Portugal. (art.º 15º da contestação)
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A restante matéria alegada não foi considerada por se tratar de matéria irrelevante, conclusiva ou de direito.
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VI – Fundamentação da Matéria de Facto. 
O tribunal fundou a sua convicção, quanto aos factos provados:
- Quanto aos factos provados nºs 1 e 2, no acordo das partes em sede de articulados conjugado com os depoimentos das testemunhas P…, E… e J….
- Quanto ao facto provado nºs 3 e 4, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 1 com a p.i., a fls. 13 verso a 15.
- Quanto aos factos provados nºs 5, 6, 7, 8, 9 e 11, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 2 com a p.i., a fls. 16 a 28.
- Quanto ao facto provado nº 10, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso, e com o teor dos depoimentos das testemunhas P… e E….
- Quanto aos factos provados nºs 12 e 13, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 3 com a p.i., a fls. 29 a 35.
- Quanto ao facto provado nº 14, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 5, por requerimento de 23/04/2018, a fls. 43 verso a 56.
- Quanto ao facto provado nº 15, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso.
- Quanto ao facto provado nº 16, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o depoimento da testemunha P…
- Quanto ao facto provado nº 17, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com os depoimentos das testemunhas P… e E…
- Quanto ao facto provado nº 18, nos depoimentos das testemunhas P… e E… em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso. 
- Quanto ao facto provado nº 19, nos depoimentos das testemunhas P… e E… em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso. 
- Quanto ao facto provado nº 20, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com o teor dos depoimentos das testemunhas P… e E…
- Quanto aos factos provados nº 21, 22, 23 e 24, nos depoimentos das testemunhas P… e E… em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso. 
- Quanto ao facto provado nº 25, nos depoimentos das testemunhas P… e E… em conjugação com o teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso. 
- Quanto aos factos provados nºs 26, 27 e 28, nos depoimentos das testemunhas P… e E…, sendo que as próprias testemunhas invocaram que desconheciam a possibilidade de retransmissão a todo o tempo pelo Banco de Portugal das Obrigações para o C… 
- Quanto ao facto provado nº 29, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com os depoimentos das testemunhas P… e E….
- Quanto aos factos provados nºs 30 e 31, nos depoimentos das testemunhas P… e E….
- Quanto ao facto provado nºs 32 e 34, no teor do documento junto como Doc. 6 com a p.i., a fls. 40 e 40 verso.
- Quanto ao facto provado nº 33, no acordo das partes em sede de articulados em conjugação com a ausência de produção de qualquer meio de prova que demonstrasse o pagamento.
O depoimento da testemunha P…, gestor de private banking, afigurou-se-nos coerente e credível: foi funcionário do Réu – (…) - desde a sua constituição em agosto de 2014 até fevereiro de 2019, tendo sido funcionário do C… desde 2004 até 2014, foi gestor de conta do Autor desde 2014 no âmbito da conta de que este era titular no B…; o Autor é recentemente seu cliente no âmbito da instituição bancária onde trabalha atualmente. A ora testemunha teve intervenção direta no processo de mediação que conduziu à venda pelo B…-R e à aquisição pelo Autor do produto financeiro a que os autos se reportam, admitiu ter apresentado e proposto o valor mobiliário em causa ao Autor, em sede de visita que fez às instalações de empresa do Autor, e que apresentou este produto como sendo obrigações do B…, cujo pagamento era da responsabilidade do B…, reforçou a segurança deste produto, em conformidade com a mensagem que lhe era transmitida pela sua hierarquia superior toda do B…, o assunto do C…era um assunto encerrado, estava-se perante uma nova entidade com um novo número de contribuinte e não informou o Autor da possibilidade dessas obrigações serem retransmitidas para o C… sendo que ele próprio desconhecia essa possibilidade (desconhecia o teor do nº 2 do Anexo 2 às Deliberações tomadas pelo Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014). À pergunta sobre se o Autor perguntou-lhe sobre se as obrigações poderiam sofrer efeito de contágio da parte do C…, respondeu que esse era um tema normal com todos os clientes e disse-lhe que o B… era uma instituição nova, que não tinha nada a ver com o C…; tinha como acionista um Fundo de Resolução; o C… era um assunto do passado. A testemunha disse ainda que não se recorda se informou o Autor de que as Obrigações em causa eram originárias do C… e que tinham sido transmitidas ao B… Era frequente os clientes perguntarem sobre se havia alguma ligação dos produtos com o C… e respondia que o C… era um assunto do passado. Afirmou que o Autor não queria adquirir nenhum produto relacionado com o C…. A testemunha disse também que, aquando da apresentação das Obrigações em causa ao Autor, explicou as suas características e que o B… estava no mercado para honrar os seus compromissos e que não havia espaço para dúvidas que o assunto C… era um assunto encerrado e que «nós tínhamos que ir para a rua, captar recursos para crescer». Mais afirmou que o perfil de cliente do Autor é de conservador, pois investia em produtos com características semelhantes a depósitos a prazo. Afirmou que as Obrigações de dívida sénior é um produto quase equivalente a depósitos a prazo. Confrontado com o teor do ponto 2 do Anexo 2 – texto consolidado - à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (junta como Doc. 3 com a p.i., a fls. 35), nos termos da qual «Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o C… e o B…, S.A., ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, nos termos do artigo 145.ºH, número 5.º» (fls. 35 dos autos), a ora testemunha afirmou desconhecer o seu teor, por isso não informou o Autor da possibilidade das Obrigações B…, cuja compra estava a promover junto do Autor, serem retransmitidas para o C…. À pergunta sobre, se tivesse dito ao Autor da possibilidade das Obrigações serem retransmitidas para o C… considera que o Autor teria adquirido na mesma as Obrigações?, respondeu perentoriamente que o Autor não teria adquirido tais obrigações, que teria resgatado naquele momento todo o dinheiro que tivesse no B…; não está a ver ninguém disponível para fazer caridade com o B… para salvar o C…; desconhece alguém que fizesse essa caridade; que acha que o Autor nunca teria comprado as Obrigações sabendo da possibilidade de retransmissão para o C… pois não se trataria de investimento, mas sim de obra de caridade. Quanto à ora testemunha, o risco de perda do investimento nas Obrigações era apenas o da insolvência do próprio B….
O depoimento da testemunha E…, funcionária do Réu – B…, S.A. - desde a sua constituição em agosto de 2014 até junho de 2018, tendo sido funcionário do C… desde 2001 até 2014, altura em que transitou para o B…S.A., afigurou-se-nos coerente e credível. Afirmou que reuniu 4 ou 5 vezes com o Autor nas instalações da empresa deste, afirmou que o Autor não foi informado da possibilidade das Obrigações B… serem retransmitidas para o C… por determinação do Banco de Portugal, pois só soube dessa possibilidade em 29/12/2015.
O depoimento da testemunha JNT, bancário, afigurou-se-nos coerente e credível. Afirmou que o Autor é seu cliente desde fevereiro de 2016 e que tem um perfil conservador ou defensivo, sendo que toma decisões para diminuir o risco e deu como exemplo o facto de o Autor, com o risco de insolvência do BA…, ter tirado dessa instituição bancária todo o seu dinheiro.
A convicção do tribunal, quanto aos factos provados, fundou-se na análise cruzada, conjugada e crítica dos meios de prova supra enunciados.     
A convicção do tribunal quanto aos factos não provados assentou na ausência ou na insuficiência de meios de prova produzidos sobre os mesmos.             
Quanto aos factos não provados constantes das alíneas a) e b), não foi produzido nenhum meio de prova sobre os mesmos.             
Quanto ao facto não provado constante da alínea c), os depoimentos das testemunhas L… e PJC… afiguraram-se-nos insuficientes para demonstrar tal facto.  
A testemunha L… – funcionário do Réu – (…) - desde a sua constituição em agosto de 2014 até à atualidade, tendo sido funcionário do C… desde 2008 até 2014, indagado quanto à possibilidade da retransmissão das Obrigações B… para o C… ser informada aos clientes, disse que à data ninguém pensaria que acontecesse o que aconteceu. A testemunha PJC – funcionário do Réu – (…) - desde a sua constituição em agosto de 2014 até à atualidade, tendo sido funcionário do C… desde 1991 até 2014, indagado quanto à possibilidade da retransmissão das Obrigações B… para o C… ser informada aos clientes, disse que o B… não imaginava que as obrigações fossem retransmitidas para o C…; o B… não imaginava que o Banco de Portugal determinasse a retransmissão das Obrigações para o C…. Com efeito, os depoimentos das testemunhas, por si sós e desacompanhados designadamente de quaisquer elementos contabilísticos reveladores da saúde financeira do B… emitidos pelo Banco de Portugal, não nos permite afirmar que a Direção do B… não tivesse qualquer previsão em 15/07/2015 (data da aquisição das Obrigações pelo Autor) sobre a possibilidade de retransmissão das Obrigações B… para o C… determinada pelo Banco de Portugal. Acresce que, ainda que se desse como provado este facto, o mesmo seria irrelevante para a decisão da causa, porquanto, ainda que o Réu B… considerasse a probabilidade de retransmissão como muito remota na data da aquisição das Obrigações pelo Autor (15/07/2015), tal não afastaria o dever de o Réu comunicar ao Autor da existência dessa possibilidade ou risco prevista nas deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014. 
Por último, refira-se que este facto não provado – al. c) - não está em contradição com o facto provado nº 14 quando menciona «sem qualquer indicação ou aviso prévios», porquanto esta falta de indicação ou aviso prévios do Banco de Portugal quanto à decisão de retransmissão das Obrigações respeita à falta de conhecimento público e dos clientes prévio quanto à tomada desta decisão em 29/12/2015 e não do B…. Ou seja, o facto de o Banco de Portugal não ter dado qualquer indicação ou aviso prévios no sentido de ir tomar a decisão de 29/12/2015, não está em contradição com o facto não provado segundo o qual nada fizesse prever para o Réu B…, à data da aquisição das Obrigações pelo Autor – 15/07/2015, que as mesmas viessem a ser retransmitidas ao C… por decisão do Banco de Portugal, pois os factos têm âmbitos e conteúdos distintos. Ademais, como acima se disse, o cerne da questão não é aferir da previsibilidade da parte do B… quanto à retransmissão das Obrigações para o C… determinada pelo Banco de Portugal, mas sim saber se o B… omitiu o dever de informar o Autor sobre a possibilidade das Obrigações em causa serem retransmitidas para o C… por determinação do Banco de Portugal prevista no anexo 2 das deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014, ainda que considerasse tal possibilidade remota”. 
IV. Apreciação
Questão 0 (ou prévia):
Nos termos do artigo 651º nº 2 do CPC, considerando-se que o documento junto pela recorrente após a interposição do recurso assume apenas o valor de um parecer jurídico, delibera-se admitir a sua junção aos autos.
De notar, todavia, que o mesmo responde a uma consulta feita pela Ré para casos idênticos ao presente, fornecendo a Ré nessa consulta a sua versão dos factos que não necessariamente corresponderá à realidade.
1ª Questão: - Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1ª Instância.
- Pretende a recorrente que a redacção do número 18 dos factos provados seja alterada para “E apresentou-lhe, entre outras possibilidades de investimento, a compra de obrigações com a designação comercial B…2017 e com o código (…), as quais descreveu como seguras e com boa rentabilidade”;
- Pretende a recorrente que a redacção do facto provado sob o número 25 seja alterada para “Em face da informação prestada e das respostas aos esclarecimentos pedidos, o A. deu, no dia 15 de Julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B…2017, melhor identificadas no facto provado n.º 18, no valor global de 196.750,00€”;
- Pretende a recorrente que a redacção do facto provado nº 22 seja alterada para “O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R.”;
- Pretende a recorrente que os factos provados sob os números 23 e 24 passem a não provados;
- Pretende a recorrente que o facto não provado sob a al. c) passe a provado;
- Pretende a recorrente que se adite um facto provado com o seguinte teor: “Desde Setembro de 2015 até à data da decisão de retransmissão para o C…, o R. realizou diversas operações de recompra de obrigações, as quais, em consequência daquela retransmissão, acarretaram prejuízos superiores a € 150.000.000 (cento e cinquenta milhões de euros), os quais se encontram reclamados no processo de liquidação do C…”.
A propósito deste último, diga-se que, ouvida a audiência e lida a transcrição integral, resulta que nas alegações finais, o i. mandatário da Ré de facto referiu comprometer-se a entregar a documentação relativa ao reconhecimento dos créditos do B… na insolvência do C… Nesta sequência, a Ré requereu, após o encerramento da audiência, a fls. 153 e seguintes dos autos, a junção de um documento que “comprova o reconhecimento, no âmbito da liquidação do C…, do crédito reclamado pelo Réu, decorrente da retransmissão ao C…, em 29 de Dezembro de 2015, dos passivos decorrentes de obrigações sénior que o Réu havia adquirido em Setembro e Outubro de 2015 (…)”. O tribunal de 1ª instância, na conclusão que lhe foi aberta para sentença, começou por se pronunciar sobre este requerimento, alinhando que a Ré não tinha requerido essa junção em alegações e que por isso o tribunal não se tinha pronunciado sobre ela, e considerando o encerramento da audiência, indeferiu a junção do documento.
Deste despacho não foi interposto recurso, nem a sua matéria vem impugnada no presente recurso.
Mostram-se cumpridos os ónus de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, previstos no artigo 640º do CPC. Este tribunal procedeu à audição integral e de resto, atentas as perturbações sonoras quase constantes, como de alguém que fala demasiadamente próximo dum microfone, sobretudo nas vídeo-inquirições, este tribunal procedeu também à leitura integral da transcrição da audiência de julgamento fornecida pelo recorrido.
Apreciando então:
Um primeiro bloco de factos a apreciar tem relação com a “conversa” que P… e (ou eventualmente e/ou) E… tiveram com o A.
Assim, pretende-se saber se:
- o facto provado 18 deve passar da redacção “E (P…, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 17) sugeriu-lhe a compra de obrigações com a designação comercial B…2017 e com o código (…), por se tratar, segundo afirmou, de uma excelente oportunidade de investimento seguro e com boa rentabilidade” para “E apresentou-lhe, entre outras possibilidades de investimento, a compra de obrigações com a designação comercial B…2017 e com o código (…), as quais descreveu como seguras e com boa rentabilidade”;
- se se deve alterar a redacção do facto provado “22. O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R. e que esta emissão não poderia deixar de ser paga (art.ºs 63º e 64.º da p.i.)” para “O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R.”;
- se os factos provados 23 e 24 devem ser dados como não provados;
- se deve alterar a redacção do facto 25 “Em face da informação prestada, das respostas aos esclarecimentos pedidos, e da recomendação de aquisição feita pelo gestor de conta, o A. deu, no dia 15 de julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B… 2017, melhor identificadas no facto provado nº 18, no valor global de 196.750,00€. (artº 68º da p.i.)” para “Em face da informação prestada e das respostas aos esclarecimentos pedidos, o A. deu, no dia 15 de Julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B…2017, melhor identificadas no facto provado n.º 18, no valor global de 196.750,00€”;
Nesta matéria, temos P…, gestor de private banking, ao tempo dos factos, de Trás-os-Montes, sendo que o Autor pertencia, ainda no quadro do C…, a equipa de private banking do Porto, equipa que “saiu em massa” para o BX…, ou seja, temos P…, a partir de 2014, Agosto, a conhecer o A. e a ser seu gestor de private banking. Enquanto gestor de private banking P… fazia o “trabalho normal de apresentação de propostas, de condições, dentro daquilo que enquadrava no perfil do cliente”, perfil este que no caso do A. era conservador ou muito conservador (“sendo que todas as propostas apresentadas por mim se enquadravam um bocadinho dentro deste perfil”). A apresentação, aos clientes, (a este tipo de clientes) de obrigações seniores era recorrente. P… apresentou as obrigações B… ao Autor. P… fez esta apresentação (como todas as demais a clientes private) nas instalações do cliente, visitando o cliente (não sendo, pois, o cliente a deslocar-se ao balcão) e não se lembra se fez a visita para apresentação destas obrigações a este cliente sozinho ou acompanhado pela colega E…, aliás, tem impressão que estava sozinho. Apresentou o produto como obrigações do B…, “obrigações de dívida sénior do B…. O B… era uma entidade que tinha sido resolvida, que tinha ficado com parte dos activos (…) daquilo que era o C…, e que tinham passado a transitar para o B… (…) Aquelas obrigações eram do B…, era o B… que iria ter que as pagar, e era um banco que estava com todos os problema daquilo que era de conhecimento público denunciados, resolvidos, tratados, e nada escondido…e, portanto, teria toda a capacidade para continuar a laborar de forma … até mais normal do que a restante banca. P… confirma ainda que uma vez que o risco de uma obrigação é o risco do balanço do emitente, ao dizer que o B…, por estar com todos os problemas resolvidos e tendo até (e/ou por isso) mais capacidade que a restante banca para continuar a laborar, reforçou a segurança do produto ao A. Aliás, e quanto a segurança, e a reforçá-la, era até o Jornal de … de Maio de 2015 que recomendava a compra de obrigações seniores do B…. O (banco) S… também recomendava.
Por aqui acaba a lembrança directa e concreta da reunião: perguntado se explicou que as obrigações tinham sido originariamente emitidas pelo C…, não se recordava, nem se isso tinha sido conversado.
Perguntado sobre se o A. pôs dúvidas ou pediu esclarecimentos para ficar claro que B… e C… era distintos, Pedro Morais evidentemente não se lembra, tentando recordar-se (depois de ler o “Auto”), adiante que “aquilo que eu (…) pode ter acontecido muito provavelmente” é que desde Agosto de 2014 a 2019, o B… era o morto que todos tentavam enterrar ainda com sinais de vida, a comunicação falava mal do B…, e que por isso esse tipo de perguntas sobre C… e B…, surgiam em todas as reuniões e “nós respondíamos, em consciência e porque era a informação que nos era prestada (pela hierarquia superior), que o assunto C… era coisa do passado, estava resolvido, nós éramos um banco novo, com um accionista com capacidade para passar por todas as adversidades. Mais adiante e se necessário abordaremos recordações provocadas pelo resto da instância e da contra-instância.
Já E…, financeira, que trabalhava num departamento que superiormente orientava os gestores de private banking, apesar das dificuldades sonoras da gravação, afirma que visitou o cliente umas poucas vezes, nunca sozinha, sempre acompanhando o gestor de private, excepto numa vez que acompanhou o director comercial, e tendo por memória a prática habitual destas visitas e os temas geral ou normalmente abordados, afiança que nunca visitavam só para apresentar um produto, mas várias possibilidades de investimento, sem que todavia se lembre em concreto da conversa.
Nada de surpreendente nem de minimamente censurável ou que deva levar a qualquer cautela apreciativa a falha de memória minuciosa e detalhada das duas testemunhas: - apesar do cliente “private” ter maior capacidade económica e financeira que explica um atendimento privado, uma atenção maior, há muitos clientes “private” e muitas reuniões, sobretudo quando depois dos, ou pelo meio aos, escândalos, e à má publicidade que nos faz a concorrência e a comunicação social, é muito aconselhável “ir para a rua” captar/conservar clientes (seus fundos económicos).
Por outro lado, não descortinamos no depoimento de P…, quer na instância quer durante a contra-instância, apesar de alguma falha de entendimento do alcance das perguntas feitas, qualquer conflito de interesses nem simples animosidade contra a Ré: a testemunha, como possivelmente muitos outros funcionários, têm a tendência de achar que nas acções que clientes interpuseram contra bancos se discute a sua responsabilidade pessoal pela prestação de falsas informações, dizendo assim de modo lato, e, sentindo-se injustiçados e incompreendidos, têm portanto uma muito natural reacção defensiva às perguntas que lhes são feitas e procuram estabelecer em tribunal e perante o juiz a sua inocência pessoal. Mas, nem assim, isto significa ou revela um tal desgosto, uma tal ofensa, que faça com que um funcionário de longos anos duma determinada instituição bancária venha agora depor contra ela, como vingança porque a administração dela é que foi responsável pela omissão de informações, inclusivamente a ele mesmo, funcionário, que o fizeram “mal” servir os clientes e que o fazem passar pelo vexame de ser indicado como testemunha e de se poder suspeitar duma sua culpa maior. Não o revela no caso concreto, ainda que possamos perceber das expressões “quando li o Auto eu …. e quando me faz essa pergunta eu fico…” esse agastamento para com uma instituição em que a hierarquia mandava ir para a rua conquistar clientes com o discurso preparado do assunto C… estar resolvido e do B… nada ter a ver com isso e ser um banco muito seguro, quando afinal o dinheiro dos clientes foi … . Ora, foi ou terá sido canalizado pelo Banco de Portugal para o C… por má situação financeira do B…, e aqui sim pode à testemunha servir-se a pergunta sobre o conhecimento dessa má situação por parte da administração e se assim para a administração não era claro que o Banco de Portugal ia fazer o que fez e se assim sendo claro se a administração não devia ter dito aos funcionários para, nos contactos com os clientes, os esclarecerem que havia a hipótese do Banco de Portugal fazer o que fez. Mas o que a testemunha possa dizer sobre isto é evidentemente ao arrasto da pergunta segundo a sensibilidade média e não revela, nem o seu depoimento revela, qualquer qualidade especial de acesso à informação sobre o que se passava na administração do B….
Portanto, tirando este arrasto, o que fica do depoimento da testemunha P… de modo algum revela que esteja a falsear o seu depoimento. Não será isto: - será que ao já não ser funcionário do B…, ao ser da “concorrência”, ao querer, como concorrência, manter o cliente Autor agora subtraído ao B…, então mente, ou insinua caminhos que levam à mentira. A recorrente não chega a este ponto, e não chega porque manifestamente nada no depoimento da testemunha lhe permitiria apontar para este cenário.
Primeiro, o gestor em causa não levou o cliente por ocasião da sua saída do B…, ou pelo menos a Ré não o demonstrou, não havendo razão para duvidar das explicações que deu para que este cliente, que já conhecia do B…, fosse “gerido” noutro banco (no novo banco para o qual a testemunha passou a trabalhar) por outro colega seu, e que só depois (da testemunha já ter começado a trabalhar) é que tenha sido atribuído à testemunha. Segundo, convenhamos, que se o ponto onde se pode encontrar a menor isenção da testemunha está na questão da sugestão ou recomendação de compra de obrigações pelo Autor ou na ocultação de que se tratou de mera execução de ordens ou de uma apresentação de diversos produtos, tudo isso já convoca um nível de conhecimento das implicações jurídicas que não é de todo de fácil acesso à testemunha, não se lhe reconhecendo uma tal capacidade de perversão.
Estabelecidas estas notas gerais sobre os depoimentos das testemunhas presenciais da negociação, prossigamos.
Vejamos então o facto provado nº 18:
Nas diferenças entre a versão dada como provada pelo tribunal e a pretendida pela recorrente trata-se de saber se P…, em vez de sugerir a compra das mencionadas obrigações, as apresentou como uma possibilidade de investimento, se além dessas obrigações apresentou outras possibilidades de investimento, e se disse que as obrigações eram seguras e com boa rentabilidade ao invés de dizer que era uma excelente oportunidade de investimento seguro e com boa rentabilidade.
P… não se referiu à apresentação simultânea de vários produtos e não há dúvida que P… foi o responsável pela operação: E… nunca se apresentou sozinha ao Autor para com ele negociar, nunca foi ela quem negociou/operou/intermediou, a sua função era acompanhar superiormente. Portanto, podemos dizer, com E…, que nunca apresentavam um único produto, e que P… terá então apresentado ao Autor diversos produtos, que ela não concretiza, numa conversa concreta de que não se lembra? É que até admitimos que E… tenha ido com P… porque é o próprio Autor que o diz, mas o Autor não diz que também lhe apresentaram diversos produtos. Ou seja, temos o silêncio de P… sobre isso e a referência abstracta de E… reportada a um episódio do qual concretamente não tem memória.
Não temos, com o devido respeito, prova de que foram apresentadas ao Autor, simultaneamente com a apresentação das obrigações em causa, outras possibilidades de investimento. Nem podemos sequer dizer que a menção, em contra-alegações de que “Se é verdade que eram apresentados vários produtos alternativos ao A. (…)” corresponde a “foram apresentados, na mesma ocasião que foram apresentadas as obrigações seniores, outros produtos”.
P… sugeriu ou apresentou? A testemunha fala sempre em apresentação, nunca emprega a palavra sugestão, que procede da petição inicial e é levada ao rol do “provado” pelo tribunal recorrido.
Ainda que o tribunal não explique exactamente porquê, o encadeamento é evidente e busca-se na própria petição inicial – O A. era cliente private de Guimarães, era igualmente titular de uma carteira de títulos que geria directamente com indicações e sugestões do seu gestor de conta, e foi nesta senda que o gestor o visitou e lhe sugeriu para investimento a obrigação X, que recomendou como oportunidade excelente de investimento seguro e com boa rentabilidade e tão mais seguro quanto ele em si é de baixo risco, o risco era apenas o que fosse imputável ao próprio B…, e que não se confundia de modo algum com o do C…, que era coisa do passado. Portanto, aqui o que temos é um cliente private, de Guimarães, reconhecidamente (E…, L… e J…, este actual gestor privado) detentor de meios económicos e monetários bastante relevantes, que naturalmente tem de ser visitado pelo seu gestor de private banking, sendo que a importância do cliente até leva o gestor a ir acompanhado pela sua superior hierárquica, tanto mais que a fase do Banco pede e a administração manda (os funcionários, estes em particular, que lidam com clientes importantes) irem para a rua captar recursos (que por certo não se confundem, antes se associam ou aditam, a uma irrisória comissão de intermediação).
Conjugando o interesse do banco, o interesse do seu funcionário, a importância do cliente, não havendo prova de terem sido apresentadas outras possibilidades de investimento, parece então claro que P… tenta o seu melhor e que por isso qualquer apresentação por um gestor de private banking acaba a ser uma sugestão ao cliente, tanto que sendo homem agressivo e assertivo nos negócios (E…) não era homem tão sabedor assim (P…) e tanto que até teve interiormente de assumir a sua ignorância ao contratar depois o aconselhamento duma empresa especializada (J…). Portanto, P… sugeriu, não há erro notório do tribunal recorrido em ter dado esta versão como provada.
P… afirmou tratar-se duma excelente oportunidade de investimento seguro e com boa rentabilidade? Ele não o disse, não disse em tribunal que tinha afirmado ao A. que era uma excelente oportunidade, mas asseverou claramente que era, mesmo para si, segundo a sua convicção, um investimento muito seguro (até porque o B… tinha como acionista o Fundo de Resolução). Se para a questão anterior – sugestão – é o enquadramento da operacionalização de papéis dos intervenientes que nos leva a aceitar a sugestão, já não conseguimos chegar, mesmo a pensar em P… como um excelente e aguerrido gestor, a que tenha naturalmente usado essa expressão (até porque não se conhecendo o Autor, também não se pode pensar que esse tipo de expressão fosse a chave da decisão ou o estilo de linguagem mais apreciado).
Em suma, e quanto ao facto provado 18, procede parcialmente a impugnação, alterando-se a redacção para “E sugeriu-lhe a compra de obrigações com a designação comercial BANCO…2017 e com o código (…), por se tratar, segundo afirmou, de um investimento seguro e com boa rentabilidade.
Prosseguindo.
Quanto à alteração de “22. O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R. e que esta emissão não poderia deixar de ser paga (art.ºs 63º e 64.º da p.i.)” para “O gestor de conta disse ao Autor que a entidade responsável pelo seu pagamento era exclusivamente o B…-R.”, está apenas em causa saber se P… disse ao Autor que a emissão das obrigações adquiridas não podia deixar de ser paga, havendo acordo em que o pagador seria o B…, ou melhor, em que o pagador, a entidade responsável à data da aquisição pelo Autor, era o B…. Quando P… afirma que a tese oficial e na realidade aquela em que ele próprio acreditava, pois que nem sequer conhecia a deliberação de transmissibilidade, era a de que o B… era o banco até mais seguro que se encontrava a operar, que tinha por trás o Fundo de Resolução, que aguentaria as complicações, e que tudo o que era mau tinha ficado para trás, quando P… assevera que assim reforçou ao Autor a segurança do produto, quando o produto em si (obrigação) é do mais seguro e quando o único risco é da insolvência do próprio emitente/pagador responsável, então tudo se conjuga para dizer que com toda a normalidade P… disse ao Autor, que estava preocupado com a separação de águas entre C… e B…, na sua ignorância de deliberação de transmissibilidade, que as obrigações não poderiam deixar de ser pagas – digamos assim, eram do mais seguro possível.
Não se evidencia, no facto da testemunha não ter reproduzido literalmente a expressão usada no facto provado, que tenha havido erro de apreciação da prova pelo tribunal recorrido, indeferindo-se, pois, a impugnação da decisão sobre o facto provado 22.
Relativamente a saber se perante a informação prestada por P… ao Autor constante dos factos provados 18 a 22, ainda assim “23. O A. reiterou as suas preocupações com o eventual “contágio” de (ir)responsabilidade do C… sobre a emissão em causa, (art.º 65º da p.i.)” e então, na mesma reunião e em sequência “24. Tendo sido reiteradamente sossegado sobre o seu investimento e afiançada a impossibilidade dessa sua preocupação se concretizar. (art.º 66º da p.i.)”, a tese da recorrente é a de que a testemunha P… o não disse, e o tribunal, na motivação, quando resume e bem o depoimento de P…, também não o refere. Ora, se é verdade que P… e E… falam da normalidade destas conversas, da resposta pronta e já estudada de remeter o C… ao passado e de tornar firme a ideia de independência do B… relativamente ao C…, já daqui não decorre que a normalidade – contrariamente ao que se refere nas contra-alegações – passasse por duplas e sucessivas insistências dos clientes e igual número de esclarecimentos pelos funcionários (até porque, para gente tão desconfiada, o melhor mesmo seria nem se “meterem” mais com nada que tivesse qualquer relação por mais remota que fosse com o C…, como era manifestamente o caso do B…, isto é, quem se “metia” com o B… não precisava de ser assim tão desconfiado e de fazer sucessivas insistências) e portanto para o “reforço” que os factos provados 23 e 24 representam relativamente ao que é afirmado em 19 a 22, já não temos base de sustentação.
Procede assim a impugnação, nesta parte, eliminando-se os factos provados 23 e 24 do rol dos provados e remetendo-se os mesmos ao rol dos não provados.
Relativamente ao facto provado 25 - “Em face da informação prestada, das respostas aos esclarecimentos pedidos, e da recomendação de aquisição feita pelo gestor de conta, o A. deu, no dia 15 de julho de 2015, ordem de compra de 2 Obrigações designadas B 2017, melhor identificadas no facto provado nº 18, no valor global de 196.750,00€. (artº 68º da p.i.)”, a dissensão da recorrente visa apenas o segmento “e da recomendação de aquisição feita pelo gestor de conta”, no seguimento coerente do que seria uma apresentação de um mostruário de diversas possibilidades de investimento sem sugestões, o que não acolhemos, e de que também no depoimento de P… não encontramos menção a recomendação. No mesmo sentido em que resolvemos a expressão “sugeriu” no facto provado 18, assim vamos aqui resolver. Não se trata do sentido técnico jurídico nem do enquadramento jurídico da actividade do gestor, mas do sentido vulgar e prático que se obtém pela lógica de, não estando provado que foram apresentadas outras possibilidades, e em todo o caso perante um gestor de conta que visita um cliente especial, se chegar a um estado de normalidade segundo a experiência das coisas de que “se não recomendasse nem sequer apresentava”. Portanto, mantemos a versão decidida pelo tribunal recorrido, improcedendo esta pretensão de alteração.
- Pretende a recorrente que o facto não provado sob a al. c), do qual consta “Que nada fizesse prever para o Réu B…, à data da aquisição das Obrigações pelo Autor, que as mesmas viessem a ser retransmitidas ao C… por decisão do Banco de Portugal. (art.º 15º da contestação)”, passe a provado, por assim resultar não só das afirmações das testemunhas L… e PF… mas também E… e por se dever dar relevância ao documento nº 1 com a contestação, a saber, notícia de imprensa sobre a recomendação de aposta na dívida do B… pelo (banco) S…
Já para o tribunal de primeira instância o facto é irrelevante porque mesmo que fosse muito improvável a retransmissão isso não afastaria o dever de informar dessa possibilidade e porque os depoimentos das testemunhas L… e PF… “por si sós e desacompanhados designadamente de quaisquer elementos contabilísticos reveladores da saúde financeira do B… emitidos pelo Banco de Portugal, não nos permite afirmar que a Direção do B… não tivesse qualquer previsão em 15/07/2015 (data da aquisição das Obrigações pelo Autor) sobre a possibilidade de retransmissão das Obrigações B… para o C… determinada pelo Banco de Portugal”.
Diga-se que, fazendo parte da defesa da Ré o argumento de que não tinha de informar da possibilidade de retransmissão constante da deliberação do Banco de Portugal porque era imprevisível que essa retransmissão viesse a ocorrer, esta imprevisibilidade apresenta-se como facto (ou como conclusão a extrair de factos) pertinente à defesa, e não podemos decidi-lo em sede de matéria de facto porque entendemos antecipadamente que em sede jurídica a imprevisibilidade não afasta o dever de informar sobre a possibilidade.
Diga-se depois que considerando o documento nº 1 junto com a contestação, notícia/comentário sobre a recomendação de compra de dívida B… pelo Banco S…, não deixa de ser público e notório que o Banco S… era interessado, já em 2014 pelas notícias da imprensa da época, na compra do B…, o que não deixa segura a isenção da recomendação.
Por outro lado, é verdade que os funcionários bancários que foram ouvidos nos autos como testemunhas, incluída E… como nota a recorrente, depuseram no sentido da imprevisibilidade, mas, com o devido respeito, deram relato apenas do que fazia para eles sentido: - sim, mandavam-nos para a rua captar recursos, o que era importante era andar para a frente, o assunto do C… tinha sido resolvido, devidamente escrutinado e investigado e alvo de medidas pelo Banco de Portugal, o perímetro estava definido desde 2014 e não tinha voltado a ser mexido, há já um ano, o acionista era o Fundo de Resolução, o risco que o B… corria era o de não encontrar comprador, mas a sua saúde financeira era das mais garantidas, donde a retransmissão não era previsível.
Simplesmente, funcionários bancários, por altos que sejam os cargos, são funcionários, e o facto pretendido dar como provado não fala em funcionários, mas sim em B…: - para o B…, nada fazia prever a retransmissão das obrigações em causa. Ora, o B… aqui, no contexto deste facto e para as finalidades do facto – prova de que a informação sobre a retransmissão não era devida porque era altamente improvável que acontecesse, prova que onera a Ré nos termos do artigo 342º nº 2 do Código Civil – e estabelecido em julgamento que os funcionários de facto não conheciam até a possibilidade de retransmissão constante da deliberação do Banco de Portugal, é a Administração do B….
Sobre o conhecimento que a administração do B… teve especificamente sobre retransmissão de obrigações seniores, sabemos apenas pela testemunha PF… que foi pedida uma autorização para a recompra de obrigações pelo B… que terá sido dada pelo BdP e se terá iniciado em Setembro de 2015, o que se tornaria muito pouco compatível com a ideia da própria previsibilidade da retransmissão destas obrigações bem como duma comunicação próxima, intensa, transparente e esclarecedora entre o Banco de Portugal e a Administração do B… (salvo o caso da retransmissão das obrigações só ter sido decidida e pensada pelo Banco de Portugal após esta data). Simplesmente, não temos prova documental específica sobre esse processo de autorização de recompra, que nos permita o acesso a dados emitidos, a informações prestadas, pelo Banco de Portugal, em sentido completamente contrário à sua actuação meses mais tarde, de modo a tornar esta de todo imprevisível.
Entendemos, pois, que a Ré não fez a prova necessária e que improcede a pretensão de aditamento da matéria constante da alínea c) dos factos não provados.
Pretende finalmente a recorrente que se adite como provado que “Desde Setembro de 2015 até à data da decisão de retransmissão para o C…, o R. realizou diversas operações de recompra de obrigações, as quais, em consequência daquela retransmissão, acarretaram prejuízos superiores a € 150.000.000 (cento e cinquenta milhões de euros), os quais se encontram reclamados no processo de liquidação do C…”.
Conforme já tínhamos dado nota, o trânsito sobre a não admissão do documento relativo ao reconhecimento do crédito reclamado pelo B… na liquidação do C…, impede dar-se como provada a parte final da pretensão. Mas podemos ainda dizer que desde Setembro de 2015 até Dezembro de 2015, o B… realizou diversas operações de recompra que, por causa da retransmissão, acarretaram prejuízos superiores a cento e cinquenta milhões de euros?
A recorrente apela aos depoimentos testemunhais – e na verdade E… e PF… abordam a questão – e aos documentos nº 2 e 3 com a contestação, sendo o primeiro uma declaração do próprio B… sobre os valores mobiliários registados em seu nome na sua própria carteira, declaração na qual se lê uma referência às Obrigações B…, e o segundo a reclamação de créditos no processo de insolvência, onde se afirma a titularidade de 1298 obrigações C… a sustentar o crédito de €129.800.000,00. Destes dois documentos não resultam a data de recompra, PF… aliás refere que algumas das obrigações já existiam em carteira anteriormente a Setembro de 2015. E… não esclarece com rigor a questão das datas de recompra, nem assegura que as obrigações recompradas hajam sido transmitidas para o C… e PF… já o faz, aludindo à execução ao longo de Setembro de 2015 e meses seguintes, de uma autorização aliás pedida ao Banco de Portugal. Ora aqui de facto, sem por em causa o depoimento de PF…, tal como para a pretensão de dar como provada a alínea c) dos factos não provados, para termos uma ideia exacta de quais os valores de prejuízo e de quando em concreto foi autorizada a recompra e em que termos, o tribunal sentir-se-ia mais seguro se a referida autorização e o seu planeamento tivessem sido juntos aos autos.
Deste modo, não se adita o facto pretendido.
2ª Questão: - Da prescrição.
É pacífico que a Ré não invocou a prescrição na sua contestação. Invoca-a agora em recurso, nos termos do artigo 324º n º2 do CVM, pois que “JJ. Resultou da prova produzida em julgamento que o Recorrido discutiu essa matéria com a testemunha P…, desde logo, no próprio dia 29 de Dezembro de 2015, além de se tratar de matéria que foi tornada pública em 13 de Janeiro de 2016, e de serem factos notórios mesmo em 29 de Dezembro de 2015, data em que os reguladores BdP e CMVM difundiram um comunicado do Recorrente sobre o tema; KK. Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 324.º, n.º 2, do CVM, o direito alegado nestes autos já se encontrava prescrito desde, pelo menos, 14 de Janeiro de 2018, ou seja, há mais de três meses quando a Petição Inicial foi apresentada”. Acresce que “nunca se podia considerar que, em termos de diligência, a actuação do Recorrente correspondeu a uma negligência grosseira, muito menos a uma situação de dolo”. 
Relembre-se que “essa matéria” se refere à alegação do artigo 70º da petição inicial, no qual o Autor alegou que “(…) veio a tomar conhecimento, por ocasião da previsível data de vencimento das Obrigações, que estas haviam sido retransmitidas ao C…, e que não seriam reembolsáveis”.
O Recorrido opõe-se, sustentando a actuação dolosa da Recorrente, mas desde logo por extemporaneidade, em função do princípio da concentração da defesa na contestação – artigo 573º do CPC – e da não superveniência factual – “Por outro lado, dispõe o art.º 588º nº 2 do mesmo diploma que “dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência”, relativamente ao conhecimento dos factos pela própria Ré.
Está fora de dúvida o princípio da concentração da defesa na contestação, cujas excepções se preveêm no artigo 573º nº 2 do CPC, a saber “as exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente”. A prescrição, enquanto sanção legal do desinteresse do titular do direito que concomitantemente alimenta a confiança no não exercício do mesmo pela contraparte, constitui excepção peremptória, que importa na absolvição do pedido – artigo 576º nº 3 do CPC – sendo que o tribunal conhece oficiosamente das excepções peremptórias cuja invocação a lei não torne dependente da vontade do interessado – artigo 579º do CPC.
Ora, o Código Civil, no seu artigo 303º, estabelece a necessidade da invocação da prescrição pelo interessado, vedando, de resto expressamente, o conhecimento oficioso da mesma pelo tribunal. Por outro lado, a prescrição apresentando-se como uma contagem de tempo a partir do momento em que o direito pode ser exercido, para ser admitido a ser exercido pelo seu titular, a lei marca momentos quer de suspensão quer sobretudo e para o caso que nos interessa, de interrupção (e inutilização do tempo decorrido) da contagem do tempo, e concretamente, dispõe o artigo 323º nº 1 do Código Civil, que a prescrição se interrompe pela citação.
Citado aquele contra quem o direito se pretende exercer, inutiliza-se o tempo já decorrido – artigo 326º nº 1 do Código Civil – e só começa a correr novo prazo (parte final do mesmo preceito e número) após o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo – artigo 327º nº 1 do Código Civil.
Como a prescrição não é, como vimos, de conhecimento oficioso, a admissibilidade da sua invocação após a contestação, e mais em concreto já só na fase de recurso, enquanto excepção prevista no nº 2 do artigo 573º do CPC, só poderia legalmente fundar-se na ocorrência anterior à citação e na superveniência do seu conhecimento pelo interessado, sendo, aliás, esses mesmos os termos em que vem invocada: - já tinha ocorrido há mais de três meses antes da interposição da acção.
Simplesmente, a fórmula apresentada desta superveniência (do conhecimento pela Ré e Recorrente da data do conhecimento pelo Autor e Recorrido da informação que alegou ter-lhe sido omitida, e portanto da data a partir da qual poderia exercer o seu direito de indemnização pelos prejuízos resultantes da informação omitida) trai-se a si mesma: - é que é indiferente que o conhecimento da matéria pelo Autor tenha resultado do depoimento de uma testemunha, se “além de se tratar de matéria que foi tornada pública em 13 de Janeiro de 2016, e de serem factos notórios mesmo em 29 de Dezembro de 2015, data em que os reguladores BdP e CMVM difundiram um comunicado do Recorrente sobre o tema”. É que se se trata de matéria pública e de factos notórios, de que o Autor podia e teria, segundo o padrão do homem comum, obrigação de conhecer, então a Ré podia perfeitamente ter concebido, a partir dessa natureza e característica dos factos, o tempo pelo qual o A. se demorou a exercer o seu direito, e tendo esse tempo ultrapassado o prazo de prescrição ainda antes da interposição da acção, já a Ré tinha conhecimento, à data da contestação, disso mesmo, donde a superveniência de conhecimento que justificaria a invocação da prescrição em recurso não se verifica.
Em suma, não só a Recorrente não fez prova do seu conhecimento superveniente da prescrição, como lhe impunha a parte final do artigo 588º nº 2 do CPC, como não a poderia fazer, por ser manifestamente contraditória com a invocação que fez, como a superveniência em função do teor dum depoimento testemunhal, enquanto condição de admissibilidade, apenas seria admissível se se reportasse a um facto da esfera privada do conhecimento do Recorrido.
Não é assim admissível a invocação da prescrição, dela não se conhecendo.
Note-se aliás, que se seguisse o parecer que a Recorrente junta, nele se afirma e defende que a contagem do prazo se realiza a partir da execução do negócio, o que mais cedo ainda completaria a prescrição, e o que por isso mais cedo (do que a apresentação da contestação) deveria ter determinado a Ré a invoca-la nesta.
3ª Questão:
Entrando em matéria de direito, recorde-se que a sentença recorrida considerou:
“Definido o conceito de Obrigações, importa atentar, de seguida, no modo ou na forma como é feita a venda deste tipo de produto e ter em consideração o regime consagrado no Código dos Valores Mobiliários.
Atente-se no disposto no Código dos Valores Mobiliários (aprovado pelo Dec.-Lei nº 486/99, de 13 de novembro), que regula a atividade da intermediação financeira. Ou seja, o quadro normativo inserido no Código dos Valores Mobiliários (CVM) constitui a linha orientadora para definir as obrigações que impendiam sobre a instituição bancária que promoveu a venda do produto financeiro/valor mobiliário em causa.  Prevê o art.º 7.º, nºs 1 e 2, do CVM, sob a epígrafe «Qualidade da informação»: «1 - A informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita. 2 - O disposto no número anterior aplica-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco».  A norma em apreço integra um princípio geral, aplicável a todas as espécies de produtos financeiros, e estabelece um grau elevado de exigência que é imposto quanto à completude, veracidade, clareza e objetividade da informação que deve ser prestada, uma vez que, sem estes elementos, não pode considerar-se que um investidor – ou potencial investidor – está devidamente esclarecido quanto às características de determinado produto financeiro.
No âmbito das disposições que regem a atividade de intermediação financeira – área onde o Banco-réu atuou -, o legislador foi ainda mais longe.
Estabelece o art.º 304.º do CVM, sob a epígrafe «Princípios»: «1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado. 2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.  3 - Na medida do necessário para o cumprimento dos seus deveres na prestação do serviço, o intermediário financeiro deve informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objetivos de investimento do cliente. 4 - Os intermediários financeiros estão sujeitos ao dever de segredo profissional nos termos previstos para o segredo bancário, sem prejuízo das exceções previstas na lei, nomeadamente o cumprimento do disposto no artigo 382.º  5 - Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração e às pessoas que dirigem efetivamente a atividade do intermediário financeiro ou do agente vinculado e aos colaboradores do intermediário financeiro, do agente vinculado ou de entidades subcontratadas, envolvidos no exercício ou fiscalização de atividades de intermediação financeira ou de funções operacionais que sejam essenciais à prestação de serviços de forma contínua e em condições de qualidade e eficiência».
Por seu turno, prevê o art.º 304.º-A do CVM, sob a epígrafe «Responsabilidade civil»: «1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública.  2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação».
Prescreve o art.º 312.º do CVM, com a epígrafe «Deveres de informação»: «1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada nos termos previstos em regulamentação e atos delegados da Diretiva 2014/65/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, incluindo nomeadamente as respeitantes: a) Ao intermediário financeiro e aos serviços por si prestados; b) À natureza de investidor não profissional, investidor profissional ou contraparte elegível do cliente, ao seu eventual direito de requerer um tratamento diferente e a qualquer limitação ao nível do grau de proteção que tal implica;  (…) e) Aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar. (…) 2 - A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.  3 - A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral.  4 - A informação prevista no n.º 1 deve ser prestada por escrito ainda que sob forma padronizada. (…)
Prescreve o art.º 30.º do CVM sobre a epígrafe «Investidores profissionais»: «1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos 317.º e 317.º-A, consideram-se investidores profissionais as seguintes entidades: a) Instituições de crédito; b) Empresas de investimento; c) Empresas de seguros;  d) Instituições de investimento coletivo e respetivas sociedades gestoras; e) Fundos de pensões e respetivas sociedades gestoras;  f) Outras instituições financeiras autorizadas ou reguladas, designadamente entidades com objeto específico de titularização, respetivas sociedades gestoras, se aplicável, e demais sociedades financeiras previstas na lei, sociedades de capital de risco, fundos de capital de risco e respetivas sociedades gestoras;  g) Instituições financeiras de Estados que não sejam membros da União Europeia que exerçam atividades semelhantes às referidas nas alíneas anteriores; h) Entidades que negoceiem em instrumentos financeiros sobre mercadorias;  i) Governos de âmbito nacional e regional, bancos centrais e organismos públicos a nível nacional ou regional que administram a dívida pública ou que gerem fundos destinados ao financiamento de sistemas de segurança social ou de regimes de pensões de reforma ou de proteção de trabalhadores, instituições supranacionais ou internacionais, designadamente o Banco Central Europeu, o Banco Europeu de Investimento, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial;  j) Pessoas que prestem serviços de investimento, ou exerçam atividades de investimento, que consistam, exclusivamente, na negociação por conta própria nos mercados a prazo ou a contado, neste caso com a única finalidade de cobrir posições nos mercados de derivados, ou na negociação ou participação na formação de preços por conta de outros membros dos referidos mercados, e que sejam garantidas por um membro compensador que atue nos mesmos, quando a responsabilidade pela execução dos contratos celebrados for assumida por um desses membros;  k) Pessoas coletivas cuja dimensão, de acordo com as suas últimas contas individuais, satisfaça dois dos seguintes critérios:  i) Capital próprio de 2 milhões de euros;  ii) Ativo total de vinte milhões de euros; iii) Volume de negócios líquido de quarenta milhões de euros; l) Pessoas a quem tenha sido conferido esse tratamento, nos termos do artigo 317.º B».
A este propósito, vejam-se ainda os art.ºs 74.º e 77.º, nºs 1, 3 e 5, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF – aprovado pelo Dec.-Lei nº 298/92, de 31 de dezembro):  Art.º 74.º - «Os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder, tanto nas relações com os clientes como nas relações com outras instituições, com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados».  Art.º 77.º, nºs 1, 3 e 5: «1 - As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes.  3 - Para garantir a transparência e a comparabilidade dos produtos oferecidos, as informações referidas no número anterior devem ser prestadas ao cliente na fase pré-contratual e devem contemplar os elementos caracterizadores dos produtos propostos, nomeadamente incluir a respetiva taxa anual de encargos efetiva global, indicada através de exemplos que sejam representativos.  5 - Os contratos celebrados entre as instituições de crédito e os seus clientes devem conter toda a informação necessária e ser redigidos de forma clara e concisa».
Não sendo o Autor um investidor profissional, o intermediário financeiro (B…, neste caso) deveria dar cumprimento a um vasto leque de obrigações legais, cujo conteúdo resulta das normas supra citadas e transcritas, revelando-se este dever de informação mais exigente pela circunstância de ter sido o gestor de conta do Autor do B… a deslocar-se às instalações da empresa do Autor e a sugerir-lhe a compra de obrigações com a designação comercial B… - cfr. factos provados nºs 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26. No caso sub judice, verifica-se que o Réu-Banco, enquanto intermediário financeiro, não observou os deveres de informação que o legislador impôs nesta matéria, omissão que, no caso em apreço, se revela mais grave, uma vez que o produto financeiro em análise foi apresentado com uma roupagem como se tivesse origem no próprio Réu-B… e não no C… O Autor não foi informado pelo Réu quanto ao emitente que estava na origem da operação – C…, nem quanto à possibilidade de retransmissão das obrigações para o C… prevista nas Deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014 (esta última informação o Banco Réu omitiu aos próprios comerciais).
Constata-se que foram grosseiramente omitidas informações essenciais relativamente a características essenciais do produto financeiro em causa (o emitente das Obrigações C… e a possibilidade de retransmissão das Obrigações para o C… por determinação do Banco de Portugal) e foram prestadas informações erradas relativamente a características essenciais do produto financeiro em causa (a ausência de ligação das obrigações com o C…) destinadas a motivar o investidor a adquirir o produto.
O Autor pensou que estava a comprar um produto financeiro emitido pelo B…, quando se tratava de um valor mobiliário cuja fonte era o C…, sendo que tal erro e convicção só existiu porque foi o próprio Réu a provocá-lo, fazendo crer – verbalmente e através dos elementos que inseriu no documento mencionado nos factos provados nºs 10, 18, 25 e 26 - que estava em causa um produto financeiro sem qualquer ligação ao banco relativamente ao qual o Autor não tinha qualquer interesse em investir, o C…. Acresce que o Banco-Réu não informou o Autor da possibilidade de retransmissão das Obrigações para o C… prevista no Anexo 2 das Deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014, o que veio a suceder por Deliberação proferida pelo Banco de Portugal em 29 de dezembro de 2015. Constata-se que o Réu incorre em responsabilidade civil contratual, decorrente da violação de deveres de informação (…)”. (fim de citação).
Ora, para a Recorrente, inexiste “ilicitude nos termos do artigo 312.º, n.º 1, do CVM, por a informação sobre o poder de retransmissão não se encontrar coberta pelo dever de informação do Recorrente”, pois que “NN. A informação alegadamente omitida não podia, sequer, considerar-se coberta pelo núcleo essencial do dever de informação, por duas ordens de razões: (i) primeiro, porque a retransmissão não era um risco especial das obrigações em discussão nos autos, mas antes algo que se encontrava genérica e expressamente previsto no RGICSF e na própria medida de resolução; (ii) segundo, por se tratar de um serviço de mera execução de ordens, no qual a intensidade dos deveres de informação que impendem sobre os intermediários financeiros é substancialmente menor”. Na realidade, o risco em causa não afectava especificamente este passivo, mas a generalidade da actividade da Recorrente, pois podia incidir sobre qualquer activo ou passivo que lhe tivesse sido transmitido, e “QQ. Ainda que se considerasse ser um risco relevante que afectasse as obrigações em discussão nos autos, incluindo os depósitos a prazo de qualquer cliente no montante não coberto pelo Fundo de Garantia de Depósitos; RR. O que se afigura incompatível a ratio de todo o regime jurídico previsto no RGICSF, no qual se sustentou a aplicação da medida de resolução ao C…, designadamente das normas contidas nos seus artigos 145.º-C, n.º 1, alínea a) e 145.º-O, n.º 1, na sua redacção em vigor à data da emissão da ordem de aquisição;”. Finalmente, na prestação de um serviço de mera execução de ordem além disso reportado a uma compra em mercado secundário a uma contraparte não pré-determinada, “os deveres de informação devem ser ajustados em função da experiência e grau de conhecimento do cliente (artigo 321, n.º 2 do CVM) e também que o Recorrente não tinha sequer que fazer a avaliação da adequação deste instrumento ao cliente”.
O recorrido sustenta a sentença, alinhando que a possibilidade de retransmissão onerava as responsabilidades da recorrente, nelas incluídas as obrigações, constituindo um risco específico, apenas aplicável, não em função da previsão abstracta constante do RGICSF mas sim, com a verificação dos pressupostos nele previstos, em função da específica deliberação do Banco de Portugal e apenas entre o C… e o B…, portanto um risco concreto e específico, que por isso devia ter sido informado ao recorrido, “em cumprimento do disposto no art.º 312º al. e) e 312ºE do CdVM”, não variando o conjunto de deveres de informação previstos nos artigos 312º a 312º - G do mesmo diploma, conforme os diversos serviços de intermediação nem consoante a operação ocorra em mercado primário ou secundário, sendo que o que pode variar é a adequação da forma de prestação da informação com o grau de conhecimentos do investidor. O artigo “321º do CdVM aplica-se, não à informação a prestar na prestação de serviços de intermediação financeira, mas antes ao contrato de intermediação financeira propriamente dito, ao abrigo do qual, depois, são prestados todos ou alguns dos serviços elencados no art.º 290º do CdVM”, sendo que “Este contrato de intermediação é aquilo que hoje se designa consensualmente contrato-quadro ou contrato de cobertura, aplicando-se-lhe os art.ºs 321º e seguintes do CdVM. Aos específicos serviços de intermediação prestados, chamam-se, por sua vez, contratos de execução, sendo a estes aplicáveis, os art.ºs 312º a 320º do mesmo diploma”.
Assim como se joga aqui a argumentação entre recorrente e recorrido, duas questões portanto para apurar da licitude ou ilicitude da conduta do Banco réu: - perceber se o conteúdo da informação a prestar ao investidor em valores mobiliários varia em função do tipo de serviço de intermediação que é prestado e em função da operação ocorrer em mercado primário ou secundário, e, saber se a existência e teor da deliberação do Banco de Portugal que previu a possibilidade de reversão da transmissão de activos ou passivos que ele mesmo determinou, do C… para o B…, devia ter sido informada ao recorrido, enquanto risco que incidia sobre o investimento feito.
Neste resumo parece que se esgota a problemática dos autos. No entanto, não cremos que assim seja: - a sentença recorrida, nos excertos acima, e percorrido o universo normativo que expôs, na análise dos factos – cfr. redacção dos factos provados 20 e 31, não postos em causa[2] – encontrou duas origens de ilicitude. Não apenas a não informação da possibilidade de retransmissão “C – B”, mas também a informação omitida/errada sobre a emissão originária C….
Na realidade é o que consta do trecho que se repete: “(…) e foram prestadas informações erradas relativamente a características essenciais do produto financeiro em causa (a ausência de ligação das obrigações com o C…) destinadas a motivar o investidor a adquirir o produto.
O Autor pensou que estava a comprar um produto financeiro emitido pelo B…, quando se tratava de um valor mobiliário cuja fonte era o C…, sendo que tal erro e convicção só existiu porque foi o próprio Réu a provocá-lo, fazendo crer – verbalmente e através dos elementos que inseriu no documento mencionado nos factos provados nºs 10, 18, 25 e 26 - que estava em causa um produto financeiro sem qualquer ligação ao banco relativamente ao qual o Autor não tinha qualquer interesse em investir, o C… (…)”.
Ora, não tendo sido impugnado o facto provado 10 – “As Obrigações identificadas no facto provado nº 3 passaram a ser apresentadas como se fosse o Banco-Réu a sua entidade emitente e a entidade responsável pelo reembolso do capital investido. (…)” temos, em face do facto provado nº 3, uma afirmação/apresentação falsa quanto à identificação do emitente. Mas é verdade que em 17 e 19 – visita do gerente ao Autor, não se diz que a apresentação das obrigações foi feita como em 10, antes que a informação prestada referiu apenas a pessoa do responsável – B....
Sabemos depois, em 20, que a única questão que o A. levantou – isso porque se queria prevenir de qualquer tipo de confusão com todos os produtos em discussão na sequência da resolução do C… – foi, não uma mas duas, primeiro, “se as Obrigações eram do” C… “ou eram do” B… e segundo se “haveria alguma hipótese de a responsabilidade pelo pagamento da emissão ser do C… em lugar do Banco-R.”. A isto (21) “(…) o gestor de conta respondeu que se tratavam de Obrigações” B… “que nada tinham a ver com o C… e com as obrigações que tinham ficado com reembolso da responsabilidade deste”. (sublinhado nosso).
É verdade que não sabemos se o A. transmite a sua preocupação preventiva (facto 20) ao gerente, mas sabemos que este, tendo informado do responsável e sido ainda perguntado (por alguém que não ficou satisfeito com a informação ou por alguém que simplesmente quer mais informações) sobre se o produto era C… ou B…, em vez de responder “é, agora é, foi C…, mas agora é B…, e até garanto que não volta para trás” – ou seja, prestar aquilo que, na sua melhor convicção e saber, entendia ser a resposta verdadeira e completa, responde “é B… e não tem nada a ver com C…”. E aqui há claramente uma informação falsa (facto provado 3), e nem vale a pena pensar em esgrimir com os tempos dos verbos, visto que “ter alguma coisa a ver” abrange qualquer tipo de relação, incluídas as passadas ou as futuras, qualquer ponto por onde se possa estabelecer uma relação. Ora, este ponto de relação do produto – tinha sido emitido pelo C… – era o ponto que tinha a ver e de que o gerente sabia, quando prestou a informação, porque sabia necessariamente da data de emissão e da data de vencimento (“prazo de emissão” - facto 19), e sabia portanto que a data de emissão era anterior à constituição do B….
Sobre isto não há discussão no recurso, outra a afirmação de que a informação prestada foi verdadeira, em função da entidade responsável e em função da irrelevância do emitente. Mas isto é abstracto e a pergunta a que há que responder é esta: - quando o cliente, nem que seja um mero ordenante, pergunta, depois das informações que espontaneamente lhe são prestadas pelo funcionário, e em esclarecimento adicional a elas, qualquer outra coisa, podemos responder falsamente? É que não se trata de dizer que não se responde porque o dever de informação não obriga a responder, trata-se de responder falsamente: - as obrigações não têm nada a ver com o C…, quando têm, porque foram por ele emitidas. Nem que estivéssemos a falar do dever de informação – e se pudesse retirar dos normativos aplicáveis que só era preciso informar sobre a entidade responsável – seria possível defender que perante uma pergunta adicional, mesmo além do dever de informação, que o cliente fizesse, o intermediário financeiro tivesse o direito ou a mera possibilidade de responder sem verdade, ou de omitir a verdade ou parte da verdade.
Se não estamos perante uma compra directa onde se convoque o princípio da boa fé nas negociações contratuais, não há dúvida porém que o último pano de fundo dos deveres de informação do intermediário financeiro acaba por ser o mesmo: - a boa fé.
E uma coisa é o artifício, a sugestão, a imagem geral que se transmite, e aquilo que geram, que varia de visado para visado, outra é a resposta que se dá a uma pergunta concreta.
E já agora e ainda antes de prosseguir, repare-se que a tarefa do tribunal não é a de analisar se em abstracto determinada informação passada se revela conforme aos deveres de informação exigidos ao intermediário financeiro, o papel do tribunal não é examinar, vamos dar um exemplo, um prospecto sobre obrigações seniores XYZ e decidir se esse prospecto cumpre as exigências de informação, o papel do tribunal é dizer, perante os termos concretos das informações concretamente dadas a alguém, por um intermediário financeiro, se estas informações estão ou não conformes aos deveres de informação, e neste ponto de conformidade, pois além da boa-fé – ou na realidade aquilo que é essência dela, é, e nem precisava vir expressamente consignado no artigo 7º nº 1 do Código dos Valores Mobiliários – se as informações são verdadeiras.
Poderia até dizer-se que esta linha argumentativa da ilicitude, que o tribunal de primeira instância expôs, não estava sob recurso e portanto, e porque é suficiente um dos fundamentos considerados pelo tribunal de primeira instância, a questão da ilicitude transitada estava.
Percorridas as alegações do recurso vemos porém que no toca ao aspecto da ilicitude – dito de outro modo, da não existência do dever de informação acusado – a recorrente vem dizer e citamos: “(…) não se pretende defender a inexistência de quaisquer deveres de informação na esfera no intermediário financeiro na mera execução de ordens, mas sim que a informação a prestar não pode, nesses casos, deixar de considerar a informação já existente e conhecida sobre o instrumento financeiro que estiver em causa” (o que lhe interessa para o argumento da desnecessidade de informar o poder de retransmissão) dizendo seguidamente “Refira-se, para efeitos de esclarecimento, que não se menciona aqui a questão da emissão originária das obrigações pelo C… por decorrer da própria causa de pedir do Recorrido que o mesmo conhecia essa circunstância,”. “Porquanto, se o mesmo não soubesse (…) não faria sentido que tivesse (…) questionado o seu gestor de conta sobre qualquer risco de contágio”, “Essa pergunta (…) demonstra que o Recorrido bem sabia que o emitente originário das obrigações era o C… e não o Recorrente”.
Reconhece-se, naturalmente, que mesmo a tratar-se de mera execução de ordens do cliente, o intermediário financeiro tem uma responsabilidade informativa reportada ao concreto, sendo que a solução para em concreto, o gestor de conta do Recorrido não ter informado quem era o emitente e isto não constituir uma falha de verdade, uma omissão de informação, ou, na resposta “não tem nada a ver com o C…”, uma inverdade, é a de que o Recorrido sabia que era o C… o emitente.
Os factos provados porém não nos assistem nesse sentido pois não temos um facto provado a dizer que o Recorrido sabia que as obrigações tinham sido emitidas pelo C… e precisaríamos de o ter, e ainda assim sempre ficaria por ajuizar que fazer à afirmação “não tem nada a ver com o C…”, não sendo muito fácil entender a sua inocuidade, mais podendo considerar-se uma especial censurabilidade quando se diz a alguém que sabe a verdade, que essa verdade que sabe afinal é mentira, quando na realidade o não é.
É verdade que no facto provado 20 se escreveu, tal como resultava da petição inicial, que o Recorrido perguntou se haveria alguma hipótese de a responsabilidade pelo pagamento da emissão ser do C… em lugar do Banco-R., mas daqui não resulta que o recorrido soubesse que as obrigações em causa tinham sido originalmente emitidas pelo C…, até porque ficaríamos com uma contradição com o facto provado 31: - o A. só aceitou adquirir as duas obrigações porque lhe foi garantido que não tinham nada a ver com o C…
E assim – sem demonstração de que o Recorrido sabia que o emitente das obrigações era o C… – não se consegue afastar a prestação de uma informação errada e concomitantemente atacar o segmento decisório que concluiu pela violação do dever de informação e pela ilicitude da conduta da Recorrente na parte além da questão de dever informar-se o poder de retransmissão do Banco de Portugal.
Esta posição assenta numa valorização da liberdade da vontade negocial, através dum não juízo ou não ordenação teleológica sobre os motivos e as circunstâncias que enformam ou explicam essa vontade: - em última análise, alguém emite uma vontade negocial por razões que não são sindicáveis nem têm de o ser. No caso concreto é claro que conseguimos encontrar um enquadramento e mesmo fazer uns juízos de aceitabilidade ou não, mas em rigor temos de valorizar a liberdade de não negociar simplesmente porque tem “qualquer coisa” a ver com o C…, simplesmente porque tem “qualquer coisa” com a qual o interessado “embirra”, e a valorização desta liberdade é feita pela imposição de um dever de boa-fé à contraparte negocial: - sendo perguntado se é “amarelo”, e se o for, não se pode responder que é “cor de laranja”.
Admitamos porém e de modo hipotético, e a bem do esgotamento das razões invocadas no recurso, que uma boa maneira de perspectivar “ter qualquer coisa a ver com o C…” seja “ter qualquer coisa que permita, ou ainda permita, a passagem de activos e passivos entre o C… e o B…” (quase aqui numa visão mais geral que terá sido a preocupação comum dos clientes, da própria confusão entre C… e B…) e por isso na realidade a grande questão a decidir seja a que respeita à informação relativa ao poder de retransmissão.
Devia informar-se?
Dispõe o artigo 290º do Código dos Valores Mobiliários:
1 - São serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros:
a) A receção e a transmissão de ordens por conta de outrem;
b) A execução de ordens por conta de outrem;
c) A gestão de carteiras por conta de outrem;
d) Os serviços e atividades de: i) Tomada firme e colocação com garantia; ou ii) Colocação sem garantia;
e) A negociação por conta própria;
f) A consultoria para investimento;
g) A gestão de sistema de negociação multilateral;
h) A gestão de sistema de negociação organizado.
2 - A receção e transmissão de ordens por conta de outrem inclui a colocação em contacto de dois ou mais investidores com vista à realização de uma operação”.
Por sua vez, estabelece, ou melhor, na versão aplicável à data dos factos (DL 486/99 de 13.11 na redacção dada pelo DL 357-A/2007 de 31.10) estabelecia o artigo 294º, na parte que aqui nos interessa:
1 - Entende-se por consultoria para investimento a prestação de um aconselhamento personalizado a um cliente, na sua qualidade de investidor efectivo ou potencial, quer a pedido deste quer por iniciativa do consultor relativamente a transacções respeitantes a valores mobiliários ou a outros instrumentos financeiros.
2 - Para efeitos do número anterior, existe aconselhamento personalizado quando é feita uma recomendação a uma pessoa, na sua qualidade de investidor efectivo ou potencial, que seja apresentada como sendo adequada para essa pessoa ou baseada na ponderação das circunstâncias relativas a essa pessoa, com vista à tomada de uma decisão de investimento.
3 - Uma recomendação não constitui um aconselhamento personalizado, caso seja emitida exclusivamente através dos canais de distribuição ou ao público.
4 - A consultoria para investimento pode ser exercida:
a) Por intermediário financeiro autorizado a exercer essa actividade, relativamente a quaisquer instrumentos financeiros (...)”.
Com os factos dados como provados poderíamos discutir se o que ocorreu não foi precisamente a “prestação de um aconselhamento personalizado a um cliente” e portanto uma consultoria para investimento feita pelo próprio gestor de conta, funcionário da própria pessoa do intermediário financeiro, neste caso instituição bancária, caso em que o dever de informação tem de ser especialmente cumprido porque do aconselhamento personalizado, dum produto reputado adequado precisamente ao cliente que se aconselha, se gera uma maior confiança no cliente e portanto uma exigência maior da não frustração desta confiança, sem embargo da operação em direcção inversa do nível de qualificação do cliente como investidor, ou dito de modo mais geral, sem embargo de que elevados e especializados conhecimentos que o cliente concretamente tenha tornam menos exigente o dever de informação.
Na realidade, aquilo de que estamos a falar é sempre da relação de proporcionalidade inversa entre informação e conhecimento.
Como se lê no sumário do acórdão do STJ de 07.11.2019, relator Conselheiro Oliveira Abreu, processo 1616/17.1T8LRA.C1.S1:
“I. O objectivo essencial da actividade de intermediação é o de propiciar decisões de investimento informadas, em ordem a defender o mercado e a prevenir a lesão dos interesses dos clientes, importando que ao nível dos deveres impostos ao intermediário financeiro, incluindo o banco para tal autorizado, se destacam os deveres de informação, expressos no art.º 312.º do CVM, relativamente aos serviços que ofereça, lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, os quais deverão ser cumpridos através da prestação de “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, sendo que a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor não qualificado, será ilícita se ocorrer a violação do dever de informação, com os seus requisitos indispensáveis: completude, veracidade, actualidade, clareza, objectividade e licitude.
II. A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (princípio da proporcionalidade inversa)”.
Quando a Recorrente e Ré sustenta que, por se estar perante mera recepção e execução de ordem do cliente, o dever de informação é menor e nem tem de saber se o produto se adequa ao perfil do cliente, tanto mais até que se está perante uma compra em mercado secundário, da qual ela é mero intermediário interessado apenas por uma comissão de cem euros, está a falar do mesmo: - se o cliente dá a ordem, é porque sabe o que é que está a fazer[3]. As operações “triviais”, mesmo em termos de investimento em valores mobiliários, não carecem de ser explicadas, presumindo-se que o ordenante sabe. A operação – compra de obrigação em mercado secundário (no caso, aqui, o mercado secundário vale a dizer que o produto em si já circula no mercado, já foi assumido o seu risco na subscrição em mercado primário e tudo se tendo passado com normalidade, pois tornou-se apetecível para o mercado secundário, que lhe acede também pela clareza que o seu trajecto já demonstrou)  – não deixa de ser “trivial” porque o gestor de conta vai visitar o cliente no seu escritório e lhe sugere um produto que diz ser rentável. A obrigação é aliás um dos produtos mais lineares, digamos assim, e de resto, como se vê afirmado de modo geral na jurisprudência, existe uma espécie de exigência da utilização pelo cliente (ou por qualquer contratante, de resto) de um mínimo de diligência na procura da informação relevante, não podendo esperar-se, nem exigir-se, à contraparte, que tudo nos explique, como se fossemos ingénuos.
O pressuposto é portanto o de que, cumprido o dever de diligência mínima, não temos de ser informados, muito informados, de coisas simples. Se porém, formos particularmente pouco versados em matéria de instrumentos financeiros, e mais especificamente se não tivermos completado a educação básica, já é unânime repor o particular dever de informação completa e minuciosa.
Sempre a mesma coisa, seja em função do produto ou operação ou serviço, de modo pertinente ao objecto, seja de modo pertinente ao sujeito – investidor não qualificado, manifesta falta de conhecimentos que não permite sequer entender a informação que é fornecida – a informação a dar é proporcionalmente inversa.
Mas que informação? A informação do produto, evidentemente, mas em geral toda e qualquer informação pertinente à formação de uma decisão esclarecida de investimento, veja-se aliás a expressão “nomeadamente” na parte final do nº 1 do artigo 312º do Código dos Valores Mobiliários, de que o cliente não seja já, comprovadamente conhecedor, ou que o mesmo, comprovadamente, não deva desconhecer.
Como se lê no sumário do acórdão do STJ proferido no processo 901/17.7T8VRL.G2.S1 em 11.7.2019, relatora Conselheira Fátima Gomes:
 “(…) II – A informação a prestar por um intermediário financeiro a um seu cliente tem patamares de intensidade, dependentes do tipo de serviço prestado pelo intermediário: se o intermediário recomenda um investimento, os deveres de informação são especialmente intensos; se o intermediário presta um serviço de “balcão” do tipo recolhe de subscrições de produtos financeiros, abertura de conta de valores mobiliários ou sua movimentação, a intensidade é outra.
III – Em qualquer caso, no entanto, variando a intensidade e o tipo de detalhe informativo, não varia a veracidade da informação e demais características que lhe estão associadas (art.º 7.º CVM)”.
Aliás, a Ré e Recorrente afirma isso mesmo que não afirma que em simples recepção de ordens não tivesse que cumprir qualquer dever de informação.
O que afirma é que o poder de retransmissão não tinha de ser informado porque em presença duma simples recepção de ordens relativamente a uma compra em mercado secundário.
Ora, como procurámos explicar, o essencial para a resposta ao volume, digamos assim, de informação a dar, depende do nível de conhecimento do cliente.
Estando provado que o Autor é um investidor não qualificado (facto provado nº 2), estando provado que o Autor não sabia da deliberação do Banco de Portugal (o Autor não sabia de quanto se escreve sob os factos provados 11 a 14) nem da existência do poder de transmissão/retransmissão, também não poderia ele como é obvio comunicar à Ré que ignorava este poder de retransmissão. Então, só conseguiríamos dizer que o facto da existência deste poder, em sede de mera execução de ordem, não tinha de ser informado, se fosse um conhecimento que o cliente, dada a simplicidade da operação a executar, devesse ter.
Ora, esta simplicidade é absolutamente claro que não pode ser afirmada porque a questão/risco não tem relação intrínseca com o produto/operação em si. Outra maneira de afirmarmos, em sede de execução de ordem, que o poder de retransmissão não tinha de ser informado, era podermos imputar o seu conhecimento ao dever de diligência do Autor: - não sabia, mas devia saber. Adiante-se, porque era público. Adiante-se, porque de Agosto de 2014 para a frente, os clientes teriam um especial dever de se informar.
Atrase-se então: se o conhecimento do poder de retransmissão, da não definitividade de fixação do perímetro da transferência, era público, não o era generalizadamente – há uma diferença muito relevante entre ser público, ter sido tornado público e ser notório por ter sido tão recorrentemente publicitado. Atrase-se novamente porque de Agosto de 2014 para a frente, não existia propriamente ou pelo menos não estava divulgada ao público a existência de uma entidade independente com um serviço de informações ao público especialmente destinado a esclarecer os eventuais interessados em terem qualquer espécie de relação comercial com o B…, da independência dessa relação relativamente à pessoa do C… Ou dito assim mais simplesmente: - apesar de, de Agosto de 2014 para a frente, se saber o que tinha acontecido ao C…, a resolução, os clientes interessados em qualquer tipo de relação com o B… que não tivesse qualquer possibilidade de vir a ser uma relação com o C…, tinham como interlocutor, para a pertinente informação, o B….
Por outro lado, quando, apesar de se o fazer em sede de culpa, é a própria Ré que fala da imprevisibilidade da retransmissão, menos ainda se justificaria exigir que o Autor conhecesse um poder abstractamente constante duma deliberação do Banco de Portugal que previsivelmente não seria usado. O que significa basicamente que estávamos perante um não assunto, não haveria notícias frequentes nem por isso um grande debate público sobre o poder de retransmissão.
Não podendo afirmar-se que o Autor conhecia e não podendo afirmar-se que devia conhecer, a concluir-se que o poder de retransmissão devia ser objecto de informação, então não se chega à afirmação de que tratando-se de uma mera execução de ordens, ele não devesse ser informado. Em todo o caso, o argumento em si (mera execução de ordens enquanto factor autónomo para justificar a falta de informação) não apresenta autonomia perante a “grande questão” da ilicitude que é precisamente saber se, como diz a Recorrente, o facto da existência dum poder de retransmissão não integra o núcleo do dever de informação do intermediário financeiro.
Invoca então a Recorrente e Ré que não pode considerar-se que o poder de retransmissão esteja compreendido pelo dever de informação, visto que não se trata de um risco especial do produto em causa, mas quanto muito, dum risco que afecta todo e qualquer produto seu, incluídos os depósitos a prazo, na realidade, qualquer activo e passivo seu, e que mesmo a considerar-se, teoricamente, que este risco genérico existe relevantemente, a sua abrangência pelo dever de informação revela-se incompatível com o espírito e razão de ser de todo o regime jurídico previsto no RGICSF no qual se sustentou a medida de resolução aplicada ao C…, e “designadamente das normas contidas nos seus artigos 145º-C, nº 1, alínea a) e 145º - O, nº 1, na redacção em vigor à data da emissão da ordem de aquisição”.
 Vejamos mais pormenorizadamente o enquadramento legislativo do dever de informação:
Nos termos do artigo 7º nº 1 do Código dos Valores Mobiliários, epigrafado “Qualidade da Informação”, a informação respeitante entre outros a instrumentos financeiros “deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita”.
Como resulta do artigo 304º do mesmo diploma, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, o que é instrumental em relação ao objectivo/dever de orientar a actividade de intermediação financeira no sentido da protecção dos legítimos interesses dos clientes e da eficiência do mercado.
Digamos que um mercado eficiente é eficiente na medida em que se gera a confiança nos clientes de que os seus interesses, levados a esse mercado, serão protegidos, o que os encoraja, ou não inibe, à acção.
Percebe-se bem como para a criação de confiança é necessário observar os requisitos qualitativos referidos no artigo 7º. Isto porém não nos diz o que tem de ser informado, mas como tem de ser informado.
Sob a nominativa de princípios gerais da informação a investidores, o artigo 312º do Código dos Valores Mobiliários estabelece que devem ser prestadas todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, (nº 1) “incluindo nomeadamente as respeitantes:
a) Ao intermediário financeiro e aos serviços por si prestados; b) À natureza de investidor não profissional, investidor profissional ou contraparte elegível do cliente, ao seu eventual direito de requerer um tratamento diferente e a qualquer limitação ao nível do grau de proteção que tal implica; c) À origem e à natureza de qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço a prestar, sempre que as medidas organizativas adotadas pelo intermediário nos termos dos artigos 309.º e seguintes não sejam suficientes para garantir, com um grau de certeza razoável, que serão evitados o risco de os interesses dos clientes serem prejudicados, incluindo as medidas adotadas para mitigar esses riscos, devendo a informação ser suficientemente detalhada, tendo em conta a natureza do investidor, para permitir que este tome uma decisão informada relativamente ao serviço no âmbito do qual surge o conflito de interesses, e cumprir o disposto em regulamentação e atos delegados da Diretiva 2014/65/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014; d) Aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas, incluindo se o instrumento financeiro se destina a investidores profissionais ou não profissionais, tendo em conta o mercado-alvo identificado; e) Aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar; f) À sua política de execução de ordens, que contém informação sobre os locais de execução e, se for o caso, à possibilidade de execução de ordens de clientes fora de mercado regulamentado ou de sistema de negociação multilateral ou organizado; g) À proteção do património do cliente e à existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar; h) Ao custo do serviço a prestar”. (sublinhado nosso).
Ao tempo da realização da operação estava em vigor o artigo 312º-A, epigrafado qualidade da informação, que estabelecia:
“1 - A informação divulgada pelo intermediário financeiro a investidores não qualificados deve:
a) (…); b) Não dar ênfase a quaisquer benefícios potenciais de uma actividade de intermediação financeira ou de um instrumento financeiro, sem dar igualmente uma indicação correcta e clara de quaisquer riscos relevantes; c) (…); d) Ser apresentada de modo a não ocultar ou subestimar elementos, declarações ou avisos importantes. (…)”. (sublinhado nosso)
De igual modo, estava em vigor o artigo 312º-C, sobre a informação relativa ao intermediário financeiro e aos serviços por si prestados, segundo o qual:
“1 - O intermediário financeiro deve prestar a seguinte informação a investidores não qualificados:
a) (…)
j) A natureza, os riscos gerais e específicos, designadamente de liquidez, de crédito ou de mercado, e as implicações subjacentes ao serviço que visa prestar, cujo conhecimento seja necessário para a tomada de decisão do investidor, tendo em conta a natureza do serviço a prestar, o conhecimento e a experiência manifestadas, entregando-lhe um documento que reflicta essas informações.
2 - Quando o cliente seja um investidor qualificado, o disposto no número anterior apenas se aplica se este solicitar expressamente as informações nele referidas, devendo o intermediário financeiro informar expressamente o cliente desse direito”.
Identicamente e de modo muito preciso, epigrafado “Informação relativa aos instrumentos financeiros” estava em vigor o artigo 312º-E, na redacção dada pelo DL 63-A/2013 de 10 de Maio, que determinava:
1 - O intermediário financeiro deve informar os investidores da natureza e dos riscos dos instrumentos financeiros, explicitando, com um grau suficiente de pormenorização, a natureza e os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa.
2 - A descrição dos riscos deve incluir:
a) Os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento;
b) A volatilidade do preço do instrumento financeiro e as eventuais limitações existentes no mercado em que o mesmo é negociado;
c) O facto de o investidor poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de aquisição do mesmo;
d) Quaisquer requisitos em matéria de margens ou obrigações análogas, aplicáveis aos instrumentos financeiros desse tipo.
3 (…)”.
Por outro lado, como bem se notou na sentença recorrida, o dever de informação em concreto também se mostra enquadrado, vista a relação bancária entre as partes, pelas disposições do RGICSF previsto no DL 298/92 de 31 Dezembro, e designadamente pelos artigos seguintes:
74º - “Os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder, tanto nas relações com os clientes como nas relações com outras instituições, com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”.
75º - “Os membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de todos os clientes em geral”.
77º nº 1 - “As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes”.
Ainda que introduzido posteriormente à aquisição em causa nos autos, o artigo 77º-E do mesmo Regime (na versão da Lei 35/2018 de 20 de Julho) dá ainda uma nota que nos interessa considerar:
1 - No âmbito da comercialização ao retalho de produtos e instrumentos financeiros, quer os mesmos tenham sido criados e instruídos por si ou por outra instituição de crédito, as instituições de crédito, antes da celebração do respetivo contrato ou subscrição do produto, prestam ao cliente todas as informações adequadas, em papel ou noutro suporte duradouro, sobre as condições, os custos, encargos e todos os riscos associados ao produto, nomeadamente quanto à rentabilidade do mesmo e o nível de perdas que podem ocorrer.
2 - Para garantir a transparência e a comparabilidade dos produtos oferecidos, as informações referidas no número anterior devem ser prestadas ao cliente na fase pré-contratual e devem contemplar os elementos caracterizadores dos produtos propostos, a entidade emitente e todas as informações relevantes, para a tomada de decisão por parte do cliente.
3 - O Banco de Portugal pode, através de aviso, emitir as normas regulamentares necessárias à concretização do disposto no presente artigo.
4 - Sem prejuízo do recurso a outros instrumentos de supervisão, o Banco de Portugal pode ordenar a suspensão da comercialização ao retalho de produtos e instrumentos financeiros sempre que as instituições de crédito não cumpram o disposto nos números anteriores”.
E a nota que nos interessa aqui retirar é que ainda que sem aplicação ao caso dos autos e neste domínio específico da venda a retalho, se repete uma fórmula que encontramos anteriormente – as informações relevantes para a tomada de decisão do cliente – onde o legislador entende que a pessoa do emitente é uma (de entre todas as que têm de ser prestadas) informação relevante.
Quando lemos todos os normativos que transcrevemos, a ideia não é a de que para determinar se o poder de retransmissão do BdP devia ter sido comunicado devamos apenas verificar se ele é um risco específico do produto “Obrigação (concretamente em causa)”, ou seja, devamos apenas apelar ao artigo 312º nº 1 al. d) e 312º-E – e como já dissemos, é patente que não é um risco intrínseco à arquitectura do produto financeiro “obrigação” – mas sim a de que o legislador pretendeu garantir que fossem prestadas informações não apenas sobre o específico produto/objecto mas sobre todas as circunstâncias relevantes para a tomada de uma decisão esclarecida e fundamentada através da qual se realizasse o acesso ao mercado, em condições de protecção dos interesses dos clientes/intervenientes/investidores, que em si mesmas são também condição de eficiência do mercado. O legislador nomeou diversos tópicos sobre que deve incidir a informação, para alguns deles criando até artigos específicos, distinguindo também entre investidores qualificados e não qualificados.
Quando no artigo 312º, nº 1, acima transcrito, se usa a expressão “nomeadamente”, significa isso que a incidência da informação a prestar será sobre o que for necessário à decisão fundamentada e esclarecida – quer dizer, o pressuposto de base aqui e para todas estas matérias é também o de que a actividade de intermediação financeira não é de conhecimento simples, não é dominável com facilidade, e que se alguma vez o foi, de há muito se tornou bastante mais complexa ou tem aspectos bem mais complexos – da pessoa concreta que tiver de tomar a decisão, e por isso, além das incidências que o legislador entendeu nominar e salvaguardar ou garantir que fossem servidas com informação, se pode, perante um caso não expressamente previsto, entender que as mesmas razões que justificam a existência e exigência de informação também nele concorrem.
Repare-se então que o referido artigo 312º, que na sua alínea d) do seu nº 1 nos fala dos instrumentos financeiros (que depois têm/tinham previsão mais concreta no artigo 312º-E, segue estatuindo sobre “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”, o que ainda nos daria uma margem para nos atermos ao “risco especial” e discorrermos sobre o carácter desta especialidade (especial em relação a quê?) e para especularmos sobre o sentido de “operações”. Este mesmo artigo 312º nº 1 na sua alínea g) consagra o dever de informação relativa à protecção do património do cliente e à existência de fundo de garantia ou protecção equivalente que abranja os serviços a prestar.
O que é aqui particularmente interessante é o posicionamento do legislador perante o funcionamento do mercado: - quem está menos habilitado para jogar este jogo tem de ser ajudado minimamente a entendê-lo. Só pode jogar neste mercado quem souber (ou possa ter ficado a saber/qualidade da informação prestada) o mínimo, porque este jogo é perigoso na medida em que pode comprometer a propriedade privada (na incidência monetária, directamente, e por arrasto em qualquer outra incidência) dos jogadores, que em bom rigor (formal) também é a nossa (profissionais) pedra basilar neste mercado – e que tem de ser salva, ou não sacrificada de modo excessivo às regras da vontade livre e esclarecida, para que a legitimidade da nossa propriedade privada se mostre assegurada. Ou dito de modo mais repetitivo – a eficiência do mercado exige que não haja abusos.
Por isso, podemos considerar que um dos princípios fundamentais da informação é o pertinente ao risco e que além dos riscos especiais dos próprios produtos propostos, os riscos relacionados com os emitentes, com os responsáveis, quando não emitentes, com o próprio mercado ou com qualquer circunstância (reflexo de “toda” a informação relevante – veja-se ainda o artigo 312º-A, alínea b) “quaisquer riscos relevantes” e alínea c) “não ocultar ou subestimar elementos, declarações ou avisos importantes”) que possa resultar numa afectação desproporcionada do património do investidor, devam ser considerados objecto do dever de informação.
Aliás, de algum modo, estando provado que o Autor era um investidor não qualificado e que a aquisição foi feita ao tempo em que ainda estava em vigor o artigo 312º-C do Código dos Valores Mobiliários, haveria de considerar-se, quanto à existência do poder de retransmissão, que a sua informação integrava um componente de configuração do próprio intermediário financeiro. É que mesmo que a compra intermediada fosse em mercado secundário, era o intermediário que assegurava o pagamento do capital na maturidade. Donde, tratava-se de prestar informação sobre si mesmo, e nesta informação sobre si mesmo estava incluída a mobilidade dos activos e passivos em sujeição a uma vontade de terceiro: - basicamente, “eu sou um adolescente promissor e vigoroso e bem apoiado e tudo corre bem, embora o que é meu ou me incumbe não esteja ainda muito bem definido, e nestas condições, eu sou o responsável por este produto, serei eu que o pago, na medida em que isso está assim definido no presente e enquanto assim se mantiver, isto é, enquanto um terceiro, mas soberano, decidir que assim deverá continuar a ser”. “Terceiro? – sim, o Banco de Portugal”. “Então e se o Banco de Portugal decidir que você não é responsável, quem é que paga?  - Pois, olhe, nos termos da deliberação do BdP, a coisa pode ir mudando entre mim e o C…”.
Estes termos coloquiais servem aqui a traduzir para termos perfeitamente claros qual era a importância e a pertinência da informação, do ponto de vista do investidor, neste caso, do Autor e Recorrido.
Repare-se aliás que nos termos do mesmo artigo 312º-C se fala em riscos especiais mas também em riscos gerais, em ambas as qualidades nomeados como pertinentes a, designadamente “liquidez, de crédito ou de mercado”. Ora, a questão do poder de transmissão e retransmissão não deixa de ser uma circunstância peculiar que afecta de modo geral todos os produtos do intermediário financeiro em concreto.
Noutra dimensão porventura a Recorrente e Ré apelou à generalidade do risco como desmerecedora de informação. Se um risco é geral não está escondido do conhecimento que a generalidade das pessoas tem. Isto tem de ser afinado para “não está escondido do conhecimento que qualquer investidor não qualificado tem”.
Ora, não está escondido porque “toda a gente sabe o que aconteceu ao C…” e que o B… foi criado para permitir continuar a sua actividade, com expurgo do que estava mal, o muito falado “banco bom e banco mau” – e aqui é manifesto que nestes termos vulgares e ultra simplificados o conhecimento sobre o poder de transmissão existiu, mas sobre a provisoriedade do perímetro e a possibilidade de retransmissão, de todo podemos dizer que se trata de algo do conhecimento público generalizado.
Até porque, como veremos de seguida, num outro sentido em que se pode dizer que o poder de retransmissão não está escondido – porque as deliberações do Banco de Portugal sobre medidas de resolução e seus efeitos, em particular para os clientes, são divulgadas – o que se pode dizer é que não está escondido mas também não sofre de qualquer exibicionismo, digamos assim. Basta verificar o nº 5 do artigo 145º-AT do RGICSF sobre a divulgação nos seguintes meios: 
“a) No sítio na Internet do Banco de Portugal; b) No sítio na Internet da Autoridade Bancária Europeia; c) No sítio na Internet da instituição de crédito objeto de resolução; d) No sistema de difusão de informação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, caso as ações, outros títulos representativos do capital social ou instrumentos de dívida da instituição de crédito objeto de resolução se encontrem admitidos à negociação em mercado regulamentado”.
Estes meios não são os que os investidores não qualificados têm por hábito ler diariamente. 
Depois, também não podemos apelar à máxima do não aproveitamento da ignorância da lei, porque o poder de retransmissão que aqui concretamente foi exercido não consta de facto do texto legal senão como hipótese abstracta referida a uma decisão concreta que tem de ser tomada, e que não existe sem ela e a não ser nos termos previstos nessa decisão concreta – artigo 145º-K do RGICSF, nº 4 e 5:
4 - Após a transferência prevista nos n.ºs 1 e 2 do artigo 145.º-O, o Banco de Portugal pode, a todo o tempo:
a) (…); b) Transferir outros direitos e obrigações e a titularidade de ações ou de títulos representativos do capital social da instituição de crédito objeto de resolução para a instituição de transição; c) Devolver à instituição de crédito objeto de resolução direitos e obrigações que haviam sido transferidos para a instituição de transição ou devolver a titularidade de ações ou de títulos representativos do capital social da instituição de crédito objeto de resolução aos respetivos titulares no momento da deliberação prevista no n.º 1 do artigo 145.º-P, não podendo a instituição de crédito objeto de resolução ou aqueles titulares opor-se a essa devolução, desde que estejam reunidas as condições previstas no número seguinte.
5 - A transferência prevista na alínea c) do número anterior só pode ser efetuada quando tal esteja expressamente previsto na decisão do Banco de Portugal prevista nos n.ºs 1 e 2 do artigo 145.º-O, quando as condições de transferência dos direitos, obrigações, ações e títulos representativos do capital social da instituição de crédito objeto de resolução aí previstas não se verifiquem ou quando aqueles direitos, obrigações, ações e títulos representativos do capital social da instituição de crédito objeto de resolução não se insiram nos critérios para a transferência aí definidos. (sublinhado nosso).
De todo o exposto conclui-se que o poder de retransmissão constituía um risco que não era generalizadamente conhecido nem tinha de ser e que portanto deveria ser informado.
Chegamos assim, salvo erro, à última parte:  - não tinha de ser informado porque tal informação contrariava o espírito do legislador no estabelecimento das medidas de salvamento de instituições de crédito para evitar riscos sistémicos.
Se, tal como resulta do artigo 145º-C do RGICSF “1 - Na aplicação de medidas de resolução, o Banco de Portugal prossegue as seguintes finalidades: a) Assegurar a continuidade da prestação dos serviços financeiros essenciais para a economia” e nos termos do artigo 145º-O nº 1 “O Banco de Portugal pode determinar a transferência parcial ou total de direitos e obrigações de uma instituição de crédito, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, e a transferência da titularidade das ações ou de outros títulos representativos do seu capital social para instituições de transição para o efeito constituídas, com o objetivo de permitir a sua posterior alienação”, ou seja, se a transferência tem como objectivo viabilizar a continuação da prestação de um serviço financeiro essencial para a economia e essa viabilização passa pela criação de uma instituição de transição cujo “dote” deve ser gerido de modo a valorizar essa instituição com vista à sua rentável alienação – autonomizando-se assim, por intervenção pública, o serviço e na realidade todos os interesses e posições activas que do serviço financeiro até aí prestado se geraram, do perigo da gestão anterior, para que a salvação desses interesses e posições se faça pela passagem a um novo gestor adquirente privado saudável, por assim dizer – então não faz sentido que o risco que periga a continuação da actividade financeira, o risco que, em vez de valorizar, ainda pode agravar a fuga de clientes e diminuir negócio, tornando este completamente desinteressante a um adquirente futuro, e assim prejudicando não apenas a instituição de transição mas a generalidade dos clientes, credores, devedores com interesses em curso, criando um problema sistémico, não deve, esse risco, ser informado ao cliente.
Respondendo a este argumento, repare-se que o legislador não instituiu o segredo das deliberações do Banco de Portugal – pelo contrário, já vimos que legislou no sentido da publicação/divulgação das medidas de resolução e seus efeitos em especial sobre os clientes. Depois, repare-se que estando legislado o dever de informação, está assegurado que para o legislador é essencial – ou pelo menos, que é requisito mínimo de admissibilidade – que o mercado financeiro opere em condições de assegurar a fundada liberdade negocial dos investidores (ou um mínimo dela que se assente na própria confiança que uma operação de gestão criteriosa e com respeito pelo património e interesses dos investidores e clientes possa gerar) e por isso o objectivo de evitar riscos sistémicos assegurando a continuação da prestação de uma actividade ou serviço financeiro em concreto não pode fundar-se num valor contrário, num valor de secretismo ou de falta de transparência. O legislador quererá salvar a operação, retirando-a dum operador, nutrindo-a ao ponto de outro operador se poder interessar por a tomar a cargo, mas quem fica encarregado dos cuidados de nutrição é uma instituição de transição que vai funcionar no mesmo mercado e que não foi isentada pelo legislador do cumprimento das regras aplicáveis a esse mercado e a essa operação, e portanto também não das regras relativas ao dever de informação. Dito de outro modo, se o espírito do legislador era evitar riscos sistémicos, ele não entendeu que fosse necessário para tanto recorrer a uma actuação menos transparente, com menos informação aos clientes sobre os riscos dos investimentos que fizessem, sobre o próprio risco de negociarem consigo, instituição de transição, qualquer que fosse o negócio.
Não entendemos por isso secundar nenhuma das razões que a Recorrente apresenta para afirmar que o poder de retransmissão constante da deliberação do Banco de Portugal não fosse um risco abarcável pelo dever de informação.
Conclui-se assim, tal como o fez o tribunal recorrido, pela ilicitude da actuação da Ré, caindo assim um primeiro argumento da Recorrente (inexistência do pressuposto ilicitude).
4ª Questão:
A Recorrente defende seguidamente que conseguiu ilidir a presunção de culpa, excluindo-se a sua responsabilidade.
Neste contexto, não está em causa que, em face de presunção de culpa estabelecida no artigo 304º-A nº 2 do Código dos Valores Mobiliários, a ilisão da presunção compete, nisso havendo interesse, ao intermediário financeiro, onerando-o com a prova dos factos que ilidem a presunção.
Sustentou a Ré e Recorrente que, dum ponto de vista subjectivo, numa óptica de probabilidade e de previsibilidade, a sua actuação ao não informar sobre o poder de retransmissão não merece censura, justamente porque o recurso a este poder, pelo Banco de Portugal e reportado às obrigações em causa, não era previsível nem provável.
Como vimos em sede de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, feneceu a pretensão de passar a provado que “nada fizesse prever para o Réu B…, à data da aquisição das Obrigações pelo Autor, que as mesmas viessem a ser retransmitidas ao C… por decisão do Banco de Portugal. (art.º 15º da contestação)”, e que se aditasse aos factos provados que “Desde Setembro de 2015 até à data da decisão de retransmissão para o C…, o R. realizou diversas operações de recompra de obrigações, as quais, em consequência daquela retransmissão, acarretaram prejuízos superiores a € 150.000.000 (…), os quais se encontram reclamados no processo de liquidação do C…”.
Se o primeiro facto era abrangente, o segundo falava sobre operações que a Recorrente nunca teria realizado se considerasse provável ou previsível a concretização do poder de retransmissão.
Não estando provados tais factos dos quais resultaria a defesa da ilisão da presunção de culpa, não tendo sido invocados outros factos nem carreada outra prova, do que está provado resulta até, por conjugação da data da deliberação com a data de aquisição que nem um ano havia passado, e portanto quando se deliberou a retransmissão a todo o tempo «Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o C… e o B…, ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, nos termos do artigo 145.º H, número 5º», não era caso para, atendendo ao volume e importância do negócio C…, supor que tudo tivesse ficado perfeitamente esclarecido e que todas as necessidades de provimento de recursos ao B… tivessem ficado perfeitamente delineadas, ou dito de outro modo, que fosse possível concluir que o perímetro da transmissão estava definitivamente concluído.
Note-se que apesar de estar provado que a retransmissão ocorreu em 29.12.2015 sem indicação ou aviso prévio, isto de facto não demonstra a imprevisibilidade nem a improbabilidade.
Sendo verdade que havia várias maneiras de prover o B… e a continuação, por ele, do serviço provindo do C…, para evitar crise sistémica, sendo verdade que o BdP podia ter tomado outro tipo de deliberação que não a retransmissão destas obrigações, na realidade não estamos em presença duma actuação do BdP sujeita a sindicância nossa, e por isso e porque desajudados por factos, apenas podemos afirmar sem rigor concreto que “havia várias maneiras” de capitalizar o B…, o que não nos permite dizer que a retransmissão das obrigações não era previsível nem provável.
Assim sendo, e não tendo a Ré e Recorrente provado outros factos, entendemos que não está demonstrada a imprevisibilidade e improbabilidade da retransmissão que tornassem não censurável a não informação desse poder.
5ª Questão:
Sustenta a Recorrente que a avaliação do nexo causal não pode deixar de ter subjacente a relação causal entre a conduta omissiva do dever de informação, considerada ilícita e culposa, e o dano sofrido pelo cliente, e que, demonstrando-se que o cliente quis proceder a um investimento sujeito a outro risco de equivalente gravidade – a insolvência do B… – aceitando-o, deve então entender-se que teria realizado o investimento mesmo que a informação omitida lhe tivesse sido transmitida. O Recorrido adquiriu as obrigações sabendo dos riscos de potencial insucesso na conclusão do processo de alienação do capital do B…, com a consequência da sua entrada em liquidação, caso em que o não reembolso das obrigações “era até – segundo a percepção de todos os agentes à data – superior ao risco de as mesmas serem retransmitidas”. Ora, o STJ segue a orientação de que o juízo que se faça sobre a diligência do intermediário financeiro deve basear-se na situação de facto e no contexto existente à data sem levar em consideração se o risco se materializou. Assim, não deveria ter-se entendido ter ocorrido um nexo de causalidade relevante.
Em primeiro lugar, a Recorrente não identifica os acórdãos do STJ que seguem essa orientação a propósito, não da diligência do intermediário, mas a propósito do nexo causal.
Podemos fazer um juízo sobre a diligência do intermediário financeiro – o que necessariamente, por envolver a sua vontade de acção ou omissão e a imputação desta, se reporta aos pressupostos da ilicitude e da culpa – com base no contexto existente à data sem cuidar do que acontece depois; sim, sobre isto há jurisprudência ou melhor, começa a haver muita jurisprudência, mas já sobre a anulação ou irrelevância do nexo causal adequado por concurso, ao tempo, dum perigo outro com potência para produzir o mesmo resultado, independentemente da posterior produção concreta desse resultado por esse perigo, já temos mais dificuldade em aceitar.
Sabemos dos casos da causa virtual que anulam a causa real, mas para esta anulação acontecer torna-se necessário considerar o resultado, melhor, perscrutar o futuro para encontrar nele a realidade da causa que, não fosse a real, teria também produzido o mesmo dano. No exemplo que Antunes Varela e Pires de Lima dão no seu Código Civil Anotado (Coimbra Editora, 3ª Edição, 1982, p. 547-548), “Exemplo típico deste fenómeno da causalidade antecipada ou prematura é o de a coisa devida perecer em consequência de caso fortuito, estando o devedor em mora, desde que se prove que, tendo a coisa sido oportunamente entregue, ela pereceria igualmente num incêndio que entretanto destruiu o armazém do credor”, não se fala da possibilidade de haver um incêndio no armazém do credor, mas na realidade desse incêndio ter ocorrido.
Ou seja, não basta afirmar que ao lado do facto causal existe outro potencialmente causador que não determinaria o lesado a retroceder, a não se sujeitar ao perigo, para desconsiderar o primeiro facto causal.
Como se lê na anotação ao artigo 563º da mesma obra que acabamos de citar (p. 547): “Vaz Serra, depois de referir alguns casos em que não há uma causa adequada, afirma igualmente: «Não podendo considerar-se como causa em sentido jurídico toda e qualquer condição, há que restringir a causa àquela ou àquelas condições que se encontrem para com o resultado numa relação mais estreita, isto é, numa relação tal que seja razoável impor ao agente responsabilidade por esse mesmo resultado. O problema não é um problema de ordem física, ou, de um modo geral, um problema de causalidade tal como pode ser havido nas ciências da natureza, mas um problema de política legislativa: saber quando é que a conduta do agente deve ser tida como causa do resultado, a ponto de ele ser obrigado a indemnizar (…)».
Ora pegando nesta ideia de política legislativa, de escolha, vamos aplicar ao caso concreto: - verificou-se um dano (perda do capital investido). O dano em concreto decorre do facto do Autor ter adquirido uma obrigação sem ter sido informado que poderia a mesma ser retransmitida para o C… e do Banco de Portugal ter retransmitido a responsabilidade pelo pagamento dessa obrigação para o C…, que foi resolvido e está insolvente. Além disto, quando o Autor subscreveu a obrigação, ela era da responsabilidade do B… e o B… era uma instituição de transição que podia não conseguir valorizar a actividade que tinha recebido do C… e que podia por isso não conseguir vir a ser vendido e em função disso poderia ir à insolvência e em função disso o Autor poderia não ver devolvido o capital investido na obrigação. Porque havia esta possibilidade, e independentemente dela não se ter concretizado (isso não nos pode interessar, segundo o argumento da Recorrente) a simples existência desta possibilidade já nos diz que vamos escolher não responsabilizar o autor da omissão de informação que levou o cliente a comprar a obrigação que não foi paga, porque o cliente é pessoa que se dá ao risco. É uma opção de política legislativa:  - não protegemos quem se arrisca. 
Com a devida licença, vamos dar dois exemplos: - “não te avisei que podias perder um dente da frente nesta intervenção e perdeste-o? Queres ser indemnizado? Não, porque também podias ter morrido na intervenção e sabias disso, assumiste fazer a intervenção e assumiste o risco de morrer. Quem se arrisca para o mais tem de aceitar também o risco menor. Eu posso ter incumprido o dever de te avisar, posso ter tido culpa nisso, foi por causa disso que perdeste o dente, mas agora pagar-te um implante, não há justificação jurídica para tanto”; “escorregaste no chão molhado da praça e partiste uma perna e queres ser indemnizado? Ora essa, eu também lá tinha deixado cascas de banana espalhadas pelo chão”. Quer dizer, a argumentação da pluralidade de factos com potência causadora igual ou superior à que efectivamente produziu o dano, atribuíveis ao mesmo lesante, permitiria sempre a este encontrar uma maneira de não ser responsabilizado. Isso, seguramente, não era uma escolha válida da política legislativa.
Digamos então que, em matéria de nexo causal a primeira coisa que podemos afirmar é que ele se estabelece entre o acto/omissão e o resultado/dano, pólos que nos autos se definem como a informação prestada/omissão de informação e o não recebimento de reembolso e de remuneração pelas obrigações subscritas.
Nesta matéria, o entendimento de que a prova do nexo causal incumbe ao lesado é genérico – vejam-se a título de exemplo os acórdãos do STJ de 11.10.2018, 6.11.2018, 19.12.2018 e 24.11.2019 - como o é também o entendimento de que a demonstração do nexo causal se faz em função da matéria de facto, segundo a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, de que incumbe ao lesado provar que, se não fosse a informação omitida, não teria contratado (e em função disso, sofrido o dano).
Ora, estando provado que “30. Se o Banco-R. tivesse informado o Autor quanto à possibilidade de retransmissão da responsabilidade pelo reembolso das Obrigações B…2017 para o C.., o Autor nunca teria dado a ordem de compra de tais obrigações. (…)” e que “31. O Autor apenas aceitou comprar as Obrigações B…2017 por lhe ter sido assegurado pelo seu gestor de conta do Banco-R. que o seu reembolso era exclusiva responsabilidade do B… e que nada tinham a ver com o C… (…)”, e estando provado ainda que “32. As Obrigações em causa tiveram o seu vencimento em 8 de maio de 2017. (…)” mas que “33. O Autor não recebeu qualquer reembolso do valor das Obrigações por si subscritas, nem o valor do capital no valor global de € 196.750,00, nem o valor dos juros remuneratórios (…)”, parece pacífico que o Autor e Recorrido fez a prova do nexo causal.
Dados estes factos provados, não se consegue sustentar a afirmação de que o risco de aquisição das obrigações não poderem ser pagas por via dum insucesso de venda do B… e duma sua liquidação foi querido pelo Autor, porque o Autor, se tivesse sido correctamente informado, nunca as teria querido comprar, ou melhor, nunca as teria comprado, e portanto nunca teria sofrido o dano que concretamente sofreu nem outro equivalente por via da insolvência/insucesso de venda do B...
Ou seja, nunca conseguimos descartar a relevância da violação do dever de informação. Mas vamos admitir que da compra concreta resulta que ao comprar e com o conhecimento que tinha, o Autor manifestou uma vontade que não era detida nem condicionada pelo conhecimento da possibilidade de insolvência/insucesso B... Mas isto diz-nos que ele, Autor, teria comprado em qualquer caso, mesmo que soubesse do poder de retransmissão – devendo assim considerar-se irrelevante a omissão da informação que também não o teria detido – quando os factos provados 30 e 31 dizem exactamente o contrário?
Quer isto dizer que estamos perante um problema de prova, ou seja, não só era preciso que a formulação dos factos provados 30 e 31 não fosse a que é, que aliás não foi impugnada pela Recorrente, como era preciso que a Ré tivesse conseguido contraprovar que o Autor teria em qualquer caso comprado as obrigações.
E se assim fosse? Por acaso o perigo alternativo e superior persistia na altura em que se produziu o dano? O B… já não laborava na data de vencimento das obrigações? 
Não estando isto demonstrado, não podemos considerar que a insolvência/insucesso do B… fosse sequer causa a que se pudesse dar relevância, ao lado da violação do dever de informação, para o dano sofrido. E na realidade há diversa jurisprudência sobre a não completude do nexo causal à violação do dever de informação quando o dano se dá, ou daria de qualquer maneira, por via da insolvência entretanto efectivamente verificada. Como é claro, não é o caso dos autos.
6ª Questão:
Assim resolvida a questão 5ª, prossegue a Recorrente sustentando a falta de nexo causal para a perda dos juros remuneratórios. Alega a Recorrente que se o Autor invoca que nunca teria adquirido as obrigações em causa se soubesse do poder de retransmissão, então também nunca teria a expectativa legítima de auferir os juros remuneratórios correspondentes à aquisição.
Sobre os danos e sua indemnização, lê-se na sentença de primeira instância: “Deve, assim, o Réu ser condenado a pagar ao Autor a quantia de € 196.750,00 (cfr. facto provado nº 25) correspondente aos danos que lhe causou decorrente de violação culposa dos deveres de informação que sobre si impendiam e que determinaram a aquisição de Obrigações pelo Autor naquele montante (cfr. factos provados nºs 17 a 28, 30 e 31), o qual não foi reembolsado no seu vencimento, nem até à presente data (cfr. facto provado nº 33).  Quanto à obrigação de juros remuneratórios, venceram-se juros remuneratórios em 08/05/2016 na quantia de € 5.164,68 (€ 196.750,00 × 2,625%) e em 08/05/2017 na quantia de € 5.164,68, perfazendo o total de € 10.329,37. Quanto à obrigação de juros de mora, estamos perante um crédito de natureza meramente civil, em função da qualidade do credor, pelo que se aplica a taxa supletiva dos juros civis, taxa essa que é de 4% ao ano - art.º 806.º, nºs 1 e 3 do Código Civil e Portaria nº 291/03, de 08/04, a contar de 8 de maio de 2017, data do vencimento das Obrigações”.
Compulsadas as conclusões da alegação, não vemos que a Recorrente tenha particularmente posto em causa, sequer pedido na conclusão final, senão como decorrência das linhas argumentativas sobre a inexistência de ilicitude e de nexo causal e sobre a ilisão da presunção de culpa, que o tribunal considerasse que relativamente ao capital investido, o mesmo, a integrar indemnização, devesse ser deduzido do valor remanescente, qualquer que seja, das obrigações em causa, ainda na titularidade do Autor e Recorrido.
Podemos então prosseguir para nos centrar na questão do nexo de causalidade para os juros remuneratórios.
Muito linearmente, o ponto de partida é, como se afirma na conclusão NNN do recurso: “O Recorrido reclamava nestes autos alegados danos decorrentes da circunstância de ter adquirido as obrigações, que alega apenas ter adquirido por não saber da existência da possibilidade de retransmissão das mesmas ao C…, e não da circunstância de as mesmas terem sido retransmitidas ao C…”.
Já para o Recorrido, “A teoria da diferença, resultante do disposto no art.º 562º do Código Civil não implica necessária e automaticamente o retorno à situação patrimonial anterior por diferença com a actual2. (2 vide a este propósito Paulo Mota Pinto, in “INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO E INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO”, em geral, e em particular págs. 818 e seguintes)”, antes “a reposição da situação do lesado num estado em que previsivelmente estaria se acaso o lesante não tivesse praticado o acto danoso - e esta reposição deve, no nosso caso, ter em consideração as vantagens que o lesado sempre tiraria do investimento dos seus fundos monetários, equivalente aos juros remuneratórios”. Afirma o Recorrido que o “acto lesivo foi a omissão de informação pelo R.” para concluir que o dano deve ser medido como se “a retransmissão das Obrigações não tivesse ocorrido”. Mais diz o Recorrido que no “âmbito da responsabilidade contratual” há que ponderar “uma situação de normalidade se acaso, num cenário normal, os direitos adquiridos contratualmente pelo lesado fossem cumpridos, total ou parcialmente, de acordo com o tal juízo de normalidade, sempre no contexto do concreto ilícito cometido pela entidade lesante”.
Retomando a lúcida observação de Vaz Serra na anotação de Antunes Varela e Pires de Lima, acima, uma escolha de política legislativa – um critério jurídico com assento necessariamente social, na ponderação do equilíbrio dos interesses em jogo, e para não escaparmos a este equilíbrio justificador da escolha legislativa – vem dizer-nos que não podemos extravasar a ideia de que alguém é escolhido como responsável em função da acção ou omissão que praticou.
Então, o ponto de partida é o acto lesivo, vulgarmente, quem é que fez ou não fez o quê e quando, e que é pelas consequências do que fez ou não fez que vai ser responsabilizado e na medida dessas consequências, sendo a ideia a de reposição na situação que existiria se o acto lesivo não tivesse ocorrido.
Ora, o acto lesivo praticado pelo B… não foi a retransmissão das obrigações para o C… com a consequência de, estando este resolvido e em liquidação, não ser livre para pagar, e realmente não ter pago as prestações devidas, ou seja, o capital na maturidade e os juros remuneratórios devidos na pendência da subscrição. Isso foi o exercício da prerrogativa que o Banco de Portugal se reservou e o resultado dela.
A causa directa desse não pagamento está na actuação do Banco de Portugal, mas a actuação só tem esse efeito porque antes disso o Autor foi levado, digamos assim por facilidade expositiva, a adquirir as obrigações, mediante a informação concretamente prestada pelo B….
Então, o acto lesivo é a informação prestada/omitida em violação do dever de informação que a lei impõe ao intermediário financeiro. Se este acto lesivo não tivesse sido praticado – o que é o mesmo que dizer, se a informação verdadeira e completa tivesse sido fornecida, concretamente, se tivesse sido dito ao Autor que o BdP tinha o poder de retransmitir a responsabilidade do pagamento das obrigações para o C…, o que é que teria acontecido? Dizem-nos os factos provados 30 e 31 que o Autor não teria subscrito essas obrigações.
O estado em que o Autor estaria sem a prática do acto lesivo seria então o de, não tendo feito o negócio, ter na sua posse o capital que usou nesse negócio.
Como chegamos aos juros remuneratórios? Na contra-alegação explica-se: - é pela previsibilidade de que o lesado sempre tiraria rendimento de investir o mesmo capital, literalmente, “sempre tiraria do investimento dos seus fundos monetários, equivalente aos juros remuneratórios”.
Como já se disse acima, o ónus de prova do nexo causal compete ao lesado, e o nexo causal não é uma questão de direito mas uma questão de facto. Portanto, não podemos dizer “sempre”, precisamos, no mínimo, ter factos provados que nos digam que o lesado, se não tivesse feito este investimento porque esclarecido da verdade, faria outro do qual lhe adviria rendimento idêntico. Ou, ao menos, que faria outro do qual lhe resultaria rendimento, qualquer que fosse, caso em que poderíamos relegar para liquidação de sentença o apuramento da taxa concreta a aplicar.
Com o devido respeito, não cremos que essa prova de que o investimento sempre seria feito tenha ocorrido nos autos. No caso concreto, não há um único facto que nos diga que foi o Autor quem, querendo investir, chamou/contactou o seu gestor de conta, que em conversa lhe tenha dito que queria investir, que queria a melhor rentabilidade com a melhor segurança, nada: - não temos nenhum facto sobre a intenção do Autor, nem sequer sobre a sua história como investidor, sabendo apenas que ele investiu. Daqui não resulta que, sabendo a verdade, tivesse mantido essa intenção de investimento, que sabendo que qualquer investimento no B… podia resultar num serviço de capital a favor do universo dos credores do C… tivesse então procurado investir noutro valor mobiliário cujo emitente e responsável não estivesse de todo em todo ligado ao universo C...
Podia – devia, segundo o ónus de alegação que acompanha o ónus de prova – o Autor ter alegado senão directa e expressamente que queria investir, ao menos a sua relação com a quantia que investiu – era um dinheiro de que não precisava, era um dinheiro reservado para uma aplicação futura que entretanto melhor seria se tivesse alguma rentabilidade, fosse o que fosse – ou algum facto relativo ao seu historial de investidor que nos autorizasse presumir que o capital em causa seria destinado a investimento.
Repare-se que não podemos dizer/presumir que “se concretamente investiu é porque de certeza era para investir”, porque a pergunta a fazer aqui não é essa, mas sim, a de saber “se soubesse a verdade, se teria investido noutro produto”. Não havendo factos conclusivos sobre a resposta a esta pergunta, fica aberta a possibilidade de pensarmos que o Autor poderia então decidir comprar mais uns veículos para a sua empresa de distribuição, ou poderia ter decidido que mantinha o dinheiro no cofre ou que ia comprar um carro novo ou um barco à vela. 
Não cremos pois que tenha sido feita prova de que, se não tivesse o Autor sido enganado, teria investido na mesma o capital noutro produto financeiro que lhe daria a mesma, aproximada, ou mesmo não aproximada, remuneração.
Procede assim nesta parte o recurso, não sendo devida a condenação da Ré no pagamento de juros remuneratórios.
O resultado do engano foi ter o Autor subscrito as obrigações, entregando o capital correspondente, sendo que se o não tivesse feito por não ter sido enganado, então teria conservado a disponibilidade do mesmo capital, ou seja, a perda de disponibilidade, como dano, reporta-se ao próprio dia da subscrição.
Repare-se que a sentença recorrida decidiu condenar a Ré no pagamento de juros moratórios a partir do prazo de vencimento da obrigação (Maio de 2017), como se o negócio devesse ser cumprido.
Ora, nas conclusões da contra-alegação, o Recorrido pede subsidiariamente que, a proceder o recurso nesta parte, seja então a Recorrente condenada a pagar juros de mora desde a data de privação do capital em função da eliminação do resultado do acto lesivo. Isto coincide com o que dizíamos: - se o Autor, como em factos 30 e 31, não subscreveria as obrigações se tivesse sido cumprido o dever de informação, então no dia em que as subscreveu não as teria subscrito e o capital que entregou não teria entregue, conservando a sua disponibilidade. Os juros moratórios servem por natureza para compensar a indisponibilidade ocorrida.
Repare-se ainda que o pedido subsidiário se integra no pedido feito à inicial – “(…) perfazendo a quantia total de €218.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva contados desde 15 de julho de 2015 (…)” – nada de novo nele havendo e nada obstando ao seu deferimento, nada tendo a Recorrente oposto especificamente e em face da análise que fizemos nesta questão.
Nestes termos, entende-se que procedendo parcialmente o recurso, deve também alterar-se, por procedência do pedido subsidiário feito no recurso, o termo inicial da contagem dos juros de mora, fazendo-se coincidir o mesmo com o dia de subscrição das obrigações.
Analisadas todas as questões e em conclusão, procede parcialmente o recurso, devendo manter-se a sentença na parte em que condenou a Ré e ora Recorrente a pagar ao Autor a quantia de € 196.750,00 (cento e noventa e seis mil setecentos e cinquenta euros) e revogar-se na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 10.329,37 de juros remuneratórios, desta quantia se absolvendo a Ré, e devendo ainda revogar-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar juros de mora contados desde 8.5.2017, nesta parte se substituindo pelo presente acórdão que condenará a Ré a pagar juros de mora civis às taxas legais sucessivamente em vigor, vencidos e vincendos e calculados sobre a quantia de € 196.750,00 (cento e noventa e seis mil setecentos e cinquenta euros), desde 15.7.2015 até integral pagamento.
Tendo decaído ambas as partes, ambas são responsáveis pelas custas, tanto em primeira quanto em segunda instâncias, em proporção, a qual se fixa em 97% para a Recorrente e 3% para o Recorrido – artigo 527º nº 1 e 2 do CPC. É que, considerando o pedido inicial, no seu conjunto, e aquilo que o presente acórdão reconhece, a diferença é, em termos numéricos, de cerca de 10% (pedidos cerca de 218 mil e reconhecidos cerca de 197 mil) mas esta percentagem diminui quando consideramos o aumento de quase dois anos de juros de mora (8.5.2017 para 15.7.2015), calculados sobre 197 mil, num valor aproximado de 15 mil euros.
V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam conceder parcial provimento ao recurso e em consequência:
- mantêm a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de €196.750,00 (cento e noventa e seis mil setecentos e cinquenta euros);
- revogam a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de €10.329,37 de juros remuneratórios, desta quantia o presente acórdão absolvendo a Ré;
- revogam ainda a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor juros de mora contados desde 8.5.2017, nesta parte se substituindo pelo presente acórdão que condena a Ré a pagar juros de mora civis às taxas legais sucessivamente em vigor, vencidos e vincendos e calculados sobre a quantia de €196.750,00 (cento e noventa e seis mil setecentos e cinquenta euros), desde 15.07.2015 e até integral pagamento.
- condenam as partes em custas, tanto em primeira como em segunda instância, na proporção do respectivo decaimento, que fixam em 97% (noventa e sete por cento) para a Ré e Recorrente, e em 3% (três por cento) para o Autor e Recorrido.
Registe e notifique.

Lisboa, 19 de Novembro de 2020
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues
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[1] Com aproveitamento do relatório da sentença recorrida.
[2] Facto provado 20 “(…) a única questão que o A. levantou foi se as Obrigações eram do C… ou eram do B…, bem como se haveria alguma hipótese de a responsabilidade pelo pagamento da emissão ser do C… em lugar do Banco-R., (art.ºs 60º e 61º da p.i.); 31. O Autor apenas aceitou comprar as Obrigações B… 2017 por lhe ter sido assegurado pelo seu gestor de conta do Banco-R. que o seu reembolso era exclusiva responsabilidade do B… e que nada tinham a ver com o C…. (art.ºs 110º e 111º da p.i.)” (negritos nossos).
[3] Vamos admitir aqui que o cenário é de execução de ordem, tal como defendido no parecer que foi junto aos autos, além do mais porque o Autor também não faz questão nisto, na medida em que sustenta que mesmo na execução de ordem haveria de ter sido prestada a informação em falta.