Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7952/2007-1
Relator: FILOMENA CLEMENTE LIMA
Descritores: RECLAMAÇÃO
EFEITO DO RECURSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/24/2007
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECLAMAÇÃO
Decisão: ATENDIDA
Sumário: Estando em causa decisão que indeferiu a produção de depoimento de parte, a retenção do recurso não o torna absolutamente inútil, mesmo que venha a ser julgado procedente, apenas podendo desencadear a repetição de actos processuais, nomeadamente a repetição do próprio julgamento com vista à produção do depoimento de parte indeferido.
Quanto à ordem de realização de uma perícia, pretendendo-se com o recurso evitar a sua realização, afigura-se que a retenção do recurso fará perder em absoluto a sua utilidade, depois de ter sido a mesma realizada.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:
I.
Na acção com processo especial n.º 1931/05.7 TBFUN do 3º Juízo Cível do Funchal vieram (A) e outros reclamar do despacho que reteve o recurso que interpusera determinou a realização de uma perícia requerida pela contraparte.
Os reclamantes efectivamente tinham interposto recurso desta decisão, agravo que foi admitido com subida diferida e efeito meramente devolutivo nos termos dos art.ºs 680º,n.º1, 685º,n.º1, 735º,n.º1, 736º e 740º CPC.

Reclamam os requerentes nos termos do art.º 688º CPC pedindo a sua subida imediata e em separado para o que, em síntese, referem :
A retenção do agravo torná-lo-ia absolutamente inútil nos termos dos art.ºs 733º, 734º,n.ºs 1 e 2 e 737º,n.º1 e 740º CPC.
Foi proferido despacho a sustentar a decisão reclamada, mantendo o regime do recurso e a admitir a reclamação.

II.
A subida imediata há-de verificar-se nos casos em que, para além dos expressamente indicados no art.º 734º n.º1 CPC, a retenção do agravo o torne absolutamente inútil (n.º2).
Há unanimidade na jurisprudência, em todos os domínios da lei adjectiva – civil, laboral e penal – na definição das situações em que a retenção de um recurso o torna absolutamente inútil: a retenção há-de produzir um resultado irreversível quanto ao recurso, retirando-lhe a eficácia dentro do processo, não bastando, por isso, uma inutilização de actos processuais para justificar a subida imediata do recurso; empregando a lei o advérbio “absolutamente”, só podem considerar-se enquadradas no referido preceito as situações em que se possa afirmar, usando linguagem comum, que o recurso já não servirá para nada se não subir imediatamente, o que não se verifica, quando da retenção do recurso apenas decorra uma situação mais gravosa paras as partes, um atraso no processo, ou a inutilização e consequente repetição de alguns actos processuais; a inutilidade absoluta, como condição da subida imediata do agravo, diz respeito aos efeitos sobre o recurso e não sobre a marcha do processo.

Um recurso é absolutamente inútil quando da sua eventual procedência o recorrente já não puder vir a obter qualquer efeito útil do mesmo.
“Mas isso só ocorre quando a eficácia do despacho de que se recorre produz um resultado irreversível oposto ao efeito jurídico pretendido, não abrangendo os casos em que a procedência do recurso acarrete a inutilização dos actos processuais praticados.
Uma coisa é a inutilização do recurso, outra será a inutilização dos actos processuais entretanto praticados, em caso de provimento daquele. Só a primeira situação é consagrada no n.º 2 do artigo 407.º” ( Proc. n.º 8901/2004- www.dgsi.pt).

Está em causa recurso de despacho que ordenou a realização de uma perícia .
Não se questiona aqui a utilidade ou necessidade da mesma para fazer a prova dos factos ao contrário do que se refere na decisão de sustentação.
Essa questão reporta-se ao objecto do recurso e não da reclamação.
O que se questiona é se haverá perda de produção do efeito útil com a subida diferida do recurso e com a sua eventual apreciação juntamente com o despacho que seja interposto da decisão final.
Mas, entenda-se, que se não perca em definitivo, ou seja, se a apreciação diferida do recurso e a sua eventual procedência ditar que deve ser admitido o referido meio de prova, o que poderá determinar a anulação de actos processuais com vista à sua produção em sede de audiência, então a retenção do recurso torna-o apenas inconveniente em termos de celeridade e economia processual mas não lhe retira a utilidade em absoluto já que a anulação de actos processuais é uma das consequências normais do recurso.
No caso da decisão relativa ao depoimento de parte, a retenção do recurso não o torna absolutamente inútil, mesmo que venha a ser julgado procedente, apenas podendo desencadear a repetição de actos processuais, nomeadamente a repetição do próprio julgamento com vista à produção do depoimento de parte indeferido.
Quanto à ordem de realização da perícia requerida, na formulação decretada, pretendendo-se com o recurso evitar a sua realização, afigura-se que a retenção do recurso fará perder em absoluto a sua utilidade, depois de ter sido a mesma realizada. Assim não seria se a mesma tivesse sido indeferida já que a sua realização posterior sempre viria a ter utilidade para o processo mesmo com o sacrifício de actos que pudessem ter de ser anulados, o que se tem entendido ser um dos efeitos normais dos recursos.

Agora, pretendendo os reclamantes evitar a realização da perícia, depois de ela feita não se vê qual a utilidade do recurso, nessa perspectiva, pois na vertente da sua validade e utilidade como meio de prova sempre aquela ficaria intocada.
Pode dizer-se que o efeito meramente devolutivo do recurso é que poderá inviabilizar a realização do referido interesse dos reclamantes mas não está em causa o efeito fixado nem sequer compete ao Presidente da Relação pronunciar-se sobre ele por não caber no objecto do incidente de reclamação que apenas permite reapreciação da decisão de não admissão ou de retenção do recurso.

Nestes termos e com tais fundamentos, decide-se atender a reclamação formulada pela reclamante e determinar a subida imediata do recurso, em separado.

Sem custas
Lisboa, 24/09/07


a) M.ª Filomena O. G. Clemente Lima, Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa.