Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | AMÉLIA SOFIA REBELO | ||
| Descritores: | DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA ATRASO NO CUMPRIMENTO IMPOSSIBILIDADE DE CONTINUAR A SATISFAZER AS SUAS OBRIGAÇÕES ACTIVOS SUPERIORES AO PASSIVO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/31/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I - A verificação do facto índice de insolvência previsto pela al. b) do nº 1 do art.º 20º basta-se com uma situação de mora/atraso no cumprimento desde que, pelo montante do crédito, no conjunto do passivo do devedor ou de quaisquer outras circunstâncias, tal evidencie a impossibilidade de continuar a satisfazer os seus compromissos, sem que exija que tal situação se verifique com todas as obrigações assumidas/contraídas pelo devedor. II – O montante de cerca de €68.000,00 do crédito do requerente, em incumprimento desde há cerca de 10 anos, e o valor dos rendimentos de que os devedores dispõem mensalmente, no montante de €2.000,00 mensais, não permitem senão concluir que o não cumprimento daquela dívida revela situação de penúria e de impossibilidade, atual, de estes satisfazerem pontualmente as suas obrigações por falta de liquidez para satisfazer a totalidade das dívidas vencidas. III – Recaem sobre os devedores e não anulam o efeito indício que decorre das circunstâncias acima elencadas as vicissitudes emergentes da discussão judicial da titularidade do imóvel sobre o qual os devedores constituíram hipoteca para garantia do crédito do requerente e que, alegadamente, tem obstado à sua satisfação por via da dação em pagamento ou da venda do imóvel em execução. IV - O critério de insolvência previsto pelo art.º 3º nº 2 do CIRE – do balanço - tem a sua aplicação legalmente restringida às pessoas coletivas e aos patrimónios autónomos e, V- Como tem vindo a ser sobejamente afirmado, a existência de ativo superior ao passivo não constitui pressuposto legal de solvabilidade nem sequer indício como tal legalmente previsto pois que, ainda que assim suceda, o devedor está insolvente se, por ausência de liquidez, estiver impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam as juízas na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa: I - Relatório 1. Por requerimento de 08.07.2022 Oitante, S.A. instaurou ação especial de insolvência contra F. e A., casados entre si, pedindo sejam declarados insolventes. Fundamentou o pedido alegando que por deliberação do Banco de Portugal sucedeu nos direitos e obrigações do Banco Banif, SA e, nessa qualidade, é titular de direito de crédito sobre os requeridos no montante de €68.330,51, sendo €46.607,91 a título de capital e o demais a título de juros vencidos, juros de mora, comissões, despesas contratuais e outras despesas, emergente de contrato de empréstimo com hipoteca conexo ao crédito à habitação celebrado em 07.02.2012, que aqueles deixaram de cumprir em 15.06.2012; que os requeridos são devedores a várias instituições bancárias e à Autoridade Tributária, que apenas possuem o imóvel objeto da hipoteca constituída para garantia do seu crédito, sobre o qual incide outra hipoteca, inscrita em 15.09.2009 a favor de LC Asset 1, SARL para garantia do montante máximo de €117.094,38. Alegou não dispor da totalidade dos elementos previstos pelo art.º 23º, nº 2 al b) do CIRE e requereu a citação dos requeridos e a sua notificação para indicarem os seus cinco maiores credores, as ações judiciais contra si movidas, e “os seus elementos contabilísticos bastantes para comprovar o seu ativo e passivo”. Juntou documentos, incluindo certidão predial de imóvel inscrito em benefício dos requeridos, e arrolou uma testemunha. 2. Citados, os requeridos deduziram oposição ao pedido por impugnação alegando que não se encontram em situação de insolvência porque na execução nº 36/13.1TBLNH instaurada em 14.01.2013 não foi por culpa sua que a requerente ainda não foi paga mas sim porque foram deduzidos embargos de terceiro por M. em 01.02.2018 sem que nos mesmos haja sentença ou sequer marcação para julgamento; que têm um empréstimo à habitação no Millenium BCP que pagam regularmente, e desconhecem a existência de qualquer outra dívida ou processo executivo; o património dos requeridos é composto pelo prédio penhorado à ordem daquela execução, com valor patrimonial de €95.024,30 mas valor real de mercado de €190.000,00, dois veículos automóveis (..-CL-.. e ..-67-..), um prédio rústico e outro urbano, pelo que excede e muito o seu passivo. Concluíram pela improcedência do pedido, indicaram testemunhas e juntaram documentos. 3. Designada e realizada audiência de julgamento, por sentença proferida em 27.10.2022 a ação foi julgada procedente e declarada a insolvência dos requeridos. 7. Inconformados, os requeridos recorreram da sentença, apresentando alegações com as seguintes conclusões: I – Os Requeridos recorrem da sentença que os declarou insolventes por não terem logrado provar a sua solvabilidade. II – Os Requeridos e Recorrentes entendem que o seu ativo é manifestamente superior ao seu passivo. III – O Tribunal a quo presume a insolvência dos devedores, mas afasta uma a uma as alíneas do artigo 20º nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. IV – Da própria sentença consta que não se apuraram fatos que permitam concluir que os requeridos suspenderam, de forma generalizada, o cumprimento de todas as obrigações vencidas (…) pelo que temos por não preenchido o índice previsto na alínea a) do nº 1 do Artigo 20º. V – Também a alínea b) do mesmo artigo não se deve dar como assente, uma vez que a divida à Requerente é de 68.000,00€ e o bem hipotecado para garantir o bom pagamento é de, pelo menos, 147.000,00€. VI – Os Requeridos não dissiparam os seus bens ou contraíram outras dividas ou créditos, pelo que não se verifica o previsto na alínea d) do supra citado artigo 20º do CIRE VII – Tal como se afirma na sentença agora recorrida, “A alínea e) do nº1 do mencionado artigo 20º do CIRE não se pode considerar assente, uma vez que o imóvel está penhorado, apenas não foi vendido e não foi pesquisada a existência de outros bens que, comprovadamente, existem”. VIII – Não ficou demonstrado nos autos o preenchimento de uma ou mais alíneas do artigo 20º do CIRE. Apenas ficou provado o crédito da Requerente. IX – Crédito esse que se fixou em cerca de 68.000,00€, tendo o imóvel hipotecado e penhorado o valor de 147.000,00€, ou seja, mais do dobro. X – A lei faz depender a declaração e insolvência da impossibilidade de cumprir pontualmente a generalidade das obrigações e no caso agora em apreço não há. XI – A sentença ora recorrida admite que o ativo dos Recorrentes é superior ao passivo. XII – Não se verifica nenhum dos factos elencados nas diferentes alíneas do nº 1 do artigo 20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, pelo que os Requeridos não devem ser declarados Insolventes, devendo decisão de que agora se recorre ser revogada. 8. A recorrida apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões: 1. Ficou demonstrado que os Requeridos tinham conhecimento do crédito detido pela Oitante, S.A., bem sobre estes. 2. Bem como confessaram estar em incumprimento, e tinham pleno conhecimento. 3. Não fizeram qualquer prova que estavam a cumprir com a generalidade das suas obrigações, aceitando estarem em situação prolongada de incumprimento. 4. Inclusivamente indicam a existência de outras obrigações em incumprimento, para além daquele perante a Oitante, S.A.. 5. Ficou provado que o incumprimento remonta a 2012, ou seja, volvidos 10 anos, sem qualquer demonstração/prova de serem capazes de fazer face às suas obrigações. 6. Defenderam-se os Requeridos num alegado património capaz de fazer face à generalidade das obrigações. 7. Ora sucede que não se fez prova da existência desse património. 8. Tão pouco consubstancia para efeitos de demonstração da situação de solvência, a alegada ou mesmo demonstração de existência de património, quando o mesmo não se converte em liquidez. 9. A existência por si só de património não corresponde a um cumprimento das obrigações. 10. Neste caso, nem sequer se fez demonstração da existência de património capaz de fazer face à generalidade das obrigações numa perspetiva aritmética. 11. Assim, apresenta-se como claro que os Requeridos estão numa situação de Insolvência, não tendo feito prova da sua situação de solvência. 12. Desta forma a Sentença Proferida não merece qualquer reparo ou censura. II - Objeto do recurso: Sem perder de vista que o objeto do recurso é antes de mais o mérito da crítica que vem dirigida à decisão recorrida – recurso reponderação -, é consensual que é delimitado pelo objeto do processo e definido pelas conclusões das alegações, destina-se a reapreciar e, se for o caso, a revogar, a modificar ou a anular decisões proferidas, ficando vedado a apreciação de novos pedidos, bem como de novas causas de pedir em sustentação do pedido ou da defesa, sem prejuízo das questões cuja apreciação resulte prejudicada pela solução dada às que a precedem ou de outras cujo conhecimento oficioso se imponha nos temos do art.ºs 608º, nº 2, ex vi art.º 663º, nº 2 do CPC, não estando o tribunal adstrito à apreciação de todos os argumentos alegados pelas partes mas apenas das questões de facto ou de direito que, contidas nos elementos essenciais da causa, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, sendo o tribunal livre na determinação e interpretação das normas jurídicas aplicáveis. Nestes termos, considerando o teor da decisão recorrida e das conclusões dos recorrentes, pelo presente recurso cumpre apreciar se os factos assentes pelo tribunal recorrido integram os pressupostos legais da situação de insolvência. III – Fundamentos de Facto 1. A factualidade a considerar pela Relação corresponde à descrita na decisão de facto da sentença recorrida, posto que não vem impugnada nas alegações de recurso, com os aditamentos que infra se determinam nos termos e com fundamento no art.º 662º, nº 1 do CPC. O tribunal recorrido proferiu a seguinte decisão de facto: Com interesse para a decisão da causa, encontram-se provados os seguintes factos: 1. Por deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 20 de Dezembro de 2015, foi constituída a sociedade Naviget, S.A. – posteriormente denominada Oitante, S.A. -, sociedade veículo de gestão de activos dos direitos e obrigações correspondentes a activos do BANIF – Banco Internacional do Funchal, S.A. – adiante abreviadamente designado por BANIF – conforme documentos 4, 5 e 6 juntos com a petição inicial e cujo teor se dá como integralmente reproduzido; 2. Pela deliberação referida em 1. foi determinada a transferência para a requerente a gestão dos activos do BANIF; 3. No exercício da sua atividade creditícia, o então BANIF – Banco Internacional do Funchal, S.A., ao qual sucedeu a Requerente, por Contrato de Empréstimo Crédito Conexo ao Crédito à Habitação, em 07 de Fevereiro de 2012, celebrado com os Requeridos F. e A., concedeu-lhes a título de empréstimo a quantia de Euros 47.000,00 (quarenta e sete mil euros), pelo prazo de dezanove anos e oito meses – conforme documento junto como documento 7 com a petição inicial e cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 4. A quantia mutuada foi efetivamente entregue aos Requeridos F. e A., tendo-se confessado devedores perante o banco cedente – conforme documento junto como documento 7 com a petição inicial e cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 5. A taxa de juro contratada foi Euribor a três meses, acrescida de spread de 2,75% e em caso de mora ou incumprimento acresceria uma sobretaxa de 4% ao ano – conforme documento junto como documento 7 com a petição inicial e cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 6. Por escritura denominada de “Hipoteca”, celebrada na mesma data, em garantia do pagamento das responsabilidades emergentes do contrato de empréstimo, referido em 3 e 4, os requeridos constituíram a favor da Requerente hipoteca sobre o prédio urbano sito na Areia Branca, freguesia e concelho da Lourinhã, inscrito na matriz sob o artigo 5… e descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã sob o n.º 2… freguesia da Lourinhã – cfr. documento 8 junto com a petição inicial cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 7. A hipoteca encontra-se registada sob a AP. 336 de 2012/02/07 e cuja transmissão do crédito encontra-se registada pela AP. 2133 de 2020/07/21 – cfr. documento 9 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 8. Os requeridos deixaram de proceder ao pagamento das prestações a que estavam obrigados, em 15.06.2012; 9. À data da entrada em juízo da petição inicial encontrava-se em dívida a quantia de €46.607,91 (quarenta e seis mil, seiscentos e sete euros e noventa e um cêntimos), a título de capital vencido; 10. Para além dos juros de mora, os requeridos devem ainda à requerente as seguintes quantias: a título de Comissões: Euros 918,42; a título de Despesas contratuais: Euros 112,80; e Outras despesas: Euros 835,48; 11. Na sequência do referido em 8 a 10, a Requerente intentou em 14.01.2013, ação executiva 36/13.1TBLNH, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo de Execução de Loures – Juiz 3, na qual não foi, ainda, ressarcida da quantia exequenda; 12. Sobre o imóvel referido em 6. encontra-se registada a penhora do processo executivo referido em 11., sob AP. 1205 de 2013/05/21 – cfr. documento 9 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 13. Para além da ação executiva referida em 11 e 12, o imóvel mencionado em 6. encontra-se, ainda, onerado com uma hipoteca registada pela AP. 319 de 2009/09/15, que assegura o capital máximo de Euros 117.094,38 – cfr. documento 9 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 14. A hipoteca referida em 13. encontra-se, actualmente, e na sequência de cessões de crédito, registada a favor da LC Asset 1 S.À.R.L. (Société à Responsabilité Limitée) – cfr. documento 9 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 15. No processo executivo referido em 11. foram, em 01.02.2018, deduzidos Embargos de Terceiro por M., invocando a aquisição do imóvel por usucapião, nos quais não se encontra marcada data para Audiência de Julgamento, nem foi proferida sentença; 16. Do portal das finanças consta que a requerida A. é proprietária de dois veículos automóveis: Citroen Berlingo com a matrícula ..– CL –.., com data de 17.11.2006 e Audi A6, de matrícula ..– 67 –.., com data de 27.05.1998, conforme consta de detalhes dos veículos juntos como documentos 1 e 2 com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 17. A requerida A. é a titular do Rendimento Tributável constante da Autoridade Tributária, em propriedade plena, dos seguintes imóveis, conforme cadernetas de registo predial juntas com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido: - Prédio rústico, denominado de “Azinhaga”, com a área total de 1,164 hectares, composto por vinhas, macieiras, pereiras e cultura arvense, inscrito na matriz predial rústica da União de Freguesias de Lourinhã e Atalaia, concelho de Lourinhã, distrito de Lisboa, sob o artigo …, secção X, com o valor patrimonial, determinado em 1989, de €206,52; - Prédio urbano, destinado a habitação, com dois pisos e três divisões, sito na Rua …, 2, Areia Branca, Lourinhã, inscrito na matriz predial urbana da União de Freguesias de Lourinhã e Atalaia, concelho de Lourinhã, distrito de Lisboa, sob o artigo …, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lourinhã, com o n.º 5…, com o valor patrimonial, determinado em 2019, de €95.109,64; 18. Os Requeridos têm um empréstimo à habitação no Millennium BCP, conforme declaração junta com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, pagando, pelo mesmo a prestação mensal de €388,14; 19. O imóvel referido em 6. tem o valor patrimonial determinado pela Autoridade Tributária em 2021, de €95.024,30, conforme caderneta predial junta com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 20. O imóvel referido em 6. foi avaliado, pela requerente, em €147.000,00; 21. O requerido Fernando Feijão é motorista de pesados, auferindo mensalmente cerca de €1.700,00 e a requerida encontra-se reformada por invalidez, recebendo de reforma cerca de €300,00. * Com interesse para a decisão da causa não se provou que: a) Para além do imóvel referido em 6., os Requeridos não são proprietários de nenhum outro bem imóvel, nem de qualquer bem móvel; b) Os Requeridos não têm qualquer tipo de crédito bancário ou de outra natureza, por falta de meios próprios e de património; c) O imóvel referido em 6. tem o valor real de mercado de 190.000,00€ (cento e noventa mil euros). 2. No uso do poder-dever pevisto pelo art.º 662º, nº 1 do CPC a Relação pode – e deve - alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Oficiosidade que se cumpre para aditar ao ponto 6 a data e o título da inscrição da aquisição do imóvel aí descrito em benefício dos recorrentes (conforme certidão predial junta com a petição inicial da insolvência), e para alterar o teor do ponto 18 através da inserção do segmento ‘são titulares de um empréstimo de crédito hipotecário referente ao imóvel sito na Rua …, nº 2 em substituição do segmento ‘têm um empréstimo à habitação’, referência (à habitação) que não encontra suporte no documento nº 5 junto com a contestação, e surge indiciariamente contrariado pelas declarações da testemunha C. consignadas na motivação da decisão de facto, na parte em que, referindo-se à casa em que os requeridos moram, declarou que esta era da mãe da requerida e ficou para os requeridos, declarações que por sua vez são reforçadas pelo teor da certidão matricial do prédio rústico descrito sob o ponto 17, da qual consta que adveio à titularidade da requerida por escritura publica de doação. Nestes termos, alteram-se os pontos 6 e 18, que passam a constar com a seguinte redação: 6. Por escritura denominada de “Hipoteca”, celebrada na mesma data, em garantia do pagamento das responsabilidades emergentes do contrato de empréstimo, referido em 3 e 4, os requeridos constituíram a favor da Requerente hipoteca sobre a o prédio urbano sito na Areia Branca, freguesia e concelho da Lourinhã, inscrito na matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã sob o n.º … freguesia da Lourinhã e aí inscrito em benefício daqueles em 31.10.1990 por “Compra por arrematação judicial por negociação particular.” 18. De acordo com o alegado pelos Requeridos em sede de oposição e declaração de 29.07.2022 emitida pelo Banco Millennium BCP que juntaram, os requeridos têm um empréstimo à habitação no Millennium BCP “referente ao imóvel sito na Rua …, nº 2”, pagando pelo mesmo a prestação mensal de €388,14; IV – Fundamentos de Direito 1. Vem o presente recurso da sentença que, julgando procedente a ação, declarou a insolvência da recorrente com fundamento legal na al. b) do nº 1 do art.º 20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)[1], assente, em síntese, no “montante e a longevidade dos incumprimentos, conjugado com os valores que os requeridos devem e o património de que dispõem e a ausência de rendimentos suficientes para pagarem o passivo, na íntegra, levam a que se possa concluir que os requeridos não dispõem de meios disponíveis para proceder ao pagamento integral e imediato dos débitos em causa, demonstrando que não está em condições de satisfazer o seu passivo.” Cumpre então apreciar se ocorre erro de julgamento, que passa exclusivamente por aferir se, conforme pretendem os recorrentes, o substrato fatual assente pelo tribunal recorrido impõe concluir pela não verificação da situação de insolvência. 2. Nos termos do art.º 3º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas é considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas. Nos termos do nº 2, as pessoas coletivas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente são ainda consideradas insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao ativo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis, excluindo-se da valorização do ativo a rubrica do trespasse do estabelecimento, critério - do balanço - que tem a sua aplicação legalmente restringida às pessoas coletivas e aos patrimónios autónomos. De acordo com o primeiro e principal critério e que decorre da literalidade da norma, – da liquidez, cash flow ou tesouraria do devedor - o que essencialmente releva na caracterização da insolvência é a impossibilidade de cumprimento pontual das dívidas, impossibilidade essa que é apreciada objetivamente, por falta de liquidez e/ou de crédito do devedor, independentemente do conjunto das causas que, uma vez reunidas, determinaram essa situação. Conforme critério adotado pelo legislador, dita a situação de insolvência do devedor a ausência de liquidez suficiente para pagar as suas dívidas no momento em que se vencem.[2] Efetivamente, ainda que no CIRE o legislador tenha omitido a referência à pontualidade como característica essencial do cumprimento das obrigações vencidas, tanto não significa que o legislador passou a desconsiderar o tempo e o modo de cumprimento convencionados entre as parte enquanto elementos inerentes ao conceito de cumprimento que se extrai dos art.ºs 406º, nº1, 762º, nº 1, 763º, nº 1, 781º e 804º do Código Civil. É que só dessa forma se satisfaz, na plenitude, o interesse do credor, e se concretiza integralmente o plano vinculativo a que o devedor está adstrito. Neste sentido não interessa somente que ainda se possa cumprir num momento futuro qualquer, importando igualmente que a prestação ocorra no tempo adequado e, por isso, pontualmente.[3] Dito de outro modo, a lei não exige que o montante em dívida ou as circunstâncias do incumprimento revelem a impossibilidade, definitiva e em absoluto, de o devedor satisfazer a totalidade da suas obrigações. É suficiente que os factos indiciadores revelem a impossibilidade de o devedor satisfazer tais obrigações ‘ponto por ponto’ nos termos acordados com os credores, isto é, a lei basta-se com uma situação de mora/atraso no cumprimento desde que, pelo seu montante, no conjunto do passivo do devedor ou de quaisquer outras circunstâncias (atinentes com a concreta atividade exercida, rendimentos auferidos, e despesas a cargo), tal evidencie a impossibilidade de continuar a satisfazer os seus compromissos. Não exige também que tal situação se verifique com todas as obrigações assumidas/contraídas pelo devedor, nem tão pouco exige a demonstração de pluralidade de dívidas vencidas e não pagas.[4] 3. Por sua vez, qualquer credor, em relação a devedor que considere insolvente, pode requerer em juízo seja o mesmo declarado insolvente verificando-se alguns dos factos indícios de insolvência previstos pelo art.º 20º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, designadamente, e fazendo referência ao fundamento considerado pela sentença recorrida, Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações (al b). Nesta tarefa, tratando-se de insolvência requerida por credor ou outro interessado, é sobre o requerente da insolvência que recai o ónus de alegar e demonstrar algum ou alguns dos factos indiciadores da situação de insolvência enunciados nas diversas alíneas do art.º 20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, dos quais resultam presunção legal de insolvência. É consensual na doutrina e na jurisprudência que “o legislador, através da enumeração desses factos-índice, pretendeu enunciar os critérios indispensáveis à identificação da insolvência e, por isso, o credor interessado na declaração da insolvência tem que demonstrar que o devedor se encontra impossibilitado de cumprir as suas obrigações, provando que tal impossibilidade se manifesta através de sintomas inequívocos que o legislador descreve.”[5] Os factos indício da situação de insolvência são assim designados, não por referência a um qualquer juízo probatório sumário dos factos em que se suporta a verificação da situação da insolvência, mas por referência ao valor presuntivo da situação de insolvência que o legislador atribuiu e/ou reconheceu a factos que a esse título expressamente previu, e o que é unanimemente aceite pela doutrina e jurisprudência, “tendo precisamente em conta a circunstância de, pela experiência da vida, manifestarem a insusceptibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações, que é a pedra de toque do instituto.[6] [7] Técnica legislativa que se justifica para obviar à grave dificuldade que os terceiros com legitimidade para requerer a insolvência do devedor teriam em demonstrar a efetiva ausência ou insuficiência de meios do devedor para satisfazer as suas obrigações vencidas (ou/e, no caso das pessoas coletivas, a superioridade do valor do passivo em relação ao ativo). Como defendem Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda em anotação ao art.º 20º do CIRE[8], O estabelecimento de factos presuntivos da insolvência tem por principal objectivo permitir aos legitimados o desencadeamento do processo, fundados na ocorrência de alguns deles, sem haver necessidade de, a partir daí, fazer a demonstração efectiva da situação de penúria traduzida na insusceptibilidade de cumprimento das obrigações vencidas, nos termos em que ela é assumida como característica nuclear da situação de insolvência (…). Caberá então ao devedor (…) trazer ao processo factos e circunstâncias probatórias de que não está insolvente, pese embora a ocorrência do facto que corporiza a causa de pedir. Por outras palavras, cabe-lhe ilidir a presunção emergente do “facto-índice”, solução esta aliás expressamente consagrada no nº 3 do art.º 30º. Conforme alerta Soveral Martins[9], Não se trata, na verdade, de outras tantas situações de insolvência que devam ser somadas às previstas no art.º 3.º, mas sim de meros requisitos de legitimidade e de «factos-índices» ou presuntivos da insolvência (…). O que bem se compreende pois, conforme refere Catarina Serra, “existem casos de incumprimento sem impossibilidade de cumprimento (o devedor não cumpre porque não quer ou porque discorda da exigibilidade da dívida).[10] 4. Com aquele desiderato, quer para sustentar a sua legitimidade para o pedido quer para o fundamentar, a requerente invocou crédito que detém sobre os recorrentes emergente de contrato de empréstimo com hipoteca celebrado em fevereiro 2012, e o incumprimento, logo em junho de 2012, do serviço de dívida por ele gerado, de reembolso mensal do capital e pagamento dos juros remuneratórios acordados, incumprimento que deu origem a crédito vencido superior a €68k, que os recorrentes confessaram dever ou ao qual nada opuseram, mais aceitando a pendência de execução para a sua cobrança coerciva desde 2013, sem que até à data aquele tenha sido satisfeito. Mais alegaram que sobre si recai crédito hipotecário titulado pelo Banco BCP e que cumprem mensalmente em prestações no valor mensal, em 2022, de cerca de €390,00 e, para além deste, nada opuseram contra a consideração, em sede de fundamentação da sentença recorrida, de uma outra e primeira hipoteca constituída em 2009 sobre o prédio descrito sob o ponto 6. para garantia de crédito sobre os recorrentes até ao montante máximo assegurado de cerca de €117.000,00[11], atualmente registada a favor de LC Asset 1, SARL. Com fundamento nas declarações prestadas pelo recorrente, mais foi julgado assente que os recorrentes auferem cerca de €2.000,00 de rendimentos mensais. O conjunto destes factos, aos quais a decisão recorrida reconheceu valor presuntivo da situação de insolvência, permite desde já concluir pelo acerto do julgamento de direito da sentença recorrida que, conforme dela consta, julgou verificada a situação de insolvência com fundamento na al. b) do nº 1 do art.º 20º que, contrariamente à posição construída pela recorrente, vale por si só como facto índice presuntivo da impossibilidade de satisfação de dívidas vencidas independentemente da verificação em processo de execução da ausência ou insuficiência de bens para satisfação de dívida exequenda que, conforme consta previsto pela al. e) do nº 1 do art.º 20º, constitui fundamento autónomo de situação de insolvência. Com efeito, sem prejuízo da sua verificação cumulativa no caso concreto, cada uma das alíneas do art.º 20º vale per si como facto índice de insolvência e não exige mais do que a verificação dos pressupostos legais que a integram. Como acima se expôs, O que verdadeiramente releva é a insuscetibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciem a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. Não exige que tal situação se verifique com todas as obrigações assumidas/contraídas pelo devedor, nem tão pouco exige a demonstração de pluralidade de dívidas vencidas e não pagas. Referindo-se à previsão da al. b) do nº 1 do art.º 20º, escreve Menezes Leitão que [N]este caso, a insolvência não necessita de uma cessação generalizada de pagamentos, podendo resultar apenas de algumas faltas de pagamento ou mesmo de uma só, desde que feitas em circunstâncias ou acompanhadas de actos de onde se possa inferir a impossibilidade de incumprimento das obrigações vencidas.[12] O que vale por dizer que nem o pressuposto da legitimidade ativa do credor nem a demonstração da situação de insolvência exige que o requerente identifique outros credores. Conforme esclarece Catarina Serra, “a pluralidade de credores não é um requisito [para a abertura] do processo de insolvência nem uma condição para a sua procedência”. [13] A este respeito, e a propósito da definição da insolvência como impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas (art.º 3º, nº 1 do CIRE), acrescenta que “a única exigência legal para que se verifique a insolvência é que haja uma ou mais obrigações vencidas.” (subl. nosso).[14] Ora, o montante do crédito sobre os recorrentes agora detido pela requerente, a longevidade da situação do seu incumprimento, desde há cerca de 10 anos, e o montante dos rendimentos de que os recorrentes dispõem mensalmente, não permitem senão concluir que o não cumprimento da dívida assente nos autos é revelador da situação de penúria e de impossibilidade, atual, de os recorrentes satisfazerem pontualmente as suas obrigações por falta de liquidez para satisfazer a totalidade das dívidas vencidas já que, reiterando o acima citado, não interessa somente que ainda se possa cumprir num momento futuro qualquer, importando igualmente que a prestação ocorra no tempo adequado e, por isso, pontualmente. preenchem o facto índice da situação de insolvência previsto pelo art.º 20º, nº 1, al. b) do CIRE por revelarem falta de cumprimento de dívidas vencidas por ausência de liquidez para o fazer, e independentemente das causas que a determinaram. Comprovada situação de impossibilidade atual de cumprimento de dívidas vencidas, no mínimo, as emergentes dos contratos de mútuo que os recorrentes celebraram em 2012, em incumprimento desde esse mesmo ano, conforme escreve Menezes Leitão, [N]este caso, a insolvência não necessita de uma cessação generalizada de pagamentos, podendo resultar apenas de algumas faltas de pagamento ou mesmo de uma só, desde que feitas em circunstâncias ou acompanhadas de actos de onde se possa inferir a impossibilidade de incumprimento das obrigações vencidas.[15] No caso, enquanto elemento de presunção da situação de insolvência, o incumprimento do crédito da requerente, associado à ausência de liquidez e/ou de rendimentos para proceder ao seu pagamento, mais do que uma presunção, ilustra e manifesta uma real e comprovada situação de insolvência porque, reiterando o acima citado, e com pertinência para a argumentação dos recorrentes quanto à pendência dos embargos de terceiro que, alegadamente, obstou à satisfação do crédito da requerente quer através da execução quer através da dação em pagamento do imóvel objeto da hipoteca que o garante, “não interessa somente que ainda se possa cumprir num momento futuro qualquer, importando igualmente que a prestação ocorra no tempo adequado e, por isso, pontualmente.”, sendo certo que não é sobre o credor - que já suporta o incumprimento do seu crédito - que recaem as vicissitudes emergentes da discussão da titularidade do direito de propriedade sobre o imóvel com fundamento na sua aquisição por terceiro por usucapião que, além do mais, e a verificar-se, apenas à inércia dos recorrentes poderia imputar-se enquanto titulares inscritos no registo e, nessa qualidade, autores da constituição da hipoteca para garantia do crédito da requerente. Do exposto resulta que, nas circunstâncias de facto apuradas - e confirmadas pelos recorrentes - as únicas que relevam para aferição dos pressupostos da insolvência, os recorrentes encontram-se em situação de insolvência atual por ausência de liquidez suficiente e necessária para honrar pontualmente todas as obrigações que contraíram. 5. Opõem os recorrentes, e a isso se resume o que em sede de conclusões opõem à sentença recorrida, que a situação de insolvência é afastada pela existência de ativo manifestamente superior ao passivo, invocando nessa argumentação a propriedade de dois imóveis no valor de cerca de €300.000,00. Ora, para além de a prova produzida nos autos não permitir dar como certo que os recorrentes são proprietários de outro imóvel para além do que é objeto da hipoteca que garante o crédito da requerente - posto que só deste foi junto comprovativo da inscrição no registo predial em beneficio dos recorrentes com fundamento no qual e nos termos do art.º 7º do Código de Registo Predial beneficiam da presunção da titularidade daquele direito, valor que a lei não atribui à certidão matricial -, ainda que assim se considerasse, flui do acima exposto que a situação de falta de liquidez suficiente para cumprimento do serviço de dívida que caracteriza a situação de insolvência não é infirmada nem prejudicada pelo facto de o devedor ser titular de património (no caso, correspondente a um imóvel) de valor superior ao seu passivo já que, conforme vem alegado e pressuposto pelos recorrentes, só através da sua liquidação poderá dar satisfação a todas as suas obrigações vencidas. Com efeito, logo em sede de oposição os recorrentes alegaram que o valor do imóvel sobre o qual constituíram hipoteca em benefício do crédito da requerente é superior ao crédito que esta sobre eles detém no pressuposto, erróneo, de que tal facto não só ilide a presunção de insolvência, como também demonstra a sua solvência. Erróneo porque os factos índices da insolvabilidade não resultam infirmados pela existência de bens na titularidade do devedor ainda que o seu valor seja superior ao passivo pois, enquanto elemento de exclusão da situação de insolvência, tal fator (relação ativo/passivo), para além de aplicação exclusiva às pessoas coletivas (conforme art.ºs 3º, nº 2 e 20º, nº 1, al. h) do CIRE), só releva se ilustrar uma situação de viabilidade financeira, passando esta pela capacidade de gerar excedentes aptos a assegurar o cumprimento da generalidade das obrigações no momento do seu vencimento, o que já resultou afastado face ao valor dos rendimentos de que os recorrentes dispõem. Sem prejuízo, reproduzindo acórdão por nós relatado e citado pela sentença recorrida[16], para além da relação de alternatividade prevista pelos nºs 1 e 2 do art.º 3º do CIRE, sempre acrescentamos que a existência de ativo inferior ao passivo é legalmente apta a indiciar a situação de insolvência do devedor (pessoa coletiva) nos termos das normas citadas (cfr. art.ºs 3º, nº 2 e 20º, nº 2, al. h). Porém, o contrário já não sucede, ou seja, a existência de ativo superior ao passivo não constitui pressuposto legal de solvabilidade nem sequer indício como tal legalmente previsto pois que, ainda que assim suceda, o devedor está insolvente se, por ausência de liquidez, estiver impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, como urge ser o caso. De resto, considerando que o imóvel foi objeto de penhora em 2013 no âmbito da execução instaurada para cobrança do crédito ora titulado pela requerente, mais se impõe considerar e concluir, nas palavras de Fátima Reis Siva, que o valor do imóvel – (…) – é indiferente porquanto a verdade é que, decorridos mais de cinco anos ele não se vendeu, nem por um nem por outro valores, demonstrando a respetiva incapacidade de ser transformado em liquidez.[17] 6. Concluindo, demonstradas circunstâncias concretizadoras dos pressupostos de facto índice de insolvência – no caso, o previsto pela al. b) do nº 1 do art.º 20º do CIRE – cabia aos recorrentes afastar a presunção de situação de insolvência que do mesmo decorre, como por exemplo, demonstrando que, não obstante aquelas circunstâncias, dispõem de rendimentos (próprios ou por recurso a crédito bancário ou outro) que lhe permitem cumprir pontualmente o serviço de dívida que assumiram[18]. Nada tendo alegado e demonstrado nesse sentido, improcedem as conclusões de recurso e reitera-se o acerto do juízo de insolvência formado pela decisão recorrida com fundamento na al. b) do nº 1 do art.º 20 do CIRE. V – Custas Considerando que, por um lado, as custas do processo da insolvência são a cargo da massa insolvente (cfr. art.º 51º, nº 1, al. a) do CIRE) e, por outro, que os recorrentes não beneficiam da isenção de custas e encargos prevista pelo art.º 4º, nº 1, al. u) do Regulamento das Custas Processuais, na ausência ou insuficiência de massa insolvente permanecem responsáveis pelas custas do processo. VI - Decisão: Por todo o exposto julga-se a apelação improcedente, com consequente manutenção da sentença recorrida. Custas em ambas as instâncias a cargo da massa insolvente ou, na ausência ou insuficiência desta, dos recorrentes (cfr. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC). Lisboa, 31.10.2023 Amélia Sofia Rebelo Renata Linhares de Castro Paula Cardoso _______________________________________________________ [1] Diploma ao qual pertencem todas as normas aqui citadas se outro não for indicado. [2] Nesse sentido, Luís Menezes Leitão, Direito da Insolvência, p. 77. [3] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Vol. I, Quid Juris, 2005, pág. 69, nota 3; no mesmo sentido vd. Ac. RL de 19.06.2008, disponível no site da dgsi. [4] Nesse sentido, Alberto dos Reis, citando acórdão do STJ de 29.10.1918, pelo qual se [d]ecidiu que pode ser declarada a falência ainda que seja uma só a obrigação que o comerciante deixou de pagar; e acórdão do STJ de 11.10.1927, que [d]eclarou que não pode a priori estabelecer-se se basta a falta de pagamento duma obrigação, se é necessária a falta de pagamento de várias; há que atender às circunstâncias. (Processos Especiais, vol. II, pág 323). [5] Acórdão da Relação de Coimbra de 14.12.2005, proc.nº 2956/05, disponível no site da dgsi. [6] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, vol. I, Lisboa, 2006, p. 131. [7] Nesse sentido, Acórdãos da Relação de Coimbra de 20.11.2007, relatado por Teles Pereira, e da Relação de Lisboa, de 22.04.2010. [8] Obra citada. [9] Ob. cit., p. 67. [10] Licões de Direito da Insolvência, Almedina, p. 56. [11] Será por referência a este primeiro crédito, igualmente celebrado com o Banif, que o mútuo celebrado em 2012 descrito sob o facto 3 foi epigrafado de “Contrato de Empréstimo Crédito Conexo ao Crédito à Habitação”. [12] Ob. cit., p. 131. [13] Ob. cit., p. 43. [14] Pág. 57. [15] Ob. cit., p. 131. [16] Acórdão de 12.11.2019, processo nº 14089/18.2T8LSB-A.L1. No mesmo sentido, acórdão (não publicado) desta Relação de 10.11.2020, processo nº 597/20.90T8BRR-A.L1, relatado por Fátima Reis Silva e subscrito pela aqui relatora na qualidade de adjunta. [17] Acórdão de 30.06.2020, proferido no processo nº 33/20.0T8FNC.L1 desta Relação, não publicado. [18] Nesse mesmo sentido, acórdão acima citado: “(…) formada a presunção de situação de insolvência, a prova da solvência cabe por inteiro ao devedor, pelo que não era ao banco requerente que cabia demonstrar que o requerido não podia recorrer ao crédito para proceder ao pagamento, mas antes ao requerido que cabia demonstrar o contrário, com base na situação fáctica concreta apurada.” |