Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9829/2008-6
Relator: GRANJA DA FONSECA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
DEFENSOR OFICIOSO
SUBSTITUIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA INSTÂNCIA
IGUALDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/17/2008
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: 1ª – O beneficiário do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, que veja quebrada a relação de confiança com o patrono oficioso, goza da faculdade de requerer a substituição do causídico nomeado por outro, o que não impede de continuar a beneficiar do apoio judiciário na modalidade concedida, interrompendo-se o prazo para a prática do acto processual na acção em curso até à nomeação do novo patrono.
2ª – Também, nada impede que, tendo sido deferido o pedido de apoio judiciário, na aludida modalidade, o beneficiário possa constituir mandatário judicial, podendo este subscrever o aludido articulado.
3ª – Porém, se, depois de nomeado patrono oficioso, o mandatário constituído vier juntar procuração forense aos autos, cessa de imediato o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e pagamento dos seus honorários, que lhe havia sido concedido, deixando igualmente de lhe aproveitar a interrupção do prazo concedida.
5ª – Admitir a interrupção do prazo a favor do requerente do apoio judiciário, mesmo depois de vir a constituir mandatário judicial, constituiria uma ostensiva violação do princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente, bem como na lei processual, porquanto estar-se-ia a admitir que qualquer cidadão que, no decurso de uma acção requeresse apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e, a posteriori, constituísse mandatário judicial nos autos, teria um prazo acrescido de exercício do seu direito em relação aos demais cidadãos que, desde o início da acção, constituíssem mandatário judicial.
G.F.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1.
Na execução para pagamento de quantia certa que J L. da intentou contra C, este deduziu oposição, apresentando, porém, duas petições iniciais, tendo uma delas sido subscrita pelo patrono oficioso e outra pelo mandatário judicial por ele constituído.

Perante esta situação anómala, foi proferido despacho, que «declarou ineficaz o apoio judiciário concedido ao Executado, na parte relativa à nomeação de patrono, ordenando o desentranhamento do articulado apresentado por este» e julgou extemporânea a oposição apresentada pelo mandatário constituído, não a admitindo e ordenando também o seu desentranhamento.

Inconformado, recorreu o Opoente, formulando as seguintes conclusões:
1ª – A questão principal prende-se em determinar se «a interrupção do prazo para dedução de oposição à execução aproveita ou não a um litigante que, tendo pedido e visto deferido um pedido de concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, apresenta esse articulado subscrito por um mandatário constituído».
2ª – A procuração forense, outorgada pelo recorrente, foi junta aos autos com a oposição à execução apresentada pelo seu mandatário constituído, em 8 de Fevereiro de 2008.
3ª – Não obstante, o Tribunal a quo entendeu que o recorrente havia constituído mandatário no processo, no dia 21 de Janeiro de 2008.
4ª – Deve-se entender que o recorrente constituiu mandatário no processo em 8 de Fevereiro de 2008, ou seja, na data de apresentação em juízo da oposição à execução e respectiva procuração forense.
5ª – Ao longo da fundamentação da decisão recorrida, é, por diversas vezes, referido que o simples facto de o recorrente ter constituído mandatário é revelador e demonstrativo de que o mesmo tinha recursos económicos para fazer face à acção.
6ª – Não existem no processo quaisquer elementos que demonstrem, ou sequer indiciem, que a situação de insuficiência económica do recorrente se alterou, desde a concessão do benefício de apoio judiciário a este concedido.
7ª – O recorrente, em requerimento apresentado em 7 de Fevereiro de 2008, invoca factos concretos, que demonstram uma previsível situação de impedimento de apresentação da oposição em tempo útil, por motivo que lhe não é imputável.
8ª – Igualmente na oposição à execução apresentada pelo mandatário do recorrente expressamente consta como “questão prévia” o motivo pelo qual este último teve de constituir mandatário no processo.
9ª – O recorrente teve de constituir mandatário para apresentar a oposição à execução em causa, sob pena de ver precludir o seu direito à defesa.
10ª – Não consta dos autos qualquer informação, acerca da data em que o deferimento do apoio judiciário e respectiva nomeação foi notificada ao patrono nomeado.
11ª – E que é determinante, desde logo, para os efeitos previstos no artigo 24º, n.º 5, alínea a) da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, o que só por si justifica a concessão de provimento ao recurso e a revogação da decisão recorrida.
12ª – Pois, não constando dos autos tal data, não poderia a decisão recorrida concluir pela extemporaneidade da apresentação da oposição à execução.
13ª – Nada na letra da lei naqueles n. os 4 e 5 do artigo 24º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, permite a conclusão de que, uma vez nomeado patrono ao requerente, fica o mesmo impossibilitado de constituir mandatário, sob pena de lhe ser, literalmente, retirado o prazo que a lei previamente lhe concedera.
14ª – Sendo certo que mandam as boas regras de interpretação que, onde o legislador não distingue, não deve o intérprete fazê-lo.
15ª – Não poderia ser exigido ao recorrente, perante os factos por si invocados perante o Tribunal, que o mesmo ficasse amarrado ao patrono nomeado, assistindo ao naufrágio do seu direito de dirimir nos Tribunais um litígio em que o mesmo é parte.
16ª – Não é correcto o afirmado na decisão recorrida de que o mesmo “tinha condições económicas para assegurar a sua defesa por advogado e, se não diligenciou nesse sentido antes, foi porque não o quis”.
17ª – O recorrente juntou aos autos o comprovativo de pedido de apoio judiciário no dia imediatamente a seguir a ter sido citado para deduzir oposição à execução.
18ª – Se atentarmos nas datas e prazos em causa, facilmente constatamos que  não só não consta dos autos a data em que o recorrente e o seu patrono nomeado foram notificados da nomeação da Ordem dos Advogados como, ainda que tivéssemos por referência as datas de notificação ao Tribunal por aquela entidade (18/01/2008), resulta evidente que a oposição foi apresentada dentro do prazo de que o recorrente dispunha.
19ª – Pois, conforme resulta de fls. 39 dos autos principais, o recorrente foi citado em pessoa diversa, pelo que deverá acrescer uma dilação de cinco dias ao prazo de vinte dias para deduzir oposição, de que aquele dispunha.
20ª – Assim, mesmo que entendêssemos contar o prazo, abstraindo da data em que o patrono do recorrente foi notificado do despacho da Ordem dos Advogados, tomando unicamente como referência a data da notificação ao Tribunal, sempre resultaria que a oposição à execução foi apresentada dentro do prazo.
21ª – Foi violado o disposto no artigo 24º, n. os 4 e 5 da Lei do Apoio Judiciário, porquanto entendeu o Tribunal a quo que o recorrente de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, constituindo mandatário após a nomeação pela Ordem dos Advogados de patrono oficioso, automaticamente perde o prazo em curso que se tenha iniciado nos termos previstos nos supra referidos normativos, para a prática do acto. Interpretação essa que não encontra qualquer suporte legal, antes pelo contrário, atento o disposto no artigo 10º da mesma lei, que prevê os casos em que o apoio judiciário é retirado ao requerente, nada dizendo acerca da sua influência na prática de actos processuais. Não competindo assim ao julgador distinguir ou excepcionar, onde a lei não distingue ou excepciona.
22ª – Foi incorrectamente aplicada a norma constante do artigo 817º, n.º 1, alínea a) do CPC, porquanto não se verifica qualquer extemporaneidade na dedução da oposição à execução em causa, não devendo, por isso, ter a mesma sido liminarmente rejeitada. Deveria, pelo contrário, ter sido admitida a oposição em causa.
23ª – A apresentação da oposição, nos moldes em que o foi, deverá ser considerada tempestiva e, consequentemente, ser revogada a decisão recorrida, permitindo-se a junção aos autos daquela oposição.

Não houve contra – alegações.

A Exc. ma Juiz sustentou de forma modelar o despacho recorrido.

Cumpre decidir:
2.
A questão que essencialmente se coloca, delimitada pelo objecto do recurso, é a de saber se a interrupção do prazo para dedução de oposição à execução aproveita ou não a um litigante que, tendo pedido e visto deferido um pedido de concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, apresenta esse articulado subscrito por um mandatário constituído.
3.
Com interesse para a decisão, interessam os seguintes factos:
1º - Em 25/10/2007, foi autuada a execução para pagamento de quantia certa que J, L. da instaurou contra C.
2º – O Executado foi citado em 5/12/2007, não tendo a citação sido efectuada na sua própria pessoa.
3º - Em 6/12/2007, o Executado requereu a concessão de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de honorários de patrono.
4º - Em 11/01/2008, foi dado conhecimento aos autos que, por despacho proferido em 4/01/2008, foi deferido o pedido de apoio judiciário nas modalidades pretendidas e que esta decisão foi notificada ao requerente e à Ordem dos Advogados.
5º - Em 18/01/2008, foi junto aos autos um ofício do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, datado de 15/01/2008, com a nomeação do patrono e com a informação que, “nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 5 do artigo 24º e artigos 30º e 31º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, o Sr. Advogado foi notificado, na presente data, da nomeação efectuada”.
6º - Em 21/01/2008, o Executado constitui seu bastante procurador, o Sr. Dr. A, Advogado, (...), a quem, com a faculdade de substabelecer, confere os mais amplos poderes forenses em direito permitidos.
7º - Em 7/02/2008, o Executado, alegando dificuldades em contactar o patrono nomeado e invocando o fim do prazo para deduzir oposição, veio requerer ao Tribunal que oficializasse “nova nomeação de patrono à Ordem dos Advogados, suspendendo-se o prazo em curso para a apresentação da oposição ou autorizar a constituição de mandatário por parte do executado, aproveitando o actual prazo para apresentação da oposição”.
8º - Em 7/02/2008, cerca das 18 horas e 28 minutos, o mandatário constituído enviou ao Tribunal, por e – mail, a oposição à execução, juntando a aludida procuração.
9º - Nesse mesmo dia, (7/02/2008), pelas 23 horas e 54 minutos, o patrono oficioso enviou, por fax, também oposição à execução.
4.
A Constituição da República consagra o direito de acesso ao direito e aos tribunais (artigo 20º).

A Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais reforça que a todos é assegurado o acesso aos tribunais judiciais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos, sendo que nesta situação o acesso aos tribunais é regulado por lei própria (artigo 7º).

Na verdade, o reconhecimento constitucional do direito ao acesso ao direito e aos tribunais seria meramente teórico para muitas pessoas se não se garantisse que o «direito à justiça» não pode ser prejudicado por insuficiência de meios económicos[1].

A Lei 34/2004, de 29 de Julho (Lei do Apoio Judiciário – LAP) veio regular o sistema de acesso ao direito e aos tribunais.
Deste modo, o apoio judiciário, modalidade do regime de acesso ao direito e aos tribunais, é um instituto que visa garantir que mesmo os mais desfavorecidos tenham acesso à Justiça, mediante o auxílio do Estado (cfr. artigo 1º, LAP).

Donde, são beneficiários do apoio judiciário, além doutros, os cidadãos nacionais que demonstrem não dispor de meios económicos suficientes para suportar os honorários dos profissionais forenses e para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de um processo (cfr. artigo 7º LAP).

Quando o pedido de apoio judiciário seja deduzido na pendência de acção judicial e o requerente pretenda a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento de concessão de apoio judiciário nos serviços de segurança social (artigo 24º, n.º 4 LAP), iniciando-se o prazo interrompido, a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação (artigo 24º, n.º 5, alínea a) LAP).

Com efeito, a decisão final sobre o pedido de apoio judiciário é comunicada ao requerente pelo Serviço de Segurança Social que o apreciou, através de notificação escrita. Se o apoio judiciário concedido compreender a nomeação de patrono, a notificação dessa decisão é feita também à Ordem dos Advogados que dispõe do prazo de dez dias, contados dessa notificação, para proceder à sua designação (cfr. artigo 26º, n.º 1 LAP), a qual é notificada ao requerente e ao patrono e, nos casos em que o pedido foi deduzido na pendência da acção judicial, essa notificação é feita com a expressa advertência do reinício do prazo judicial e é igualmente comunicada ao tribunal (cfr. artigo 31º, n.º 1 LAJ).

A notificação da decisão de nomeação do patrono é ainda feita com menção expressa, quanto ao requerente, do nome e escritório do patrono bem como do dever de lhe dar colaboração, sob pena de o apoio judiciário lhe ser retirado (artigo 31º, n.º 2 LAP).

É, pois, dever do requerente entrar de imediato em contacto com o patrono nomeado, que lhe prestará as informações necessárias.

Em contrapartida, o beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido (artigo 32º, n.º 1 LAP).

O apoio judiciário concedido pode ser retirado antes do termo do processo, quando se prove, designadamente, por novos documentos a insubsistência das razões pelas quais o apoio judiciário foi concedido (cfr. artigo 10º LAP).

Reportando-nos ao caso dos autos, o executado foi citado em 5/12/2007 para deduzir oposição, querendo, na execução que contra ele havia sido instaurada.

Como a citação não foi feita na sua própria pessoa, o recorrente, para deduzir oposição, disporia do prazo de vinte dias, a que acresceria uma dilação de cinco dias, pelo que, atendendo ao período de férias judiciais do Natal, o prazo para deduzir oposição teria o seu terminus em 9 de Janeiro de 2008, (artigos 812º, n.º 6, 252º-A, alínea a) e 143º, n.º 1, do CPC). Isto, naturalmente, no caso de ser deduzida oposição por mandatário judicial.

Acontece que o recorrente pediu a concessão de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de honorários de patrono, tendo juntado aos autos, em 6/12/2007, documento comprovativo da apresentação desse pedido.

Como tal, porque o pedido foi deduzido na pendência de acção judicial, o prazo que se encontrava em curso, interrompeu-se em 6/12/2007 e reiniciou-se em 18/01/2008.

Com efeito, tendo sido deferido o pedido, foi dado conhecimento aos autos, em 11/01/2008, não só desta decisão como também que a mesma havia sido comunicada ao requerente e à Ordem dos Advogados e, em 18/01/2008, foi junto aos autos ofício do respectivo Conselho Distrital, datado de 15/01/2008, com a nomeação do Patrono e com a informação que, “nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 5 do artigo 24º e artigos 30º e 31º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, o Sr. Advogado foi notificado, na presente data, da nomeação efectuada”, pelo que se presume que, no dia 18/01/2008, terceiro dia imediato à data da expedição da carta, se reiniciou o prazo judicial.

Também o recorrente, enquanto beneficiário do apoio judiciário, cumpriu o seu dever de contactar o patrono, pois, de contrário, não disporia este, como dispôs, dos elementos que lhe permitiram deduzir a oposição, e dentro do prazo.

Porém, conforme se alcança da procuração junta aos autos, não obstante lhe haver sido concedido o apoio judiciário na aludida modalidade, o executado, três dias depois de haver tomado conhecimento do patrono que lhe havia sido nomeado, constituiu, em 21/01/2008, seu bastante procurador, o Sr. Dr. A, Advogado, (...), a quem, com a faculdade de substabelecer, conferiu os mais amplos poderes forenses em direito permitidos.

Porque a procuração foi outorgada no período em que o executado podia deduzir oposição, caso a mesma fosse subscrita pelo patrono nomeado, pretende que o prazo de interrupção concedido pelo facto de haver requerido o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono lhe continue a aproveitar, apesar de haver constituído mandatário.

Mas porque a interrupção do prazo aproveita, apenas, ao requerente do apoio judiciário, o executado veio invocar um facto impeditivo da apresentação da oposição pelo patrono, o que, em seu entender, justificaria que pudesse constituir mandatário judicial.

Juntou aos autos, em 7/02/2008, um requerimento, alegando dificuldades em contactar com o patrono nomeado e, invocando o fim do prazo para deduzir oposição, veio requerer ao Tribunal que oficializasse “nova nomeação de patrono à Ordem dos Advogados, suspendendo-se o prazo em curso para a apresentação da oposição ou autorizar a constituição de mandatário por parte do executado, aproveitando o actual prazo para apresentação da oposição”.

Não se questiona que o beneficiário do apoio judiciário possa, em qualquer processo, requerer a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido, mas devê-lo-á fazer à Ordem dos Advogados, pelo que não tinha o Tribunal competência para deferir o seu pedido, nem, em caso de tal requerimento ser susceptível de apreciação pelo Tribunal a quo, o mesmo seria exequível, dado o terminus do prazo.

Este requerimento torna-se tanto mais extravagante, quanto, nesse dia, cerca das 18H28, o mandatário constituído enviou ao Tribunal a oposição à execução, a que juntou a aludida procuração, quando, nesse mesmo dia, pelas 23H54, o patrono oficioso enviou também ao Tribunal a oposição à execução que havia deduzido.

Temos, assim, que o C, no mesmo dia, apresentou duas petições iniciais, tendo uma delas sido subscrita pelo patrono oficioso e outra pelo mandatário judicial constituído por aquele, depois de lhe ter sido concedido e comunicado o deferimento do pedido e a indicação do patrono.

Este comportamento do executado, ao constituir outro advogado como seu mandatário, manifesta claramente que não pretende mais continuar a ser representado pelo patrono oficioso em causa.

E, presumindo-se que o mandato é oneroso, comprova igualmente que o executado dispunha, afinal, de meios económicos para assegurar o pagamento dos honorários.

Decorrendo da lei que a protecção jurídica e, em concreto, a nomeação e pagamento de honorários a patrono nomeado visa assegurar aos desprotegidos economicamente, que demonstrem essa insuficiência, o acesso ao direito e aos tribunais, poder-se-á concluir, a contrario, que, a partir do momento em que o beneficiário não se encontra mais em situação de insuficiência económica para custear os honorários do patrono, a protecção jurídica que eventualmente lhe tenha sido concedida deve cessar de imediato (cfr. artigo 10º, n.º1).

Donde se infere que, tendo sido nomeado patrono oficioso ao recorrente mas, constituindo este, entretanto, mandatário que juntou procuração forense, cessa, de imediato, porque então ineficaz, o apoio judiciário na modalidade de patrono[2].
Perante tal ineficácia, importa retirar as respectivas consequências.

Tendo o patrocínio oficioso cessado em 21/01/2008, data em que o recorrente outorgou procuração, constituindo mandatário judicial, e tendo sido enviada primeiramente a oposição à execução subscrita pelo mandatário constituído, é a este articulado que se deve atender, devendo, consequentemente, ser desentranhado o articulado apresentado pelo defensor oficioso.

Por outro lado, como a interrupção do prazo para dedução de oposição à execução havia ocorrido por força do pedido do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, que afinal era desnecessário, não pode essa interrupção aproveitar ao executado, para apresentar esse articulado subscrito por um mandatário constituído.

Como se refere no despacho de sustentação, admitir essa interrupção seria pugnar ostensivamente pela violação do princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente, bem como na lei processual civil, porquanto seria admitir que qualquer cidadão que, no decurso de uma acção requeresse apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e, a posteriori, constituísse mandatário nos autos, teria um prazo acrescido de exercício do seu direito em relação aos demais cidadãos que, desde o início da acção, constituíssem mandatário.

Daí a extemporaneidade da apresentação do requerimento de oposição pelo recorrente.

Esta é a posição sufragada na decisão recorrida que merece a nossa concordância.

Nas suas doutas alegações, sustenta o recorrente que, não obstante o executado ser representado nos autos por patrono nomeado no âmbito do apoio judiciário, uma vez quebrada a relação de confiança entre cliente – patrono, deve aquele ter a faculdade de dispensar os serviços do profissional forense porque o contrário seria afirmar que “os pobres não têm direito à escolha, tendo que sujeitar-se ao que lhe aparece”.

Como se referiu, o beneficiário do apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono para deduzir oposição à execução pode, em qualquer altura do processo, constituir mandatário judicial, nada obstando a que tal oposição seja apresentada por esse causídico. Mas aí terá de suportar os respectivos honorários e deixa de beneficiar da interrupção do prazo.

Pelo contrário, se não dispuser de meios económicos e houver incompatibilidades com o patrono nomeado, pode requerer à Ordem dos Advogados a substituição desse patrono, fundamentando o seu pedido, devendo o respectivo Conselho Distrital comunicar ao Tribunal a nova nomeação, quando esteja pendente a acção.

A lei concede, portanto, ao beneficiário do apoio judiciário que veja quebrada a relação de confiança com o seu patrono, a faculdade de requerer a substituição do causídico, continuando a beneficiar do aludido apoio e da interrupção do prazo para a prática do acto processual na acção em curso, mas apenas nessas circunstâncias, sendo da competência da Ordem a indicação do novo mandatário. O que não concede é a faculdade do executado, que obteve o benefício do apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, prescindir deste, quando entender, e continuar a usufruir do prazo que a lei de forma excepcional concede ao beneficiário do apoio judiciário, o que se justifica, pois que não pode praticar o acto processual na acção em curso senão a partir da nomeação do patrono.

Concluindo:
1ª – A lei concede ao beneficiário do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, que veja quebrada a relação de confiança com o patrono oficioso, a faculdade de requerer a substituição do causídico, continuando a beneficiar do aludido apoio e da interrupção do prazo para a prática do acto processual na acção em curso.
2ª – Também, nada impede que, tendo sido deferido o pedido de apoio judiciário, na aludida modalidade, o beneficiário do apoio possa, no decurso do prazo legal para a dedução da oposição à execução, constituir mandatário judicial, podendo este subscrever o aludido articulado.
3ª – Porém, tendo sido nomeado patrono oficioso e juntando-se posteriormente  procuração forense nos autos, cessa de imediato o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e pagamento dos seus honorários.
4ª - E a interrupção do prazo para dedução da oposição à execução não aproveita ao litigante que, tendo requerido e visto deferido um pedido de concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, apresenta esse articulado subscrito por um mandatário constituído.
5ª – Com efeito, admitir nessas circunstâncias a interrupção do prazo constituiria uma ostensiva violação do princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente, bem como na lei processual, porquanto se estaria a admitir que qualquer cidadão que, no decurso de uma acção requeresse apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e, a posteriori, constituísse mandatário judicial nos autos, teria um prazo acrescido de exercício do seu direito em relação aos demais cidadãos que, desde o início da acção, constituíssem mandatário judicial.
5.
Pelo exposto, negando provimento ao agravo, confirma-se a decisão recorrida.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2008
Manuel F. Granja da Fonseca
Fernando Pereira Rodrigues
Maria Manuela dos Santos Gomes (vencida pelas razões que vão enunciadas em declaração que junto)
_________________
Declaração de voto
Fui vencida pelas razões que, sucintamente, passo a enunciar:
O recorrente pediu e obteve o beneficio do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, de dispensa do pagamento dos serviços do patrono nomeado e demais encargos do processo.
Em processo civil - não existindo norma de conteúdo idêntico ao disposto no art. 43° da Lei n° 34/2004, de 29 de Julho, relativa a processos penais — aquele beneficio não cessa automaticamente, mas apenas por cancelamento (casos taxativamente elencados no artigo 10° daquele mesmo diploma) ou por caducidade (ocorrência de qualquer das situações do artigo 11° da citada Lei).
O recorrente constituiu mandatário por, tal como alega e referiu nos autos, não ter conseguido localizar, em tempo que entendeu útil, o patrono nomeado. Tal não implica, contudo, a perda do benefício de apoio judiciário, por não integrar qualquer caso de cancelamento ou de caducidade que, de todo o modo, tinha de ser judicialmente declarado, garantido o contraditório.
Daí que não perca nenhum dos benefícios inerentes, enquanto o mesmo não lhe for retirado ou o patrono nomeado não pedir escusa (art. 34° da Lei citada), pelo que se entende que o recorrente continuou a beneficiar do prazo para contestar, com a interrupção derivada do disposto no art. 24°, n° 4, da E Apoio Judiciário.
Acresce que se me afigura que representaria uma verdadeira denegação do direito de acesso aos Tribunais e da defesa, desconsiderar um articulado subscrito pelo patrono oficioso em funções, só porque o beneficiário constituiu outro advogado, cujo articulado, aliás, de teor perfeitamente coincidente (ipsis verbis) e entrado no mesmo dia, também não foi admitido, embora neste tivesse sido expressamente referido que só era apresentado, com carácter subsidiário, para a hipótese do patrono oficioso o não fazer e que visava “apenas assegurar a efectiva apresentação da oposição à execução pelo executado”.
Termos em que daria provimento ao recurso, admitindo o articulado de oposição subscrito pela patrono oficioso.
(Manuela Gomes)
_______________________
[1] Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1º Volume, 4ª Edição, 411.
[2] Acórdão da Relação de Coimbra, de 27 de Abril de 2004, in CJ, 2004, II, 37.