Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5488/2007-1
Relator: MARIA DO ROSÁRIO BARBOSA
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
FALTA DE PAGAMENTO
EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/30/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário:
1. Se a recusa, por falta de pagamento de taxa de justiça de uma petição de uma acção declarativa, não impede que se apresente nova petição,  o mesmo se pode dizer de uma  oposição à execução, face ao decurso do prazo legal para apresentação da mesma.
2. A não se entender assim estaria criada uma situação excepcional – que não estaria certamente no espírito do legislador – em que, o executado/opoente, por falta ou engano no montante do pagamento de taxa de justiça veria, sem possibilidade de atempada correcção, vedada a possibilidade de fazer seguir a sua oposição à execução.
M.R.B.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam nesta secção cível os Juízes do Tribunal da relação de Lisboa

L interpõe o presente recurso de agravo da decisão proferida pelo 3ºJuízo de Execuções de Lisboa que declarou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide (art. 287°, e), do CPC, no processo de oposição à execução comum que aí foi instaurado contra o agravante/executado pela Exequente M, Lda.

Nas respectivas conclusões de recurso refere o agravante:

“À oposição à execução, pese embora seja uma acção declarativa enxertada na acção executiva, devem ser aplicadas as regras relativas à contestação, no que concerne ao pagamento da taxa de justiça inicial.
O Tribunal “a quo” face à ausência de pagamento de taxa de justiça inicial, deveria ter ordenado a notificação do ora recorrente, para proceder ao pagamento de taxa de justiça em falta e dos respectivos acréscimos legais, sob pena de ser ordenado o desentranhamento da oposição apresentada.

Face ao exposto, deve o presente recurso ser admitido e consequentemente ser revogada a decisão recorrida.”

Foi proferido despacho de sustentação, mantendo a decisão.

A decisão recorrida á a seguinte:

“Nos termos do disposto no art. 23°, n.º 2 do CCJ, «Para a promoção de execuções é devido o pagamento de uma taxa de justiça correspondente a ou '/2 UC, consoante a execução tenha valor igual ou inferior ao da alçada do tribunal da Relação ou superior ao mesmo, aplicando-se, com as devidas adaptações, o regime da taxa de justiça inicial».
Por outro lado, o n.º 1 do artigo citado dispõe que: «Para promoção de acções e recursos, bem como nas situações previstas no art. 14°, é devido o pagamento da taxa de justiça inicial auto liquidada nos termos da tabela do Anexo I».
Confrontadas as referidas disposições legais, temos para nós que a taxa de justiça a auto liquidar para promoção da presente oposição é aquela que resulta da tabela do anexo I, acima mencionada, atendendo-se para o efeito ao valor que resulta da aplicação do critério estabelecido na Al. j) do n.º 1 do art. 6° do CCJ.

Resulta dos autos que o opoente não procedeu ao pagamento da taxa de justiça como devia.
Nos termos do art. 28° do CCJ, a omissão do pagamento da taxa de justiça inicial dá lugar à aplicação das cominações previstas na lei de processo.
A nova redacção do art. 28° do CCJ veio, pois, acabar com o regime sancionatório pecuniário que existia e sobrecarregava a secção de processos e veio remeter para as cominações previstas nas leis processuais.
Em anotação a este preceito, refere Salvador da Costa: «Os serviços judiciais devem controlar o montante das autoliquidações da taxa de justiça inicial e ou subsequente e, se for pago pelas partes menos do que o devido a consequênçia jurídica parece ser a seguinte:
- se a diferença se reportar à taxa de justiça inicial relativa à petição inicial, deve a secretaria recusá-la ou, se isso, não ocorrer, deve o juiz ordenar a sua devolução;
- reportando-se a diferença à taxa de justiça inicial concernente a peça processual diversa da petição inicial ou à taxa de justiça subsequente, deve aplicar-se, com as necessárias adaptações, conforme os casos, o disposto nos arts. 486°-A, 512°-B e 690°-B do Código de Processo Civil» (sublinhado nosso, Cód. Custas Judiciais Anotado e Comentado, 7a ed., p. 218).
Deste modo, equivalendo o requerimento de oposição do executado à petição inicial da acção declarativa (vide J. Lebre de Freitas e A. Ribeiro Mendes, Cód. Proc. Civil Anotado, vol. 3°, p. 323), entendo que a consequência a retirar da falta de pagamento de tudo o que for devido, quando a secretaria não tenha recusado o recebimento do requerimento da oposição nos termos do disposto no art. 474°, f), do CPC, terá, de ser o desentranhamento daquela peça processual, discordando, pois, da posição daqueles que entendem que nesse caso haveria lugar à notificação prévia do faltoso nos termos do disposto no art. 476° do CPC, a fim de lhe dar a possibilidade de justificar a sua actuação ou suprir o montante da taxa de justiça que estivesse ainda em débito e concordando-se com a posição do ler. Salvador da Costa, supra mencionada, ou seja, o desentranhamento e devolução da peça processual à parte.

É que, se atentarmos à letra do art. 476° do CPC, verificamos que este expressamente refere que o autor pode apresentar outra petição ou juntar o documento a que se refere a primeira parte do disposto na alínea f) do art. 474° dentro dos 10 dias subsequentes à recusa de recebimento.
E, dispõe o art. 474°, f), que a secretaria recusa o recebimento da petição inicial quando não tenha sido junto o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça.
Assim, entendo que da conjugação destes dois artigos resulta que o prazo de 10 dias facultado pelo art. 476° do CPC, apenas é concedido para os casos em que, efectivamente, se procedeu previamente, à entrada da acção, ao pagamento da taxa de justiça devida e autoliquidada, conforme dispõe o art.23° do CCJ, mas não foi entregue o seu comprovativo na data da entrada da petição inicial.
Por outro lado, de harmonia com o disposto no art. 467°, 3, do CPC "o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial ou da concessão do beneficio de apoio judiciário (...).
O n° 5 do referido artigo dispõe que "(...) o autor deve efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da data da notificação da decisão definitiva que indefira o pedido de apoio judiciário, sob pena de desentranhamento da petição inicial apresentada (...)".
Ou seja, a consequência do não cumprimento do referido pagamento é a recusa da petição inicial, sendo o n° 4 do citado art. 467° a única excepção existente.
Concordamos com o ler. Salvador da Costa quando refere na obra supra mencionada que "no caso de a secretaria, por erro, ter recebido a petição inicial sem o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial, deve a secção de processos apresentar a petição ou o requerimento inicial ao juiz, nos termos do n° 2 do artigo 166° do Código de Processo Civil, o qual despachará no sentido da sua devolução ao autor ou requerente".

Aliás nem se compreenderia que fosse de outro modo, pois se no caso de indeferimento do apoio judiciário requerido, a parte tem 10 dias para proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida sob pena de desentranhamento da petição apresentada, porque razão aquele que não requereu apoio judiciário beneficiaria de mais dez dias para proceder ao pagamento em falta?
Assim sendo, e conforme supra se expôs a consequência da falta do pagamento da taxa de justiça devida (parcial ou total) terá de ser o desentranhamento e a devolução do requerimento da oposição.
É o que se vai decidir, com a consequente extinção da instância, por impossibilidade superveniente da lide (art. 287°, e), do CPC).

Por todo o exposto, determino o desentranhamento e subsequente devolução ao apresentante do requerimento de oposição.
Declaro extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide
Custas pelo opoente.
Registe.
Notifique.”

Os factos a ter em consideração para a apreciação da decisão são os seguintes:
1. No processo 85682/05 do 3º J., 3ª secção de execuções de Lisboa o agravante L apresentou oposição à execução em 25.07.06.-carimbo aposto na face da p.i.
2. O agravante havia sido citado para deduzir oposição em 29.6.06.
3.O agravante apresentou petição de oposição mas não procedeu ao pagamento da taxa de justiça.
4. A secção, em 14.12.06, concluiu os autos ao julgador com a informação de que o agravante não havia efectuado o pagamento da taxa de justiça.
5. Na sequência de tal conclusão-informação foi proferido em 12.12.06(data aposta) o despacho de que se agrava.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Objecto do recurso

Nos termos do disposto nos art. 684, nº3 e 4 e 690, nº1, do CPC o objecto do recurso delimita-se, em princípio, pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento das questões de que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art. 660, ex vi do artº 713, nº2, do mesmo diploma legal.

A questão objecto do recurso consiste em saber se o agravante deveria ter sido convidado a pagar a taxa de justiça devida com os acréscimos legais em vez de se ter determinado a devolução do requerimento de oposição.

Vejamos:

A dedução da oposição à execução tem sido entendida como petição duma acção declarativa, constituindo a oposição uma «contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e (ou) da acção que nele se baseia» (Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 4ª ed., Coimbra Editora, 2004, págs. 188 -190).
Dispõe o art. 28º do CCJ que a omissão do pagamento das taxas de justiça inicial e subsequente dá lugar à aplicação das cominações previstas na lei do processo.
«1 - Quando a prática de um acto processual exija, nos termos do Código das Custas Judiciais, o pagamento de taxa de justiça inicial ou subsequente, deve ser junto o documento comprovativo do seu prévio pagamento ou da concessão do benefício do apoio judiciário, salvo se neste último caso aquele documento já se encontrar junto aos autos.
2 - Sem prejuízo das disposições relativas à petição inicial, a falta de junção do documento referido no número anterior não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos artigos 486.º-A, 512.º-B e 690.º-B.»

Nos termos do art. 467º, nº3 do CPC, o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial ou da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa total ou parcial do mesmo.
De acordo com o disposto no art. 474º, al. f), do CPC, a secretaria deve recusar a petição inicial, indicando por escrito o fundamento da rejeição, quando não tenha sido junto documento comprovativo da taxa de justiça inicial ou o documento que ateste a concessão de apoio judiciário, excepto no caso previsto no n.º 4 do artigo 467.º
Nos termos do art. 476º do CPC, o autor pode apresentar outra petição ou juntar o documento a que se refere a primeira parte do disposto na alínea f) do artigo 474.º, dentro dos 10 dias subsequentes à recusa de recebimento ou de distribuição da petição, ou à notificação da decisão judicial que a haja confirmado, considerando-se a acção proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo.
Não recusando a secretaria a petição deve o juiz decidir logo pelo desentranhamento desta ou, pelo contrário, deve dar a oportunidade ao autor de, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento em falta?
Cremos que a melhor solução é a segunda.
É que recusando a secretaria o recebimento, como a lei impõe, inviabiliza-se a possibilidade de o autor/opoente lançar mão do benefício estabelecido no art. 476º. Ora, o autor não pode ser prejudicado por uma tal omissão da secretaria (art. 161º, nº6 do CPC). Neste sentido, entre outros vide os Acs. da Rel. de Coimbra, de 31-05-2005 (Rel. Garcia Calejo) e da Rel. do Porto, de 23-05-2006 (Rel. Mário Cruz) e de 09-10-2006 (Rel. Abílio Costa) e da Relação de Lisboa, de 16/11/2006(Rel. Tibério Silva disponíveis em www.dgsi.pt).
E como bem se refere neste ultimo aresto, a não se entender assim, estaria criado um sistema em que, em idênticas circunstâncias, uns, conforme a actuação/omissão da secretaria, teriam a oportunidade de praticar o acto, outros veriam precludida essa faculdade e, como no caso dos autos, de forma irremediável.
Para efeitos de pagamento de taxa de justiça dever-se-á equiparar o opoente ao R. (aliás, parece ser esse o entendimento de Salvador da Costa, CCJ, 8ª ed. pág. 195, quando afirma, por referência à al. b) do nº1 do art. 24º do CCJ, que as «expressões réu e requerido estão utilizadas em sentido amplo, em termos de abrangência, além do mais do executado no que concerne à oposição à execução executiva, à reclamação de créditos ou à penhora»), com a consequente possibilidade de beneficiar do estabelecido no art. 486º-A do CPC. É que, não se poderá esquecer que a oposição surge na sequência de uma execução em curso e dentro de um prazo estabelecido na lei, tendo a sua não apresentação consequências gravosas se esse prazo for ultrapassado (art. 817º, nº1, a) do CPC).
Se a recusa, por falta de pagamento de taxa de justiça, de uma petição de uma acção declarativa não impede que se apresente nova petição, já o mesmo não se pode dizer –excepto no entendimento acabado de referir- de uma oposição à execução, face ao decurso do prazo legal para apresentação da mesma. Mas, desta forma estaria criada uma situação excepcional – que não estaria certamente no espírito do legislador – em que, o executado/opoente, por falta ou engano no montante do pagamento de taxa de justiça veria, sem possibilidade de atempada correcção, vedada a possibilidade de fazer seguir a sua oposição à execução.
O entendimento acabado de explanar é o que, salvo melhor opinião, respeitará a mens legislatoris e aquele que salvaguarda o princípio do tratamento igual para situações semelhantes.
Pelo exposto, dá-se provimento ao agravo, revogando-se a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que se determine a notificação do executado/opoente para, em 10 dias, depositar a taxa de justiça em falta e acréscimos legais, montante que lhe deverá ser indicado.
Sem custas.

Lisboa,30 de Outubro de 2007.
Maria do Rosário Barbosa
Rosário Gonçalves
Maria José Simões