Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
428/11.0TBALQ.L1-1
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
ACORDO
RELAÇÃO DE TRABALHO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/18/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1- O Código de Processo Civil, no âmbito da competência interna, trata e reparte a competência/jurisdição dos tribunais portugueses, no essencial, em razão da matéria, da hierarquia judiciária e da competência territorial (cfr. artº 62º, do Cód. de Proc.Civil e artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
2- No que à competência em razão da matéria ( aferir se determinado tribunal é o competente para conhecer de certa causa em razão da matéria que ela envolve/aborda – competência ratione materiae ) diz respeito , o mesmo diploma legal citado, no respectivo artigo 66º, estabelece a competência regra dos tribunais judiciais, dispondo que são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional ( cfr. ainda o artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
3- Dir-se-á assim que, para efeitos de atribuição de uma causa a tribunal judicial dotado de competência especializada, vigora a regra geral da subsidiariedade da jurisdição comum, pois que a competência especializada decorre directa e concretamente da lei e, a dos tribunais comuns, apenas por via indirecta ou por exclusão se fixa .
4- Dispondo a alínea n), do artº 85º, da LOFTJ, que em matéria cível compete aos tribunais do trabalho conhecer “Das execuções fundadas nas suas decisões, ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais ,e porque sob a alçada da competência especializada do tribunal do Trabalho estão todas as questões emergentes de relações de trabalho subordinado, ou , no mínimo, apresentam elas um qualquer nexo com um vínculo jurídico que a lei equipara ao de trabalho, em sede de acção executiva e quando não consubstancia ele uma sua própria decisão, há-de o respectivo titulo executivo , também , directa ou indirectamente, estar relacionado com matéria conexa com as relações de trabalho subordinado ou , pelo menos, com um vínculo jurídico equiparado por lei aos de natureza laboral.
5- Daí que, se do título executivo que integra a causa petendi de uma acção executiva resulta uma obrigação - exequenda – que surge no âmbito de uma relação jurídica de natureza laboral que até à data vinculava ambas as partes, nascendo a obrigação precisamente em resultado e por causa da extinção da referida relação laboral , inequívoco é que se está perante uma acção executiva cujo desiderato visa a cobrança de uma divida emergente de uma relação de trabalho.
6- E, sendo assim como é, forçoso é que, as razões de ordem pública de vocacionalidade, adequação e idoneidade funcional do Juiz do Tribunal do Trabalho, encaminhem necessariamente a referida acção executiva para a competência especializada dos tribunais do trabalho.
( Da responsabilidade do Relator )
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
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1.Relatório.
Em acção executiva que A intentou no Tribunal Judicial de Alenquer, para pagamento de quantia certa ( € 2 837,89 ) , contra B ( …,SA ) e C , foi o respectivo requerimento executivo liminarmente indeferido pelo tribunal a quo, considerando-se na referida decisão que tal se justificava porquanto era manifesta a incompetência absoluta do tribunal para tramitar a acção executiva proposta.
Considerou-se, além do mais, na decisão supra referida, que baseando-se a execução em título executivo que correspondia a decisão subsumível à previsão da alínea n), do artº 85º, da Lei 3/99, de 13 de Janeiro, eram os tribunais do trabalho os competentes para a tramitar.
Não concordando com tal decisão, veio de imediato o exequente da mesma apelar, sendo que em sede de alegações formulou as seguintes conclusões:
I - O Acordo Extra-Judicial celebrado entre Exequente e Executado, não consubstancia uma decisão do tribunal de trabalho, cuja execução esteja votada por lei àquele foro, pelo que não se aplica in casu o vertido no artigo 85.º, alínea n) da Lei 3/99.
II - Extinguindo-se a relação contratual laboral entre Exequente e Executado, a execução do presente acordo extra judicial recai no âmbito da matéria cível, valendo como reconhecimento da existência da obrigação pecuniária pelo devedor.
III - A presente divida surgiu após a extinção da relação laboral e não efectivamente condição de extinção desta.
IV - Não estamos perante uma execução de divida emergente de relação de trabalho, atributiva de competência material ao especializado foro do trabalho.
V - Não procedem, a benefício deste foro, as razões de ordem pública de vocacionalidade, adequação e idoneidade funcional do Juiz, que justificam a atribuição de competência em matéria laboral aos tribunais do trabalho.
VI - Por exclusão de partes, caímos no regime regra de atribuição de competência ao tribunal comum (cível).
VII - A decisão recorrida violou as disposições conjugadas dos artigos 85.º, 102–A, n.º 1 e 103.º, todos da Lei 3/99, de 13 de Janeiro, bem como o artigo 94.º, n.º 1, do Código do Processo Civil.
Nestes termos, deve ser revogada a sentença de indeferimento liminar do Requerimento Executivo, sendo julgada improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, prosseguindo a acção executiva os seus trâmites até final.
Assim se fará JUSTIÇA!
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Thema decidenduum
1.1. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (cfr. artºs. 684º nº 3 e 685º-A, nº 1, do Cód. de Proc. Civil ), a questão a apreciar e a decidir visa tão só apurar se :
- In casu, é o tribunal a quo , internamente, o competente em razão da matéria para conhecer/tramitar a acção executiva proposta pelo apelante.
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2.Motivação de Facto.
A factualidade a atender é, para além da que consta no relatório supra , a seguinte ( o que resulta do expediente junto aos autos ) :
2.1.- Em sede de diligência nos Serviços do Ministério Público do Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, presidida por Magistrado do Ministério Público , a 30/11/2010, entre o exequente A , na qualidade de trabalhador, e a ora executada B , na qualidade de entidade patronal, foi alcançado o acordo extrajudicial ( por ambos assinado ) que se segue :

A entidade patronal acorda pagar ao trabalhador a quantia total de € 5 290,00 (cinco mil, duzentos e noventa euros) a título de compensação pecuniária global, pela cessação do CONTRATO DE TRABALHO.

Tal quantia será paga em duas prestações, sendo a primeira no montante de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) e a segunda no montante de € 2.790,00 (dois mil, setecentos e noventa euros).

A 1ª prestação vence-se no dia 15 de Dezembro de 2010 , vencendo-se a segunda no dia 30 de Dezembro de 2010.

O pagamento será efectuado por transferência bancária para a conta nº 000000000000000000000, de que o A é titular na agência do banco Caixa Agrícola de …..

O trabalhador renuncia ao contrato de trabalho que a ligou à entidade patronal, dando o mesmo por findo, e declara que, após boa cobrança do montante acima mencionado, nada mais lhe é devido por força da relação de trabalho que o ligou à mencionada entidade patronal, seja a que título for, renunciando, por isso; igualmente, a todos e quaisquer outros créditos civis ou laborais, decorrentes da relação de trabalho, agora extinta, pois considera liquidados todos os créditos exigíveis.

A entidade patronal está ciente que esta declaração constitui título executivo bastante, no caso de incumprimento.
2.2.- Com referência ao requerimento executivo apresentado pelo apelante, em sede de despacho liminar, proferiu o tribunal a quo a seguinte decisão :
“ Nos presentes autos o título executivo é um acordo extra judicial respeitante a matéria laboral.
Cumpre apreciar da competência do presente tribunal para tramitar os presentes autos.
Dispõe o artigo 85º, alínea n) do da Lei 3/99:
Compete aos tribunais do trabalho conhecer, em matéria cível: ()
n) Das execuções fundadas nas suas decisões ou noutros títulos executivos ,ressalvada a competência atribuída a outros tribunais.
Do normativo ante parcialmente ante transcrito, resulta, pois, que o tribunal não tem competência para tramitar a presente execução, a qual pertence aos tribunais do trabalho.
Trata-se de um caso de incompetência absoluta, prevista no artigo 101º do Código de Processo Civil.
A incompetência absoluta de um determinado tribunal para apreciação de um determinado pleito consubstancia uma excepção dilatória insuprível e de conhecimento oficioso (artigo 494º, alínea a), e 495º, ambos do Código de Processo Civil), que implica a absolvição do réu da instância ou o indeferimento em despacho liminar, quando o processo o comportar (artigos 105º, 1, 288º, alínea a), e 493º, 2, todos do Código de Processo Civil).
De harmonia com o artigo 812º-E, n.º 1, alínea b), o juiz deve indeferir liminarmente o requerimento executivo quando ocorram excepções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso.
Por conseguinte, resta concluir que há que indeferir liminarmente o requerimento executivo em apreço.
São devidas custas pelo exequente (artigo 446º do C.P.C.)
Pelo exposto, ao abrigo das disposições legais supra citadas, indefere-se liminarmente o requerimento executivo que deu azo à presente execução.
Custas pelo exequente.
Registe e notifique “ .
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3.Motivação de direito.
Como resulta do relatório supra referido, no âmbito da presente apelação pretende-se decidir/apurar tão só da competência em razão da matéria do tribunal a quo ( tribunal judicial ) para a tramitação da acção executiva intentada pelo apelante, sendo que o referido tribunal considerou que era aos tribunais do trabalho que a LOFTJ atribuía a necessária competência para o efeito, maxime em função do que dispunha a alínea n) do artº 85 º do citado diploma legal.
Ex adverso, insiste porém o apelante pela competência em razão da matéria do tribunal a quo e, consequentemente , daí o recurso interposto.
Ora bem.
O Código de Processo Civil, no âmbito da competência interna, trata e reparte a competência/jurisdição dos tribunais portugueses, no essencial, em razão da matéria, da hierarquia judiciária e da competência territorial (cfr. artº 62º, do Cód. de Proc.Civil e artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
No que à competência em razão da matéria ( aferir se determinado tribunal é o competente para conhecer de certa causa em razão da matéria que ela envolve/aborda – competência ratione materiae ) diz respeito , o mesmo diploma legal citado, no respectivo artigo 66º, estabelece a competência regra dos tribunais judiciais, dispondo que são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional ( cfr. ainda o artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
Qualquer das últimas disposições legais citadas , mostram-se assim , como de resto se impunha, em perfeita consonância com “princípio da plenitude da jurisdição comum” consagrado no art. 211º, n.º 1 da CRP, de acordo com o qual os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal, e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.
Tal equivale a dizer, v.g., que dispondo a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais ( LOFTJ – Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro) que aos Tribunais do Trabalho compete conhecer, em matéria cível, das execuções fundadas nas suas decisões [ cfr. alínea n) ], não devem elas - tais execuções - correr termos nos tribunais judiciais comuns .
E, segundo uma perspectiva contrária, não resultando da lei que, relativamente a execuções fundadas em decisões proferidas por Tribunais do Trabalho, a competência para a respectiva tramitação incumbe aos mesmos Tribunais, então forçosamente são todas elas - tais acções executivas - encaminhadas forçosamente para a alçada/competência dos tribunais judiciais ( é a regra geral da subsidiariedade da jurisdição comum, pois que a competência especializada decorre directa e concretamente da lei e, a dos tribunais comuns, apenas por via indirecta ou por exclusão se fixa ).
Dito isto, o 67º do Código de Processo Civil remete para as leis de organização judiciária a aferição/determinação de quais as causas que, em razão da matéria, são da competência material de um tribunal judicial dotado de competência especializada ( de entre as várias espécies a que alude o artº 78º da LOFTJ ).
Como refere Manuel de Andrade (1), a instituição de diversas espécies de tribunais e a demarcação da respectiva competência obedece a um princípio de especialização, com as vantagens que lhe são inerentes.
No essencial (2),com a repartição da competência entre os tribunais especiais e o foro comum, “(…) procura-se adaptar o órgão à função, procura-se assegurar a idoneidade do Juiz ; pretende-se que as causas sejam decididas por quem tenha uma formação jurídica adequada. Põe-se assim a matéria da causa em correlação com a preparação técnica dos magistrados que a hão-de julgar . de modo a obter-se um julgamento mais perfeito.
Dito de uma outra forma, no âmbito da distribuição da competência por diversos tribunais especiais em função da natureza da matéria a judicar, procura-se que seja esta atribuída ao tribunal que mais vocacionado esteja para do respectivo objecto conhecer, razão porque, em rigor, o critério de atribuição de competência material ao juiz projecta a vocacionalidade, a aptidão, a adequação ou a agilização do tribunal à causa, sendo que, num Estado de Direito , é fundamental a bondade da lei organizativa judiciária, no acerto e determinação dos factores objectivos de conexão judiciária para que o Estado cumpra ao mais alto nível possível a qualidade da prestação judiciária pública.(3)
Postas estas breves considerações, é tempo, agora ( em razão do disposto no artº 67º do CPC ), de aferir se, efectivamente, em função do disposto na LOFTJ, e tal como o concluiu o tribunal a quo, a causa/execução intentada neste último tribunal se acha porém compreendida no espaço de jurisdição de um tribunal dotado de competência especializada, maxime de um tribunal do Trabalho.
Ora, os tribunais do trabalho, como decorre do citado artigo 78º, alínea d), da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro , são efectivamente e como vimos já, tribunais de competência especializada.
E, no âmbito da respectiva competência , em matéria cível, decorre do artº 85º da LOFTJ, maxime das respectivas alíneas b), f), n) e o), que compete aos tribunais do trabalho conhecer :
(…)
b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho ;
(…)
f) Das questões emergentes de contratos equiparados por lei aos de trabalho ;
(…)
n) Das execuções fundadas nas suas decisões, ou noutros títulos títulos executivos ,ressalvada a competência atribuída a outros tribunais ;”
(…)
o) Das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros , quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente ;
De todas as indicadas alíneas ( do artº 85º da LOFTJ) , uma primeira nota se impõe extrair, qual seja a de que, obviamente, qualquer acção declarativa , para obrigatoriamente cair sob a alçada da competência especializada do tribunal do Trabalho, há-de forçosamente abordar matéria do foro/natureza laboral, ou seja, há-de incidir sobre questões emergentes de relações de trabalho subordinado, ou , no mínimo, há-de ela apresentar um qualquer nexo com um vínculo jurídico que a lei equipara ao de trabalho.
E , do mesmo modo, também em sede de acção executiva, quer quando o respectivo titulo executivo consubstancia uma sua própria decisão ( proferida necessariamente em acção declarativa da sua competência ), quer quando ela tem como causa petendi um outro/diferente título executivo, há-de este último também , directa ou indirectamente, estar relacionado com matéria conexa com as relações de trabalho subordinado ou , pelo menos, com um vínculo jurídico equiparado por lei aos de natureza laboral.
Sobre a última situação referida, e socorrendo-nos agora das pertinentes considerações tecidas no Ac. do STJ de 20/3/1997 (4) , dir-se-á que, quando na lei se fala "noutros títulos executivos" [ na alínea n) do citado artigo 85º , da LOFTJ ], “ (…) se teve em mente "títulos" em que estivessem em causa, directa ou indirectamente, e aqui pela possibilidade legal de se poderem deduzir embargos, assuntos conexos com as relações de trabalho, os quais dizem única e exclusivamente respeito aos Tribunais do Trabalho.
É que, acrescenta-se na mesma e citada decisão do Venerando STJ, “
A não ser entendido deste modo, estar-se-ia a apontar a unidade do sistema jurídico - o que é imposto pelo legislador -, deixar-se-ia estilhaçar e postergar o pensamento do legislador vertido no citado artigo 64, desuniformizando-o - na realidade, a intenção foi sempre de conferir aos tribunais do trabalho, como tribunais que são de competência especializada, a competência para apreciar e decidir das questões laborais, como assuntos de natureza bem específica que são.”
Chegados aqui, e como de resto constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, a competência do tribunal é apreciada em função dos termos em que a acção é proposta (5) , determinando-se pela forma como o autor estrutura o pedido e os respectivos fundamentos , impondo-se designadamente, quando no âmbito de acção executiva, aferir se o respectivo titulo executivo emerge de obrigação que, para o executado, resulta de uma relação jurídica de natureza laboral, assentando assim e em rigor a acção executiva em matéria de natureza laboral , é tempo agora de se esmiuçar o conteúdo do titulo executivo que sustenta a execução ora em apreço.
Ora, se atentarmos à factualidade inserta no item 2.1 do presente acórdão, vemos que o titulo executivo consubstancia um acordo subscrito por exequente e executada sociedade, tendo o mesmo sido alcançado no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira , é certo, mas nos Serviços do Ministério Público e em diligência presidida por Magistrado do Ministério Público ( depreende-se que em sede de processo interno/administrativo - logo não judicial - do Ministério Público ).
Portando, em causa não está , para efeitos da alínea n), do artº 85º da LOFTJ, uma decisão judicial do Tribunal do Trabalho , v.g. um acordo alcançado aquando da realização de uma tentativa de conciliação que obrigatoriamente tem lugar, em processo comum laboral, no âmbito da realização da audiência de partes ( cfr. artºs 51º, 52º, 54º,nº2 e 55,nº2, todos do Cód. de Processo do Trabalho ).
Não obstante, do mesmo título executivo logo se alcança que , aquando do acordo , uma das partes ( o exequente A ) age na qualidade de trabalhador, e uma outra ( a ora executada B ) , na qualidade de entidade patronal.
Ainda do mesmo título ( maxime do seu clausulado ) , inequívoco é que a ora executada sociedade assume uma obrigação na qualidade de entidade patronal do ora exequente e, ademais, acordam ambos os outorgantes que a quantia total de € 5 290,00 é devida pela sociedade ao ora apelante - na qualidade este último de seu trabalhador - a título de compensação pecuniária global, pela cessação do CONTRATO DE TRABALHO.
Perante um tal clausulado, dúvidas não existem, portanto, que o acordo de onde emerge a obrigação exequenda surge no âmbito de uma relação jurídica de natureza laboral que até à data vinculava ambas as partes, isto por um lado, e , por outra banda, nasce a obrigação precisamente em resultado e por causa da extinção da referida relação laboral ( e não em momento posterior à sua extinção, não existindo – como in casu existe - um qualquer nexo entre ambas ).
Perante um tal quadro, impõe-se pois concluir que a obrigação exequenda emerge de um vínculo de natureza laboral e por causa da respectiva extinção, ou , dito de uma outra forma, inequívoco é que se está perante uma acção executiva cujo desiderato visa a cobrança de uma divida emergente de uma relação de trabalho.
E, sendo assim como é, forçoso é que , as razões de ordem pública de vocacionalidade, adequação e idoneidade funcional do Juiz do Tribunal do Trabalho, encaminhem necessariamente a referida acção executiva para a competência especializada dos tribunais do trabalho.
Uma última nota se impõe ainda deixar presente, justificando-se ela pelo facto de, em abono do seu entendimento, ter o apelante referido que, para todos os efeitos, a relação contratual laboral entre Exequente e Executado extinguiu-se e, daí, a obrigatoriedade de a execução do acordo extra judicial recair no âmbito da matéria cível.
Ora, olvida o apelante que, como vimos supra, para além de em sede de embargos/oposição à execução poder suscitar-se a apreciação de questões de natureza laboral, o certo é que, no âmbito dos tribunais do trabalho, com frequência ( uma larga percentagem ) , as acções são interpostas após a cessação – ainda que licitamente – do vínculo laboral, nada tendo que ver directamente com ela ( maxime com a respectiva validade e ou ilicitude ) , antes visam tão só os trabalhadores a cobrança de créditos emergentes de contrato de trabalho já há muito cessado ( desde que reclamados dentro do ano seguinte àquele em que cessou o contrato – cfr, artº 337º do CT ) .
Do mesmo modo, não obstante a cessação por acordo válido do contrato de trabalho, não raro são também os tribunais do trabalho chamados a decidirem questões que se interligam com a validade, eficácia e os efeitos de clausulas de remissão abdicativa nelas inseridos, a tal não obstando, também, o facto de a relação jurídica de trabalho subordinado ter-se extinguido validamente.
Impondo-se terminar, a apelação , em face do exposto, só pode improceder, pois que bem andou o tribunal a quo em indeferir liminarmente o requerimento executivo do apelante em resultado da verificação de excepção dilatória insuprível e de conhecimento oficioso (artigo 494º, alínea a), e 495º, ambos do Código de Processo Civil).
4-Em conclusão:
- O Código de Processo Civil, no âmbito da competência interna, trata e reparte a competência/jurisdição dos tribunais portugueses, no essencial, em razão da matéria, da hierarquia judiciária e da competência territorial (cfr. artº 62º, do Cód. de Proc.Civil e artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
- No que à competência em razão da matéria ( aferir se determinado tribunal é o competente para conhecer de certa causa em razão da matéria que ela envolve/aborda – competência ratione materiae ) diz respeito , o mesmo diploma legal citado, no respectivo artigo 66º, estabelece a competência regra dos tribunais judiciais, dispondo que são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional ( cfr. ainda o artº 18º,nº1, da LOFTJ ).
- Dir-se-á assim que, para efeitos de atribuição de uma causa a tribunal judicial dotado de competência especializada, vigora a regra geral da subsidiariedade da jurisdição comum, pois que a competência especializada decorre directa e concretamente da lei e, a dos tribunais comuns, apenas por via indirecta ou por exclusão se fixa .
- Dispondo a alínea n), do artº 85º, da LOFTJ, que em matéria cível compete aos tribunais do trabalho conhecer “Das execuções fundadas nas suas decisões, ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais ,e porque sob a alçada da competência especializada do tribunal do Trabalho estão todas as questões emergentes de relações de trabalho subordinado, ou , no mínimo, apresentam elas um qualquer nexo com um vínculo jurídico que a lei equipara ao de trabalho, em sede de acção executiva e quando não consubstancia ele uma sua própria decisão, há-de o respectivo titulo executivo , também , directa ou indirectamente, estar relacionado com matéria conexa com as relações de trabalho subordinado ou , pelo menos, com um vínculo jurídico equiparado por lei aos de natureza laboral.
- Daí que, se do título executivo que integra a causa petendi de uma acção executiva resulta uma obrigação - exequenda – que surge no âmbito de uma relação jurídica de natureza laboral que até à data vinculava ambas as partes, nascendo a obrigação precisamente em resultado e por causa da extinção da referida relação laboral , inequívoco é que se está perante uma acção executiva cujo desiderato visa a cobrança de uma divida emergente de uma relação de trabalho.
- E, sendo assim como é, forçoso é que , as razões de ordem pública de vocacionalidade, adequação e idoneidade funcional do Juiz do Tribunal do Trabalho, encaminhem necessariamente a referida acção executiva para a competência especializada dos tribunais do trabalho.
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5.-Decisão.
Por todo o exposto acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa , em , julgando improcedente o recurso de apelação apresentado pelo exequente , manter a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
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(1) Neste sentido vide o Prof. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 95
(2) Cfr. José Alberto dos Reis, in Comentário, Vol.1º, segunda edição, pág. 107.
(3) Cfr. Ac. do STJ de 27/5/2003, in www.dgsi.pt
(4) Disponível in www.dgsi.pt
(5) Neste sentido vide v.g. o Prof. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 91 e, bem assim , o Ac. da Relação de Lisboa de 8/3/89, in C.J., tomo II, pág. 175 e demais jurisprudência nele citado.
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Lisboa, 18 de Outubro de 2011

António Santos (Relator)
Eurico José Marques dos Reis ( 1º Adjunto)
Ana Maria Fernandes Grácio ( 2º Adjunto)