Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
482/14.3TVLSB.L2-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: OMISSÃO DE PRONÚNCIA
CONDENAÇÃO EM CUSTAS
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
TRANSACÇÃO QUANTO A CUSTAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/17/2021
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE A ARGUIÇÃO DE NULIDADE
Sumário: I - Havendo um acórdão do STJ sem condenação em custas, verifica-se uma omissão de pronúncia que tem de ser corrigida pelo colectivo que proferiu aquele acórdão (art. 614/3 do CPC).
II - Sendo anulada pelo TRL, em recurso, uma decisão, que não foi provocada pela parte contrária, nem defendida por esta, e que não a beneficiava, o recurso deve ficar sem custas.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

A 14/12/2015, foi proferida sentença nestes autos, com condenação dos réus.
Os três réus interpuseram dois recursos.
A 13/10/2016, foi proferido, nestes autos, um acórdão no qual se julgaram as apelações improcedentes, com custas pelos réus.
A 15/12/2016, dois dos três réus interpuseram uma revista excepcional contra o acórdão.
A 13/02/2017 o TRL não admitiu o recurso.
A 07/03/2017, é apensada uma reclamação daqueles réus contra esse despacho (que virá a ser remetida ao STJ a 14/07/2017).
Em e-mail de 14/03/2017 (consta de fls. 2930-2934), de autores e réus, é apresentado um pedido de extinção da instância, com uma desistência dos pedidos pelos autores (aceite pelos réus). Inclui um requerimento de dispensa ou redução do pagamento do remanescente, com considerações sobre a inconstitucionalidade das normas que estão em causa (reproduzindo, aliás, o que os réus já tinham dito nas peças processuais de 14/11/2016 e de 22/02/2016) e uma transacção quanto a custas (entre o mais, consta que as custas a pagar são da responsabilidade dos réus recorrentes e dos autores, em partes iguais, com o limite máximo de 18.000€ para os autores).
Por despacho de 27/03/2017 dá-se aos autores e réus a hipótese de se pronunciarem sobre o entendimento do relator de que o poder jurisdicional do TRL se esgotou com a prolação do acórdão declarado irrecorrível.
Nem autores nem os réus se pronunciam.
Por despacho de 08/05/2017, sobre o requerimento de fls. 2930 a 2934 (extinção/transacção/dispensa), relega-se o conhecimento do mesmo para depois da posição do STJ sobre a reclamação que não admitiu a revista excepcional (fls. 2986-2987) contra o acórdão de 31/10/2016, isto na base da questão prejudicial: se a irrecorribilidade fosse confirmada, a instância já estaria extinta, pelo que não podia ser homologada a desistência/transacção.
A 31/05/2017, há uma reclamação para a conferência contra o despacho de 08/05/2017.
A 13/07/2017 é proferido acórdão do TRL confirmando o despacho do relator de 08/05/2017.
A 15/09/2017, autores e réus apresentam uma revista contra este acórdão do TRL (fl. 3084 refere-se às alegações deste recurso).
A 06/10/2017, é devolvido o apenso A (a reclamação); tem decisão do STJ de 11/09/2017 no sentido de não caber ao TRL apreciar os pressupostos da revista excepcional.
Por despacho de 16/10/2017 e perante esta decisão da reclamação, o TRL admitiu o recurso de revista excepcional de 2016 que tinha sido interposto do acórdão de 13/10/2016; nada foi dito quanto à revista normal de 2017.
Por acórdão do STJ de 06/12/2017 e perante os dois recursos de revista que estavam no processo (a revista excepcional contra o ac. do TRL de 13/10/2016 e a revista normal contra o ac. do TRL de 13/07/2017), a formação do STJ prevista no art. 672/3 do CPC diz que não se verificam os pressupostos da revista excepcional contra… o ac. do TRL de 13/07/2017 e que se trata de uma revista normal e remete aos autos à distribuição como tal.
Redistribuídos os autos, a 19/12/2017, o relator no STJ, por decisão singular, não admite a revista contra o ac. do TRL de 13/07/2017. Condena nas custas do mesmo os recorrentes (que são autores e réus).
Os autos são devolvidos à 1.ª instância que, por despacho de 19/02/2018, os remete de novo ao TRL, por haver ainda questões a decidir.
Por despacho de 19/03/2018, o TRL determina a remessa dos autos ao STJ para conhecimento da revista excepcional contra o recurso de 13/10/2016.
Por acórdão de 03/05/2018 – da formação prevista no art. 672/3 do CPC – o STJ não conhece dos pressupostos da revista excepcional contra o ac. do TRL de 13/10/2016, por evidente inutilidade, diz, determinando que o TRL conheça do requerimento de extinção/transacção. Neste acórdão nada se diz quanto a custas do recurso.
Por despacho de 04/06/2018, o TRL, depois de dizer que vai ficcionar que o STJ tinha dito que a revista excepcional seria admissível, pelo que instância não estaria extinta, decide ouvir o MP sobre a questão das custas colocada no requerimento de extinção/transacção/dispensa de 14/03/2017.
A 22/06/2018, o MP pronuncia-se contra o deferimento do pedido de dispensa do pagamento do remanescente (fls. 3226 e segs).
Por decisão singular de 01/10/2018, o TRL decide, com base no que disse no despacho de 04/06/2018, que a instância não estava extinta e, por isso, homologou a desistência e o acordo quanto a custas. E indeferiu o pedido de dispensa/redução do pagamento do remanescente de custas com as considerações de inconstitucionalidade de normas.
Todas as partes são notificadas de tal despacho e dele não reclamam nem recorrem.
A 22/11/2018, na 1.ª instância, é determinada a remessa dos autos à conta.
O que só é cumprido mais de um ano depois, a 02/12/2019.
A 24/02/2020 são elaboradas 4 contas:
A primeira, da responsabilidade dos autores, para além de outras, menciona que está em dívida, de taxa de justiça, pelos autores, o valor de 44.217€ (depois de eles já terem pago [pelas contra-alegações do recurso de revista excepcional – fl. 2886] 816€, sendo a taxa devida de 45.033€.
A segunda, da responsabilidade dos réus J e V, menciona que está em dívida, de taxa de justiça, por estes réus, o valor de 44.217€ (depois de eles já terem pago [pelas alegações do recurso de revista excepcional – fl. 2823] 816€, sendo a taxa devida de 45.033€.
A quarta, da responsabilidade de todos os autores e réus, menciona que está em dívida, de taxa de justiça, por todos eles, o valor de 44.217€ (depois de eles já terem pago [pelas alegações do recurso de revista – fl. 3084] 816€, sendo a taxa devida de 45.033€.
A 13/03/2020, 2 dos 3 réus reclamam das contas.
Dividem a reclamação em três partes.
Na I.ª referem-se ao acordo quanto a custas.
Na II.ª referem-se a inconstitucionalidade das custas e querem que o remanescente seja dispensado ou reduzido, ou que pelo menos o remanescente referente à revista excepcional o seja.
Na III.ª falam de um depósito autónomo (de 405.297€).
Terminam com 4 pedidos:
em (a) dizem que as contas devem ser elaboradas conforme o transacção;
em (b) dizem que as partes devem dispensadas do pagamento da taxa de justiça remanescente (que é de 576.453€) ou, subsidiariamente, o seu montante ser substancialmente reduzido;
em (c) dizem que, pelo menos, as partes devem ser dispensadas do pagamento da taxa de justiça remanescente referente ao recurso de revista excepcional, no montante total de 88.434€, nos termos do artigo 14-A/-c do RCP, ou, subsidiariamente, ser reduzido o montante da taxa de justiça devida neste caso, por a mesma ser manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade e do direito de acesso aos tribunais;
em (d), finalmente, dizem que deve ser considerado o montante já depositado.
A 23/10/2020 o MP pronuncia-se quanto a tal reclamação, dizendo:
- No que respeita ao solicitado em (a) mormente a fls. 3289, entende assistir razão aos requerentes face ao acordo havido entre ambos, homologado por decisão de fls. 2930 a 2934 (9º vol.) – veja-se artigo 17º, alínea ii) do referido acordo, pelo que devem as contas de custas respectivas ser reformuladas nos termos da transacção – parte B.2 alíneas i) e ii) a fls. 2933.
- Quanto ao requerido em (b e c) do aludido requerimento:
Pr. se indefira, uma vez que as questões suscitadas, quer relativamente ao pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou da sua redução, quer as questões de alegada inconstitucionalidade foram exaustivamente analisadas, escalpelizadas – fls. 3226 a 3233 - e decididas superiormente no TRL a fls. 3246 a 3252. (11º vol.)
- Relativamente ao requerido em (d), nada temos a opor, nos termos do disposto no art. 32/4 do RCP (depósito autónomo consta a fls. 2804, 9º vol.)
A 09/11/2020, é proferido o seguinte despacho:
No que respeita ao requerido sob (a), assiste razão aos requerentes, tendo em conta o teor da transacção quanto a custas celebrada entre as partes em 14/03/2017 (fls. 2930 a 2934) e a decisão de 01/10/2018 (fls. 3246).
Por conseguinte, determino a reformulação da conta em conformidade.
No que concerne ao requerido sob (b), quer a questão relativa à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou da sua redução, quer a referente à inconstitucionalidade ora invocada foram já objecto de decisão transitada em julgado (despacho de 01/10/2018, a fl. 3245 a 3252), pelo que sobre as mesmas encontram-se esgotados os poderes jurisdicionais deste tribunal (cfr. art. 613.º do NCPC), nada mais cumprindo decidir.
Finalmente, quanto a (c), em face do acordo das partes e do disposto no art. 32.º, n.º 4 do RCP, defere-se o requerido.
Os réus recorrem contra este despacho, para que seja revogado e substituído por outro que julgue ilegal a cobrança de qualquer valor de custas pelo recurso de revista excepcional em causa, atendendo a que a decisão do STJ não condenou as partes no seu pagamento; ou, caso assim não se entenda, que substitua o despacho por outro que dispense as partes do pagamento da taxa de justiça remanescente referente ao recurso de revista excepcional, no montante total de 88.434€, ou, subsidiariamente, reduza substancialmente o valor a pagar de taxa de justiça remanescente, por a mesma ser manifestamente inconstitucional, por violação do princípio do acesso ao Direito e aos Tribunais e da proporcionalidade.
Entre o muito mais, dizem, em síntese deste TRL, que:
a\ Relativamente à parte que se refere ao recurso de revista excepcional existe omissão de pronúncia;
b\ o acórdão sobre a revista excepcional não fixou custas processuais, o que consideram natural, uma vez que não chegou a ser apreciado, por inutilidade superveniente da lide, “além de não ter resultado de matérias a que as partes deram causa.” [sic]
c\ pelo que ficaram surpreendidos quando constataram que, segundo o tribunal a quo, pela revista excepcional havia a pagar 90.066€, havendo ainda por liquidar o valor de 88.434€, matéria que corresponde a (c) da reclamação;
d\ o tribunal a quo agregou na mesma decisão o pedido relativo à dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente referente às custas do processo, com o pedido relativo à dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente relativa à revista excepcional, para concluir que tal matéria já havia sido decidida pelo TRL;
e\ mas não foi, porque à data da decisão do TRL, o acórdão do STJ de 03/05/2018 é omisso quanto a custas;
f\ o tribunal a quo não podia fixar qualquer montante a pagar pelas partes quanto à revista excepcional;
g\ acresce que, não tendo havido condenação em custas no âmbito da revista excepcional e integrando a taxa de justiça as custas (conforme determinam os artigo 527/1 e 529 do CPC), estavam, aquando da notificação da conta final, em tempo de peticionar a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente ou, subsidiariamente, a sua redução, não se encontrando relativamente ao mesmo esgotado o poder jurisdicional do tribunal;
h\ o ac. do STJ de 03/05/2018, decidiu não conhecer dos pressupostos do recurso de revista excepcional, por inutilidade superveniente da lide, razão pela qual não pode ser cobrada a taxa de justiça remanescente, por aplicação analógica do artigo 14-A/-c do RCP.
g\ acresce que, a cobrança da taxa de justiça remanescente relativa à revista excepcional é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade consagrado nos artigos 2 e 18/2, 2.ª parte, da Constituição da República Portuguesa, tendo em consideração que o STJ não conheceu dos pressupostos do recurso de revista e que os montantes a pagar com base no valor do recurso (7.500.000€), que se cifram em 88.434€, são manifestamente desadequados, excessivos e desproporcionais face à natureza e complexidade do recurso (o qual, como vimos, nem chegou a ser apreciado).
*
Questão a decidir: se se verifica a nulidade apontada; se os réus não têm de pagar as custas da revista excepcional que interpuseram do acórdão do TRL de 13/10/2016.
*
No requerimento de 13/03/2020, que deu origem ao despacho recorrido de 09/11/2020, os réus queriam ser dispensados do pagamento de todos os remanescentes de taxa de justiça.
Faziam tal requerimento como se não existisse a decisão do TRL de 01/10/2018 que tinha analisado de forma completa o requerimento feito por eles a 14/03/2017, pronunciando-se sobre todas as questões por eles levantadas.
O despacho recorrido lembrou-lhes tal decisão.
Agora os réus recorrem deste despacho quase como se nada mais tivessem requerido, a 13/03/2020, do que serem dispensados do pagamento do remanescente das taxas de justiça da revista excepcional.
Fique, por isso, esclarecido que o despacho recorrido está certo na sua maior parte, já que o que os réus pretendiam já lhes tinha sido, no essencial, indeferido: não há dispensa das taxas remanescentes de todos os recursos interpostos e em que houve decisão sobre as custas, porque a decisão singular de 01/10/2018 foi proferida depois de todos eles e teve em devida consideração tudo o que se passou no processo.
Ou seja, a pretensão dos réus de serem dispensados do valor de 576.453€ como remanescente de todas as taxas devidas está indeferida por decisão transitada em julgado.
*
Mas, quanto à revista excepcional interposta pelos réus, a 15/12/2016, do acórdão do TRL de 13/10/2016, os réus têm parcialmente razão (sendo que o recurso que está agora em apreciação, contra o despacho de 09/11/2020, está limitado à taxa remanescente da revista excepcional, como decorre claramente da pretensão dos réus).
As contas 1 e 2 referem-se às custas dessa revista excepcional, mas o acórdão do STJ de 03/05/2018, que se pronunciou quanto a essa revista excepcional, não condenou em custas.
Não havendo decisão sobre as custas, as contas de custas não podiam englobar as custas desse recurso excepcional.
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A revista excepcional não foi conhecida, por inutilidade superveniente.
Mas a revista é um recurso e todos os recursos têm de ter, regra geral, condenação em custas (art. 527/1 do CPC e art. 1/2 do Regulamento das custas processuais), mesmo que terminem por inutilidade superveniente, como até decorre da norma que diz de quem é a responsabilidade pelas custas nesses casos (art. 536 do CPC).
De resto, havendo normalmente uma taxa de justiça inicial paga pelas alegações (quando o alegante não tenha apoio judiciário) e uma taxa de justiça inicial paga pelas contra-alegações (art. 7/2 do RCP), como no caso há, sempre teria que haver uma decisão quanto a custas para se saber quem é que ficava responsável por essas taxas.
Repare-se, aliás, que a decisão singular do STJ de 19/12/2017, proferida nestes autos, não admitiu a revista contra o ac. do TRL de 13/07/2017 e, apesar disso, e logicamente, condenou nas custas do mesmo os recorrentes.
Assim sendo, os réus não tinham razão em achar natural que a revista excepcional tivesse ficado sem custas, nem se podem aproveitar de tal facto.
Em suma, no ac. do STJ de 03/05/2018 verificou-se uma omissão de pronúncia sobre as custas.
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O despacho recorrido não se apercebeu que a reclamação dividia a II.ª parte em duas subquestões e se reflectia em dois pedidos distintos, (b) e (c), e por isso só decidiu, com base no esgotamento dos poderes jurisdicionais, a 1.ª subquestão e o pedido (b), não tomando posição sobre a 2.ª subquestão correspondente ao pedido (c).
Assim, incorreu numa nulidade (art. 615/1-d, 1.ª parte, do CPC), omissão que tem de ser suprida por este tribunal e que pode ser suprida desde já, visto que os réus se pronunciam sobre a questão (e não há contra interessados), o que se passa a fazer.
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Nos termos do artigo 614/1 do CPC, se a sentença […] for omissa quanto a custas […], pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz.
Acrescenta o art. 614/3 do CPC: se nenhuma das partes recorrer, a rectificação pode ter lugar a todo o tempo.
Quer isto dizer que a omissão de custas não tem a solução que os réus defendem, isto é, que a revista excepcional fique sem custas.
O juiz a que se refere a norma do art. 614/1 do CPC é o tribunal que proferiu a decisão que omitiu as custas.
Ou seja, no caso, é o colectivo que proferiu o acórdão do STJ de 08/05/2020. Pelo que, os autos lhe devem ser remetidos para que possa suprir a omissão.
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As restantes razões dos recorrentes não têm relevo para a decisão da questão colocada, valendo apenas como considerações que poderão ser tidas em conta pelo acórdão do STJ que corrigir a omissão de condenação em custas.
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As custas deste recurso não podem ficar a cargo de um vencido, que não existe (art. 527/1, 1.ª parte, do CPC), nem a cargo dos réus que têm ganho de causa.
Não pode valer aqui a regra de as custas ficarem a cargo de quem do processo tirou proveito (art. 527/2.ª parte, do CPC) porque esta regra vale para aqueles casos em que a parte teve que necessariamente utilizar o processo para obter uma vantagem extraprocessual, não para os casos em que o proveito se traduz simplesmente na revogação/anulação de uma decisão do tribunal que estava errada e que não foi provocada pela parte contrária e que não beneficiava esta.
Dito de outro modo: a decisão anulada não foi proferida na sequência da posição assumida pela parte contrária, não a favorece e ela não a defendeu; isto é, se a decisão tivesse sido mantida a parte contrária não ficaria beneficiada (com uma vantagem que lhe tivesse sido conferida). Assim sendo, ela não pode ser onerada com o pagamento das custas de parte dos apelantes.
Mas os apelantes tinham razão em parte, na parte em que recorreram (havia efectivamente omissão de pronúncia do tribunal de 1.ª instância recorrido) e por isso o despacho vai ser anulado nessa parte por este TRL em substituição do tribunal recorrido. Pelo que, aquilo que eles despenderam para poderem recorrer, deve ser-lhes devolvido. É que, por outro lado, não se pode invocar que eles tenham tirado proveito da actividade desenvolvida pelo tribunal. A consideração deste proveito tem a ver com os casos em que o exercício do direito tem que passar pelo tribunal, como por exemplo, um divórcio sem consentimento. Aqui compreende-se que a parte pague pelo serviço que o Estado lhe preste. Já não assim relativamente à actividade judicial necessária à correcção de um erro do tribunal (“não provocado” pela parte contrária e que não beneficia esta).
Ninguém entenderia que a oficina que reparou a avaria do motor da viatura do cliente, lhe cobrasse, para além do custo da reparação da avaria, ainda o custo do pára-brisas que a oficina partiu durante a reparação. Se a conservatória do registo se enganou a fazer um registo, não se compreenderia que o requerente do registo tivesse que pagar a rectificação do registo (os artigos 132-C do CRP e 93-C do CRC são o simples reconhecimento disto: o registo da rectificação é gratuito, salvo se se tratar de inexactidão proveniente de deficiência dos títulos).
Se uma parte tem que recorrer contra um despacho errado – que não teve por causa uma posição defendida pela parte contrária e que não a favorece - e se se demonstra que esse despacho está errado, ela não pode ficar a perder a taxa de justiça que pagou pela interposição do recurso, sob pena de aquele despacho errado ser a única fonte do prejuízo para a parte. Ou seja, mesmo que ganhe o recurso, perde na prática, pelo menos, o dinheiro da taxa de justiça (para além dos honorários do advogado que teve de pagar). Estamos a colocar o juiz como a única fonte do prejuízo para a parte: o juiz a dar um despacho errado e a obrigar a parte a pagar para corrigir o erro do juiz.
O juiz tem o “direito” de errar, mas isso não pode ser a única fonte do prejuízo para a parte. Estaríamos a caucionar o erro do juiz como fonte de receitas para o Estado.
Para além disso, a não devolução da taxa paga para impulsionar o recurso, neste tipo de casos, põe em causa o princípio de que o processo deve ser gratuito para a parte vencedora (como demonstração deste princípio, veja-se o art. 26/6 do RCP: Se a parte vencida for o Ministério Público ou gozar do benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, o reembolso das taxas de justiça pagas pelo vencedor é suportado pelo IGFEJ, IP).
Note-se ainda, como reflexo disto tudo, o disposto no art. 157/6 do CPC: Os erros e omissões dos actos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes; e também no art. 534/1 do CPC: A responsabilidade do vencido no tocante às custas não abrange os actos e incidentes supérfluos, nem as diligências e actos que houverem de repetir-se por culpa de algum funcionário judicial […].
E ainda o art. 27/5 do Regulamento emolumentar dos registos e notariado (aprovado pelo DL 322-A/2001, de 14/12, com sucessivas alterações, publicado https://www.irn.mj.pt/sections/irn/legislacao/docs-legislacao/regulamento-emolumentar/), secção IX, emolumentos diversos:
5 - Impugnação:
5.1 - Por cada processo de recurso hierárquico - (euro) 175;
5.1.1 - Por cada processo de recurso hierárquico de conta ou de recusa de passagem de certidão - (euro) 120;
5.2 - Em caso de procedência do recurso, há lugar à devolução dos emolumentos previstos nos números anteriores;
5.3 - Em caso de provimento parcial do recurso o emolumento previsto no n.º 5.1 é reduzido a metade, sendo devolvido na sua totalidade o emolumento previsto no n.º 5.1.1;
5.4 - A rectificação oficiosa da conta com base nos fundamentos invocados em recurso hierárquico findo por falta de verificação dos respectivos pressupostos, dá lugar à devolução do emolumento previsto no n.º 5.1.1. […]”
E, entre muitas outros, do mesmo regulamento, o art. 12/1-a-b, secção IX, emolumentos diversos: Actos [notariais] gratuitos: 1 - São gratuitos os seguintes atos: a) Rectificação resultante de erro imputável ao notário ou de inexactidão proveniente de deficiência de título emitido pelos serviços dos registos e notariado; b) Sanação e revalidação de actos notariais; […]; e o artigo 14.º; Actos [de registo predial] gratuitos: 2 - São ainda gratuitos os seguintes actos: a) Rectificação de actos de registo ou documentos, resultante de erro ou inexactidão proveniente de deficiência dos títulos emitidos pelos serviços dos registos e do notariado; […]”
De todas estas normas é possível extrair a regra de que, neste tipo específico de casos, com (e apenas com) as características descritas, a parte que venceu o recurso tem direito à devolução da taxa de justiça que teve que pagar para que o recurso viesse a ser apreciado, isto é, o recurso deve ficar sem custas.
Note-se que não se está a defender esta solução para a situação diferente em que a contraparte não deu origem ao despacho recorrido errado, nem contra-alegou no sentido no sentido de ser mantido, mas a procedência do recurso retirar-lhe-ia uma vantagem que o despacho recorrido lhe tivesse conferido. Aqui ela teria de ser condenada nas custas do recurso (na vertente de custas de parte).
*
Quanto ao voto de vencido:
O voto de vencido acaba por tomar posição no sentido de considerar não serem devidas custas nos recursos não admitidos.
Por um lado, não é esta a questão que compete agora a este tribunal decidir, substituindo-se à decisão que por omissão cabe ao STJ.
Por outro lado, não tem razão, pelo que se segue:
(i) as custas de um recurso, mesmo que não admitido, têm que ser pagas por alguém:
A contraparte do recorrente, porque o recurso foi interposto, tem que pagar, querendo contra-alegar, uma taxa de justiça e, para além disso, tem de pagar ou continuar a pagar os honorários do seu advogado para que este contra-alegue (artigos 529/2 e 530/1 do CPC e 6/1 e 7/2 do RCP).
O facto de um recurso não ser admitido, não evita que a contraparte tenha tido estas despesas (taxa e honorários) e que tenha direito ao pagamento parcial delas através das custas de parte (artigos 529/4 e 533/2-d do CPC e 26 do RCP).
E só o pode ter se, no despacho que não admitir o recurso, se determinar por conta de quem elas ficam, mesmo que o recurso não seja admitido por inutilidade superveniente (artigos 607/6, 613/3 e 536 do CPC).
Isto tudo vale quer para o caso do despacho do art. 641/2 do CPC, quer para o despacho do art. 655 do CPC, pois que, quando o juiz do tribunal recorrido profere o despacho do art. 641/2 do CPC, já as partes tiveram que pagar a taxa de justiça para as alegações e contra-alegações de recurso e constituir advogado para o efeito, e portanto têm direito a receber as custas de parte, mesmo que o recurso não seja admitido (não tendo assim razão o voto de vencido quando faz essa destrinça para tentar justificar a condenação em custas do ac. do STJ de 19/12/2017). Para além disso, no caso do acórdão do STJ de 03/05/2018, não se trata de uma decisão ao abrigo do art. 641/2 do CPC, mas sim de uma decisão que materialmente tem cabimento do art. 655 do CPC.
(ii) o voto de vencido não dá destino às taxas pagas por recorrentes e recorridos, nem dá solução para os valores de honorários que os recorridos tenham tido de pagar ao seu mandatário.
Isto em termos que sirvam para todos os casos e não só para este caso (art. 3 do CC: Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.). Isto é, esta decisão de haver ou não custas quando não é admitido um recurso, é uma questão genérica, que não deve ser resolvida tendo em conta o caso concreto.
Ao invocar, como argumento, a transacção quanto a custas existente no caso dos autos, o voto de vencido pretende resolver uma questão genérica com os elementos de um caso concreto.
E, para mais sem razão, porque o acórdão do STJ de 03/05/2018, nem sequer podia saber se a transacção ia ser homologada ou não (pois que a homologação ocorreu 5 meses depois).
E o argumento que acaba por utilizar, do art. 30 do RCP, é uma petição de princípio, porque pressupõe que o contador pode, por sua iniciativa, devolver as taxas pagas, quando este acórdão está a afirmar, precisamente, que não o pode fazer, porque depende de uma decisão do tribunal. Nesse sentido, veja-se o começo da norma do art. 30 do RCP: 1 - A conta é elaborada de harmonia com o julgado em última instância […]. E além disso, não resolve a questão das outras custas de parte (honorários e despesas).
(iii) Tal como a instância se inicia com a proposição da acção e esta considera-se proposta, intentada ou pendente logo que a respectiva petição se considere apresentada, produzindo efeitos contra o réu a partir do momento da citação (art. 259/1 e 2 do CPC) e não com um despacho de admissão da acção, assim um recurso inicia-se com a interposição do mesmo e produz efeitos em relação à parte contrária com a notificação da interposição deste, não com um despacho que admite o recurso.
(iv) como consta no relatório deste acórdão, neste mesmo processo, o STJ, pela decisão singular de 19/12/2017 não admite a revista normal contra o acórdão do TRL de 13/07/2017 e condena nas custas do mesmo os recorrentes (que são autores e réus). Pelo que, ao tentar demonstrar que o acórdão do STJ de 03/05/2018 não incorreu no lapso de omitir a condenação nas custas, o voto de vencido está a dizer (sem o assumir de modo expresso) que a decisão singular do STJ de 19/12/2017 está errada (mas é evidente, por tudo o que se disse, que não está).
(v) se a posição do voto de vencido fizer vencimento, o Estado passa a ter de devolver todas as taxas de justiça pagas pelos recursos que não sejam admitidos, independentemente de todo o trabalho que os tribunais tenham tido, e os recorridos deixam de ter direito, a título de custas de parte, a honorários dos advogados que tenham tido que contratar.
*
Pelo exposto, julga-se procedente a arguição da nulidade do despacho de 09/11/2020 (apenas na parte que se refere à taxa remanescente de 88.434€ pela revista excepcional), e, em substituição do tribunal recorrido, constata-se o erro material de omissão de decisão quanto a custas no acórdão do STJ de 03/05/2018, determinando-se que os autos sejam remetidos ao STJ para que o colectivo que proferiu tal acórdão corrija tal omissão, decidindo as custas do recurso de revista excepcional (de 2016).
Este recurso fica sem custas, pelo explicado acima (pelo que a taxa de justiça paga pelos réus como impulso deste recurso deve-lhes ser devolvida).

Lisboa, 17/06/2021
Pedro Martins
Inês Moura
Laurinda Gemas (vencida, conforme a declaração de voto que segue:

Declaração de voto
Voto vencida, por não acompanhar a decisão de julgar procedente a arguição de nulidade da decisão recorrida e, em substituição do tribunal recorrido, constatar um erro material de omissão de decisão quanto a custas do recurso de revista excecional do acórdão do STJ de 03-05-2018 que deva ser corrigido nos moldes apontados (“acórdão do STJ que corrigir a omissão de condenação em custas”).
Penitenciando-me por não lograr ser mais sintética na indicação das razões da minha discordância, começo por lembrar que no requerimento de desistência dos pedidos e transação quanto a custas, as partes acordaram que “(i) Cada parte é responsável pelas custas que já pagou. (ii) As custas e outros encargos, para lá das custas já pagas, que resultem e vierem a resultar da presente ação, incluindo os do presente recurso, e a ela devem ser exigidas pelo Tribunal, caso, eventualmente e sem conceder, venham a ser cobradas, serão da responsabilidade dos Autores Recorridos e dos Réus Recorrentes em partes iguais, com o limite máximo de € 18.000,00 (dezoito mil euros) para os Autores Recorridos. (iii) Os Autores Recorridos prescindem de cobrar a título de custas de parte aos Recorrentes (a)as custas já pagas e ainda (b) os montantes referidos no artigo 533.º, n.º 2, alíneas b) e d) do Código de Processo Civil.”
No seguimento do acórdão da formação do STJ de 03-05-2018, foi proferida decisão homologatória da desistência dos pedidos na Relação de Lisboa (em 01-10-2018) que considerou que só “mediante recurso a mecanismo técnico excepcional vertido a fls. 3209 e 3210 foi possível chegar à homologação da desistência” a qual, sem o mesmo, “nunca seria homologável face à manifesta extinção anterior do poder jurisdicional”; quanto a custas, nesta decisão da Relação, faz-se constar “Custas nos termos acordados”. Inexiste, pois, decisão condenatória das custas relativas ao recurso de revista excecional.
O despacho recorrido apreciou a reclamação apresentada (em 13-03-2020, por todos os Autores e Réus), a qual, na sua motivação, compreende três segmentos, assim intitulados “I. Do acordo das partes quanto às custas”, “II. Da inconstitucionalidade das custas” e “III. Do depósito autónomo”, terminando nos seguintes termos (acrescentei o sublinhado):
a) As contas de custas n.ºs 920400027762020, 920400027792020, 920400027852020 e 920400027862020 ser retificadas nos termos acima expostos e emitidas novas guias, o que se requer;
b) As partes serem dispensadas do pagamento da taxa de justiça remanescente ou, subsidiariamente, o seu montante ser substancialmente reduzido;
c) Caso assim não se entenda – o que se considera por mera cautela de patrocínio, sem conceder -, as partes serem dispensadas do pagamento da taxa de justiça remanescente referente ao recurso de revista excecional, no montante total de € 88.434,00 (oitenta e oito mil, quatrocentos e trinta e quatro euros), nos termos do artigo 14.º-A, alínea c) do RCP, ou, subsidiariamente, ser reduzido o montante da taxa de justiça devida neste caso, por a mesma ser manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade e do direito de acesso aos tribunais;
d) Por mera cautela de patrocínio, caso se considere que há a pagar taxa de justiça remanescente, deverá o montante de € 405.297,00, depositado pelos Réus F- SGPS, S.A., J e V- LDA., à ordem do IGFEJ, ser utilizado para efetuar o respetivo pagamento.
No ponto II dessa reclamação, as partes, depois de pugnarem pela inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 6.º, n.ºs 1 e 2, e 11.º do RCP conducente à obrigação do pagamento da taxa de justiça remanescente no montante global de 576.453 €, pronunciaram-se especialmente (cf. pontos 36. a 46. da reclamação) sobre a conta de custa n.º (…) nos campos respeitantes ao recurso de revista excecional interposto (por dois Réus) em dezembro de 2016 (do acórdão da RL de 13-10-2016 que julgou improcedentes as apelações) e à respetiva alegação de resposta de janeiro de 2017, desenvolvendo aí uma linha de argumentação diferente. Assim, alegaram que o acórdão do STJ de 03-05-2018 decidiu não conhecer dos pressupostos da revista excecional, ou seja, que nem sequer foram conhecidos os pressupostos para “deferir ou indeferir o recurso de revista excecional em causa” e que, muito menos, foi proferida qualquer decisão de mérito sobre o referido recurso, pelo que, no seu entender, não devia ser cobrada taxa de justiça relativa ao recurso de revista excecional por tal contrariar o disposto nos artigos 529.º, n.º 1 do CPC, e 3.º, n.º 1, e 14.º-A, al. c), ambos do RCP. Retomaram, de seguida, as partes a argumentação sobre a inconstitucionalidade da interpretação normativa.
Lembro ainda que o despacho recorrido tem o seguinte teor:
“Requerimento de 13.03.2020 (fls. 3278 a 3291):
No que respeita ao requerido sob a al. a), assiste razão aos requerentes, tendo em conta o teor da transacção quanto a custas celebrada entre as partes em 14.03.2017 (fls. 2930 a 2934) e a decisão de 01.10.2018 (fls. 3246).
Por conseguinte, determino a reformulação da conta em conformidade.
No que concerne ao requerido sob a al. b), quer a questão relativa à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou da sua redução, quer a referente à inconstitucionalidade ora invocada foram já objecto de decisão transitada em julgado (despacho de 01.10.2018, a fls. 3245 a 3252), pelo que sobre as mesmas encontram-se esgotados os poderes jurisdicionais deste tribunal (cfr. art. 613.º do NCPC), nada mais cumprindo decidir.
Finalmente, quanto à al. c), em face do acordo das partes e do disposto no art. 32.º, n.º 4 do RCP, defere-se o requerido.
Notifique e DN.”
No confronto do assim decidido com a reclamação apreciada, é manifesto que o despacho recorrido, quando se referiu ao requerido na al. c), pretendia, naturalmente, referir-se ao requerido na al. d) da reclamação. Ademais, quando aludiu ao requerido na al. b), pretendeu também englobar o referido em c), cujos argumentos se encontravam desenvolvidos na parte II da motivação da reclamação. Portanto, considerou o Tribunal que a questão da dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, incluindo quanto à revista excecional, não podia ser conhecida porque havia sido objeto de decisão transitada em julgado. Isto mesmo foi reconhecido pelos Apelantes (cf. conclusão 10) quando afirmam que o Tribunal recorrido se limitou a agregar na mesma decisão o pedido relativo à dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente referente às custas do processo com o pedido relativo à dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente relativa ao recurso excecional de revista, para concluir que tal matéria já havia sido decidida pelo Tribunal da Relação de Lisboa. Apesar de inexistir decisão condenatória nas custas do recurso.
Assim, na presente apelação, o que é, em primeira linha, invocado pelos Apelantes não é a nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida, mas o erro de julgamento, pois, no seu entender, não se podia considerar abrangido pelo caso julgado formal a questão da dispensa do pagamento de taxa de justiça remanescente relativo ao recurso de revista excecional quando nem sequer existia decisão condenatória de custas. E nisto têm razão: há erro de julgamento quanto ao alcance do caso julgado da decisão da Relação de Lisboa de 01-10-2018, a qual não abrange as custas do recurso de revista excecional.
Nessa conformidade, defendem os Apelantes que se imporia, pois, apreciar a questão que não chegou a ser conhecida (por o tribunal recorrido ter considerado que estava abrangida pela autoridade do caso julgado formal), isto é, se deviam as partes ser dispensadas do pagamento da taxa de justiça remanescente ou, subsidiariamente, se o respetivo montante devia ter sido reduzido, pugnando pela tempestividade do então requerido (cf. conclusões 14 e 15).
Na linha da argumentação então incipientemente aflorada pelos Reclamantes (e que era de conhecimento oficioso) e agora retomada, defendem os Apelantes, em primeiro lugar, não serem devidas quaisquer custas pelo recurso de revista excecional, isto pelo simples facto de, quanto a tal recurso, inexistir decisão - da RL ou do STJ - de condenação das partes no pagamento das custas.
O processado nos presentes autos evidencia que não se chegou a completar a tramitação atinente à admissão do recurso de revista excecional, até porque tal implicaria a passagem pelo prévio crivo da formação do STJ (cf. art. 672.º, n.º 3, do CPC), que, por considerar inútil fazê-lo, no acórdão de 03-05-2018, não chegou a tomar posição a respeito da verificação dos pressupostos específicos da revista. De salientar que o anterior despacho da Relação de Lisboa de 16-10-2017 se limitou a referir que não tinha sido proferida decisão considerada válida sobre a verificação dos pressupostos referidos no n.º 1 do art. 672.º do CPC, continuando nos seguintes termos: “Tendo sido interposto recurso de revista excepcional e não se divisando fundamento de rejeição do mesmo ao nível da respectiva tempestividade bem como da legitimidade do(a) Recorrente(s), determino que se remetam os autos ao Supremo Tribunal de Justiça face ao disposto no n.º 3 do art. 672.º do Código de Processo Civil”.  Com a ulterior sentença homologatória da desistência dos pedidos, acabou por ficar prejudicada ou “inacabada” a admissão do recurso.
Ora, esta situação pode ser equiparada à não admissão do recurso prevista no art. 641.º, n.º 2, do CPC (que não se confunde com a decisão do relator a que se refere o art. 655.º do mesmo Código, como é o caso da decisão sumária de 19/12/2017, que, de modo algum, se pretende questionar) e, assim sendo, não dar lugar a condenação nas custas do recurso. Neste particular, veja-se o “Guia das Custas Processuais”, 5.ª edição, e-book CEJ, disponível online, pág. 108, “No caso de não admissão do recurso, é duvidoso se deverá haver lugar a condenação do recorrente nas custas do recurso. Considera-se que a resposta deverá ser negativa, por se tratar de ocorrência processual incluída na tributação geral do processo88, contrariamente ao que sucede no caso de deserção do recurso ou desistência do recurso, em que a instância de recurso já se iniciou (sendo, pois, nestes casos, devidas custas pelo recorrente).
No entanto, é devida taxa de justiça pela reclamação do despacho de não admissão do recurso, sendo o reclamante responsável pelo pagamento das custas no caso de indeferimento (Tabela II).” No mesmo sentido, cita-se nesta obra, na nota de rodapé 88, SALVADOR DA COSTA, Regulamento das Custas Processuais Anotado, 2013, 5.ª edição, Almedina, pág. 208.
De referir que a lei prevê a possibilidade de restituição de montantes (incluindo taxas) pagos, servindo a conta de custas, além do mais, para essa indicação (cf. art. 30.º do RCP) e que as partes podem dispor do seu crédito por custas e do direito à devolução de quantias depositadas. No caso dos autos, existiu transação quanto a custas, em que as partes, além do mais, aceitaram a sua responsabilidade pelas custas já pagas e os Autores recorridos prescindiram de cobrar montantes relativos a custas de parte, o que pode ser entendido como uma renúncia a tais direitos.
Tendo presente que inexiste na jurisprudência critério uniforme a respeito das custas nos recursos não admitidos e as particularidades do processado que antecedeu o acórdão do STJ de 03-05-2018 e o conteúdo do mesmo, em particular a circunstância de assentar em razões de economia processual e correta gestão processual, tendo a considerar que o acórdão não é omisso quanto a uma condenação em custas, tanto mais que proferido pela formação do STJ, determinando a baixa dos autos à Relação para apreciação de requerimento de desistência dos pedidos.
Embora se possa colocar a dúvida sobre uma eventual omissão de pronúncia do aludido acórdão a respeito das custas, o que consentiria uma decisão intercalar de remessa dos autos ao STJ em ordem a possibilitar a apreciação sobre se existiu uma omissão de condenação em custas, na falta daquela e de ulterior retificação de (hipotética) omissão decisória de condenação nas custas do recurso de revista excecional que dê cobertura às contas de custas relativamente às quais foi apresentada a reclamação pelas partes, resta concluir que as contas de custas devem ser retificadas, não podendo englobar as custas desse recurso, assistindo razão aos Apelantes a este respeito.