Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | GRAÇA AMARAL | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO RENDA REGIME APLICÁVEL RENDA CONDICIONADA | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/29/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I - O NRAU, relativamente ao regime de rendas, , prevê a aprovação de novos regimes, ressalvando a manutenção em vigor dos regimes da renda condicionada e da renda apoiada previstos no RAU. II - O elemento literal do artigo 61º, da Lei 6/2006, de 27-02, é demasiado claro para comportar uma interpretação restritiva ou correctiva, no sentido de fazer excluir a actualização de renda ao abrigo do art.º 81-A, do RAU, do elenco dos regimes que o NRAU considerou manter em vigor. (Sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, I - Relatório Partes: R e M (Autores/Recorridos) D e M (Réus/Recorrentes) Pedido: - Declarar-se válida a actualização da renda; - Declarar-se a resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento das rendas devidas; - Condenação dos Réus: a) a devolverem o locado livre e devoluto de pessoas e bens; b) a pagarem as rendas relativas a Outubro, Novembro e Dezembro de 2007, no valor actualizado e nas que se vierem a vencer na pendência da acção e até ao trânsito em julgado da sentença. Subsidiariamente: - Declarar-se válida a actualização da renda; - Condenação dos Réus a pagarem as rendas relativas a Outubro, Novembro e Dezembro de 2007, no valor actualizado e nas que se vierem a vencer na pendência da acção e até ao trânsito em julgado da sentença. Fundamentos: - serem proprietários da fracção autónoma designada pela letra B do prédio urbano sito em Benfica, e o Réu arrendatário da referida fracção por força de um contrato de arrendamento celebrado com o anterior proprietário, pagando uma renda mensal de 40 euros; - serem os RR proprietários de dois imóveis em condições de serem habitados, não se encontrando ocupados: moradia na Praia das Maçãs; - ter sido comunicado aos RR, a actualização da renda ao abrigo das disposições do regime da renda condicionada, fixando-se a mesma no montante de 251,00 euros; - O Réu não procedeu ao pagamento das rendas relativas aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2007, entendendo ainda não lhes ser aplicável 1qualquer fundamento para a actualização das rendas Contestação: Os Réus vieram invocar a caducidade do direito de resolução do contrato por falta de pagamento das rendas, alegando terem procedido ao depósito da renda mensal devida - 40,00 euros – através de depósito na CGA – em virtude dos Autores não terem passado qualquer quitação do pagamento da renda referente ao mês de Outubro de 2007. Consideram legalmente indevida a aplicação do regime de renda condicionada, pelo que não aceitam a actualização da renda comunicada pelos senhorios. Deduziram reconvenção pedindo a condenação dos AA no pagamento do montante de 11.334,00 euros, relativas ao custo das obras que fizeram no arrendado perante a omissão dos senhorios na execução de obras de reparação indispensáveis à utilização do locado. Na réplica os AA mantiveram o posicionamento assumido na petição e, em consequência da reconvenção deduzida, requereram a alteração da forma de processo (para processo com forma ordinária) e ampliação da causa do pedir e do pedido (condenação dos RR no desmantelamento e fecho das varandas, por terem procedido a obras no arrendado não autorizadas pelo senhorio). Em resposta os RR alegaram que as obras realizadas foram autorizadas pelo anterior proprietário. Alterado o valor da acção e a forma de processo o tribunal julgou-se incompetente para o conhecimento da acção, tendo determinado a remessa dos autos às Varas Cíveis (despacho de fls. 100/101). Sentença Na fase do saneador o tribunal a quo considerou que os autos habilitavam à decisão de mérito pelo que julgou a acção parcialmente procedente e não conheceu do pedido reconvencional. Declarou válida a actualização da renda do locado para o valor de 215,00 euros mensais e condenou os Réus ao pagamento das mesmas desde Outubro de 2007. Conclusões da apelação: a. O art.º 81ºA do DL 321-B/90, de 15-10 foi revogado pelo art.º 60 da Lei 6/2006 de 27-02; b. As normas transitórias previstas no capítulo I do NRAU são imperativas. Relativamente aos arrendamentos habitacionais existentes à data da entrada em vigor do RAU, como é o caso do arrendamento dos autos, é admissível apenas proceder à actualização de renda nos termos do disposto nos artigos 30º e seguintes da Lei 6/2006 de 27-02; c. O art.º 61 da Lei 6/2006, de 27-02, mantém (excepcionalmente) em vigor até à publicação de novos regimes, apenas o regime da renda condicionada e apoiada e não o mecanismo de actualização de renda previsto no art.º 81 do RAU, que não foi consagrado no novo regime e é contrário ao “espírito” do NRAU; d. A interpretação da parte final do disposto no art.º 61 da Lei 6/2006, de 27-02deve ser restritiva ou correctiva, ou sejam no sentido de se reportar apenas às normas do RAU que estabelecem o regime de renda condicionada e apoiada, designadamente os seus art.º 79, 80 e 82; e. A actualização da renda pretendida pelo Apelado não tem suporte legal, pelo que dever. Conclusões dos Apelados: A. O recurso apresentado pelos Apelantes restringe-se apenas à questão jurídica do NRAU ter ou não revogado o regime previsto no art.º 81 do RAU; B. Os apelantes sustentam a inaplicabilidade do art.º 81 do RAU, entendendo que no art.º 61 do NRAU, o legislador estaria a referir-se apenas às rendas condicionada e apoiada e não ao seu regime. C. Salvo o devido respeito, essa conclusão é absolutamente desprovida de sentido, não encontrando qualquer correspondência quer na letras quer no espírito da lei, porquanto o art.º 61 do NRAU refere-se expressamente aos “regimes da renda condicionada e da renda apoiada” (sublinhado nosso) e não apenas às rendas. D. Estando provado que os Apelantes são proprietários de duas habitações na mesma área metropolitana do locado, estando as mesmas aptas à satisfação das necessidades habitacionais dos Apelantes, encontram-se preenchidos os requisitos para a actualização levada a cabo pelos Apelados. II - Apreciação do recurso Os factos: O tribunal a quo deu como provado o seguinte factualismo: Ø Está registada a favor dos Autores, por compra, a propriedade da fracção autónoma designada pela letra B do prédio urbano sito em Benfica. Ø À data da aquisição da fracção pelos Autores já o Réu a ocupava a dita fracção, por força de um contrato de arrendamento celebrado com o anterior proprietário. Ø A renda mensal era de € 40,00. Ø Está registada a favor dos Réus, por compra, a casa sita na Praia das Maçãs, Sintra. Ø Tal casa tem condições de habitabilidade e não está arrendada. Ø Está igualmente inscrito a favor do Réu, a fracção autónoma designada pela letra R, sita na Rua das …. Ø Tal fracção tem condições de habitabilidade e não está arrendada. Ø Por carta datada de 20 de Abril de 2007, os Autores comunicaram ao Réu a actualização a actualização da renda, ao abrigo das disposições relativas ao regime da renda condicionada, fixando a nova renda no valor de € 176,00 mensais. Ø Em 10 de Maio de 2007, os Autores enviaram nova carta ao Réu, rectificando o valor anterior e fixando a nova renda no montante de € 251,00. Ø A estas missivas, respondeu o Réu, em carta datada de 3 de Julho de 6 2007, alegando a revogação do RAU e a falta de previsão no NRAU da possibilidade de actualização das rendas nos termos pretendidos pelos Autores. Ø Face a esta resposta, os Autores enviaram nova carta, datada de 10 de Julho de 2007, na qual reiteravam a sua posição, exigindo o pagamento a 1 de Setembro de 2007 da renda relativa a Outubro de 2007 com o valor de € 251,00. Ø A 24 de Julho de 2007, o Réu enviou nova carta aos Autores reafirmando a sua posição, alegando novamente que o RAU tinha sido revogado pelo NRAU e este nada dispunha sobre o regime de renda condicionada. Ø Ao que os Autores replicaram nos termos da carta datada de 20 de Agosto de 2007, reafirmando a obrigação do Réu de pagar a 1 de Setembro de 2007 o valor actualizado de renda, no montante de € 251,00. Ø O Réu não pagou aos Autores as rendas relativas aos meses de Outubro, Novembro, Dezembro de 2007, no valor de € 251,00 cada. Ø A forma acordada para o pagamento das rendas é através de vale postal enviado para o domicílio dos Autores. Ø Em 03.09.2007, o Réu enviou ao Autor um vale postal no valor de € 40,00 para pagamento da renda relativa ao mês de Outubro. Ø Como o Autor não enviou o recibo da renda, o Réu depositou na Caixa Geral de Depósitos a renda relativa ao mês de Outubro, no montante de € 40,00, facto que comunicou ao Autor. Ø O Réu procedeu também ao depósito na Caixa Geral de Depósitos das rendas referentes aos meses de Novembro e Dezembro de 2007 e Janeiro de 2008, no valor de € 40,00 cada uma. Ø Em 04.12.2007, o Réu depositou também na CGD a quantia de € 1.346,00 correspondente à diferença entre o valor de € 40,00 e o valor da actualização feito pelos Autores, acrescido de 50%. Ø Os Réus mandaram fechar duas varandas do locado com alumínio. O direito Questão submetida pelos Apelantes ao conhecimento deste tribunal: (delimitada pelo teor das conclusões do recurso e na ausência de aspectos de conhecimento oficioso – art.ºs 690, n.º1, 684, n.º3, 660, n.º2, todos do CPC) Ø - Da (in)aplicabilidade do art.º 81 do DL 321-B/90, de 15/10 1. Nesta fase dos autos apenas permanece sob litígio a questão da validade da actualização da renda do locado. A sentença objecto de recurso considerou válida a actualização de renda indicada pelos Autores tendo por subjacente a seguinte argumentação: - ser aplicável à situação sub judice o Novo Regime do Arrendamento Urbano; - encontrar-se em vigor os regimes da renda condicionada e da renda apoiada, previstos nos art.ºs 77 e seguintes do RAU, face à não publicação, até à data, de novos regimes; - enquadrar-se o factualismo provado na previsão do art.º 81º-A, do RAU, aditado pelo DL 278/93, de 10-08, nos termos do qual se permite a actualização de renda até ao que seria o seu valor em regime de renda condicionada quando o prédio arrendado para habitação se situe na área metropolitana de Lisboa ou do Porto e o arrendatário tenha outra residência ou seja proprietário de imóvel situado nessa área que possa satisfazer as respectivas necessidades habitacionais, ou quando se trate de casa arrendada noutro ponto do país e o arrendatário tenha outra residência ou seja proprietário de imóvel nas mesmas condições na área da respectiva comarca. Insurgem-se os Réus contra esta decisão fundamentados na revogação do art.º 81-A do RAU, operada pelo art.º 60 da Lei 6/2006, de 27-02, norma que, segundo os mesmos, terá de ser interpretada de forma restritiva e correctiva, à luz da vontade real do legislador (art.º 9, n.º1, do Código Civil). Segundo os Apelantes, nos contratos de arrendamento para habitação existentes à data da entrada em vigor do NRAU, apenas é possível proceder à actualização das respectivas rendas nos termos do disposto nos artigos 30º e seguintes da Lei 6/2006, uma vez que o mecanismo de actualização previsto no art.º 81-A não foi expressamente salvaguardado no texto do NRAU, e contraria o espírito do regime transitório consagrado no capítulo I do referido diploma. Defendem, nessa medida, que o art.º 61, da Lei 6/2006, mantém, tão só e excepcionalmente em vigor (até à publicação de novos regimes), a renda condicionada e a renda apoiada (artigos 79º, 80º e 82º, do RAU). 2. Não oferece qualquer dúvida que na situação sub judice, em que se está perante um contrato de arrendamento para habitação celebrado antes da vigência da RAU, há que aplicar o regime transitório previsto no NRAU (aprovado pela Lei 6/2006, de 27-02, que entrou em vigor em 28-6-2006), isto é, o consagrado no art.º 26 e seguintes da citada Lei 6/2006 (cfr. art.ºs 59º e 28). A problemática suscitada reconduz em saber se o art.º 81-A, do RAU, se encontra (ou não) em vigor. No que se reporta ao regime de rendas, conforme dispõe o artigo 61º, da Lei 6/2006, de 27-02, o NRAU prevê a aprovação de novos regimes, ressalvando, porém, a manutenção em vigor dos regimes da renda condicionada, e da renda apoiada previstos no RAU. Com efeito e nos termos deste preceito, Até à publicação de novos regimes, mantêm-se em vigor os regimes da renda condicionada e a renda apoiada, previstos nos artigos 77 e seguintes do RAU. Ao invés do defendido pelos Apelantes, entendemos que o elemento literal do preceito é demasiado claro para comportar a pretendida interpretação restritiva ou correctiva, no sentido de fazer excluir a actualização de renda ao abrigo do art.º 81-A do RAU do elenco dos regimes que o NRAU considerou manter em vigor. Acresce que, igualmente, não descortinamos tal interpretação do espírito da lei, conforme (embora sem o explicitar) afirmam os Recorrentes. Com efeito, o citado art.º 61 ao estatuir no sentido de se manterem em vigor os regimes da renda condicionada e da renda apoiada está a referir-se aos regimes na sua globalidade (e, não, apenas às rendas propriamente ditas), na forma como se encontravam estruturados no momento da revogação do RAU. Por outro lado, mantendo-se tais regimes, carece de cabimento considerar que a vontade do legislador seria a de fazer excluir parte desse regime - o referente à actualização da renda -, uma vez que o pressuposto que se encontra subjacente à actualização – inexistência de fundamento de protecção do arrendatário justificativa da não actualização da renda, quando disponha de casa ou residência na mesma comarca ou na mesma área metropolitana em que resida – assume justificação na caracterização e natureza do respectivo regime de renda. Por conseguinte e contrariamente ao sustentado pelos Apelantes, o mecanismo de actualização de renda previsto no art.º 81-A, do RAU não teria de se encontrar expressamente salvaguardado no texto do NRAU, tendo presente que o art.º 61 já o contempla (ao manter em vigor o regime de renda de que o mesmo faz parte). Consideramos, por isso, que o posicionamento que os Réus vieram em recurso defender não assume suporte legal (quer na letra, quer no espírito da lei) já que não se vislumbra (nem os Recorrentes o justificam) que essa tenha sido a vontade do legislador. Improcedem, por isso, as conclusões das alegações. III – Decisão Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida. Custas pelos Apelantes. Lisboa, 29 de Março de 2011 Graça Amaral Ana Maria Resende Dina Monteiro |