Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6100/10.1TBVFX.L1-7
Relator: ISABEL SALGADO
Descritores: SEGURO MULTIRISCO
PROPOSTA DE SEGURO
OMISSÃO DO ENVIO À SEGURADORA
RESPONSABILIDADE CIVIL
PERDA DE CHANCE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. A relação entre o mediador de seguros e o proponente-tomador de seguro resolve-se numa relação contratual (embora preparatória de uma outra relação contratual, a do contrato de seguro), pela qual o proponente incumbe o mediador de receber a proposta e de providenciar pelo seu encaminhamento para a seguradora, aceitando o mediador, a contendo do seu interesse e daquela, levar a cabo essa actividade.
2. Decorridos cinco meses sobre a data definida para a apreciação da proposta do seguro de multi-riscos pela seguradora, seria expectável à luz do senso comum, que esta enviasse a apólice confirmativa do contrato e pagassem o recibo do prémio (no premium, no cover). De acordo com as regras da experiência, presente o objectivo lucrativo da actividade da seguradora, uma proposta de seguro relativa à cobertura de riscos de imóvel habitacional em construção e sem valor estabilizado na matriz, seria de prever que a mesma procedesse à prévia análise do risco, com deslocação ao local e a consulta e solicitação aos AA dos elementos documentais em ordem à fixação do valor do prémio.
3. Situação que descuraram com apatia inesperada em assunto de relevância crucial para o seu património, nada fazendo para se assegurarem da aceitação da proposta do contrato de seguro e a sua conclusão e eficácia.
3.A confiança na aceitação da proposta contratual excedeu manifestamente o padrão normal de confiança em circunstância equivalente, afastando-se por consequência da diligência própria do homem médio.
4. Entre a conduta imputada à Ré e os estragos ocorridos não é possível extrair qualquer nexo etiológico material. O dano ocasionado pela omissão do seu dever reconduz-se à   quebra de comunicação entre os AA e a seguradora, durante um espaço temporal delimitado e transitório. Em abstracto, segundo o curso normal das coisas, a actuação da Ré mostra-se inidónea para produzir os estragos ocorridos na casa em consequência do deslizamento de terras na zona de implantação.
5. A factualidade apurada não revela necessidade da maior plasticidade das teorias que a jusante da teoria da causalidade adequada, corrijam dúvidas ou fronteiras ténues a propósito do nexo de causalidade.
6. A teoria do escopo da norma violada, conquanto enfatize a importância de determinar o âmbito da protecção da norma violada e dos interesses agredidos, desloca a abordagem do nexo de causalidade para o campo da ilicitude.
7. Na formulação da teoria das esferas de risco, é ainda imprescindível que haja uma conexão material entre o risco gerado pela conduta e o resultado ilícito, a qual não se verifica na situação concreta. 
8. Provado que a instabilidade do terreno se deve às condições geológicas –geotécnicas da zona de edificação, condicionante relevante na aceitação e termos do contrato de seguro, queda-se em mera probabilidade ou fraco padrão de consistência, o sucesso da pretensão da cobertura dos danos verificados no âmbito da proposta de seguro multi-riscos subscrita, à luz da perda de chance.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ªSecção do Tribunal da Relação de Lisboa

I.RELATÓRIO
1. Da Acção
P… e  D…intentaram acção declarativa de condenação com processo comum, contra Caixa Geral de Depósitos, pedindo a sua condenação no pagamento da indemnização, a título de reparação dos danos de natureza patrimonial no valor de Euros 150.000,00 e Euros 100,000,00 por danos morais, reduzido para Euros 192.441, 92 acrescendo juros de mora.
 Em fundamento da responsabilidade da Ré, alegaram ter com ela celebrado em 28.03.2007, um contrato de mútuo no montante de Euros 200,00, 00, destinado à construção de uma moradia para a sua habitação, contra a imposição de condição de celebração de um contrato de seguro multirriscos, proposta que subscreveram.
No dia 10.03.2010, quando já habitavam a casa, dada a forte precipitação registada nesse inverno, ocorreram deslizamentos de terras que causaram extensos e graves danos. Lembrando-se do contrato de seguro, participaram o sinistro à Ré, que lhes comunicou que a proposta nunca tinha sido enviada à Fidelidade, e assim concluindo pela violação culposa da posição contratual e consequente obrigação da Ré de indemnizar os AA pelos prejuízos ocorridos, nos termos do artigo 483º, do Código Civil.  
A Ré contestou e alegou em síntese, que o deslizamento das terras não se ficou a dever ao invocado fenómeno natural das chuvas, mas às caraterísticas do solo e a deficiências na construção da casa, risco não coberto pelas condições da proposta, sendo além do mais inaceitável, que decorrido o período temporal extenso desde a assinatura da proposta, os AA. estivessem convencidos da celebração e conclusão do contrato de seguro, impugnando ainda o valor dos danos e o custo da reparação.
Concluem pela improcedência da acção e a consequente absolvição do pedido.
Na réplica, os AA. mantiveram o conteúdo e pretensão da petição inicial.
*
Realizou-se audiência prévia com fixação dos temas de prova, e juntas as provas periciais e outras, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, seguindo-se a sentença que julgou improcedente a acção e absolveu a Ré do pedido.    
2. Do Recurso 
Inconformados, os Autores interpuseram recurso da sentença, extraindo a final as seguintes Conclusões:
a ) Os Recorrentes demandaram a Recorrida, peticionando a condenação desta no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e também não patrimoniais, alegando, em suma, que: b) Contrataram com a Recorrida um mútuo com vista à construção de uma moradia sobre um terreno sito no Casal Lapão, na Arruda dos Vinhos; c) A Recorrida exigiu que os Recorrentes contratassem um seguro “Multi-Riscos” Crédito Habitação, que se destinava a proteger a Recorrida em caso de destruição e/ou danificação da moradia a construir e a hipotecar, passando a moradia a ser o garante do pagamento do mútuo contratado à Recorrida; d) Os Recorrentes subscreveram, na agência da Recorrida Caixa Geral de Depósitos da Arruda dos Vinhos, uma proposta de seguro “Multi-Riscos” Crédito Habitação; e) No dia 7 de Março de 2010, devido a um acentuado período de chuvas, ocorreu um deslizamento de terras que causou danos na moradia dos Recorrentes. O que foi verificado pelo LNEC e pela Câmara Municipal da Arruda dos Vinhos; f) Os Recorrentes certos de terem subscrito um seguro Caixa Seguro Lar (o tal seguro multi-riscos), participaram o sinistro ocorrido, no dia 12 de Março de 2009; g) Ao abrigo do ponto 23 da cláusula 4ª das Condições Gerais da apólice; h) O perito da Companhia de Seguros Fidelidade Mundial deslocou-se à moradia dos Recorrentes para efeitos de vistoria. i) No dia 18 de Março de 2010 os Recorrentes receberam uma carta da companhia de seguros comunicando que, na sequência da peritagem, decidia-se pela não-aceitação do risco. j) Na sequência desta estranha comunicação da companhia de seguros os Recorrentes dirigiram-se à agência da Recorrida na Arruda dos Vinhos, onde lhes foi transmitido que a proposta de seguro subscrita não teria sido enviada pela Recorrida à companhia de seguros, por esquecimento, e que, afinal, nem sequer existia seguro; k) A Recorrida actuou como mediador de seguros; l) Devido à deslocação de terras ocorrida por via do fenómeno natural (chuva intensa e anormal) a moradia dos Recorrentes sofreu vários danos, cuja reparação importaria o dispêndio de uma quantia nunca inferior a € 150.000,00 (Cento e Cinquenta Mil Euros); m) Os Recorrentes sofreram danos não patrimoniais indemnizáveis em quantia nunca inferior a € 100.000,00 (Cem Mil Euros). n) A Recorrida, em Contestação, expendeu, em apertada síntese, o seguinte: o) Logo tratou de confessar que “…Por razões que se desconhecem e que foi impossível averiguar tal proposta (de seguro) não chegou a ser remetida para a Fidelidade Mundial, não tendo assim, ocorrido a aceitação da proposta de seguro pela Seguradora.”; p) Mesmo que proposta fosse enviada à seguradora, tal não significava que a proposta fosse aceite nem significava que o sinistro fosse coberto e indemnizável; q) Este sinistro estaria excluído das coberturas da apólice porquanto os danos sofridos e verificados na moradia dos Recorrentes derivavam não de um fenómeno natural, mas, da má execução da moradia e da qualidade do terreno onde foi implantada a moradia; r) E, ainda, que a seguradora não assumiria o sinistro como coberto pela apólice de seguro, porquanto os Recorrentes deveriam ter informado a companhia de seguros que a moradia se situava em terreno com grau de risco elevado no que respeita à ocorrência de sinistros, nomeadamente aluimentos e deslizamentos de terras; s) Os Recorrentes, entretanto, e, já depois de proferido Despacho Saneador, vieram a reduzir o pedido inicial, para a quantia de € 192.441,92 (Cento e Noventa e Dois Mil, Quatrocentos e Quarenta e Um Euros e Noventa e Dois Cêntimos), fazendo corresponder a reparação da moradia na quantia de € 75.156,04 (Setenta e Cinco Mil, Cento e Cinquenta e Seis Euros e Quatro Cêntimos), acrescida de IVA, à taxa legal de 23%. t) Foram julgados provados e não provados os factos que melhor constam da decisão recorrida. u) A acção foi julgada improcedente, por não provada. v) Com os fundamentos que melhor constam da decisão recorrida. w) Se bem se interpretou a decisão agora posta em crise, está provada e demonstrada a conduta ilícita da Recorrida e bem assim, estão provados e demonstrados os danos patrimoniais e extra patrimoniais sofridos pelos ora Recorrentes. x) Apenas não ficou provado e demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta ilícita da Recorrida e os danos sofridos pelos ora Recorrentes. y) Mas andou mal o Tribunal a quo. z) A decisão a quo vem estribada, em termos de determinação de nexo de causalidade, na clássica doutrina da causalidade adequada. aa) A teoria da causalidade adequada propugnada na decisão de que ora se recorre mostra-se, assim, falha em muitas situações. bb) Insuficiências que são, contudo, supridas pela teoria do escopo da norma violada. cc) A doutrina do escopo da norma violada desliga-se da linguagem causal e resolve o problema da delimitação dos danos a indemnizar, na sequência de um acto ilícito e culposo, a partir de considerações de tipo normativo, centradas na indagação da finalidade da norma violada. dd) Neste caso concreto, mostra-se inequivocamente provado e demonstrado que a Recorrida Caixa Geral de Depósitos, actuando como mediadora de seguros, agiu em contrário aos seus deveres de mediadora de seguros para com os Recorrentes, violando, expressa e confessadamente, o que se regulou na al.) d) do artº31º do Dec. Lei 144/2006 de 31/07: - Transmitir à empresa de seguros, em tempo útil, todas as informações, no âmbito do contrato de seguro, que o tomador do seguro solicite. ee) Actuação, essa, que, de acordo com o nº1 do artº799º do Código Civil se presume culposa. ff) A norma violada visava tutelar que os Recorrentes, por via da mediação da Recorrida, teriam contratado uma apólice de seguro multi-riscos, tendo por objecto segurar a moradia acabada de construir na Arruda dos Vinhos. gg) A norma confessada e culposamente violada pela Recorrida destinava-se a proteger os interesses dos Recorrentes. hh) Daqui vem a decorrer, claramente, que, de acordo com a doutrina da teoria do escopo da norma violada, no que tange à determinação do nexo de causalidade, dúvidas não deviam ter restado de que existiu, de facto, nexo de causalidade entre a conduta ilícita da Recorrida e os danos sofridos pelos Recorrentes. ii) Porquanto se basta a violação de uma norma.jj) E, portanto, mal andou o Tribunal a quo ao não julgar verificado o nexo de causalidade no caso sub judice. kk) Nexo de causalidade que também se deveria ter julgado verificado com recurso a outra teoria: a teoria das esferas de risco. ll) De acordo com a teoria das esferas de risco, que estabelece critérios imputacionais, a responsabilidade deixa de ser entendida exclusivamente do ponto de vista dogmático, para passar a ser compreendida do ponto de vista ético-axiológico. A própria acção, de onde se parte, deve ser vista como uma categoria onto-axiológica, o que, no diálogo com a pressuposição do risco, permite inverter alguns dos aspectos tradicionais da problemática do achamento do nexo de causalidade. mm) Duas hipóteses são, então, em teoria, viáveis: ou a pessoa actua investida num especial papel/função ou se integra numa comunidade de perigo concretamente definida e, neste caso, a esfera de risco apta a alicerçar o juízo imputacional fica a priori desenhada, ou, a esfera de risco/responsabilidade que abraça não é suficientemente definida para garantir o acerto daquele juízo. nn) Está bom de ver e parece ser pacífico que a Recorrida, actuando como mediador de seguros assumiu um risco que extravasa a esfera do risco geral da vida. Extravasa o risco natural. Extravasa o risco universal. oo) Mas, outrossim, assume o risco concreto da actividade de mediador de seguros. Assume o risco de uma actividade comercial. Assume o risco de uma actividade comercial especialmente regulada. Assume o risco de uma actividade que, para ser exercida legal e licitamente, importa, como condição, a existência de um seguro de responsabilidade civil profissional que cubra (com limites mínimos) danos provocados a terceiros por erros e omissões verificados no exercício da actividade. pp) Daqui decorre que também por esta via apontada pela teoria das esferas de risco se haveria de ter considerado verificado o nexo de causalidade. qq) Consta assente no ponto 43) dos factos provados que: A moradia edificada pelos AA. Encontra-se implantada numa encosta cujas características geológicas e geotécnicas lhe conferem instabilidade que pode sujeitá-la a escorregamentos/deslizamentos. rr) salvo o devido respeito, devia ter sido considerado provado era que: A moradia edificada pelos AA. Encontra-se implantada numa encosta cujas características geológicas e geotécnicas lhe conferem instabilidade que pode sujeitá-la a escorregamentos/deslizamentos, quando combinadas tais caraterísticas geológicas e geotécnicas como períodos de chuvas intensas e prolongadas.  ss) Nessa medida, deve alterar-se a redacção do ponto 43) da matéria assente nos termos supra propugnados. tt) O Tribunal a quo decide não considerar provado o ponto 50) dos factos não provados, no qual se constava: Que o Inverno que se iniciou em 2009 tenha sido extremamente rigoroso e chuvoso, tendo a precipitação sido mais abundante que nos anos anteriores. uu) A certidão do IPMA refere que a precipitação verificada nos dias 1 a 10 de Março de 2010 foi de 190% do valor médio de precipitação em quase trinta anos de registos. O que permitiria a conclusão que o Inverno que se iniciou em 2009, ou pelo menos parte dele, os primeiros dez dias de Março, foram extremamente chuvosos. vv) Razão pela qual se deveria ter dado como provado o facto 50) dos factos não provados. ww) O mesmo se dizendo relativamente ao facto não provado 51) dos factos não provados. xx) Também mal andou o Tribunal a quo ao não julgar provado o ponto 62) dos factos não provados. yy) Desde logo porquanto não cuidou de atentar que o pedido original dos Recorrentes (quantia superior a € 150.000,00) foi reduzido, com o requerimento probatório, para a quantia de € 75.156,04 (Setenta e Cinco Mil, Cento e Cinquenta e Seis Euros e Quatro Cêntimos), acrescido de IVA, à taxa legal de 23%. zz) A realidade é que os Recorrentes, numa primeira fase (Petição Inicial), ainda não tinham concretizado o valor exacto necessário para a reparação da moradia que edificaram. Mas, tinham uma estimativa. aaa) Sendo que, depois, reduziram o pedido para a exacta quantia que terceiros profissionais do ramo indicaram como necessária para a reparação da moradia danificada por um fenómeno natural. bbb) Sendo, ainda, que a justeza e necessidade das reparações indicadas no orçamento foram confirmadas pelo legal representante da sociedade que estimou os custos com a reparação da moradia, em audiência de discussão e julgamento. ccc) Sendo, de resto, pacífico e incontroverso por banda do perito Nuno Alexandre (autor do relatório pericial junto aos autos em 2 de Abril de 2019), que todos os danos alegados pelos Recorrentes existiram, tal qual foram alegados. ddd) De qualquer maneira, o perito Nuno Alexandre quando inquirido em audiência, e, por cotejo e análise do orçamento junto pelos Recorrentes com o Requerimento Probatório datado de 5 de Setembro de 2013, com a referência Citius 14328510, acabou por afastar-se daquela quantia que arbitrou (€ 1.750,00+IVA), assumindo (ao contrário do que teria aposto no relatório pericial) claramente que existiram trabalhos que se justificavam e até tinham valores adequados. eee) Tendo inclusive, admitido, quando a isso instado pelo Tribunal, item por item do orçamento que os trabalhos eram necessários, no todo ou em parte, até tendo concordado, as mais das vezes, com os valores unitariamente indicados. fff) Sendo que, tal exercício, era apto a que o Tribunal a quo chegasse à quantia necessária a despender para reparação da moradia dos Recorrentes. ggg) O que não podia era julgar, de forma simplista, afirmando que não se havia provado que na moradia se haveria de despender pelo menos € 150.000,00 na reparação de estragos. hhh) Devendo, por isso, com os factos de que tomou conhecimento, julgar provado que, para reparação dos danos verificados na moradia dos Recorrentes se teria que despender determinada quantia, conforme indicado pelo perito Nuno Alexandre. iii) Sendo de alguma forma irrelevante se os Recorrentes aceitaram ou não aceitaram o orçamento ou se os trabalhos foram já efectuados ou não. O que releva é que os danos se verificaram e que a reparação de tais danos importa determinada quantia definida pelos terceiros profissionais que indicaram o preço da reparação. jjj) O Tribunal a quo “abre a porta” para a ressarcibilidade dos danos sofridos pelos Recorrentes, por banda da Recorrida, ao abrigo da perda de chance. kkk) Mas, de imediato a fecha por não ter sido peticionado pelos Recorrentes.  lll) Em, primeiro lugar deve dizer-se que continua a não se concordar com a opção propugnada na decisão recorrida, em termos de inexistência de nexo de causalidade entre a conduta ilícita da Recorrida e os danos sofridos pelos Recorrentes. mmm) Mas, nnn) No caso concreto, não corresponde à realidade dos factos que os Recorrentes não tenham alegado factos tendentes a ser compaginada a possibilidade da verificação da perda de chance. ooo) Com efeito, toda a narrativa dos Recorrentes assenta na ideia (que corresponde à indesmentível verdade) que não fora a conduta ilícita da Recorrida e os Recorrentes teriam contratado um seguro multi-riscos com uma seguradora, no âmbito do qual existiam coberturas a acionar com vista à reparação dos danos verificados na moradia dos Recorrentes. ppp) Toda a narrativa assenta na ideia de que os Recorrentes apenas não dispõem de seguro que cobriria os danos porquanto a Recorrida, enquanto mediadora de seguros, não cumpriu os seus deveres legais de enviar para a seguradora a proposta de seguro. qqq) Toda a narrativa dos Recorrentes, desde o início dos autos se baseia na ideia de que perderam a oportunidade de discutir com a seguradora se o sinistro existiu ou não devido a um fenómeno natural e que perderam a oportunidade de discutir com a seguradora se os danos verificados na moradia estavam ou não cobertos pela apólice de seguro. rrr) E, por isso, e, atento o que ficou provado, não restam grandes dúvidas que o Tribunal a quo poderia (e deveria) ter condenado a Recorrente em indemnização justa e equitativa, ao abrigo da ressarcibilidade do dano de perda de chance. sss) Isto porque, do artº5º do Código do Processo Civil (que corresponde ao artº664º do revogado CPCivil), resulta a vinculação do Tribunal à matéria de facto alegada e só a esta, mas não ao seu enquadramento jurídico. ttt) Por isso, se o Tribunal entender que a solução jurídica do caso, em face dos concretos factos alegados e provados, é diferente da propugnada pelas partes, deve decidir conforme assim entender. uuu) Ou seja, deve (e não pode), o Tribunal, exercitando o seu poder de livre apreciação das regras de direito, subsumir o caso aos institutos que considere aplicáveis. vvv) O que também se impunha até do ponto de vista do princípio da economia processual: para quê obrigar a parte a intentar nova acção só para invocar outros institutos jurídicos à luz dos quais deveria formular os seus pedidos, quando o relevante é a alegação e prova dos factos porque se pede? www) Ou seja, se o Tribunal entendia, como aparentemente entendia, que, in casu instituto jurídico se aplicava, diverso do alegado pelos  Recorrentes, o que deveria (e não poderia) ter feito seria subsumir os factos provados a tal instituto jurídico diferente do alegado pelos Recorrentes. xxx) Certo é que, não tendo feito ocorreu uma verdadeira denegação de justiça. yyy) A verdade é que estavam preenchidos os tais factos que o próprio Tribunal a quo pretendiam ver discorridos sobre o tema “perda de chance”. zzz) Devendo, o Tribunal a quo, por esta via, condenar a Recorrida com recurso a juízos de equidade, tendo, em conta, igualmente, os danos não patrimoniais que, comprovadamente, os Recorrentes sofreram. aaaa) O que se requer seja feito, agora, nesta via recursiva. bbbb) Substituindo-se a decisão recorrida por outra que venha a condenar a Recorrida.  cccc) O que desde já se requer. Nestes termos, E, nos melhores de Direito que Vª. Exas. Venerandos Desembargadores melhor suprirão, requer-se que seja o presente Recurso provido por procedente, e, em consequência se revogue a sentença proferida, substituindo-se a mesma por outra que venha a decidir pela CONDENAÇÃO da Recorrida, assim se fazendo Justiça.»
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A Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência integral do recurso com a confirmação do julgado de primeira instância e a sua absolvição do pedido. 
O recurso de apelação foi admitido em regularidade dos pressupostos processuais.   
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Colheram-se os vistos e nada obsta ao conhecimento de mérito do recurso.
3. Objecto do Recurso-thema decidendum
São as conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, que fixam o objecto do recurso e delimitam os poderes cognitivos do tribunal ad quem, conforme previsão legal e entendimento pacífico da jurisprudência – artigos 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº3 a 5, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil.
Posto o que, face ao conteúdo da sentença recorrida e as conclusões enunciadas, o empreendimento decisório convoca a apreciação dos seguintes tópicos:
- Saber se, ocorre erro de julgamento na decisão de facto;
- Saber se, se verifica nexo de causalidade entre a conduta omissiva da Ré e os danos ocorridos, cuja indemnização os AA. reclamam, à luz da teoria do escopo da norma violada e bem assim sob a teoria das esferas de risco;
- Saber se, a factualidade alegada e provada comporta a recondução do pedido de indemnização à figura da perda de chance.  
II. Fundamentação
A. Os Factos
Para a apreciação da causa o tribunal a quo atendeu à seguinte factualidade:        
AA) Factos Provados:
1) Na Conservatória do Registo Predial de Arruda dos Vinhos consta inscrita, sob a apresentação n.º 3 de 2005/04/15, a aquisição por doação a favor de D… do prédio rústico denominado L…, sito em Arruda dos Vinhos, ali descrito sob o n.º 0000/199920810, da freguesia de Arruda dos Vinhos e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 4 C.
2) Por documento particular intitulado “empréstimo com hipoteca”, a R. declarou emprestar aos autores a importância de € 200 000, 00, que estes declaram aceitar, para a construção de uma moradia no imóvel referido em 1), mediante o reembolso em 43 prestações mensais e sucessivas, no valor aproximado de € 550, tendo dado em garantia a hipoteca sobre o imóvel referido em 1), crédito esse que foi concedido em 28.03.2007.
3) Sob a cláusula 14.ª do documento complementar que faz parte integrante do documento referido em 2) lê-se o seguinte: «A parte devedora obriga-se a: (…) c) tê-lo seguro à vontade da credora e a só por intermédio desta e com o seu acordo alterar o referido seguro».
4) Em 9.2.2007, o autor subscreveu junto da CGD uma proposta de seguro “Multi-riscos” crédito habitação, o qual se destinava a proteger a Caixa Geral de Depósitos, em caso de destruição ou danificação da moradia a construir.
 5) Num dos campos a proposta referida em 4) consta a menção: “o seguro proposto neste formulário considera-se aceite no 15º dia após a sua entrega na Seguradora, salvo se, entretanto, o proponente for notificado pela Seguradora da recusa, da sua antecipada aprovação, ou da necessidade de recolher elementos adicionais para validação do risco. Contudo, o seguro só produzirá os seus efeitos se o prémio for pago no momento da celebração do contrato ou até à data indicada no aviso de pagamento”.
6) Sob o ponto 23 da cláusula 4.ª das Condições Gerais do seguro (onde no canto inferior esquerdo consta “Dez/2009”) referido em 4), lê-se o seguinte: “23. Aluimento de Terras Âmbito da Garantia Esta cobertura garante os danos directamente causados aos bens seguros em consequência dos seguintes fenómenos geológicos: a) Aluimentos; b) Deslizamentos; c) Derrocadas e afundamentos de terrenos” e ainda “EXCLUSÕES ESPECÍFICAS”:1. Para além das exclusões previstas na cláusula 3.ª, ficam ainda excluídos desta cobertura as perdas ou danos: a) Resultantes de colapso, total ou parcial, das estruturas, não relacionado com os riscos geológicos garantidos, causados directa ou indirectamente por vibrações, rebaixamento do nível freático, trabalhos de remoção de terras ou que ocasionem o enfraquecimento dos apoios das estruturas, escavações, fundações, trabalhos de bate-estacas e análogos; b) Sofridos por edifícios ou outros bens seguros, que assentem sobre fundações que contrariem as normas técnicas ou as boas regras de engenharia ou execução das mesmas em função das características dos terrenos e do tipo de construção ou bens garantidos; c) Resultantes de deficiência de construção, do projecto, da qualidade dos terrenos ou outras características do risco que fossem ou devessem ser do conhecimento prévio do segurado, assim como os danos em bens seguros que estejam sujeitos a acção contínua da erosão e acção das águas, salvo se o segurado fizer prova de que os danos não têm qualquer relação com aqueles fenómenos; d) Sofridos pelos bens seguros quando o edifício seguro ou o edifício onde se insere a fracção segura se encontrar, no momento imediatamente anterior ao do sinistro, desmoronado, deslocado das suas fundações, danificado ou defeituoso, de forma que esteja afectada a sua estabilidade e segurança global. 2. Salvo convenção em contrário constante das Condições Particulares, esta cobertura também não garante as perdas ou danos resultantes de qualquer um dos riscos abrangidos pela garantia que se verifiquem durante a ocorrência de fenómenos sísmicos ou no decurso das 72 horas seguintes à sua última manifestação.» 
7) Na cláusula 6ª das condições gerais do seguro relativo à proposta referida em 4) consta: “1. O tomador do seguro ou segurado está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pelo segurado”.
8) Em 24.07.2009, foi emitido Alvará de Obras de Construção n.º 81/2009, pela Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos, que titula a aprovação de obras que incidem sobre o prédio referido em 1).
9) Em 31.08.2009, foi emitido Alvará de Utilização n.º 73/2009, pela Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos, que titula a aprovação de utilização da habitação sita em …., da freguesia de Arruda dos Vinhos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Arruda dos Vinhos sob o n.º 0000/19920810 e inscrito na matriz predial sob o artigo 4, secção C da respectiva freguesia.
10) Na certidão emitida pela Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos, em 26.3.2010, lê-se o seguinte: «(…) Após deslocação ao local (pelas 16 horas e 10 minutos), a técnica do Serviço Municipal de Protecção Civil acompanhada pelo técnico da Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística (Eng. Élio Piriquito) verificou a ocorrência de movimentos de terra que originaram danos na referida habitação, como é documentado nas fotografias abaixo apresentadas. Afigura-se que os danos causados na moradia não resultam exclusivamente de movimentos de terra causados pelo assentamento da construção em si, mas sim de movimentos de escorregamento de camadas de materiais argilosos que não são superficiais.»
11) No auto de vistoria, datado de 26.3.2010, da Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos lê-se o seguinte: «(…) A vistoria teve por objectivo verificar as anomalias do edificado referidas na exposição da Sra. D…, determinada pelo despacho do Sr. Vice-Presidente de 17/03/2010. Em resultado desta vistoria, a comissão verificou que ocorreram deslizamentos de terras na zona envolvente da construção que poderá estar na origem das anomalias detectadas. Relativamente às anomalias da construção, verificou-se o seguinte: 1. Existência de fissuras localizadas nas fachadas poente e sul (interior e exterior); 2. O pavimento da garagem tem empolamentos generalizados com inutilização do portão automático do revestimento (mosaicos); 3. Detectou-se um desnivelamento global da habitação que provocou dificuldade na utilização das portas e um deslocamento horizontal da estrutura superior da pérgola; 4. Fendas localizadas no muro técnico.»
12) No parecer emitido pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, datado de Abril de 2010, lê-se o seguinte: «(…) Com base nos elementos apurados, é possível concluir que a causa dos danos na habitação terá sido o deslizamento de terreno ocorrido a 7 de Março de 2010, após período de chuvas intensas e prolongadas, que levaram à saturação dos terrenos e a subida do nível freático. A construção da moradia e o movimento de terras a ela associado terão criado localmente condições propícias à formação das superfícies de escorregamento. No entanto, a causa principal da instabilidade global deve-se às condições geológico-geotécnicas da encosta (de declive ondulado e relativamente suave), caracterizadas pela presença de bancadas calcárias no topo e de formações margo-gresosas e argilosas na restante zona, de grande susceptibilidade a escorregamentos induzidos pela saturação dos terrenos. A ocorrência destes escorregamentos é um fenómeno conhecido nesta região, que apresenta uma periodicidade de décadas, em geral, coincidente com períodos de elevada e prolongada precipitação atmosférica. (…) Em consequência destes deslocamentos, para além de fendilhação em grande parte das paredes de alvenaria da moradia, constatou-se que a laje do piso térreo se encontra com uma inclinação considerável no sentido descendente do talude. O piso da garagem, por seu turno, apresenta um empolamento importante, provavelmente devido a um aumento das subpressões da água. (…) O muro lateral do acesso à garagem também tinha sido afectado, tendo acompanhado os movimentos da moradia e, deste modo, apresentando fissurações numa extensão de cerca de 3 m (…)»
13) No dia 13.03.2010, a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial contactou com os autores, para agendar e levar a cabo a peritagem da moradia.
14) Por carta datada de 18.3.2010, a Fidelidade Mundial comunicou aos AA. que, “Temos presente a proposta de seguro Multi-riscos Habitação, certificada em 12.3.2010, relativa ao local e risco e ao empréstimo da Caixa Geral de Depósitos, S. A. a cima referidos. Realizada a devida peritagem, concluímos pela na aceitação do risco proposto”.
15) A Caixa Geral de Depósitos, S.A. agiu como mediador de seguros ao intermediar a celebração do contrato de seguro Multi- Riscos entre os autores e a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial.
16)Por carta datada de 9.7.2010, a R., além do mais, deu conta ao A. que: “Compreendemos o desagrado manifestado na sua comunicação, contudo, lamentamos não ser possível apresentar-lhe, a esta data, uma resposta definitiva. Como será do seu conhecimento, estamos a proceder a diligências internas para resolução da situação, em articulação com a companhia de seguros Fidelidade Mundial, com a maior celeridade possível”.
17) A proposta referida em 4), que deveria ser certificada informaticamente aquando da libertação da última tranche das verbas referentes ao empréstimo concedido, ou seja, em 29.09.2009, por razões que se desconhecem e que foi impossível averiguar, não foi remetida para a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial, pelo que não ocorreu a aceitação da referida proposta por esta seguradora.
18) A Caixa Geral de Depósitos encontra-se registada sob o n.º 207186041, no Instituto de Seguros de Portugal, na categoria de Mediador de Seguros Ligado, nos Ramos Vida e Não Vida e com a respectiva autorização para trabalhar com a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial, S. A.
19) A Caixa Geral de Depósitos facilita e faculta aos seus clientes as propostas de adesão para os seguros a que eventualmente estejam obrigados por força dos contractos celebrados com a Caixa Geral de Depósitos
20) Na Conservatória do Registo Civil de Lisboa, consta registado que L… nasceu em 18 de Setembro de 2010 e é filho de P… e de D…..
21) Em data não apurada, os AA., que então viviam entre si em união de facto, decidiram construir no prédio referido em 1) uma moradia unifamiliar para aí instalarem a sua habitação.
22) Para o efeito os AA. contrataram um empreiteiro que edificou a moradia.
23) A subscrição da proposta referida em 4) destinou-se a satisfazer a obrigação aludida em 3).
24) Após a conclusão da moradia os AA. instalaram nela a sua residência.
25) No dia 10.3.2010, após um período de chuvas intensas e prolongadas, ocorreu um deslizamento de terras.
26) Que provocou na moradia edificada pelos AA. os estragos referidos em 11) e 12). 27) E assustou os AA.
28) Na sequência do deslizamento de terras e dos estragos por ele provocados na sua habitação os AA. solicitaram a vistoria e parecer referidos em 11) e 12).
 29) Em moldes que se desconhecem os AA. participaram a ocorrência do sinistro à Companhia de Seguros Fidelidade Mundial, a fim de accionarem o seguro referido em 4).
 30) Na sequência do contacto referido em 13) a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial fez deslocar um perito à moradia dos AA. para a vistoriar, o qual elaborou um relatório da visita.
31) Após o recebimento da carta referida em 14) os AA. dirigiram-se à agência da CGD na Arruda dos Vinhos a fim de pedirem explicações. 32) Os AA. tomaram conhecimento da ocorrência referida em 15) e de que a CGD e a agência da Arruda dos Vinhos estavam a tentar ultrapassar a situação. 
33) Os AA. estavam convencidos que a CGD tinha dado o devido encaminhamento à proposta referida em 4) e que beneficiavam do seguro a que esta reporta.
34) A edificação da moradia referida nos autos foi para os AA. a concretização de um projecto e sonho de vida. 
35) Os AA. não têm gosto ou prazer em habitar na moradia. 36) Após o referido em 25) e 26) os AA. tiveram medo de habitar na moradia.
37) O medo sentido causou perturbação aos AA. durante algum tempo.
38) À data da ocorrência referida em 25) os AA. aguardavam o nascimento de um filho.
39) Após o referido em 25) e 26) a A. vivenciou um período de persistente nervosismo e ansiedade.
40) Após a ocorrência referida em 25) e 26) os AA. estiveram a viver alguns meses em casa dos pais da A. 
41) Tendo voltado a residir na moradia por si edificada algum tempo após o nascimento do seu filho referido em 20).
42) Na sequência dos factos referidos em 25) e 26) os AA. ficaram e viveram largo tempo nervosos, inquietos, tristes e preocupados. 
43) A moradia edificada pelos AA. encontra-se implantada numa encosta cujas características geológicas e geotécnicas lhe conferem instabilidade que pode sujeitá-la a escorregamentos/deslizamentos.
44) Por não disporem do seguro a que reporta a proposta dita em 4), os AA. não puderam accioná-lo aquando da ocorrência assinalada em 25) com vista à reparação dos estragos referidos em 26). 
45) Os AA. nunca receberam qualquer aviso de pagamento, nem foram notificados para pagar, o prémio do seguro a que reporta a proposta dita em 4).
46) Os AA. nunca foram interpelados pela Companhia de Seguros Fidelidade Mundial relativamente a qualquer seguro Incêndio/Multi-riscos.
47) Os AA. não receberam qualquer certificado de seguro, nem condições gerais, especiais ou particulares.
48) Os AA. nunca pagaram qualquer prémio referente a seguro de Incêndio/Multi-riscos à Companhia de Seguros Fidelidade Mundial referente à moradia dos autos.
49) Aquando da subscrição da proposta referida em 4) os AA. não deram conta das características do terreno em que edificaram a sua habitação.
AB) Factos Não Provados:
50) Que o Inverno que se iniciou em 2009 tenha sido extremamente rigoroso e chuvoso, tendo a precipitação sido mais abundante que nos anos anteriores. 
51) Que o rigor do Inverno tenha provocado o deslizamento de terras referido em 25).
52) Que a participação referida em 29) tenha sido feita no balcão de Arruda dos Vinhos da CGD
53)  Que os AA. tenham recebido no balcão da CGD de Arruda dos Vinhos indicação de que seriam contactados pela companhia de seguros.
54)  Que os AA. tenham solicitado directamente à Companhia de Seguros Fidelidade Mundial a resolução do problema e que na sequência desse contacto esta entidade lhes tenha respondido que não assumia o risco ou a reparação da moradia por inexistência de contrato de seguro.
55) Que nessa sequência os AA. tenham voltado a contactar a R., dirigindo-se quase todas a semanas à agência de Arruda dos Vinhos.
56) Que os AA. tenham ido a várias reuniões na referida agência, com a presença do Dr. J.., Director Comercial da R. para a Região Oeste.
57) Que nessas reuniões e visitas a R., através dos seus funcionários, garantisse aos AA. que o problema seria resolvido e dirimido pela R.
58) Que, em Novembro de 2010, na sede da R., em reunião com a sua administração, tenha sido dito aos AA. que ela não se responsabilizava pelo sucedido e que só o faria em instância judicial.
59) Que a moradia possa derrocar a qualquer momento em razão dos estragos referido em 11) e 12).
60) Que os AA. ainda tenham medo de habitar na moradia.
61) Que a moradia tenha divisões inutilizadas.
62) Que a reparação dos estragos registados na moradia importe o dispêndio de quantia superior a € 150 000.
 63) Que em razão do referido em 39) a A. tenha tido uma gravidez de risco clínico, que a tenha obrigado a ficar em casa dos pais nos dois últimos meses de gestação.
64) Que a situação aludida em 63) tenha agravado as preocupações dos AA.
65) Que o assentamento da construção da moradia tenha provocado movimentos de terra que originaram os estragos ditos em 11) e 12).
66) Que a construção da moradia naquele local tenha obrigado a uma movimentação de terras que criou condições propícias à formação de superfícies de escorregamento.
67) Que, caso conhecesse as características do terreno em que foi implantada a moradia construída pelos AA., a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial, aceitasse a proposta referida em 4).
68) Que a reparação dos estragos referidos em 11) e 12) estivesse coberta pelo seguro a que respeita a proposta dita em 4).
69) Que a Companhia de Seguros Fidelidade Mundial tenha considerado os estragos causados na moradia como resultantes de problemas ou deficiências de construção, a serem tratados com a entidade responsável pela obra e não no âmbito do seguro multirriscos.
70) Que os AA. não pudessem ignorar a sua obrigação de informar a seguradora de qualquer situação que pudesse influenciar na aceitação ou não do risco.
71) Que os AA. não ignorassem que a sua moradia se situava em terreno com grau de risco elevado no que respeita à ocorrência de sinistros, nomeadamente aluimentos e deslizamentos de terras. 
 72) Que, no dia 8.3.2009, os AA. se tenham dirigido à agência da CGD da Arruda dos Vinhos, informando que a sua moradia tinha sofrido um sinistro e solicitando o contacto da seguradora para participar a ocorrência, o qual foi facultado por funcionário da R. 
73) Que os AA. tenham comunicado o sinistro directamente à seguradora através do serviço de call center. 
74) Que os AA. tenham regressado à agência da CGD de Arruda dos Vinhos em 10.3.2010, tendo nessa altura informado que não existia seguro em vigor.
75) Que, de imediato, nessa sequência a R. tenha diligenciado junto da Fidelidade Mundial pela aceitação do seguro a que se refere a proposta dita em 4).
76) Que no dia 12.3.2010 a R. tenha transmitido aos AA. que o pedido de aceitação do seguro havia sido formalizado, com conhecimento do sinistro em causa, sendo necessária a realização de uma peritagem. 77) Que o referido em 19) tenha acontecido perante os AA. 78) Que a R. tenha imposto aos AA. a subscrição da proposta dita em 4).
B.   Enquadramento Jurídico
1. Da impugnação da matéria de facto
Os recorrentes cumpriram os ónus enunciados nos artigos 639º e 640º, nº1, do CPC, na medida em que são indicadas as concretas questões de facto que pretendem ver reapreciadas, as respostas que, na sua perspectiva, devem ser dadas e, os fundamentos probatórios que suportam a alteração preconizada.
Haverá, doravante a considerar a ressalva restritiva infra explicitada em 1.3.   
A divergência dos recorrentes quanto ao sentido probatório alcançado pelo tribunal a quo é apontada à matéria vertida no ponto 43) dos factos provados, e quanto aos pontos 50), 51) e 62) do elenco dos factos não provados.
*   
Em primeira linha de fundamentação global da decisão de facto , consta da sentença :«   Para fixar como antecede a matéria de facto relevante à apreciação da causa o tribunal procedeu à análise crítica das declarações de parte dos AA. e dos depoimentos das testemunhas L..e LC…, engenheiros civis e autores do parecer de fls.48 e ss./946 e ss., …, irmão do A., A… e M…a, pais da A., D…, empresário da construção civil, J…, empreiteiro a quem foi adjudicada a edificação da moradia dos demandantes, R…, PP.. e H…, técnicos da Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos, PM.., funcionário da R., H… e PM…, colaboradores da Fidelidade Mundial e de um prestador de serviços desta, A…, engenheiro civil, L…s, autor do projecto de arquitectura da moradia dos AA., C.., engenheiro civil e autor dos projectos de especialidades da mesma edificação, e A…, colega dos demandantes. Teve-se ainda em atenção os documentos de fls.23 e ss. (certidão predial), 26, 27 e ss. (contrato de mútuo), 38 (alvará de construção), 39 (alvará de utilização), 40 e ss., 42, 43 e ss. (vistoria), 48 e ss./946 e ss. (parecer do LNEC), 59/145 (carta de 18.3.2010), 60 (carta de 9.7.2010), 61 e ss. (certidão de nascimento), 69 e ss. (condições de seguro), 109 e ss. (proposta de seguro), 146 (carta de 28.4.2010), 230 e ss. (orçamento), 256 e ss. (certidão IPMA) e 458 e ss. (certidão camarária do projecto da moradia dos AA.) e regras de normalidade e experiência comum.  Ponderou-se igualmente o teor dos relatórios periciais de fls.299 e ss. e 922 vs. e ss., de cujas conclusões técnicas não se vê razão para divergir, bem como os esclarecimentos prestados em audiência pelos respectivos autores e por um deles por escrito a fls.936.»   
Especifica-se de seguida a convicção probatória por referência a cada um dos factos provados e não provados, que se extratará a propósito do objecto da impugnação dos recorrentes.     
Constata-se assim, que o tribunal a quo, no âmbito da apreciação da matéria de facto em apreço, percepcionou os requisitos formais do ónus de impugnação e procedeu a uma pormenorizada análise crítica dos meios de prova, em adequado alinhamento com o disposto nos artigos 607.º, n.º 4 e 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, e 662.º, n.º 1, do CPC.
*
Posto isto e revisitados os elementos probatórios à luz da apreciação crítica deste tribunal ad quem.
Antecipa-se que não se acomodam as alterações da decisão de facto que os recorrentes propugnam, como adiante se procurará demonstrar, nem se evidencia qualquer erro no raciocínio formulado pelo tribunal a quo ao considerar como provada a matéria que consta do ponto 43) dos factos provados nos termos formulados e por não provada a matéria dos pontos 50) e 51) dos factos não provados, com aquela relacionada.   
1.1. Facto provado 43)
 «A moradia edificada pelos AA. encontra-se implantada numa encosta cujas características geológicas e geotécnicas lhe conferem instabilidade que pode sujeitá-la a escorregamentos/deslizamentos.»
Alegam os apelantes que a prova produzida inculca a sua ampliação – alteração a matéria, devendo passar a constar que: «A moradia edificada pelos AA. encontra-se implantada numa encosta cujas características geológicas e geotécnicas lhe conferem instabilidade que pode sujeitá-la a escorregamentos/deslizamentos, quando combinadas tais caraterísticas geológicas e geotécnicas como períodos de chuvas intensas e prolongadas », ao que se interpreta, por indicação do conteúdo do relatório pericial do LNEC, datado de Novembro de 2015, junto aos autos.  
Sobre este ponto a motivação probatória do tribunal:
 «A factualidade contida em 25), 26) e 43) está afirmada com base na perícia do LNEC, sendo que o deslizamento de terras ocorrido e as suas consequências para a habitação dos AA. foi ainda larga e consensualmente referido pelos inquiridos em julgamento, estando também registados nos documentos de fls.42, 43 e 48 emanados pelo LNEC e a Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos na sequência de deslocações técnicas ao local.»
Supomos que, a questão ficará clarificada com o visionamento integral da dinâmica do processo causal que despoletou o evento danoso, ordenado ao longo da matéria de facto provada e alicerçada em major, nas perícias efectuadas.      
Da matéria fáctica assente e não controvertida, ressuma que os danos na casa resultaram de deslizamentos no terreno da zona de implantação, que sucedeu após um período de chuvas intenso e prolongado, levando à saturação do solo e à subida do nível freático, tendo a movimentação de terras associada à construção, criado localmente condições propícias à formação das superfícies de escorregamento – cfr. pontos 10, 11, 12, 25 e 26 dos factos provados - essa constitui, por conseguinte, a causa imediata e exterior do evento danoso.       
No entanto, a causa principal da instabilidade/deslizamento/escorregamento global das terras foram as condições geológico-geotécnicas da encosta (de declive ondulado e relativamente suave), caracterizadas pela presença de bancadas calcárias no topo e de formações margo-gresosas e argilosas na restante zona, de grande susceptibilidade a escorregamentos induzidos pela saturação dos terrenos. A ocorrência destes escorregamentos é um fenómeno conhecido na região, que apresenta uma periodicidade de décadas, em geral, coincidente com períodos de elevada e prolongada precipitação atmosférica.     
Em reforço desta linha probatória, no relatório do LNEC os peritos afirmam em segurança, que a causa principal do deslizamento derivou da natureza do solo e não da pluviosidade, como se retira, v.g. deste excerto:
“A construção da moradia e o movimento de terras a ela associado terão criado localmente condições propícias à formação das superfícies de escorregamento. No entanto a causa principal da instabilidade global deve-se às condições geológico- geotécnicas da encosta (de declive ondulado e relativamente suave), caraterizadas pela presença de bancadas calcárias no topo e de formações margo-gresosas e argilosas na restante zona, de grande suscetibilidade a escorregamentos induzidos pela saturação dos terrenos…”  
Daqui é de concluir que, a chuva intensa e prolongada que os apelantes pretendem sediar como motor dinamizador do deslizamento de terras não foi identificada numa relação de causa-efeito.
A chuva intensa terá, quando muito precipitado a subida do nível freático, indissociável, porém, da originária composição argilosa do solo e da sua instabilidade prévia.    
De resto, seguindo ainda o conteúdo do relatório pericial do LNEC , determinado  pelo tribunal a quo , para [1] apurar “se a causa dos estragos (..) [2]é um deslizamento de terras provocado por chuvas intensas e prolongadas”,[3] dele consta, que o solo onde foi edificada a moradia dos AA. tem uma “elevada sensibilidade à água” e que, em “períodos de maior pluviosidade, este nível superficial de depósitos, de composição argilosa, exibe elevada suscetibilidade para o desenvolvimento de escorregamentos.” 
E, mais adiante, constando que o terreno onde se situa a moradia dos AA. está “historicamente sujeito a movimentos de terreno, o que determina o caráter remexido destes solos, acentuando as suas baixas caraterísticas resistentes. A identificação de socalcos na paisagem denuncia, em regra, a ocorrência de escorregamentos antigos, apresentando estas zonas elevada suscetibilidade para o desenvolvimento de novos movimentos de terreno através da reativação das instabilizações prévias”.
Em suma, face ao conteúdo do relatório pericial indicado e os demais elementos probatórios, inexiste fundamento para a pretendida alteração da factualidade provada no ponto 43).
1.2. Factos Não provados 50) e 51)
«Que o Inverno que se iniciou em 2009 tenha sido extremamente rigoroso e chuvoso, tendo a precipitação sido mais abundante que nos anos anteriores.»
«Que o rigor do Inverno tenha provocado o deslizamento de terras referido em 25»
Consta em sede de motivação da decisão recorrida «Os elementos probatórios carreados ao processo e em particular a certidão de fls.256 não são suficientes para permitir a afirmação do facto referido em 50).»
E, ainda, «Por não ter merecido confirmação pericial, sendo aliás matéria contrária aos juízos periciais formulados no processo, foi dada como não provada a matéria contida em51), 59), 65) e 66).»
Valem aqui os argumentos que se expenderam retro.
Ficando afastada a hipótese de considerar o nível de precipitação como causa do deslizamento de terras, em coerência lógica da decisão, o facto provado sob o ponto 43) anuncia a falta de prova do facto consignado no ponto 51).
Au contraire, caso o tribunal a quo assim o considerasse, iria infirmar sem respaldo ou justificativo, os juízos periciais formulados e corroborados em audiência pelos peritos, e na mesma linha dos depoimentos prestados pelos técnicos da Câmara.    
Acerca do relatório elaborado pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera,[4] que no entender dos apelantes, apontará para que a matéria dos pontos 50) 51) seja dada como provada.
A indagação solicitada ao IPMA destinava-se somente a obter os índices de precipitação no ano da ocorrência, por comparação com anos anteriores.
Ora, s. d.r, é bom de ver, que dadas as competências do organismo, o relatório em causa não poderia ajuizar sobre a relação entre o deslizamento de terras e a pluviosidade verificada, e essa é justamente a questão core, com pertinência e utilidade na consideração da prova ou não prova da matéria dos pontos 50) e 51). 
Por último, no estrito apuramento dos níveis de pluviosidade registados no local, também o relatório em causa não certifica cabalmente; apontando outrossim, para   dados registados em localidade que dista cerca de 30 KM, diferença geográfica que à luz das regras da experiência, não permite acolher com fiabilidade.
Daí que, a incerteza no suporte probatório do facto dita a resposta negativa consignada no ponto 50).
Improcede o objecto da impugnação neste segmento.             
1.3. Facto Não Provado 62)
«Que a reparação dos estragos registados na moradia importe o dispêndio de quantia superior a € 150 000.»
O tribunal afirmou a sua convicção nos seguintes termos:
 «Não foi produzida prova quanto o inscrito em 60), 61) e 62). Importando referir quanto a este último aspecto que o valor aí indicado é muito superior ao do orçamento junto a fls.230 e ss., que se julga oferecido para o comprovar. Orçamento que ademais se sabe não foi aceite pelos AA. e que, segundo um dos peritos nomeados no processo, comporta soluções e trabalhos desnecessários e desadequados a corrigir os estragos que a habitação dos demandantes registou.»
Vejamos a argumentação dos apelantes.
Alegam que, o tribunal não teve em conta que o pedido original (quantia superior a € 150.000,00) foi, entretanto, reduzido para a quantia de € 75.156,04,” em virtude de ao tempo da propositura da acção desconhecerem o valor exacto que seria necessária para a reparação da moradia.
Pois bem, os AA. apresentaram na verdade  requerimento de redução de pedido[5] para a quantia de 192.441,92 €.
Com esse requerimento, descuidando qualquer nota explicativa, juntaram um documento intitulado de “proposta de restauros interiores e exteriores” no valor de 75.156,04 €, acrescido de IVA.
Os AA. dispensando a exigida explicação ou elucidação, ficou o tribunal sem saber qual era afinal o valor do pedido reduzido e que incidência repercutiam nos danos materiais e, também, ou, não patrimoniais.  
Alegam ainda os apelantes, que N…, autor do relatório pericial junto aos autos em 2 de abril de 2019, ouvido em audiência, acabou por aceitar que o custo de reparação dos danos na moradia seria, pelo menos, na quantia de € 21.952,18, acrescida de IVA.
Sucede que, os apelantes não identificam a passagem do registo sonoro do depoimento em causa, nem procedem à respectiva transcrição escrita, pelo que não tendo cumprido neste particular o ónus de impugnação estabelecido no artigo 640º, nº2 al) a do Código de Processo Civil, não iremos reapreciar o ponto impugnado nessa componente.     
De todo em todo, o seu testemunho oral, sempre teria de ser confrontado com o conteúdo do relatório pericial que subscreveu. 
Note-se que na página 15 desse seu relatório, pode ler-se “Para reparação dos estragos que observámos na moradia indicamos o custo de €1.750,00+IVA.”  
Em que ficamos?!       
Quer isto dizer, que perante os elementos díspares produzidos a propósito, sobra a incerteza reforçada quanto ao valor dos custos da sobredita reparação da moradia, à semelhança da convicção probatória do tribunal a quo.
Em suma, improcede a impugnação da matéria de facto.
2. Caracterização da relação contratual entre as partes; a causa de pedir  
Os AA. modelaram a acção a partir da responsabilidade contratual da Ré, enquanto mediadora de seguros da Companhia Fidelidade, consequente da violação da obrigação de remessa da proposta de seguro multirriscos por eles subscrita e relativa à moradia construída com capital mutuado pela Ré.
Proposta, cujos termos e condições, validada pelo contrato de seguro subsequente, cobriria a benefício dos AA., o risco dos estragos que vieram a verificar-se na moradia, assim obrigando a Ré a indemnizá-los pelo custo da reparação e compensação pelos danos não patrimoniais sofridos.  
Quanto aos danos, alegaram que a sua ocorrência se prendeu com o deslizamento de terras no local da edificação, motivado pelos níveis intensos e prolongados de precipitação registada.
Na sentença recorrida, apurada a relação contratual invocada pelos AA., a omissão do envio da proposta de seguro à Fidelidade e o evento danoso, concluiu-se pela inexistência de nexo causal entre a conduta da Ré e os estragos verificados na moradia, e por consequência, na ausência de fundamento legal para a sua responsabilidade e obrigação de indemnização, que também não merece amparo na doutrina de perda de chance.
Em sede de recurso, além da questão do julgamento da matéria de facto acima apreciada, os AA. invocam erro de interpretação e aplicação do direito, no respeitante à interpretação preconizada sobre o nexo de causalidade, assente na estrita teoria da causalidade adequada, argumentando que os factos suscitam a aplicação da denominada teoria do escopo da norma violada, pugnando pela a responsabilização consequente da Ré pela indemnização dos danos que directamente lhes causaram, de igual sorte subsumível à perda de chance.  
Assinala-se que, não tendo os AA. equacionado na petição tal matéria de direito, o argumentário recursivo corresponderá ao desenvolvimento da solução jurídica, consubstanciada na causa de pedir e pedido, em contraponto à fundamentação veiculada na sentença, que lhes foi desfavorável.      
2.1 O contrato de seguro; a intervenção do mediador
Na ausência de definição legal do contrato de seguro, podemos retirar que constituem suas linhas essenciais: o risco, ou seja, a possibilidade de um evento futuro e incerto suscetível de determinar a atribuição patrimonial do segurador; a empresa; e a prestação do segurado (prémio ou quotização ).[6]
Tal como decorre do disposto no artigo 1º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro(RJCS)- Decreto-Lei nº 72/08, de 16.04., as partes no contrato de seguro são o segurador, como aquele que assume o risco que o tomador de seguro visa proteger, e o tomador do seguro, aquele que invoca um interesse digno de proteção legal relativamente ao risco coberto (próprio ou de terceiro) e que por via da celebração do contrato transfere para a seguradora -  artigo 43º daquele diploma.
Em paralelo, é sabido que o contrato de seguro pode ser celebrado com a intervenção de um mediador de seguros, cujas condições de acesso e exercício da actividade estavam ao tempo previstas no Decreto-Lei n.º 144/2006, de 31 de Julho. [7]
Passou-se a distinguir os mediadores de seguros em três categorias, que se caracterizam, fundamentalmente, como se afirma no preâmbulo do citado diploma, “pela maior ou menor proximidade ou grau de dependência ou de vinculação às empresas de seguros”: a) mediador de seguros; agente de seguros; c) corretor de seguros.
Na circunstância do mediador ao qual não sejam conferidos poderes de representação por parte da seguradora, o mesmo desenvolve a actividade de intermediação entre o tomador e a seguradora, tendente à realização do contrato de seguro, como seja a recepção da proposta subscrita pelo tomador e a sua remessa para apreciação e eventual aceitação ou recusa por aquela.
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O contrato de mediação é um contrato atípico, regulado pelas suas cláusulas contratuais, pelo apoio da previsão na subsecção Mediação – artigos 28º a 31º, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro(RJCS)- [8], tendo presente a  afinidade com o contrato de prestação de serviços[9] e o regulado pelas regras gerais dos contratos.
2.2. O vínculo contratual estabelecido entre os AA. e a Ré CGD enquanto mediadora de seguros
No caso sub judice foi alegado e provado, que no contrato de mútuo celebrado entre os AA e a Ré, se previu que, «A parte devedora obriga-se a: (…) c) tê-lo seguro à vontade da credora e só por intermédio desta e com o seu acordo alterar o referido seguro».
Tendo para o efeito, o autor subscrito junto da Ré CGD em 9.2.2007 uma proposta de seguro “Multi-riscos” crédito habitação, o qual se destinava a proteger a Caixa Geral de Depósitos, em caso de destruição ou danificação da moradia a construir. 
Ficando também assente, que a Ré CGD opera como “ mediadora “ dos produtos da Fidelidade, age sob inteira responsabilidade desta, em complemento da sua actividade bancária, da qual o seguro é acessório, não recebendo prémios ou somas destinados aos tomadores de seguros, segurados ou beneficiários - na aproximação das definições e categorias de mediadores constantes dos artigos  5º e 8.º do Decreto-Lei n.º 144/2006, de 31 de Julho, relativo às condições de acesso e exercício da actividade de mediação de seguros (ou de   resseguros).
Não há dúvida que, a relação entre o mediador de seguros e o proponente –tomador de seguro resolve-se numa relação contratual (embora preparatória de uma outra relação contratual, a do contrato de seguro), pela qual o proponente  incumbe o mediador de receber a proposta e de providenciar pelo seu encaminhamento para a seguradora, aceitando o mediador, a contendo do seu interesse e daquela, levar a cabo essa actividade.
 Á Ré CGD, mediadora, competia-lhe então a remessa da proposta de seguro à Fidelidade,[10] actuação  que por razões não apuradas, omitiu.
Por outro lado, dada a aparência da organização e dimensão da Ré, é justificável a confiança dos AA depositada na Ré para “tratar” – “facilitar” -   intermediar o contrato de seguro de risco associado ao crédito concedido.
2.3. A ilicitude da conduta e as circunstâncias abrangentes
Prosseguindo esse ângulo, o comportamento por omissão da Ré, traduz em abstracto, a violação de uma obrigação jurídica própria no confronto dos AA., susceptível de configurar incumprimento pontual da obrigação subjacente à relação jurídica com os AA, por aplicação do disposto no artigo 406º, nº1, do Código Civil.
Agindo em contrário ao dever decorrente da boa-fé e confiança dos AA., em verem a sua proposta de contrato submetida à apreciação da seguradora, com a inerente expectativa de que a mesma aceitasse a transferência de responsabilidade do risco em causa.  
Citando a lição de Baptista Machado[11] « (..)toda a conduta, todo o agir ou interagir comunicativo, além de carrear uma pretensão de verdade ou de    autenticidade (de fidelidade à própria identidade pessoal) desperta nos outros expectativas quanto à futura conduta do agente.»      
Aqui chegados, supomos, todavia, que na situação concreta apurada, confluem outras circunstâncias, que objectivamente apreciadas, permitem questionar da razoabilidade da confiança prolongada e desmedida dos AA.  na conclusão e efectivação do contrato de seguro, e nessa medida nos levam a afastar a presunção de culpa da Ré que vale na responsabilidade contratual.
Nessa linha de subsunção normativa - a omissão da Ré no encaminhamento da proposta de seguro à seguradora -  excluirá a pretensão indemnizatória dos AA pelos danos invocados por falta de verificação do pressuposto da culpa- artigo 799º ex vi artigo 563º, de Código Civil.
Explicando.
Com relevância para apreciação in casu, resulta da petição inicial e assim ficou provado, que a Ré não fez chegar à seguradora, até à data do sinistro, a proposta de contrato de seguro Multirriscos que o Autor subscrevera, e obviamente a Fidelidade após a ocorrência, viria a declinar a aceitação do risco constante da proposta.
Importará ainda mencionar, que não ficou  provado que a Ré impusesse aos AA. a celebração exclusiva do contrato de seguro com a Fidelidade; mais  consta       do clausulado da proposta de contrato , que o silêncio da seguradora por 15 dias equivaleria à respectiva aceitação.[12]
Até quando, e em que medida, deveriam os AA. pressupor e confiar na conclusão e vigência do contrato de seguro, decorridos cerca de 5 meses e a ausência de factos que indicassem a apreciação aceitação da sua proposta pela Fidelidade?
Já se viu que, está em causa uma proposta de seguro de risco de dano e destruição da moradia, que os AA. edificaram em terreno de sua propriedade, com recurso ao crédito de Euros 200,000 financiado pela Ré, através do contrato de mútuo datado de 28.03.2007, e cuja última tranche foi concedida em 29.09.2009.
De acordo com o apurado, a proposta de seguro subscrita pelo Autor deveria seguir para a apreciação e avaliação da seguradora naquela última data, conquanto os elementos dos autos não permitam definir se a moradia estava edificada em plenitude em data anterior ou posterior. 
No contrato de seguro, apesar de actualmente não ser exigida forma especial para a sua celebração, bastando o mero consenso entre o proponente tomador e a seguradora, mantém-se a obrigatoriedade de emissão da apólice titular.
Sobre este tópico, Pedro Romano Martinez [13]entende, que «esta desformalização tem particular relevo na sociedade actual, não tanto por corresponder ao princípio geral do consensualismo – que é tradicional -, mas principalmente por implicar um impulso para a desmistificação do papel como suporte paradigmático dos documentos. O contrato de seguro passa a ser consensual, devendo, contudo, ser formalizado num instrumento escrito (a apólice), mas não necessariamente num documento de papel.»
Ora, incidindo o risco sobre a casa, onde os AA. se encontravam a residir, transpostos cerca de cinco meses sobre a data definida para a apreciação da proposta do seguro de multi-riscos pela Fidelidade, seria expectável à luz do senso comum, que esta lhes enviasse a apólice confirmativa do contrato e, maxime pagassem o recibo do prémio (no premium, no cover).
De igual modo, sob a perspectiva da experiência, incidindo o risco segurado sobre um imóvel, implicaria a deslocação ao local dos peritos da seguradora ou da Ré por aquela autorizados, em ordem a fundar a aceitação ou recusa da proposta.         De acordo com as regras da experiência, uma proposta de seguro, relativa à cobertura de riscos de um imóvel habitacional em construção e sem valor estabilizado na matriz, presente o objectivo económico e lucrativo da actividade que prossegue, que a seguradora procedesse à prévia análise do risco em concreto, designadamente através da consulta e solicitação aos AA dos elementos documentais em prol do seu interesse negocial e em ordem à fixação do valor do prémio.    
 Situação que os AA. descuraram por cerca de cinco meses, mantendo uma apatia inesperada perante assunto de relevância crucial para a sua casa e património, nada fazendo para se assegurarem da regular aceitação da proposta do contrato de seguro pela Fidelidade e a conclusão e eficácia do mesmo.     
A confiança do declarante na recepção e aceitação da sua proposta pelo declaratário excedeu manifestamente o padrão normal de circunstância equivalente, afastando-se por consequência da diligência própria do homem médio.   
Vale para dizer, que pese embora a intervenção do mediador de seguros, por natureza facilitadora da celebração do contrato de seguro, esteja submetida às regras gerais do cumprimento das obrigações inerentes à sua prestação, não desonera o proponente tomador de quaisquer preocupações com a conclusão e aceitação do contrato pela seguradora.
Sublinhe-se que deparamos com um mediador de seguros, que não representa a seguradora perante o tomador, ou que de alguma forma, tenha induzido os AA a concluir que a subscrição da proposta equivaleu à vinculação da seguradora.[14]
Na materialidade fáctica provada, não se identificam razões para que os AA.  ao cabo de cinco meses sobre o envio previsto para a proposta de contrato, estivessem plenamente convencidos que com a entrega da proposta ao mediador, a sua responsabilidade infortunística pelos danos na moradia estava transferida para a Fidelidade.
As exigências decorrentes dos deveres da Ré mediadora têm como contrapartida, e por imposição do princípio da boa fé, o dever de diligência média por parte do outro contraente interessado na prossecução daqueles deveres.
Justifica-se, pois, alguma perplexidade, à luz dos comuns padrões comportamentais, que os AA. apenas após a ocorrência aleatória do evento danoso, passível de integrar os riscos constantes da proposta de seguro, manifestassem estranheza pela ausência efectiva de contrato de seguro.
A adopção de um comportamento contratual medianamente diligente por parte dos AA. em tais circunstâncias, poderia ter impelido a Ré a enviar a “esquecida” proposta contratual à Seguradora, ou de outro modo, terem-na interpelado directamente sobre o estado da situação.   
Donde, não se poderá acompanhar na íntegra, a ilação simplificada da sentença, quanto à verificação “automática” da ilicitude da conduta da Ré consumada no incumprimento do dever de “transmitir à empresa de seguros, em tempo útil, todas as informações, no âmbito do contrato de seguro, que o tomador do seguro solicite” a que aludia o artigo 31º, nº1 d) do   DL 144/2006 de 31.7.
Obtempera-se ainda, que o conteúdo do dever do mediador para com o cliente ali consignado, contextualiza a relação inter partes, no pressuposto da execução de contrato de seguro vigente, situação que se distancia do caso ajuizado.
3. A proposta de contrato não remetida à Seguradora e o evento danoso; o nexo causal    
O tribunal a quo acabou, contudo, por concluir que, «em sede de responsabilidade civil o dano indemnizável é aquele que, em termos de causalidade adequada, se apresenta como consequência normal, directa e necessária do facto gerador da responsabilidade – cf. artº. 563º CC, (…)  os danos invocados pelos AA. e pelos quais pretendem ser ressarcidos não são consequência normal, directa e necessária da omissão ilícita de comportamento devido pela R. Crendo-se claro e evidente que nenhuma relação existe entre a circunstância de a demandada não ter remetido à seguradora a proposta de seguro referida em 4) e o deslizamento de terras referido em 25). Este sim o facto que deu origem causal aos prejuízos/danos que os demandantes querem ver reparados
Cremos que a decisão recorrida extraiu com acerto, a impossibilidade de estabelecer o nexo entre a conduta da Ré, e, o deslizamento de terras que detonou os estragos na casa dos AA.
Vejamos.
Com efeito, entre a conduta imputada à Ré e os estragos na casa dos AA., não é possível extrair qualquer nexo etiológico material.
Partindo do postulado inamovível, que tal como na responsabilidade extracontratual ou delitual, na responsabilidade contratual são quatro os pressupostos: o facto ilícito (constituído pela omissão do zelo exigível), a culpa (que aqui se presume – artigo 799º, nº1 do Código Civil), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, e a factualidade que resultou provada.
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Algumas notas de suporte adicional ao concluído.
Para apurar a existência da causalidade entre os factos e os danos evocados, a análise da realidade fáctica estende-se por dois patamares consecutivos: primeiramente a causalidade enquanto fenómeno naturalístico-concreto e posteriormente, a causalidade enquanto formulação jurídico-doutrinária.
O dano ocasionado pela omissão do dever da Ré, reconduz-se a uma   quebra de comunicação entre os AA. e a seguradora, durante um espaço temporal delimitado e transitório. Interrupção que a não ter ocorrido, levaria à apreciação da proposta subscrita pela seguradora, que então aceitaria ou recusaria contratar, em grau de probabilidade equivalente.  
Desta realidade não é possível retirar como consequência que a seguradora, por um lado, aceitaria contratar, e que por outro, na afirmativa, os danos verificados fossem assumidos como integrando os riscos cobertos.
Em abstracto, segundo o curso normal das coisas, a verificada actuação desconforme da Ré mostra-se inidónea para produzir o evento danoso.       
Face à recepção no artigo 563º, do Código Civil da doutrina da causalidade adequada, impõe-se primeiramente verificar a existência de um facto naturalístico concreto condicionante do dano, e na afirmativa, aferir de seguida se o facto é em abstracto, adequado e apropriado para provocar o dano sofrido pelo lesado.
Cremos ser esta a concepção metodológica perfilhada maioritariamente na jurisprudência[15]  e respaldo na doutrina civilista tradicional dominante.[16]
Nesta formulação da causalidade adequada promove-se, ademais, um conceito bastante amplo, em termos de consideração de âmbito material ou de efeito irradiante de nexo causal, enquanto pressuposto da responsabilidade civil, estendendo-se em consequência o próprio espaço axiológico – normativo de influência.
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.04.2005[17] lê-se: “ Pode-se assim afirmar que a causa juridicamente relevante será a causa em abstracto adequada ou apropriada à produção desse dano segundo as regras da experiência comum ou conhecidas do lesante e que pode ainda ser vista, numa formulação positiva, como condição apropriada à produção do efeito segundo um critério de normalidade, ou, numa formulação negativa, que apenas exclui a condição inadequada, pela sua indiferença ou irrelevância, verificando-se então o efeito por força das circunstâncias excepcionais ou extraordinárias.   “   
Ligação entre o dano e a ocorrência factual na qual poderão confluir intervenções estranhas, exteriores e alheias ao facto e que desvirtuam os resultados por ele produzidos, ou quando tais resultados apenas ocorrem por circunstâncias totalmente anómalas e invulgares segundo as regras da experiência.
Conforme afirma Antunes Varela, « Não são já relevantes todas as condições que originaram determinado dano, nem a análise se cinge a uma espécie de casuísmo, pois temos agora uma verdadeira norma geral que cinge os factos relevantes àqueles cuja não verificação implicaria a não verificação do dano.»[18]
Em síntese, à luz da formulação positivada do nexo de causalidade no artigo 563º, do Código Civil, a factualidade provada exclui a responsabilidade da Ré pelos danos verificados.   
3.1. A teoria do escopo da norma violada e o risco da omissão no envio da proposta de contrato à seguradora 
Os apelantes em suporte da responsabilização da Ré pelos danos sofridos, invocam que o critério a prosseguir na individualização do nexo causal na hipótese dos autos, corresponde à função da norma violada que abarca a protecção do evento danoso, por apelo à teoria desenvolvida na doutrina e denominada “teoria do escopo da norma violada”.        
Apreciemos da bondade da interpretação no quadro legal dos pressupostos da responsabilidade civil, na medida em que pode contribuir para melhorar a análise já veiculada.
Trata-se, como se sabe, de um dos mais fascinantes temas da civilística moderna, cujo interesse da reflexão teórica não deverá, todavia, exceder a importância prática e metodológica que releva para a apreciação e julgamento do caso em juízo. 
Em traços breves, a dogmática da teoria da causalidade.
É já longo o caminho percorrido pela doutrina e jurisprudência em prol da necessidade de se afastarem as formulações limitadoras e naturalistas da indagação da condicionalidade entre o acto e o dano, para olhar, do ponto de vista da juridicidade, para o comportamento do lesante e aferir se, em abstrato, ele é ou não idóneo a produzir um dano.
Acresce que, é confirmada a necessidade de superar algumas disfuncionalidades na aplicação da teoria da causa adequada em situações fronteira e de dificultosa apreensão, que vêm concebendo teorizações de excepção.   
Neste espaço se inscreve a denominada teoria do escopo da norma, abordada por variada doutrina portuguesa, sinalizando-se que a sua aplicação é utilizada no tratamento das consequências advindas e quais os danos que podem ser vinculados à lesão do direito.
Acerca desta teorização,  defende Ana Mafalda Castanheira Neves Miranda Barbosa: [19] “A doutrina do escopo da norma violada desliga-se da linguagem causal e resolve o problema da delimitação dos danos a indemnizar, na sequência de um ato ilícito e culposo, a partir de considerações de tipo normativo, centradas na indagação da finalidade da norma violada.”
Em proximidade de entendimento, também Menezes Cordeiro [20] assevera, que  a teoria do escopo da norma violada não é bitola de coisa nenhuma, mas “espaço que iremos preenchendo com base no senso comum e em juízos de tipo ético.”
Menezes Leitão, citado pelos apelantes, direcciona também a teoria do escopo da norma violada, como critério fundamental de delimitação dos danos indemnizáveis. De resto, assinala-se que o insigne autor parece delimitar a aplicação da teorização ao domínio da responsabilidade extracontratual, que o caso ajuizado não configura.  
Compreende-se afinal a importância de determinar o âmbito da protecção da norma violada e dos interesses agredidos, mas essa abordagem, como explica grande parte da doutrina, desloca a questão para o campo da ilicitude.
Em boa verdade, como aponta incisivamente grande parte da doutrina portuguesa, a exigência do âmbito de protecção/finalidade da norma incluir os interesses agredidos corresponde a um problema de ilicitude e não de causalidade.
Resta-nos a ousadia de partilhar a reserva da doutrina proeminente, quanto à  utilidade e falta de resposta para a questão do nexo causal,  que a teoria apresenta como ferramenta para o intérprete e aplicador da lei,[21] e cujo sucesso de importação da doutrina Alemanha, por ora não é visível.
Destacamos que o caso concreto em juízo, não revela, salvo o devido respeito, a necessidade da maior plasticidade das teorias que a jusante da causalidade adequada, corrijam dúvidas ou fronteiras ténues a propósito do nexo de causal ou da ilicitude na responsabilidade contratual da Ré.[22]     
Isto porque, como se explicitou os danos ocorridos e cuja reparação pretendem os AA., não são manifestamente resultantes da falta de submissão da proposta contratual à seguradora, mas outrossim, são consequência do deslizamento de terras no local de implantação da casa. 
3.2. A teoria das esferas de risco
Finalmente, argumentam os apelantes que também esta teoria permite inverter alguns aspectos do problema da aferição do nexo de causalidade.
Na doutrina portuguesa, Rui Ataíde perfilha a funcionalidade da teoria das esferas de risco, adiantando, de todo modo que «(..) é ainda imprescindível que o risco criado se tenha concretizado no evento proibido, ou seja, que haja uma conexão material entre o risco gerado pela conduta e o resultado ilícito.»   [23]  
 A este propósito , refere Patrícia Costa, [24] «Esta teoria tem-se revelado determinante no tratamento das hipóteses de causalidade múltipla , aqui se incluindo as de causalidade alternativa incerta(..)».
 Situações que não evidenciam qualquer proximidade com o caso dos autos, dispensando-se outros desenvolvimentos.
4. A convocada perda de chance        
 Na sequência da apreciação residual que a sentença culmina na eventual configuração da satisfação da indemnização no quadro da ressarcibilidade do dano de perda de chance, os apelantes alegam a contrario, que toda a narrativa factual aponta tal viabilidade.
 Falha-lhes a razão.
 Não está em causa uma diferente qualificação jurídica dos factos pelo tribunal, legitimada à partida pelo disposto no artigo 5º , nº3, do Código de Processo Civil.
O que se configura é uma diferente construção fáctica de causa de pedir, pois que, como se infere dos autos os AA.  assentaram a sua pretensão na base da relação de causa e efeito, que defendem verificar-se entre a omissão da Ré no envio da proposta contratual de seguro à Fidelidade, e, os danos sofridos pelo deslizamento de terras na zona de implantação da sua casa.
De novo se sublinha, que não equivalendo a submissão da proposta à aceitação do contrato de seguro pela Fidelidade, e por outro, que os danos advindos fossem contemplados no risco transferido, soçobra também a tese da perda de chance.
Na verdade, ex abundanti, no que concerne ao requisito próprio da perda de chance - “elevado grau de probabilidade ou verosimilhança dos AA. alcançarem o benefício” - no caso, a cobertura do risco dos danos ocorridos, há que dizer que conforme provado, a causa principal da instabilidade do terreno situou-se nas condições geológicas –geotécnicas da zona de edificação da moradia, e não na invocada chuva intensa. 
Circunstância largamente documentada na zona pelas entidades competentes, que vinculariam os AA à obrigação de comunicação à seguradora aquando da apresentação da proposta de seguro, factor que condicionaria a aceitação do risco e os termos do contrato a assumir.
Do que havia de concluir-se, que a probabilidade do ganho na pretensão da cobertura dos danos no risco contratado no contexto do seguro multirriscos, queda-se, ressalvada melhor opinião, em mera probabilidade ou fraco padrão de consistência no sucesso desse resultado.
Em suma, acompanha-se neste particular a decisão de primeira instância.
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Improcedem assim as conclusões dos apelantes.
III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação interposta, e em consequência deliberam confirmar a sentença, embora com fundamentos não totalmente coincidentes.    
As custas são a cargo dos apelantes.

Lisboa, 10 de Novembro de 2020
ISABEL SALGADO
CONCEIÇÃO SAAVEDRA
CRISTINA COELHO
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[1] E ainda para resposta aos “quesitos” de fls. 225 a 228 e 240 a 241.
[2]  Nas alíneas I) e J) do despacho de seleção da matéria de facto.
[3] Cfr.  despacho de 25.05.2015.
[4] CF. fls.256 e seguintes.
[5] Em 05.09.2013.
[6] Seguindo de perto a definição adiantada por Margarida Lima Rego, in “Contrato de Seguro e Terceiros”, Coimbra Editora, 2010, pág. 66.  
[7] Entretanto revogado pela Lei nº7/2019, de 16.01.
[8] Em vigor desde 1-01-2009.
[9] Cf. a propósito o Acórdão do STJ de 6.12.2012, in www.dgsi.pt.
[10]  De resto, sendo do conhecimento geral que a Ré e a seguradora em causa, pertenciam à época  ao mesmo grupo económico ( como outros)  prosseguindo  um interesse comum na defesa dos interesses das empresas integrantes do grupo; daí que a Ré, enquanto entidade bancária, promova  a realização de seguros em empresa pertencente a esse mesmo grupo, divulgando o produto, concedendo benefícios em função da subscrição de produtos ou serviços de empresas integrantes do grupo, fornecendo as propostas de seguro, que são preenchidas e entregues nas suas instalações, remetendo-as posteriormente para a seguradora, e realizando por conta daquela  a avaliação dos bens para apuramento do valor a figurar no seguro.
[11] In RLJ nº 117, pág.266.
[12]  Cf. artigo 27º do RJCS. O contrato apenas se considera celebrado quando, decorrido o prazo de quinze dias após a recepção da mesma, a seguradora não proceda à notificação do requerente, comunicando-lhe a sua aceitação ou recusa, valendo o silêncio como declaração tácita de aceitação da proposta.
[13] Em anotação à “Lei do Contrato de Seguro Anotada”, Almedina, 2ª ed., pág. 219.
[14] Situação que poderia convocar a denominada representação aparente, com consequências distintas.
[15]   Cf. exemplificadamente o Acórdão do STJ de 20.06.2006 e de 24.05.2007 in CJSTJ, II, pág. 119 e 82.; 2.11.2010 in www.dgsi.pt; e Acórdão do TRL de 30.10.2010 in CJ, V, pág.111
 16. Cf. exemplificadamente Pessoa Jorge in Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, pág.410, e Galvão Telles in Direito das Obrigações, pág.409: “determinada acção será adequada de certo prejuízo, se tomadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem comum podia conhecer, essa acção se mostrava, à face da experiência comum, como adequada à produção do referido prejuízo, havendo fortes probabilidades de o originar”. 
[17] In www-dgsi.pt.
[18] In Das Obrigações em Geral, Vol. I, 7ª edição, Almedina, Coimbra (1991), pág. 879.
[19] In Do nexo de causalidade ao nexo de imputação: contributo para a compreensão da natureza binária e personalística do requisito causal ao nível da responsabilidade civil extracontratual, Vol. II. Lisboa: Princípia Editora, 2013, Vol. II, 2013, pág. 1157.
[20]   In da responsabilidade, pág.534.
[21] Cf. Ana M.C.N.M. Barbosa “Se é certo que, com base nesta doutrina, não somos conduzidos às aporias que a
probabilidade nos comunica, não menos certo é que parece que ficamos dependentes da existência de uma norma da qual se possa determinar o escopo violado. Percebe-se, por isso, que alguns autores se mostrem particularmente interessados na doutrina a propósito da segunda modalidade de ilicitude. Mas percebe-se, também, que ela não nos satisfaça como resposta global ao problema causal, no seio da responsabilidade civil. Ademais, mantém-se presa a uma visão linear do problema, que não tem em conta a complexidade conformativadas sociedades atuais.”
[22] Virtualidade afirmada por Antunes Varela in Das Obrigações em geral, I, 5ª edição, pág.858 /60. 
[23] In Causalidade e Imputação Objectiva, pág. 200.
[24] In novos olhares sobre a responsabilidade civil, Coleção da Formação Contínua do CEJ, pág.94 a 97.