Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANA RESENDE | ||
Descritores: | PROVIDÊNCIA CAUTELAR NÃO ESPECIFICADA OBRIGAÇÃO DE INFORMAÇÃO LEGITIMIDADE DIREITO DE PROPRIEDADE PROVA NOTIFICAÇÕES ENTRE MANDATÁRIOS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/28/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. A alteração do art.º 229-A, do CPC, produzida pelo DL 303/2007, de 24 de agosto, consagra uma visão alargada do dever de notificação, salvaguardando os primeiros momentos de intervenção processual das partes. 2. Não se impõe, numa sobrevalorização da forma, em detrimento do conteúdo, que não merece tutela, a repetição, por parte da Secretaria, da notificação já efetuada pelo mandatário, de cópias de documentos que tinham sido juntos como o requerimento inicial, e cuja apresentação foi ordenada no conhecimento de uma nulidade relativa ao ato de citação, não afetando a respetiva validade, mas determinando tão só o não decurso do prazo para a oposição, uma vez que a notificação efetuada já realizara os objetivos a que se destinava. 3. Compaginando-se a situação delineada nos autos, como a obrigação de informação, consagrada genericamente no art.º 573, do CC, surgindo um dos proprietário da fração como alguém que se encontra em situação de prestar informações sobre o conteúdo de um direito, face a dúvidas razoáveis, e fundadas que assistem ao Condomínio requerente, não se mostra necessária a intervenção no processo do outro coproprietário da fração. 4. Solicitando o requerente que o requerido permita a realização de uma diligência com vista a aferir se, de facto, se verificam as consequências funestas, que o primeiro teme terem advindo de obras realizadas pelo segundo, não se configura a ofensa do direito, passível de fundar o decretamento do embargo de obra nova, antes se mostrando-se a providência cautelar não especificada como o meio próprio para conhecer do pedido. (Sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I – Relatório 1. CONDOMÍNIO DO PRÉDIO URBANO, representado pelo seu administrador, J, veio propor contra P, o presente procedimento cautelar não especificado, pedindo que o Requerido seja intimado a permitir que seja realizada a vistoria referida, facultando o acesso pela sua fração e permitindo todos os atos a tanto necessários, ao técnico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, de forma a evitar os perigos referidos, ficando ainda sujeito a uma sanção pecuniária compulsória que deverá ser fixada em não menos de 250,00€, por cada dia de atraso no cumprimento da referida intimação. 2. Alega para tanto que o Requerido é o proprietário da fração H do prédio identificado, tendo na mesma realizado obras de remodelação. O administrador do Requerente, em 18 de junho, efetuou uma visita ao local onde decorriam as obras, tendo constatado que os pilares e vigas do edifício tinham sido danificados de modo a pelo seu interior passassem as tubagens, tendo nos pilares do edifício sido abertos roços com 10cm de profundidade e 10cm de altura em toda a sua largura e que as vigas tinham também sido danificadas. Na sequência dessa primeira visita, ficou acordada uma reunião com visita mais detalhada, a realizar no dia 1 de julho de 2010, encontrando-se ainda em curso as obras. Nessa data, o então administrador do Condomínio, acompanhado dos condóminos do 4.º e 8.º andares, com autorização do Requerido fizeram com ele uma reunião no local onde decorriam as obras, reunião que teve lugar por suspeitas que no âmbito de tais obras, teria havido intervenção, por parte do empreiteiro nos pilares e vigas de sustentação do edifício. Ficou acordado nessa reunião, que o Requerido, após a conclusão dos trabalhos repararia todos os estragos causados no edifício, bem como asseguraria a limpeza das zonas que ficassem sujas, mas também que o administrador do Requerente seria autorizado a visitar a fração acompanhado por uma empresa de aconselhamento técnico na área da engenharia civil, para analisar os estragos causados nos pilares e vigas do edifício, sendo reduzidos a escrito os pontos acordados, e entregues em documento que o Requerido não devolveu assinado. Na sequência do acordado, o condómino do 4.º andar, então também administrador e o condómino do 8.º andar, que tinham estado no local em 1 de julho de 2010, deslocaram-se, acompanhados de dois engenheiros civis no dia 6 de julho desse ano, verificando-se que os roços já tinham sido tapados, impossibilitando a análise por parte dos engenheiros civis que se deslocavam ao local. Desde essa data o Requerido recusa-se a permitir que seja feita a análise às intervenções efetuadas nas vigas e pilares que sustentam o edifício. Após diversos esforços no sentido de o persuadir a tal vistoria, foi deliberado na assembleia de condóminos de 28 de fevereiro de 2011, que fosse requerida uma avaliação a técnico competente. O Requerido, contudo, recusa o acesso à sua fração, o qual seria essencial para que a avaliação pudesse ser realizada, uma vez que só através dela se poderá aceder aos pilares e vigas danificadas. A situação é tanto mais grave, quanto os pilares que foram objeto de intervenção são aqueles que fazendo parte do edifício, o sustenta e se, como se teme, tal intervenção os danificou nos seus pontos de sustentação, ou seja na sua consistência, poderão causar a ruína de parte ou até de todo o edifício. Face à recusa do Requerido em autorizar a vistoria, em assembleia de 10 de abril de 2012, foi deliberado a constituição de mandatário judicial para obter coercivamente a vistoria recusada. 3. Foi proferida decisão que julgou a providência procedente por provada, determinando que o Requerido seja intimado a permitir que seja realizada a vistoria destinada a apurar se foram afetados os pilares e vigas que compõem a estrutura do prédio e sustentam o edifício a que os autos se reportam, por forma a se poder aquilatar dos reais riscos envolvidos e, se necessário, serem tomadas as providências necessárias para os afastar, facultando para tanto o acesso pela sua fração e permitindo todos os atos a tanto necessários, ao técnico do Laboratório nacional de Engenharia Civil que for indicado pelo Tribunal. Mais se determinou a aplicação duma sanção pecuniária compulsória ao Requerido, no valor de 250,00€, por dada dia de atraso no cumprimento da referida intimação. 4. Inconformado, veio a Requerido interpor recurso da decisão proferida, bem como dos despacho interlocutórios de 21.12.2012 – que indeferiu a reclamação da nulidade suscitada pelo Requerido – e de 9.01.2013 – pelo qual o Tribunal considerou que o prazo para deduzir a oposição se iniciara em 10.10.2013, uma vez que o Requerido tinha sido notificado nessa data pelo Requerente da junção das fotografias a cores, e tendo esse prazo já decorrido sem que o Requerido tivesse deduzido oposição, julgou confessados os factos alegados pela Requerente – , formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: · As notificações efetuadas pelos mandatários nos termos do art.º 229-A, do CPC só são obrigatórias – e processualmente relevantes – após a notificação da Secretaria da contestação do réu ao autor, tal significando que até à notificação da contestação, todos os atos processuais praticados pelas partes são obrigatoriamente objeto de notificação pela Secretaria. · Do mesmo modo, se até à contestação um mandatário de outra parte “notifica” a outra de um requerimento ou documento apresentado no processo, tal “notificação” é processualmente irrelevante, não dispensando a Secretaria do dever de proceder à respetiva notificação, de acordo com disposto no art.º 229.º - A, do CPC. · A interpretação partilhada pelo tribunal a quo levaria a conclusão absurda de que sempre que o mandatário do réu “notificasse” o mandatário do autor da contestação apresentada, a secretaria ficaria dispensada de proceder a essa notificação (por se tratar de um “ato inútil” – nas palavras do tribunal a quo) e o prazo para apresentação de eventual réplica ter-se-ia logo iniciado com aquela notificação do mandatário do réu. · Ocorreu assim uma nulidade processual decorrente de a Secretaria não ter notificado o Requerido da cópia legível das fotografias apresentadas pelo Requerente em 10.10.2012, violando o disposto no art.º 229, do CPC, devendo ser revogado o despacho interlocutório do Tribunal de 21.12.2012 que indeferiu a arguição da respetiva nulidade, por violação do disposto no art.º 229, do CPC. · Consequentemente, deve também ser revogado o despacho interlocutório do Tribunal de 09.01.2013 que considerou que o prazo para deduzir a oposição se iniciara em 10.10.2012, uma vez que o requerido tinha sido notificado nessa data pelo Requerente da junção das fotografias a cores, e tendo esse prazo decorrido sem que o Requerido tivesse deduzido oposição, julgou confessados os factos alegados pelo Requerente; · A final deve ser revogada a sentença recorrida desde logo porque a mesma assentou em factos confessados pelo decorrido decorrentes da falta de dedução de oposição quando se deve considerar que o prazo para apresentação desta ainda nem sequer se havia iniciado. · A título subsidiário, dado que o direito de propriedade sobre imóveis só é possível de ser provado por documento escrito e jamais por confissão das partes, o Tribunal a quo jamais poderia ter sido dado como provado que o requerido é proprietário da fração H correspondente ao sexto andar do prédio urbano a que se refere o condomínio Requerente, somente a partir da confissão do Requerido. · E o documento n.º 1, junto pelo Requerente com o seu r.i. para prova desse facto desmente a própria alegação do Requerente dado que o mesmo apenas prova a propriedade da fração J! · Consequentemente o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar por confessado que o Requerido, ora Recorrente, era o proprietário da fração H, correspondente ao sexto andar do prédio urbano a que se refere o Condomínio requerente. · A verdade dos factos é que o Requerido, ora recorrente não é “o” proprietário da fração em causa sendo simplesmente seu coproprietário em conjunto e em partes iguais com a suam mulher (conforme documento ora junto com o presente recurso) · Numa situação de compropriedade, verifica-se uma situação de litisconsórcio necessário, nos termos exigidos pelo art.º 28, do CPC, de tal modo que a falta de um dos interessados em juízo é motivo de ilegitimidade passiva, determinante in casu da absolvição da instância do Requerido. · Deve aliás concluir-se que a sentença produzida é completamente inútil por ser insuscetível de cumprimento por parte do ora Recorrente uma vez que este não dispõe da totalidade da fração em causa e não sendo a sendo a sentença, como se compreende, oponível à outra coproprietária que foi alheia à ação. · Acresce ainda que no caso tinha lugar também a aplicação do disposto no art.º 28.ºA, n.º 3, do CPC que exige que devem ser propostas contra o marido e a mulher as ações que tenham por objeto, direta ou indiretamente, a casa de morada de família. · Finalmente a sentença recorrida errou também ao admitir a presente providência cautelar não especificada quando, in casu, conforme previsto no n.º3, do art.º 381, do CPC, o risco da lesão que o Requerente pretendia acautelar era especialmente prevenido por uma das providências tipificadas no CPC, mais concretamente o embargo de obra nova, previsto e regulado nos artigos 412, e seguintes do CPC. 6. Nas contra-alegações o Recorrido veio apresentar, em síntese, as seguintes conclusões: ü Não houve qualquer nulidade de citação pelo que nem sequer deveria ter sido proferido o douto despacho de 30.10.2012, uma vez que os efeitos da citação deveriam ter-se por cumpridos com a entrega ao Recorrente da exata cópia da petição do procedimento e dos documentos juntos. ü A prova dos factos não se confunde com a sua alegação, e assim nos termos do art.º 684.º -A, do CPC, alarga os fundamentos do recurso para que seja julgada essa questão, ou seja para que, como se entende, se julgue que o prazo para o Recorrente deduzir oposição se iniciou em 19 de outubro de 2012. ü Notificado o Recorrido para a junção de fotografias a cores, quando efetuou tal junção procedeu à notificação à Ilustre Mandatária do Recorrente, não se confundido tal com a notificação da oposição ou contestação, as quais por corresponderem a elementos essenciais do processo influenciam os contornos deste. ü O requerimento em causa não respeitava à apresentação de qualquer peça processual, mas sim a requerimento probatório, a ser apresentado em qualquer fase processual, não estando dentro do âmbito do regime previsto para a oposição. ü Para que a regularidade invocada pudesse ser havida como nulidade, teria que ter tido influência na exame ou decisão da causa, sendo que o Recorrente admite ter sido notificada. ü Por despacho de 12 de dezembro de 2012, notificado no mesmo dia, foi determinado que já era admissível o contraditório do Recorrido, pelo que, pelo menos desde essa data deveria ter apresentado a oposição que entendesse. ü O direito de propriedade do Recorrente sobre a fração é inquestionável, apenas sendo certo que sobre a mesma existe um outro direito de propriedade. ü O Recorrido moveu a presente providência ao abrigo do art.º 573, do CC, por forma a obter dele uma informação que se revela essencial e que respeita à existência, ou não de perigo para o edifício decorrente da intervenção realizada pelo Recorrente nos pilares de sustentação desse edifício. ü Como um dos proprietários o Recorrente está em condições de prestar a informação em questão, permitindo o exame da fração. ü O procedimento em causa não tem por finalidade qualquer direito real sobre a fração, nem a oneração dessa fração, não se verificando nenhuma situação de litisconsórcio necessário, nem sequer que seja casa de morada de família, o que não se encontra provado. ü O Recorrido não poderia ter lançado mão do procedimento cautelar especificado de embargo de obra nova pois apenas tem suspeitas e não a firme convicção que a intervenção realizada põe em risco a estrutura do prédio. ü Caso se entendesse que o procedimento configura outra forma processual, o tribunal na altura em que profere a decisão não está vinculado à concessão da medida cautelar individualizada pelo requerente, tendo a liberdade para integrar na decisão a medida que entender mais adequada a tutelar a situação e determinar aquilo que melhor favoreça a conservação do direito do requerente ou a antecipação dos efeitos que através da ação definitiva se procuram atingir. ü Assim caso se considere que face aos fundamentos invocados o presente procedimento cautelar corresponde a outra forma processual, sempre deverá ser convolado nessa forma processual e assim tramitado, sendo que nada haveria a alterar por o presente procedimento assegurar de forma mais cabal e célere os direitos de defesa do Requerido do que o embargo de obra nova. ü Deve ser julgado improcedente o presente recurso, mantendo-se o douto despacho recorrido, ou caso assim não se entenda sempre deve julgar-se que o prazo para o Recorrente deduzir oposição se iniciou em 19 de outubro de 2012, sem que este tenha apresentado qualquer oposição, mantendo-se o douto despacho impugnando. 7. Cumpre apreciar e decidir. * II – Enquadramento facto - jurídico Como se sabe, o objeto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formulado, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, artigos 684.º, n.º 3, 660.º, nº 2, e 713.º, todos do CPC, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas por aquelas invocadas, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do CPC, igualmente do CPC. Para o conhecimento das questões postas, releva atender às seguintes ocorrências processuais: - Por requerimento de 25.10.2012, o Requerido veio arguir a nulidade da citação por violação do disposto no n.º 3, do art.º 228, do CPC, invocando que as fotografias que acompanham o requerimento inicial estão a preto e branco e são impercetíveis. - No despacho de 30.10.2012 consignou-se: Veio o requerido na presente providência cautelar arguir a nulidade de citação, porquanto com o requerimento inicial foram juntos documentos com os n.º 2 a 9, que constituem cópia a preto e branco de fotografais que não são legíveis, o que constitui uma violação do disposto no art.º 228, n.º 3, do CPC. (….) A apresentação dos documentos nestas condições, constitui uma efetiva limitação ao exercício pleno do direito de defesa, mas não podemos dizer que tal facto ponha em causa a validade do ato de citação. De facto, a citação, tal como foi realizada cumpriu as formalidades legais na estrita medida em que o Requerido recebeu os documentos nas mesmas condições que o Tribunal. Portanto, em rigor, não estamos perante uma nulidade de citação, em si mesma considerada. O que está em causa é apenas a salvaguarda do direito do Requerido a exercer o contraditório de forma plena, com conhecimento integral de todos os meios de prova que o Requerente pretendeu desde logo juntar para demonstrar o por si alegado no requerimento inicial. Consideramos assim que há nulidade, mas a nulidade em causa não é uma nulidade do ato de citação, nos termos previstos no art.º 198, do CPC (…) Julgamos assim que a citação deve ter-se por válida e eficaz. No entanto enquanto não for junta cópia legível dos documentos, não corre o prazo para o exercício do contraditório, pois o vício verificado prejudicou, e continua a prejudicar, o direito de defesa pleno do Requerido, embora não ponha em causa o efeito do seu chamamento ao processo, nem o conhecimento sobre o objeto da instância contra si deduzida. (…) declarando apenas a nulidade da junção dos documentos n.º 2 a 9, juntos como o requerimento inicial, por motivos dos mesmos serem ilegíveis e não permitirem o exercício pleno do contraditório sobre esse meio de prova. Mais se determina que o Requerido faça juntar aos autos versão legível dos mesmos documentos, por forma a que sobre eles o Requerido se possa pronunciar. Por força da declaração de nulidade ora decidida, considerando que a mesma influi no exame da causa e prejudica o exercício pleno do contraditório, determina-se que o prazo para deduzir a oposição à providência cautelar não corra até que o Requerido da providência corrija o vício verificado, nos termos supra ordenados.(….). - Por requerimento de 9.11.2012, veio o Requerido requerer a clarificação da decisão no sentido de se explicar que o prazo para deduzir a oposição só começava a correr no momento em que fosse notificado de copa legível dos documentos, veio também arguir a nulidade da notificação, referindo que na notificação ora recebida foram-lhe entregues cópias a preto e branco das fotografias, que embora menos más que as primeiras, continuavam a ser de má qualidade, tendo indagado junto da Secretaria que com o requerimento de 30.10.2012 o Requerente fez juntar fotografias a cores, existia a nulidade da notificação nos termos do n.º1, do art.º 198, do CPC, devendo ser deferida a arguida nulidade, dando-se sem efeito a notificação efetuada e ordenar-se que o Requerente juntasse aos autos cópias da mesma qualidade daquelas que juntou com o seu requerimento de 30.10.2012, isto é, cópias a cores das fotografias. - Em 27.11.2012 foi proferido despacho, no qual se consignou: As cópias dos documentos que o R. recebeu são de facto de má qualidade, repetindo-se assim o vício já reconhecido no despacho de fls. 48 a 51. Nessa conformidade, damos aqui por reproduzido o mesmo, com toda a sua fundamentação, reconhecendo-se a nulidade verificada. - Por requerimento de 10.12.2012, com notificação por via eletrónica, ao Mandatário do Requerido, veio o Requerente juntar documentos – fotografias e certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Lisboa. - Em 12.12.2012 foi proferido despacho, notificado na mesma data ao Requerido, no qual se consignou: Julgamos suprido o vício verificado relativamente à certidão permanente do registo predial. Por outro lado, a qualidade das fotografias agora apresentadas já permitem o exercício do contraditório pleno por parte do R. (…). - Por requerimento de 20.12.2012, o Requerido veio arguir a nulidade processual decorrente de a secretaria do tribunal não ter procedido à notificação dos documentos apresentados pelo Requerente. - No despacho de 21.12.2012, consignou-se: A secretaria não notificou o requerido da junção de documentos, porque não tinha nada que o fazer, considerando que a outra parte já tinha cumprido essa formalidade, nos termos do art.º 229.º-A, do CPC. O ato de notificação desses documentos pela secretaria seria um ato inútil e logo assim, proibido (art.º 137, do CPC). Nestes termos em face da simplicidade da questão suscitada e sem necessidade de cumprimento do contraditório (art.º 207 do CPC), julgamos desde já indeferir a reclamada nulidade. (…). - No despacho de 9.01.2013, consignou-se: Considerando o teor dos despachos de fls. 48 a 51, e fls. 102, e bem assim, que o requerente do procedimento cautelar já cumpriu com a notificação do teor dos documentos n.º 2 a 9, juntos como o requerimento inicial, agora de forma perfeitamente legível, de modo que permitiria ao Requerido o exercício pleno do contraditório, (…) resulta daí que o prazo para deduzir a oposição à providência iniciou-se em 10.12.2012 (…) tendo já decorrido integralmente (…) Nessa medida julgamos os factos alegados pelo requerente por confessados (...) - Foi proferida sentença, consignando-se, (…) Citado o Requerido para deduzir oposição à providência requerida, apesar de intervindo no processo, não se opôs ao requerido (…) considerou-se (…) que foram julgados por confessados todos os factos alegados pelo Requerente (….) sendo evidente que dos factos alegados e do direito invocado e aplicável ao caso a providência deverá proceder (….). Procedendo à devida subsunção jurídica, no conhecimento da pretensão do Recorrente, temos que a título principal, veio o Recorrente insurgir-se contra o despacho de 21.12.2012 e o de 9.01.2013. A discordância formulada assenta no entendimento na interpretação dada ao art.º 229.º A, do CPC, no sentido que as notificações efetuadas pelos mandatários só são obrigatórias, e como tal processualmente relevantes, após a notificação pela Secretaria da contestação, e assim até esta se realizar, todos os atos processuais praticados pelas partes são de forma obrigatória, objeto de notificação pela Secretaria. Deste modo, deveria ter sido julgada procedente a nulidade arguida, decorrente de a Secretaria não ter notificado o Recorrente da cópia legível das fotografias apresentadas em 10.12.2012, e assim, ser revogado o despacho subsequente de 9.01.2013, que considerou que o prazo para apresentar a oposição já se esgotara, porquanto se iniciara na data em que o Recorrente fora notificado de tal junção. Apreciando, diz-nos o art.º 229.ºA, do CPC, que nos processos em que as partes tenham constituído mandatário judicial, os atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes após a notificação da contestação do réu ao autor, são notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte. Tal normativo, aditado pelo DL 183/2000, de 10 de agosto, surgiu com a finalidade de desonerar os tribunais da prática de atos de expediente que podiam ser praticados pelas partes, sem que tal contendesse com a observância de quaisquer prazos, pois tratava-se, tão só, de notificar atos que foram praticados no processo, e não de substituir os autos por um processo paralelo, correndo entre os mandatários das partes[1]. Delineado então o dever de recíproca notificação dos mandatários, substancialmente limitativo do regime de notificação oficiosa a realizar pelas Secretarias, previsto no n.º2, do art.º 229, do CPC, embora fosse apontada alguma falta de clareza em termos da respetiva previsão[2], poderá dizer-se que se foi firmando um entendimento no sentido de estar abrangido no dever de notificação tudo o que tivesse proveniência do escritório do mandatário judicial, cumprindo à Secretaria notificar o que viesse do próprio Tribunal[3]. A alteração produzida pelo DL 303/2007, de 24 de agosto, mostra-se convergente com tal orientação, numa visão alargada do dever de notificação, salvaguardando os primeiros momentos de intervenção processual das partes, sem que tal signifique, segundo se crê, uma visão redutora da não validade da notificação efetuada entre mandatários, numa perspetiva não só de economia processual, mas sobretudo da prevalência da justa composição do litígio, na realização da justiça material, sobre a forma, desde que devidamente salvaguardado o pleno exercício do contraditório que ao caso concreto assista. Reportando tais considerandos aos autos, verifica-se que tendo sido declarado válido e eficaz o ato de citação do Recorrente, produzindo os seus efeitos no concerne ao chamamento ao processo, bem como ao conhecimento do respetivo objeto, ainda assim, ocorreu uma nulidade nos termos dos artigos 228, n.º1 e 3, e 201, do CPC, determinando, tão só, que o prazo para deduzir a oposição não correria até o Recorrido corrigir o vício, relativo à legibilidade de alguns dos documentos apresentados. Diga-se, tendo em conta a solicitação efetuada pelo Recorrido, ao abrigo do disposto no art.º 684-A, do CPC, que está previsto no n.º 3, do art.º 228, do CPC, o princípio da plena inteligibilidade do objeto da citação pelo respetivo destinatário, traduzindo-se o mesmo não só na entrega de todos os elementos necessários para que haja a apreensão do que é notificado, mas também que permitam o desenvolvimento da atividade processual subsequente, implicando, desse modo, e em conformidade, a legibilidade dos documentos apresentados[4]. Ora, aferida pelo Julgador a falta de legibilidade das fotografias em causa, em termos que não surgem contrariados, verificando-se efetivamente um vício que importava suprir, com vista a que não fosse, de algum modo cerceado, o pleno exercício do contraditório por parte do Requerido, e assim com possíveis repercussões no exame e decisão da causa, integrando o conceito de nulidade previsto no art.º 201, do CPC, sem prejuízo da validade do ato de citação praticado, que como vimos foi salvaguardada, necessário se mostrava que fosse determinada a sua sanação, conforme o ordenado. Assim, e diversamente do que pretende o Recorrido, o prazo para a dedução da oposição, como foi entendido no despacho em crise, apenas deveria correr logo se mostrasse suprido o vício detetado. Continuando na análise da pretensão do Recorrente, certo é que foram posteriormente juntas novas fotografias, vindo aquele reagir aquando da respetiva notificação, deduzindo a respetiva nulidade, invocando que apesar de haver melhorias, ainda assim tinham má qualidade. O Tribunal deu assentimento ao pedido do Recorrente, vindo o Recorrido juntar novas cópias dos documentos, procedendo desde logo à notificação daquele (requerimento de 10.12.2012), sendo proferido despacho de 12.12.2012, na mesma data notificado, atestando a qualidade necessária das fotografias apresentadas para o cabal exercício do contraditório. Na sequência da nulidade da notificação deduzida pelo Recorrente, entendeu o Tribunal que a mesma não se configurava, não se justificando que a Secretaria levasse a cabo uma notificação, que já fora realizada. Na verdade, não enjeitando o Recorrente que já fora notificado dos documentos, nem invocando que a legibilidade dos mesmos não era suficiente para o exercício do seu direito, não se divisa que se impusesse a repetição, por parte da Secretaria, dum ato já efetuado, e que realizara os objetivos a que se destinava, numa sobrevalorização da forma, em detrimento do conteúdo, que não se configura que deva ser tutelada. Com efeito, ciente que estava o Recorrente do direito que lhe assistia e dos termos em que podia exercê-lo, na sequência de várias intervenções processuais e chegado que foi, ao seu conhecimento, o último item para efetivá-lo, confirmado, aliás, por despacho que lhe foi notificado, não avulta que tenha sido praticado ato, legalmente proibido, mas principalmente, que a possível irregularidade pudesse influir no exame ou decisão da causa, afastada ficando, como se decidiu a existência de uma nulidade, concluindo-se, em conformidade, pela manutenção do despacho recorrido de 21.12.2012. Desta forma, inexiste fundamento para alterar o decidido no despacho de 9.1.2013, igualmente questionado, porquanto procedeu à aplicação dos dispositivos legais atendíveis, e assim, por falta de oposição, julgou confessados os factos alegados pelo Recorrido. Aqui chegados, importa então apreciar o recurso formulado quanto à decisão que conheceu a pretensão do Requerente, deferindo a providência requerida. Desde logo insurge-se o Recorrente em termos do que foi tido como indiciariamente provado, porquanto no concerne ao direito de propriedade sobre o imóvel, só podia ser o mesmo provado por documento escrito, referindo que o junto pelo Requerente com o requerimento inicial não se reporta a fração em causa. Ora conforme resulta do acima enunciado, em data anterior à prolação da decisão em crise, foi junta aos autos certidão permanente emitida pela Conservatória do Registo Predial competente, da qual resulta a inscrição a favor do Recorrente e outro, da fração referenciada. Certo é, também que o Recorrente não enjeita a titularidade do direito de propriedade, embora invoque a existência de compropriedade, como, aliás, atesta com documento junto com as alegações, isto é, certidão permanente da Conservatória do Registo Predial. Com efeito, não suscitando dúvidas que o registo predial não tem natureza constitutiva, mas essencialmente declarativa[5], do mesmo decorrem, contudo, presunções, como a prevista no art.º 7, do CRgPd, no sentido de se presumir que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos teremos em que o registo o define, isto é, a existência de um direito que resulta do facto jurídico inscrito, a respetiva pertença ao titular, e ainda que o direito recai sobre o objeto apontado, a saber, o prédio conforme se mostra identificado na descrição predial, sendo que na devida interpretação de tal normativo, sempre a presunção poderá ser ilidida mediante prova em contrário, art.º 350, n.º 2, do CC, realidade contudo que não se verifica, como se viu, nos presentes autos. Desta forma, demonstrada está a titularidade do direito por parte do Recorrente, e assim considerada, nos termos do factualismo alegado pelo Recorrido, descrito no relatório, e para o qual se remete. Diz, contudo, o Recorrente, que sendo o mesmo coproprietário com outrem da fração em causa, verifica-se uma situação de ilegitimidade por preterição de litisconsórcio necessário passivo, carecendo a decisão proferida de qualquer utilidade, por quanto a coproprietária não foi chamada a ação, para além de a intervenção desta última ser sempre necessária em ações que tem por objeto, a casa de morada de família. Apreciando, no atendimento do disposto do art.º 26, do CPC, como critério normal, no concerne à legitimidade singular e direta, a solução encontrada assenta na titularidade da relação material controvertida, conforme surge delineada pelo autor[6], sabendo-se que a legitimidade constitui um mero pressuposto processual, necessário para que o juiz se possa pronunciar sobre o mérito da causa, distinguindo-se dos requisitos que respeitam à procedência do pedido, com os mesmos não se confundindo. Já no que respeita à legimitação extraordinária[7], quer como legitimidade plural, com a exigência de uma situação de litisconsórcio, quer como legitimidade indireta, as respetivas atribuições, anteriores e destacadas do conhecimento do mérito, não dependem, tão só, da afirmação efetuada pelo autor na petição inicial, mas sim de se verificar que, no caso em análise, existem na realidade outros interessados que possam ser tidos como litisconsortes, ou de se mostrar efetivamente patenteada a existência de interesses, que permitem a atribuição da ilegitimidade indireta. Reportando-nos aos presentes autos ressalta, desde logo, com vista à invocada aplicabilidade do disposto no n.º 3, do art.º 28.º - A, do CPC, que indemonstrada está que a fração em causa seja casa de morada de família, mas mais relevante, contudo, importa ater-nos ao que foi solicitado em termos da presente providencia cautelar, que como facilmente se depreende, não envolve a perda ou oneração do bem em referência. De igual forma, no concerne à situação de compropriedade, tendo em conta o previsto no art.º 1405, do CC, em causa está o exercício de direitos como “proprietário”, o qual deverá ser realizado conjuntamente por todos os consortes. Acontece que o pedido formulado nos autos não se centra na qualidade de proprietário, nem a pressupõe de forma necessária. Na realidade, configura-se antes um caso compaginável com uma situação de dever de dar uma informação, consagrado genericamente no art.º 573, do CC, surgindo o Recorrente como aquele que se encontra em situação de prestar informações sobre o conteúdo de um direito, face a dúvidas razoáveis, e fundadas que assistem ao Requerente, enquanto entidade legitimada para as formular. Assim, sendo, não avulta que tendo em conta a pretensão formulada em juízo, maxime para produzir o seu efeito útil, fosse necessária a intervenção do outro coproprietário da fração. Por último, invoca o Recorrente que o Recorrido deveria ter lançado mão de outra providência, a saber embargo de obra nova, pois o risco de lesão que pretendia acautelar está especialmente ali previsto e regulado. Em traços breves, resulta do disposto no art.º 412, do CPC, que a providência em causa, constituindo um dos meios de defesa da propriedade, quer em sentido restrito, quer abrangendo as situações da compropriedade ou propriedade horizontal, abarcando ainda os restantes direitos reais de gozo, visa a sustação de obras, que já sejam causa de prejuízo ou que constituam a ameaça da sua ocorrência[8], aquém se julgue ofendido no seu direito, isto é, e contrariamente ao que sucede no caso de procedimento cautelar comum, em que basta o justo receio de ocorrência de lesão nos direitos do requerente, exige-se naquela providência cautelar especificada, que as obras ou trabalhos já tenham ofendido o direito[9]. Atendendo ao teor do alegado em sede do requerimento inicial, e subsequente pedido formulado, resulta que o Requerente, ora recorrido, solicita que o Recorrente permita a realização de uma diligência com vista a aferir se, de facto, se verificam as consequências funestas, que o Recorrido teme que tenham advindo da intervenção do Recorrente, não se configurando, assim, que seja enunciada uma ofensa do direito, passível de fundar o decretamento do embargo de obra nova, mostrando-se a providência cautelar não especificada como o meio próprio para aquilatar da requerido pelo Requerente. Inexistindo quaisquer outras questões que importe conhecer, improcedem, na totalidade, as conclusões formuladas pelo Recorrente. * III – DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando as decisões sob recurso. Custas pelo Recorrente. * Lisboa, 28 de maio de 2013 Ana Resende Dina Monteiro Luís Espírito Santo ---------------------------------------------------------------------------------------- [1] Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in As Recentes Alterações na Legislação Processual Civil, in Separata da Revista da Ordem dos Advogados, Ano 61, I, janeiro de 2001. [2] Na discussão do que pretendia o legislador regular com a figura do “requerimento autónomo”. [3] Cfr. Lopes do Rego, in Comentário ao Código Processo Civil, vol. I, pag. 207 e segs. [4] Cfr. Lopes do Rego, obra citada, pag. 206, que aqui de perto se seguiu. [5] Na fórmula sintética, o registo não dá nem tira direitos, cfr. Oliveira Ascensão, in Direitos Reais, pag. 359. [6] Próxima da posição do Prof. Barbosa de Magalhães na famosa controvérsia que o pôs ao Prof. Alberto dos Reis, visando sanar-se uma querela jurídica que se vinha desenrolando há várias décadas. [7] No sentido de excluída da normal, enunciada. [8] Na divisão entre embargos repressivos e preventivos. [9] Cfr. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV volume, Procedimentos Cautelares Especificados, fls. 219 e seguintes, que aqui de perto se seguiu. |