Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
106/19.2SWLSB.L1-9
Relator: SIMONE ABRANTES DE ALMEIDA PEREIRA
Descritores: ADMISSÃO DO RECURSO
JOVEM DELINQUENTE
ATENUAÇÃO ESPECIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: 1) PARCIALMENTE PROCEDENTE A RECLAMAÇÃO E, EM CONSEQUÊNCIA, ADMITIDO O RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO.
2) NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO, MANTENDO-SE A DECISÃO RECORRIDA.
Sumário: I. A competência para apreciar a admissibilidade de recurso [da decisão final] dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, em processo com outros recursos dirigidos ao Tribunal da Relação [para reexame da matéria de facto], cabe ao Tribunal da Relação  por via da extensão de competência prevista no nº 8 do artigo 414º do CPP [desvio à regra geral prevista no nº 3 do mesmo normativo].
II. O recurso incorrectamente dirigido ao STJ, cujo objecto não integra a competência deste, deve ser apreciado pelo Tribunal da Relação por forma a assegurar a efectividade da tutela constitucional do direito ao recurso, previsto no artigo 32º da CRP.
III. A aplicação da atenuação especial da pena prevista no artigo 4º do D.L. 401/82, de 22 de Setembro, não é de funcionamento automático e impõe que se apure, casuisticamente, se a atenuação favorece a ressocialização do agente.
IV. O factor idade e a ausência de antecedentes criminais, só por si, não constituem factores determinantes de atenuação especial da pena, apenas poderão relevar como atenuantes de carácter geral.
(da inteira responsabilidade da relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes na 9ª Secção Criminal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
No âmbito dos presentes autos [Processo Comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, n.º 106/19.2 SWLSB, a correr termos no Juízo Central Criminal de Lisboa, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa], entre outros, foi julgado e condenado o arguido A, como co-autor, pela prática de um crime de tráfico e estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22.01, por referência às tabelas I- A e I-B anexas, na pena de quatro anos e oito meses de prisão.
Inconformado com a decisão final condenatória proferida pelo Tribunal de 1ª instância interpôs recurso [tal como quatro dos demais arguidos], a fls. 2889 a 2895 dos autos, para o Supremo Tribunal de Justiça, pedindo reexame restrito à matéria de direito, invocando como quadro legal o disposto nos artigos “399º, 400º, 401º, nº1, al. b), 402, nº 1, 406º, nº1, 407º, nº 2, al. a), 408º, nº 1, al. a), 411º, nº 1, al. b), 412º e 432º, nº 1, alínea c) todos do Código de Processo Penal”.
Os recursos, entre os quais o do arguido A, foram admitidos pelo Tribunal de 1ª instância por despachos proferidos a 24 e 28 de Abril de 2022 [fls. 2070 e 2977], a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
Por despacho do relator deste Tribunal de 17.10.2022 foi solicitado esclarecimento à 1ª instância relativamente ao despacho de admissão do recurso do arguido A e ordenado o prosseguimento dos autos, para apreciação em conferência dos demais recursos interpostos, que vieram a ser julgados improcedentes por acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de Outubro de 2022.
Tendo sido notificado o referido despacho de 17.10.2022, veio arguido A apresentar requerimento em 21.10.2022, através do qual informa que por lapso mencionou o STJ quando pretendia dirigir o recurso ao Tribunal da Relação de Lisboa, juntando novo recurso.
Prestado esclarecimento pela 1ª instância em 11.11.2022, cuja incorporação nos autos foi determinada na mesma data, foi proferido despacho pelo relator em 14.11.2022 de não admissão do recurso interposto pelo arguido A.
Do despacho de não admissão do recurso, vem o arguido reclamar para a conferência [por requerimento de 22.11.2022, com referência citius 43957078], apresentando as seguintes conclusões:

A presente Reclamação visa impugnar o Douto Despacho de não admissão de recurso interposto pelo arguido A no âmbito do processo à margem referenciado.

A decisão de não admissão do recurso tem como único fundamento o facto de o requerimento de recurso ter sido dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça quando, em bom rigor e por uma interpretação à contrario da norma contida na alínea c) do nº 1 do artigo 432º do Código de Processo Penal, deveria ter sido dirigido ao Venerando Tribunal da Relação.

Não obstante o lapso, o recurso foi aceite pelo Tribunal a quo que o remeteu ao Tribunal da Relação de Lisboa por considerar ser este o competente para a apreciação, conforme Despacho proferido já em momento posterior.

O mesmo entendido terá tido o Ministério Público, quer junto do Tribunal que proferiu a decisão condenatória, quer junto do Tribunal da Relação de Lisboa, urna vez que não usou de tal argumento para fundamentar qualquer pedido de improcedência do recurso.

O lapso contido no endereço do recurso foi assumido e as circunstâncias explicitadas em requerimento dirigido ao Mmº Juiz do Tribunal a quo, razão pela qual entendemos dever o recurso ser aceite e não rejeitado corno consta do Douto Despacho.
De facto,

O Tribunal da Relação de Lisboa é o único tribunal com competência material e territorial para conhecer e apreciar o recurso.

No modesto entender do arguido e salvo o devido respeito por opinião diversa, não existe fundamentação legal para a não admissão do recurso, nomeadamente em matéria de competência do Tribunal da Relação e como se verifica pelo Douto Despacho recorrido, o Tribunal também não lhe fez qualquer referencia para fundamentar a decisão de não admissão.

Como explicitado na motivação, as causas de inadmissibilidade do recurso em processo penal são as constantes do artigo 414º do C.P.P. e de entre elas não vislumbramos qual delas possa fundamentar a decisão recorrida.

Igualmente se entende que, tendo o Tribunal tomado conhecimento das conclusões do recurso que, como jurisprudencialmente aceite, delimitam o seu objeto, não pode por isso mesmo ignorar que a matéria de que se recorre é de apreciação exclusiva desse mesmo Tribunal.
Só o Supremo Tribunal de Justiça poderia rejeitar o recurso baseado na incompetência absoluta para conhecer de tal matéria, por se tratar de uma violação das regras de hierarquia.
NESTES TERMOS,
Deverá a presente Reclamação ser julgada procedente e, por via disso, a Decisão Recorrida, carente de fundamentação legal ser substituída por uma outra que considere a admissibilidade do recurso.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso interposto pelo arguido A deve ser transmitido ao Supremo Tribunal de Justiça, tribunal perante o qual foi interposto, por ser este o competente para, ao abrigo do artigo 414.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, apreciar da sua admissibilidade.
*
II. Fundamentos:
A apreciação da reclamação ora submetida à conferência, na sequência da não admissão do recurso interposto pelo ora reclamante para o Supremo Tribunal de Justiça, impõe a apreciação de três questões distintas:
a) Rectificabilidade do recurso interposto;
b) Competência do Tribunal da Relação para a prolação do despacho sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça;
c) Verificação dos pressupostos legais para a apreciação do recurso pelo Tribunal da Relação por incompetência absoluta do Supremo Tribunal de Justiça, em razão da hierarquia, para apreciação do recurso.
a) Rectificabilidade do recurso interposto
O ora reclamante vem, por via da reclamação em apreciação, sustentar a existência de um lapso rectificável na identificação do Tribunal a que pretendia dirigir o recurso, tendo para efeito junto novo recurso aos autos.
Conforme foi referido no despacho reclamado e aqui se reitera, à rectificabilidade dos erros de escrita cometidos em peças processuais aplica-se o disposto no artigo 249º do Código Civil que estipula que «O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.».
Ora, no caso dos autos o alegado lapso não encontra no texto do recurso qualquer suporte, pelo contrário, todo o texto do recurso - cabeçalho, exposição motivacional, conclusões e pretensão petitória – apontam no sentido de que o recorrente pretendeu, ainda que erradamente, interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.  O recorrente para além de se dirigir ao STJ e expressamente aos Senhores Conselheiros ao longo do recurso, invocou expressamente o artigo 432º, nº 1, al. c) do CPP, como fundamento legal do recurso.
Por conseguinte, não evidenciando a peça processual qualquer lapso, a mesma não é rectificável, ao invés do que sustenta o reclamante na conclusão 5ª.
b) Competência do Tribunal da Relação para a prolação do despacho sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça
Sustenta ainda o reclamante, em posição idêntica à do Ministério Público junto deste Tribunal [que entendeu dever o recurso ser remetido ao Supremo Tribunal de Justiça para aferir da respectiva admissibilidade ou inadmissibilidade] que apenas o Supremo Tribunal de Justiça poderia rejeitar o recurso com fundamento na sua incompetência absoluta.
É incontroverso que a sindicabilidade da decisão de admissão do recurso proferida pelo Tribunal de 1ª instância cabe, por regra, ao Tribunal superior ao qual é dirigido o recurso, nos termos do disposto no artigo 414º, nº 3 do Código de Processo Penal. Todavia, a lei prevê no nº 8 do artigo 414º do Código de Processo Penal um desvio à regra geral da competência em razão da hierarquia, estipulando que «Havendo vários recursos da mesma decisão, dos quais alguns versem sobre matéria de facto e outros exclusivamente sobre matéria de direito, são todos julgados conjuntamente pelo tribunal competente para conhecer da matéria de facto.». Ora, tal situação ocorre no caso dos autos porquanto para além do recurso do arguido, ora reclamante, foram interpostos outros quatro recursos da decisão final condenatória, alguns dos quais com pedido de reexame da matéria de facto. Por conseguinte, por via de tal extensão de competência para o Tribunal da Relação, mesmo que tivessem sido interpostos recursos da competência do Supremo Tribunal de Justiça [situação que não corre], a sua apreciação estaria deferida a este Tribunal da Relação. Assim sendo, não pode deixar de se entender que no caso dos autos, pese embora o recurso esteja dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, a competência para a prolação do despacho de admissão ou não admissão do recurso, está deferido a este Tribunal da Relação, carecendo de fundamento a posição do reclamante e do Ministério Público de que apenas o Supremo Tribunal de Justiça se poderia pronunciar sobre a admissibilidade do recurso, nos temos do artigo 414º, nº 3 do Código de Processo Civil.
c) Verificação dos pressupostos legais para a apreciação do recurso pelo Tribunal da Relação por incompetência absoluta do Supremo Tribunal de Justiça, em razão da hierarquia, para apreciação do recurso
Resta apreciar a questão nuclear da presente reclamação – [in] verificação dos pressupostos legais para a apreciação do recurso por este Tribunal da Relação – atenta a manifesta falta de competência do Supremo Tribunal de Justiça para conhecer do recurso interposto, face ao teor do acórdão condenatório proferido pela 1ª instância [condenação do arguido na pena de quatro anos e oito meses de prisão] e atento o disposto no artigo 432º do CPP - que define as situações em que é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Tendo em consideração o teor do acórdão condenatório proferido pelo Tribunal colectivo, o mesmo apenas é susceptível de recurso ordinário para o Tribunal da Relação nos termos dos artigos 400º, à contrário, e 427º do Código de Processo Penal, sendo, consequentemente, o Supremo Tribunal de Justiça incompetente para conhecer do recurso interposto pelo arguido, ora reclamante [por a pena de prisão aplicada não ser superior a 5 anos], o que ora se declara ao abrigo do conteúdo normativo ínsito no artigo 414º, nº 8 do Código de Processo Penal.
Em função da recorribilidade da decisão condenatória, que versa sobre matéria da competência deste Tribunal da Relação, e ultrapassando a errada interposição do recurso pelo ora reclamante por forma a assegurar a tutela constitucional do direito ao recurso previsto no artigo 32º da Constituição da República [garantia imprescindível de defesa, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, nos casos, como o dos autos, em que estamos perante decisão condenatória privativa da liberdade[1]], decide-se [alterando a relatora a posição anteriormente assumida quanto à admissibilidade do recurso] dar como verificados os pressupostos legais para a apreciação do recurso em causa, passando a dele conhecer.
*
III. Apreciação do Recurso:
III. 1) Relatório
No âmbito do Processo Comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, n.º 106/19.2 SWLSB, a correr termos no Juízo Central Criminal de Lisboa, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, entre outros, foi julgado e condenado o arguido:
- A, como co-autor, pela prática de um crime de tráfico e estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22.01, por referência às tabelas I- A e I-B anexas, na pena de quatro anos e oito meses de prisão.
Desta decisão veio o arguido A [e os arguidos R, G, V e T, cujos recursos foram julgados improcedentes por acórdão deste Tribunal de 27 de Outubro de 2022] interpor recurso, nos termos e com os fundamentos que constam dos autos, que se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos, terminando com a formulação das seguintes conclusões:
1.
Pelo Douto Acórdão proferido e objeto deste recurso, o recorrente foi condenado em coautoria pela pratica de um crime de trafico de estupefacientes p.p. pelo artigo 21º do DL 15/93 de 22.01, à pena de quatro anos e oito meses de prisão efetiva.
2.
Vem o presente Recurso interposto pelo facto de não se aceitar o quantum da pena, consequência da não aplicação pelo Tribunal do regime penal especial para jovens (DL 401/82 de 23.09), e tem por objeto a revogação da Douta decisão e sua substituição por outra que considere a aplicação desse regime e, em consequência lhe diminua consideravelmente a pena e a suspenda na sua execução ou, sem conceder, suspenda na execução a pena agora aplicada
3.
À data em que foi referenciada a primeira prática do crime de tráfico de estupefacientes nas o arguido tinha apenas 17 anos de idade. Não foi detido e nada lhe foi dito.
4.
Durante a investigação que durou pelo menos 11 meses (de junho de 2020 a abril de 2021, altura em que foi detido) o recorrente foi vigiado pela policia e visto a transacionar produto estupefaciente por quatro vezes (3 de junho de 2020; 28 de janeiro; 10 de março e 12 de abril de 2021).
5.
É sabido que no crime de tráfico de estupefacientes, as exigências de prevenção geral são muito elevadas, tendo em conta o enorme alarme social que provoca e as inúmeras e nefastas consequências que daí advêm para as pessoas mais diretamente afetadas com o fenómeno (consumidores e familiares) e para a comunidade em geral
6.
Contudo, no caso concreto, as imposições da necessidade de prevenção especial não são particularmente altas, tendo em conta a ausência de antecedentes criminais do recorrente e o apoio familiar que recebe.
7.
Em face de todo um quadro de circunstâncias que nos parece poderem beneficiar o recorrente, não se compreende que o tribunal a quo não tenha sido sensível à questão da ressocialização e, mesmo tendo em conta a sua juventude, tenha obstado a aplicação do regime aplicável em matéria penal aos jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos.
8.
O Recorrente confessou os factos, mesmo aqueles que praticou antes de ser detido, assumindo que nos dias em que a polícia o referenciou, vendeu produtos estupefacientes que identificou como heroína e cocaína o que permitiu à policia e ao Ministério Público saberem de que produtos se tratava uma vez que as vigilâncias efetuadas à distância e de forma discreta não possibilitavam esse conhecimento.
 9.
Assumiu que o dinheiro que lhe foi apreendido era proveniente da venda desses produtos o que denota vontade de colaborar e arrependimento.
10.
Teve bom comportamento antes e depois dos factos (não tem antecedentes criminais e o Relatório Social efetuado pela DGRSP carateriza o seu comportamento, em contexto criminal, como ajustado e de acordo com as normas e regras institucionais.
11.
Ainda de acordo com o referido relatório, o arguido demonstra ter consciência do desvalor e gravidade da conduta criminal em causa e uma postura intimidada perante a intervenção do sistema de justiça penal, e capacidade critica face à tipologia criminal de que se encontra acusado e reconhecendo a existência de vitimas.
12.
A família denota total disponibilidade para o apoiar no que se mostrar necessário. Tem fortes espectativas de emigrar para junto da mãe que reside atualmente na Suíça.
13.
Em face das circunstâncias expostas entendemos que a pena aplicada pelo Tribunal é claramente excessiva, desproporcional e, em consequência injusta e, por isso, com o respeito devido se dirá que houve violação dos artigos 9º e 71º do Código Penal.
14.
Como é hoje jurisprudencialmente aceite, uma pena excessiva não cumpre as finalidades da prevenção geral porque a própria comunidade a repudia, nem realiza as funções de prevenção especial porque o agente não a aceita, por vê-la por injusta, e uma pena injusta não cumpre os objetivos da ressocialização.
15.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas, Colendos Conselheiros, doutamente suprirão se pede que seja dado provimento ao presente recurso e seja revogada a Douta decisão que condenou o arguido a uma pena de prisão efetiva de 4 anos e oito meses, por se entender ser excessiva, desproporcional e não cumprir a finalidades das penas, e em seu lugar ser produzida decisão que aplique uma outra pena mais consentânea com o regime previsto no DL 401/82 e não privativa da liberdade.
Se não for esse o entendimento de V. Exas, roga-se que a pena agora aplicada ao Recorrente seja suspensa na sua execução, assim se fazendo, como sempre a boa e costumada JUSTIÇA.
Ao recurso apresentado pelo arguido respondeu o Ministério Público, conforme consta de fls. 2979 a 2990 dos autos, pronunciando-se pela improcedência do mesmo face à inexistência de facto objectivo que permita firmar um juízo de prognose favorável quer à suspensão da pena quer à aplicação do regime Penal Especial para Jovens.
O recurso foi admitido por despacho proferido a 21 de Abril de 2022 [fls. 2070], a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo.                                                           
Neste Tribunal de recurso o Digno Procurador-Geral Adjunto no parecer que emitiu, e que se encontra junto a fls. 3013 dos autos, pugna pela improcedência do recurso apresentado, com base na argumentação exposta pelo Ministério Público junto da 1ª instância.
Cumprido o preceituado no art.º 417.º, n.º 2 do Cód. Proc. Penal, respondeu o arguido A, reiterando novamente o pedido de procedência do recurso face à sua idade, confissão e ausência de antecedentes criminais.
*
O arguido recorrente A encontra-se sujeito à medida de prisão preventiva desde 12/04/2021.
Nada obsta ao conhecimento do mérito.
III. 2) Fundamentação:
III.2.a) São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal de 1.ª Instância:
I.
1. No dia 10 de Dezembro de 2019, pelas 09h30, o arguido C encontrava-se na via pública, na X, nas imediações do ‘’Café ...”, a proceder à venda de heroína.
2. Neste dia, o arguido C foi abordado por indivíduos que pretendiam adquirir-lhe, pelo menos, heroína.
3. Após essa abordagem, este arguido recolhia embalagens de heroína que, previamente, ocultara na roda de uma viatura de marca e modelo “Ford Fiesta”, que ali se encontrava parqueada, e entregava-lhas.
4. Enquanto isso, neste dia, o arguido B circulava do lado oposto da via, no passeio, exercendo funções de vigilância a eventuais actuações policiais, de forma a controlar a sua aproximação ou presença, aquando das transacções efectuadas pelo arguido C.
5. Sempre que necessitava de abastecer de embalagens com heroína, o arguido B deslocava-se ao Lote 4 da X, de onde regressava, pouco depois, trazendo uma ‘’bolsa” contendo embalagens com o aludido produto.
6. Assim, pelas 10h00 deste dia, o arguido C foi abordado por D, consumidor de heroína, que pretendia adquirir-lhe este produto.
7. Acto contínuo, o arguido C recolheu uma embalagem de heroína da roda do veículo e entregou-a a D, recebendo em troca quantia não apurada.
8. Esta embalagem continha no seu interior, heroína, com o peso líquido de 0,529 gramas.
9. Pelas 10h20m, o arguido C foi abordado por E, consumidor de heroína, que pretendia adquirir-lhe este produto, tendo para o efeito entregue quantia não apurada.
10. Seguidamente, o arguido C retirou de uma bolsa que guardara no bolso do casaco que envergava uma embalagem de heroína com peso líquido de 0,226 gramas e entregou-a a E.
11. Pelas 10h45 deste dia, o arguido C foi abordado por F consumidor de heroína, que pretendendo adquirir-lhe este produto para seu consumo, entregando-lhe para esse efeito, quantia não apurada.
12. Então, o arguido C dirigiu-se junto do já referido veículo “Ford Fiesta” e retirou da “bolsa’’ que ali ocultara a embalagem pretendida, que entregou a F.
13. Esta embalagem continha no seu interior heroína, com o peso líquido de 0,359 gramas.
14. Pelas 11h45m chegou àquele local o arguido G, que contactou com os arguidos C e B, recebeu de C a quantia monetária que recebera das vendas realizadas, que contou e guardou no bolso.
II.
15. No dia 03 de Janeiro de 2020, o arguido B encontrava-se na X, junto ao Y, a proceder à venda de heroína e/ou cocaína a terceiros.
16. Pelas 11h49, o arguido B foi interpelado por cinco indivíduos que pretendiam adquirir-lhe um dos referidos produtos.
17. Acto contínuo, o arguido B retirou de uma bolsa que trazia a tiracolo um saco transparente que continha embalagens heroína e/ou cocaína, mantendo-as na mão, enquanto os indivíduos escolhiam a embalagem pretendida e entregavam a quantia monetária devida em troca.
18. Pelas 11h52, o arguido B foi abordado por um indivíduo que pretendia adquirir heroína e/ou cocaína, tendo-lhe entregue uma embalagem do referido produto e recebido desse indivíduo, como pagamento, quantia monetária.
19. Em seguida, o arguido B deslocou-se ao Lote 1, para recolher mais embalagens de heroína e/ou cocaína para venda, após, o que, regressou ao local onde se encontrava, retomando as vendas, nos moldes descritos.
20. Nessa ocasião, o arguido B foi abordado por H, consumidor de heroína.
21. Acto contínuo, o arguido B entregou-lhe uma embalagem que continha heroína, com o peso líquido de 0,378 gramas e recebeu daquele, em troca, quantia não apurado.
22. Pouco antes das 12h35, o arguido B foi contactado por I, consumidor de heroína, que, pretendendo obter uma embalagem deste produto para seu consumo, lhe entregou em contrapartida, quantia não apurada.
23. De seguida, o arguido B entregou-lhe uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 0, 432 gramas.
III.
24. No dia 04 de Fevereiro de 2020, pelas 17h30, na X, junto ao estabelecimento comercial denominado Y, encontrava-se um indivíduo não identificado, que, neste dia, realizava as vendas de heroína e/ou cocaína aos indivíduos que ali se se dirigiam para adquirir tais produtos.
25. Pelas 17h45 chegou ao local o arguido G, que recolheu junto deste indivíduo quantia não apurada.
26. De seguida, o arguido G dirigiu-se ao Lote 4, de onde regressou breves minutos depois, trazendo consigo um saco transparente que acondicionava várias embalagens de heroína e/ou cocaína, que entregou ao referido indivíduo, para que prosseguisse as vendas.
27. Logo depois, este indivíduo foi abordado por J, consumidor de heroína, que pretendia adquirir-lhe este produto.
28. Acto contínuo, o indivíduo não identificado retirou várias embalagens da bolsa preta que tinha a tiracolo, abriu a mão, permitindo que J escolhesse e retirasse a embalagem pretendida, o que fez, tendo-lhe entregue quantia não apurada.
29. J obteve assim uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 0,423 gramas.
30. O indivíduo não identificado prosseguiu as vendas nos moldes descritos, a pelo menos mais 4 indivíduos.
31. Pelas 11h20, o arguido G aproximou-se do indivíduo não identificado e recolheu a quantia realizada com as vendas, seguindo de imediato para o interior do Lote 4, enquanto as vendas prosseguiam.
IV.
32. No dia 28 de Maio de 2020, pelas 10h00, o arguido G encontrava-se junto ao Y.
33. Nessa ocasião, foi contactado por vários indivíduos, a quem deu indicação para aguardarem, enquanto se dirigiu ao túnel junto ao prédio 4-B, onde permaneceu, por alguns minutos.
34. Pelas 10h15, chegou ao local o arguido C, que foi ao encontro do arguido G, tendo recebido deste indicações, para se posicionar num local com visibilidade para os acessos da rua, por forma a poder alertá-lo da eventual aproximação de agentes policiais no local.
35. De seguida, o arguido G deslocou-se ao Lote ..., acedendo à fracção do 7.ºA.
36. Volvidos cinco minutos, saiu daquela habitação e trazendo na sua posse (no bolso das calças que trajava) um objecto volumoso, que continha várias embalagens de heroína e/ou cocaína.
37. Seguidamente, o arguido G deslocou-se junto de uma viatura que se encontrava parqueada junto ao Y, tendo ocultado as embalagens junto à roda do veículo.
38. Em seguida, o arguido G sinalizou aos compradores que ali aguardavam para se aproximarem de si e entregou-lhes embalagens de heroína e/ou cocaína, recebendo, em troca, quantias monetárias.
39. Pelas 10h40, três indivíduos dirigiram-se para junto do arguido C, tendo-lhes este dado indicação para aguardarem, enquanto recolheu as embalagens de heroína e/ou cocaína pretendidas junto à descrita viatura, que entregou em seguida aos indivíduos, recolhendo destes a respectiva quantia em pagamento.
40. Pelas 11h15, L, pretendendo adquirir canábis, acercou-se dos arguidos C e G.
41. O arguido G deu-lhe indicação para aguardar junto do arguido C e deslocou-se às imediações do Lote 4-B, regressando, pouco depois, com uma embalagem contendo canábis, que entregou a …, recebendo deste € 90.
42. Este produto foi apreendido na posse de L, tendo apurado tratar-se de canábis (resina) com o peso líquido de 12,867 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 12,1%.
V.
43. No dia 03 de Junho de 2020, pelas 09h00, chegaram à X, junto ao Y o arguido A, que assumiu as funções de vendedor, e um indivíduo não identificado, que manteve a vigilância das imediações do local, no lado oposto ao café.
44. Pelas 09h20, chegou ao local o arguido C, tendo-se deslocado, de imediato junto do arguido A, e entregou-lhe um saco transparente que continha várias embalagens de heroína e/ou cocaína.
45. Após receber o saco, o arguido A iniciou as vendas aos diversos indivíduos que o abordavam.
46. Após ser contactado pelos compradores, o arguido A retirou várias embalagens de heroína e/ou cocaína.do interior de uma bolsa preta que tinha a tiracolo e entregava-lhes o produto pretendido, recebendo em troca quantia em dinheiro, o que fez sucessivamente com vários indivíduos.
47. Pelas 09h25, o arguido C afastou-se do local.
48. Após algumas vendas, o arguido A procedeu à contabilização das embalagens disponíveis para venda e dirigiu-se ao interior do Lote 1, para obter mais embalagens de heroína e/ou cocaína, regressando com uma “bolsa”, ainda fechada, contendo mais embalagens.
49. Pelas 11h30, o arguido G chegou ao local, encetou conversa com o arguido A e com o indivíduo não identificado que mantinha vigia e encaminhou-se para o café “Lisboa ...”, onde foi abordado por um indivíduo que pretendia adquirir produto estupefaciente.
50. O arguido G entregou então várias tiras de canábis ao descrito indivíduo, recebendo em troca quantia em dinheiro, após o que este arguido foi ao encontro do arguido A, de quem recebeu a quantia lograda com as vendas que este realizara.
51. Pelas 14h20 aproximou-se do arguido A um indivíduo que lhe entregou a quantia de €60,00 (sessenta euros), recebendo em troca 4 embalagens de heroína e/ou cocaína.
52. Entretanto, o indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar, encaminhava os compradores para junto do arguido A e mantinha vigilância sobre as imediações e acessos ao Bairro.
53. Pelas 16h00, o arguido A dirigiu-se novamente ao Lote 1 da X, para recolher mais embalagens pelo menos heroína e/ou cocaína para venda.
54. Pelas 17h30, M, consumidor de heroína, pretendendo obter este produto, chegou ao local, dirigiu-se ao arguido A e depois de receber deste arguido uma embalagem, que A retirou da bolsa que tinha a tiracolo, entregou-lhe, em troca, quantia não apurada.
55. Esta embalagem continha heroína, com peso líquido de 0,382 gramas.
VI.
56. No dia 04 de Novembro de 2020, pelas 14h30, dois indivíduos, cujas identidades não se lograram apurar, asseguravam as vendas de heroína e/ou cocaína e a vigilância junto ao Y.
57. Após várias vendas, ambos dialogaram e o indivíduo que procedia às vendas deslocou-se ao Lote 1, para recolher mais embalagens de heroína e/ou cocaína para venda, que obteve na caixa de correio da fracção do 7°A, acondicionando as “bolsas” no casaco que envergava.
58. Regressou então junto ao Y, para retomar as vendas, sucessivamente entregando as embalagens com produto pretendido e recolhendo quantias em pagamento, sob observação do indivíduo que mantinha vigia das imediações.
59. Pelas 15h30, o arguido N chegou ao local, dialogou com o indivíduo que procedia às vendas, e, em seguida, dirigiu-se ao Lote 10, de onde saiu rapidamente em direcção ao Lote 1, retirando aí do casaco várias “bolsas” com embalagens contendo, heroína e/ou cocaína que ocultou na caixa de correio da fracção do 7.ºA.
60. Foi depois ao encontro de um dos dois indivíduos que realizava as vendas de produto estupefaciente, com quem estabeleceu um breve diálogo, e, momentos depois, este dirigiu-se à sobredita caixa de correio recolhendo as “bolsas” com embalagens contendo heroína e/ou cocaína, para manter as vendas.
VII.
61. No dia 26 de Novembro de 2020, pelas 11h20, com o propósito de proceder à venda de canábis, o arguido N chegou à X, tendo permanecido na via pública, entre o Lote 2 e o Y.
62. Pouco depois, chegou ao local outro indivíduo.
63. Pelas 11h46, o arguido N, percebendo a chegada de um comprador, dirigiu-se ao Lote 1 e retirou da caixa de correio do 7.ºA um pedaço de canábis, saiu do prédio, e deu indicações àquele indivíduo para que vigiasse as imediações.
64. De seguida, o arguido N foi ao encontro do comprador, entregou-lhe o pedaço de canábis e recebeu deste, em troca, quantia em dinheiro.
65. Durante este dia, sucessivamente, pelo menos 15 indivíduos deslocaram-se ao encontro do arguido N para adquirir, pelo menos, canábis.
66. Nessas alturas, este dirigiu-se ao interior do Lote 1, recolheu na descrita caixa de correio embalagens com os produtos pretendidos, e entregou-as aos indivíduos, mediante quantia monetária.
67. A dada altura, o arguido N deslocou-se ao Lote 3 e recolheu um saco de plástico contendo vários pedaços de canábis, que transportou para o Lote 1 e ocultou na caixa do correio do 7.ºA.
68. Pelas 13h45, O e P , consumidores de canábis, que pretendiam adquirir este produto, com esse propósito, foram ao encontro do arguido N e solicitaram-lhe, cada um, esse produto.
69. Seguidamente, o arguido N dirigiu-se à caixa de correio à caixa de correio supra aludida de onde retirou vários pedaços de canábis e regressou para junto de O e de P , entregando-lhes esta substância, em troca de quantia não apurada.
70. Assim, O recebeu do arguido N canábis (resina), com o peso líquido de 1,664 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 29,0%.
71. Por seu lado, P  recebeu do arguido N canábis (resina), com peso líquido de 1,642 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 29%.
VIII.
72. No dia 12 de Janeiro de 2021, pelas 10h30, o arguido G encontrava-se junto ao Lote 4-B, da X, em Lisboa.
73. Nessa altura, o arguido G dirigiu-se à entrada do Lote 4-B, onde se encontrava o arguido C, tendo ambos, dialogado.
74. Pelas 10h45, chegaram ao local alguns indivíduos, que foram, de imediato, encaminhados pelo arguido G para o Lote 4-B, para junto do arguido C, de quem receberam heroína e/ou cocaína, entregando em troca quantia em dinheiro.
75. Neste dia, além de encaminhar os compradores, o arguido G mantinha observação sobre os acessos ao Bairro para alertar para a aproximação de agentes policiais, enquanto eram realizadas as transacções.
76. Pelas 11h40, …, consumidor de heroína, pretendendo obter este produto para seu consumo, chegou ao local, tendo aí abordado o arguido G.
77. De seguida, após estabelecer um breve diálogo com o mesmo, dirigiu-se à entrada do Lote 4-B, onde contactou o arguido C.
78. Acto contínuo, ... recebeu do arguido C uma embalagem de heroína, com peso líquido de 0,420 gramas, entregando-lhe quantia monetária não apurada.
IX.
79. No dia 28 de Janeiro de 2021, pelas 13h30, os arguidos A e G encontravam-se junto ao Lote 4-B da X.
80. Pelas 13h30, foram interpelados por um indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar.
81. Nessa altura, o arguido A retirou do bolso das calças que envergava um saco em plástico que acondicionava várias embalagens contendo heroína e cocaína, retirando dali uma que entregou ao indivíduo, e recebeu deste, em contrapartida, uma nota de €10,00 (dez euros).
82. Em seguida, pelas 13h50, dois indivíduos, cujas identidades não se lograram apurar, dirigiram-se ao arguido G, que os encaminhou para a entrada do Lote 4-B, onde se encontrava o arguido A.
83. Após ser contactado pelos dois indivíduos, o arguido A retirou o saco (“bolsa”) com embalagens contendo heroína e cocaína e entregou algumas aos indivíduos, recebendo, em troca, quantia em dinheiro.
84. Durante estas transacções, o arguido G permaneceu junto às viaturas que se encontravam parqueadas em frente ao local, vigiando as proximidades.
85. Pelas 14h50, após estabelecer um diálogo com o arguido A, o arguido G dirigiu-se e entrou no Lote 4-B, de onde regressou, cerca de 10 minutos depois.
86. Seguidamente, regressou para junto do arguido A e entregou-lhe algumas “bolsas” contendo embalagens de heroína e cocaína para venda, afastando-se do local, em seguida.
87. O arguido A manteve-se à entrada do Lote 4-B, recebendo os compradores e, após assegurar-se da discrição dos seus actos, entrava com os compradores no hall do prédio, procedendo, aí, à entrega das embalagens com o produto solicitado e recebendo em troca quantias em dinheiro.
88. Pelas 16h05 o arguido A foi abordado por Q, consumidor de cocaína, que pretendia adquirir uma embalagem deste produto.
89. Acto contínuo, o arguido A entregou a Q uma embalagem de cocaína (cloridrato), com peso líquido de 0,161 gramas, recebendo em troca quantia não apurada.
90. Durante este dia, o arguido A prosseguiu as vendas de cocaína e heroína, logrando realizar trinta transacções, num período de quatro horas.
X.
91. No dia 10 de Março de 2021, pelas 15h00, o arguido A encontrava-se no hall de entrada do Lote 4-B da X (alternando entre o interior do prédio e as arcadas de entrada), enquanto que o arguido R se encarregava de vigiar os acessos ao Bairro, permanecendo no exterior do Lote (no acesso à escadaria que permite aceder ao prédio) e de encaminhar os compradores que ali se dirigiam para o Lote 4-B, para irem ao encontro do arguido A.
92. Aí chegados, os consumidores solicitavam ao arguido A o produto pretendido.
93. Acto contínuo, este retirava do bolso das calças que envergava um saco de plástico contendo diversas embalagens de heroína e cocaína, retirava as embalagens com o produto solicitado e entregava-as, mediante recebimento de quantia em dinheiro.
94. Concretizadas as transacções, os consumidores abandonavam o local, e os arguidos mantinham as suas posições.
95. Neste dia, a dada altura, os arguidos A e R estabeleceram um diálogo junto à entrada do Lote 4-B.
96. Durante o diálogo, o arguido A retirou a “bolsa” com embalagens de heroína e cocaína do bolso das calças e exibiu-a ao arguido R, indicando, assim, a quantidade ainda disponível.
97. Pelas 15h40, um indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar, deslocou-se junto do Lote 4 B.
98. Nessa altura, este indivíduo foi interpelado pelo arguido R, que lhe indicou que acedesse à entrada do Lote 4-B, onde se encontrava o arguido A.
99. Ao vê-lo, o arguido A, que se encontrava no interior da porta do prédio, dirigiu-se às arcadas da entrada, retirou do bolso das calças a “bolsa” contendo várias embalagens de heroína e cocaína, e após apurar junto do comprador a quantidade pretendida, entregou-lhe várias embalagens, recebendo em troca a correspondente quantia monetária.
100. Neste dia, sucederam-se cerca de 20 transacções, sempre realizadas nos mesmos moldes.
101. Pelas 16h30, o arguido R, ao se aperceber da aproximação de uma viatura policial, gritou: “UGA!”, para alertar o arguido A da presença de agentes da autoridade.
102. Acto contínuo, o arguido A refugiou-se no interior do Lote 4-B.
103. Minutos depois, após o afastamento da viatura, o arguido R foi ao encontro do arguido A, tendo ambos retomado as respectivas posições.
104. Pouco depois, o arguido A estabeleceu um diálogo com R e entregou-lhe a “bolsa” com embalagens de heroína e cocaína, assumindo, agora, a posição de vigia e controlo de acesso ao Bairro, trocando as funções entre si.
105. Pelas 17h50, RA, consumidor de cocaína, pretendendo obter este produto para seu consumo, dirigiu-se ao Lote 4-B.
106. Após aí ter contactado com o arguido A, dirigiram-se ambos ao hall do referido prédio.
107. Ali, RA  recebeu do arguido R cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com o peso líquido de 0,118 gramas, tendo-lhe entregue, em troca, a quantia de pelo menos €10 (dez euros).
108. Após, até às 18h15, os arguidos prosseguiram as vendas nos moldes descritos, excedendo as três dezenas.
XI.
109. No dia 12 de Abril de 2021, pelas 10h00, os arguidos A e S encontravam-se junto ao hall de entrada do Lote 4-B, tendo aí sido abordados por diversos indivíduos, com quem realizaram transacções de heroína e de cocaína.
110. Nessas circunstâncias, o arguido T mantinha-se no exterior do Lote 4-B, com visibilidade para o acesso da Quinta do Loureiro e observava as imediações, para se certificar de que se não aproximavam agentes policiais e alertar os arguidos A e S caso tal sucedesse.
111. Pelas 10h25 deste dia, V, consumidor de heroína, pretendendo adquirir este produto para seu consumo, dirigiu-se ao hall de entrada do Lote 4B da X, tendo aí contactado o arguido A, solicitando-lhe uma dose do referido produto, entregando-lhe, para o efeito, a quantia de €10.
112. Acto contínuo, o arguido A entregou-lhe uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 0,378 gramas.
113. Durante este dia, alguns indivíduos que chegavam ao Lote 4 B foram interpelados pelo arguido T.
114. Após, obtida a autorização deste arguido, acederam ao hall de entrada do Lote 4B, onde se encontravam os arguidos A e S, que lhes entregavam as embalagens com heroína ou cocaína, entregando-lhes em troca quantias em dinheiro.
115. A dada altura, dois indivíduos, cujas identidades não se lograram apurar, contactaram com o arguido Ruben Pinho, no hall de entrada do Lote 4-B.
116. Acto contínuo, este retirou do bolso do casaco que envergava um saco de plástico (“bolsa”), que continha pequenas embalagens com heroína e cocaína, retirou dali algumas embalagens e entregou-as aos dois indivíduos, recebendo destes, em contrapartida, quantia em dinheiro.
117. Neste dia, no período compreendido entre as 10h00 e as 11h40, os arguidos realizaram transacções, nos moldes descritos, com 60 (sessenta) indivíduos.
118. Pelas 11h40, os arguidos T, A e S reuniram-se na entrada do Lote 4B, no patamar do R/c.
119. Nesse instante, ao se aperceberem da presença de agentes policiais no local, indivíduo não apurado “Uga!”, para alertar os arguidos, tendo todos encetado fuga para o interior do Lote 4-B.
120. Naquele prédio, procuraram refugiar-se no interior da fracção 1.ºB, residência dos arguidos AA e AB, o que apenas T logrou.
121. Nessas circunstâncias, o arguido A trazia consigo, numa bolsa a tiracolo de marca NIKE:
- 315 embalagens de heroína, com peso líquido de 118,930 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 16%;
- 110 embalagens de cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com peso líquido de 15,305 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,6%;
- a quantia monetária de €802,00 (oitocentos e dois euros);
- um telemóvel de marca “Apple”, modelo “Iphone”, com IMEI 353074102120456 e um cartão da operadora móvel “Altice-MEO”.
122. Na mesma ocasião, o arguido S trazia consigo, numa bolsa a tiracolo de marca Antony Morato de cor preta:
- 9 embalagens de heroína, com peso líquido de 1,345 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 13,8%;
- 79 embalagens de cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com peso líquido de 7,020 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,9%;
- a quantia monetária de €485,00 (quatrocentos e oitenta e cinco euros);
- um telemóvel de marca “Apple”, modelo” Iphone”, com IMEI 352923114888644, com cartão da operadora móvel “Altice-MEO”.
123. Na mesma ocasião, o arguido T tinha consigo:
- um telemóvel de marca “Maxcom” modelo MM134 com IMEI 358597093144890 6 358597093144908.
124. Nessa mesma data, quando os arguidos foram encaminhados para a residência do arguido G, sita na X, Lote 4-B, 2.ºA, o arguido S procurou ocultar atrás do sofá da sala algumas embalagens com produto estupefaciente, que trazia consigo e que lograra omitir à revista a que fora sujeito.
125. O arguido S tinha então, ainda, consigo:
- 5 embalagens de heroína, com peso líquido de 0,732 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 14,5%;
- 25 embalagens de cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com peso líquido de 2,170 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,3%;
126. Ainda na mesma data, na residência do arguido G, sita na X, Lote 4-B, 2°A, este guardava, na prateleira do móvel:
-um conjunto de cantos de sacos de plástico utilizados para embalar produto estupefaciente.
127. Nesta ocasião, o arguido G, tinha consigo:
- um telemóvel de marca “Honor”, de cor azul.
128. Em seguida, na residência do arguido N, sita na fracção 4°A do Lote 1 da X, este guardava:
a) na cozinha:
- na gaveta do móvel, seis sacos com fecho hermético, para acondicionar produto estupefaciente.
b) na sala:
- a quantia monetária de €470,00 (quatrocentos e setenta euros);
- um x-acto com resíduos de canábis, que era utilizado para proceder ao fraccionamento desta substância;
- vários pedaços de canábis, (resina), com peso líquido de 4,020 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 24,8%;
- uma soqueira/boxer.
129. Também na mesma data, na residência do arguido C, sita na X, Lote 1, 4.ºD, em Lisboa este guardava:
a) no quarto:
-10 (dez) “bolsas”, contendo um total de 104 embalagens de cocaína (éster metílico de benzoilecgonina) com o peso líquido de 17,243 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,7%;
b) na sala:
- uma caixa de plástico que acondicionava canábis (resina), com peso líquido de 1,135 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 18,8%;
- um telemóvel de marca Huawei, modelo EVA-L09, com IMEI 869827022272971 com cartão da operadora móvel NOS.
XII.
130. Pese embora a sua constituição como arguido nestes autos, no dia 03 de Maio de 2021, pelas 10h35, o arguido G permanecia sentado nas escadas de acesso ao Lote 4-B da X, dando indicações aos indivíduos que ali se apresentavam para adquirir produtos estupefacientes para aguardarem nas imediações.
131. Pelas 10h45 chegou ao Lote 4-B um indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar, que foi ao encontro do arguido G e, após estabelecerem breve conversa, recebeu deste arguido instruções que o levaram a dirigir-se ao Lote 8-A da mesma Rua, acedendo então à fracção 4.ºD, residência da arguida AC.
132. Entretanto, o arguido G mantinha observação das imediações.
133. Pouco depois, o indivíduo não identificado saiu do Lote 8-A, avançando apressadamente em direcção ao Lote 4-B, onde entregou ao arguido G um saco transparente (‘’bolsa”) contendo várias embalagens menores com heroína e cocaína, que se encontravam guardadas na residência da arguida AC, que este arguido logo guardou na bolsa que trazia à cintura.
134. Em seguida, o referido indivíduo imobilizou-se no acesso à escadaria do Lote 4- B, onde mantinha observação sobre quem se aproximava, e encaminhava os indivíduos que ali se deslocavam para adquirir produto estupefaciente, para o hall de entrada do Lote 4-B, onde se encontrava o arguido G.
135. Por seu lado, o arguido G, mantendo-se no interior do prédio entregava aos compradores que ali se deslocavam as embalagens com o produto pretendido e recolhia destes as quantias correspondentes como pagamento.
136. Pelas 12h15, ao ver no local uma viatura policial, o indivíduo que mantinha vigia gritou “UGA!” e fez dispersar os indivíduos que ali aguardavam pela venda de produto estupefaciente, dizendo-lhes: “Baza…baza… baza”.
137. Acto contínuo, o arguido G refugiou-se no interior do Lote 4 B.
138. Após a passagem da viatura, o referido indivíduo gritou “TÁ LIMPO!”, e, em seguida, o arguido G regressou ao hall de entrada do Lote 4-B, retomando as vendas de produtos estupefacientes.
139. Pelas 13h10, o arguido G manteve um breve diálogo com o indivíduo cuja identidade não se logrou apurar.
140. De seguida, o indivíduo dirigiu-se ao Lote 8-A, e acedeu à fracção 4.ºD, residência da arguida AC, enquanto o arguido dava indicações a outros indivíduos que ali permaneciam junto a si, que aguardassem.
141. Momentos depois o referido indivíduo saiu da fracção 4.ºD do Lote 8-A, ocultando sob o casaco que envergava uma embalagem (“saco”) com embalagens menores contendo heroína e cocaína, que se encontravam guardadas naquela fracção, que transportou até ao Lote 4-B, entregando-a no hall de entrada ao arguido G, que prosseguiu então as vendas, nos moldes descritos.
142. Nesse dia, num período de cinco horas, o arguido G realizou, pelo menos, cem vendas de produto estupefaciente aos consumidores que foram ao seu encontro.
XII.
143. No dia 10 de Maio de 2021, pelas 10h05, os arguidos G e V encontravam-se na X, junto ao Lote 4-B, a conversar.
144. Nessa altura, o arguido G dirigiu-se ao Lote 6-A, enquanto o arguido V ficou no mesmo local, a aguardar.
145. Cerca de cinco minutos depois, o arguido G saiu do Lote 6-A e regressou ao Lote 4-B, tendo permanecido no hall de entrada daquele Lote, enquanto o arguido V permanecia no exterior, observando as imediações e os acessos pela X Norte e Sul àquele Lote.
146. Nessa altura, um indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar, contactou o arguido G.
147. Após estabelecerem um breve diálogo, o arguido G retirou de uma bolsa preta que tinha na sua posse um saco transparente (“bolsa”) contendo pequenas embalagens de heroína e cocaína, tendo dali retirado várias embalagens que entregou ao indivíduo, recebendo deste, em troca, quantia monetária.
148. Entretanto, o arguido V mantinha-se junto ao Lote 4-B, em local com visibilidade para a X e indivíduos que ali circulavam.
149. Pelas 10h50, Z, consumidor de cocaína, pretendendo obter este produto para seu consumo, dirigiu-se ao hall de entrada do Lote 4-B da X, tendo aí abordado o arguido G, e solicitado uma embalagem do referido produto, tendo-lhe entregue, a quantia monetária de €5,00 (cinco euros).
150. Acto contínuo, o arguido G entregou-lhe:
- uma embalagem de cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com peso líquido de 0,077 gramas.
151. Durante cerca de 1 hora e 45 minutos, os arguidos G e V procederam da forma descrita, realizando pelo menos trinta transacções de heroína e /ou cocaína, nos moldes descritos.
152. Pelas 11h45, ao se aperceber da presença de agentes policiais no local, o arguido V gritou “UGA!” e colocou-se em fuga no sentido norte do bairro.
153. Ao ouvir esta palavra, o arguido G encetou fuga para o interior do Lote 4-B, procurando aí refugiar-se, contudo, foi interceptado por Agentes da P.S.P.
154. Nessas circunstâncias, o arguido G trazia consigo:
-uma bolsa de marca “Guess”, de cor preta;
- uma bolsa a tiracolo de marca “Ellesse”, azul e amarela;
- 138 (cento e trinta e oito) embalagens contendo heroína, com o peso líquido de 56,230 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 14,1%;
- 50 (cinquenta) embalagens contendo heroína, com o peso líquido de 7,465 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 14,7%;
- 48 (quarenta e oito) embalagens contendo cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 5,280 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 52,1%;
- 57 (cinquenta e sete) embalagens contendo cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com o peso líquido de 15,235 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,2%;
- 266 (duzentas e sessenta e seis) embalagens contendo cocaína (éster metílico de benzoilecgonina), com o peso líquido de 31,967 gramas, produto este que apresentava um grau de pureza de 44,4%;
- a quantia monetária de €356,10 (trezentos e cinquenta e seis euros e dez cêntimos).
155. Nessa ocasião, na sua residência, sita na X, Lote 4-B, 2.ºA, em Lisboa, o arguido G guardava, na sala, em cima da mesa de jantar:
- a quantia monetária de €3.556,90 (três mil quinhentos e cinquenta e seis euros e noventa cêntimos);
- uma folha de cartão com anotações manuscritas referentes às vendas de produto estupefaciente.
156. Neste dia 10 de Maio de 2021, pelas 11h45, a arguida AC tinha na sua posse, no interior da sua residência, sita na X, Lote 8A, 4.ºD, em Lisboa:
- 42 munições de calibre 9mm, para armas de fogo curtas, semi-automáticas;
- um estojo de transporte de arma de fogo;
- um carregador de calibre 9mm de marca “Glock”;
- um coldre interior para transportar arma de fogo;
- duas folhas A5, com anotações alusivas às vendas de estupefaciente.
157. Todos os arguidos conheciam a natureza e características estupefacientes dos produtos que guardavam, ocultavam, e comercializavam, destinando-os à cedência a terceiros mediante contrapartida económica, bem sabendo que tal conduta os fazia incorrer em responsabilidade criminal.
158. Agiram em conjugação de esforços e vontades, em execução de plano comum dirigido à venda de heroína, cocaína e canábis a terceiros, com o fito de obter vantagem económica.
159. As quantias que os arguidos tinham consigo eram provento de vendas de canábis, de cocaína e de heroína já realizadas.
160. O arguido N detinha consigo a soqueira/boxer que lhe foi apreendido, cujas características conhecia, não tendo qualquer autorização para adquirir e possuir o mesmo, bem sabendo que a respectiva detenção e uso do mesmo não lhe era permitida, sendo tal conduta punida por lei.
161. A arguida AC conhecia as características das munições que possuía, não sendo titular de qualquer autorização para as ter na sua posse, bem sabendo que a detenção e uso das mesmas não lhe era permitida, sendo tal conduta punida por lei.
162. Todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas por lei.
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido A
163. A é filho único do casal progenitor, que se separou quando o mesmo tinha aos 12 anos de idade e tem um irmão uterino mais velho.
164. A vivência familiar decorreu com vínculos afectivos entre os elementos do agregado familiar, pese embora algumas dificuldades económicas.
165. Após a separação dos pais, o processo de educação e crescimento do arguido passou a ser essencialmente assegurado pela mãe.
166. No entanto, A manteve sempre contacto com o pai que residia relativamente perto.
167. O arguido integrou o sistema de ensino em idade regular e manteve um percurso escolar com algumas retenções devido à falta de motivação e absentismo, tendo concluído o 8º ano de escolaridade com 17 anos de idade.
168. Ingressou num curso de Assistente Familiar na casa Pia de Lisboa, que lhe daria equivalência ao 9º ano de escolaridade, mas passados poucos meses, por vontade própria, desistiu do curso sem o concluir.
169. Quando A tinha 17 anos de idade, a mãe decidiu emigrar sozinha para a Suíça na procura de melhores condições de vida.
170. Por decisão familiar, A ficou em Portugal, inicialmente aos cuidados da avó materna e depois aos cuidados do pai.
171. Antes de ser preso preventivamente, o arguido residia há cerca de um ano com o pai, ....
172. ... mantinha algumas discórdias com o arguido, pois tentava impor-lhe regras, que este nem sempre cumpria.
173. Por trabalhar por turnos, desconhecia algumas das rotinas do arguido, nomeadamente o absentismo e abandono escolar que apresentava e o grupo de pares com quem convivia.
174. A família residia num apartamento arrendado pelo pai do arguido, de tipologia T2, numa zona residencial onde não se verificavam problemáticas sociais significativas.
175. ... mudou, entretanto, de residência, para a …, Monte da Caparica, onde arrendou uma casa que reúne melhores condições de habitabilidade.
176. A subsistência da família é assegurada pelos rendimentos auferidos pelo pai que trabalha há vários anos numa superfície comercial e aufere um vencimento de €1160 mensais.
177. As despesas elencadas relacionam-se com a renda da habitação, num valor mensal de 180€, valor a que acrescem as despesas domésticas.
178. A nunca desempenhou actividade laboral, sendo as suas despesas pessoais asseguradas pelo pai.
179. No período que antecedeu a prisão preventiva, o arguido permanecia grande parte do tempo inactivo, praticando a modalidade de Muay Thai e Jiu-Jitsu, ocasionalmente.
180. Encontrava-se inscrito numa escola de condução, onde frequentava aulas de código, tendo o pagamento da carta sido um presente da mãe.
181. Mantinha consumos de haxixe desde o final da adolescência.
182. Em meio prisional tem apresentado uma conduta consentânea com as normas e regras institucionais.
183. De forma a ocupar o seu tempo, frequenta um curso de Inteligência Emocional e participa no Projecto Ópera na prisão.
184. Mantém acompanhamento psicológico; não faz qualquer tipo de medicação.
185. No Estabelecimento Prisional Leiria - já teve visitas do pai e do irmão.
186. A família mostra total disponibilidade para o apoiar no que se mostrar necessário.
187. A mãe, que se encontra a residir na Suíça, já veio várias vezes a Portugal com o intuito de o visitar e de lhe demonstrar apoio.
188. No futuro, o arguido tem como objectivo emigrar para a Suíça onde conta com o apoio da mãe.
189. O arguido não tem antecedentes criminais registados.
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido S
190. Antes da actual reclusão, S vivia no agregado materno, constituído pela avó materna, por dois tios e por um primo, num registo relacional adequado, afectivamente próximo e de entreajuda, sendo valorizado positivamente nesse contexto.
191. O arguido tem as suas referências neste meio comunitário, constituindo-se a avó a figura substitutiva que assegurou os seus cuidados no decurso da sua vida e com quem estabelece uma relação privilegiada.
192. A economia do agregado registava estabilidade e dependia dos rendimentos auferidos pelo exercício profissional dos tios maternos, na área das limpezas e da construção civil, a que acrescia a pensão de reforma da avó, não sendo conhecidos constrangimentos a este nível.
193. S mantém um relacionamento de namoro há 4 anos, constituindo-se a namorada um elemento significativo na vida do arguido, perspectivando o casal coabitar no futuro.
194. A namorada integra o agregado materno na Reboleira e mantém-se laboralmente ativa no exercício de funções num estabelecimento comercial (café) localizado dentro do Aeroporto de Lisboa.
195. Anteriormente, S passava parte do seu tempo junto da namorada, tendo o casal experienciado com sofrimento o falecimento de 2 filhos, um deles aos 8 meses de gestação e o outro menos de 1 mês após o seu nascimento.
196. Profissionalmente, o arguido mantinha-se activo, desenvolvendo há cerca de 6 meses actividade na lavagem de carros na empresa do irmão da namorada, “DM Rent”, sendo valorizado nesse contexto laboral quanto ao seu desempenho e à adequabilidade das interacções que estabelecia, tendo possibilidade de vir a reintegrar-se na sua restituição à liberdade nas mesmas funções ou como servente da construção civil numa outra empresa desse mesmo empregador.
197. O arguido mantinha como actividade de lazer estruturada a prática desportiva (boxe) na Associação …, em Alcântara, constituindo-se essa prática gratificante na vida de S, a quem não são conhecidos hábitos de consumo aditivo.
198. Filho de pai incógnito, após o seu nascimento S foi acolhido no agregado da avó materna devido à idade da mãe (14 anos), constituindo-se aquela uma figura substitutiva e de referência significativa na sua trajectória de vida, mantendo sempre no contexto intrafamiliar uma atitude adequada e de cumprimento das regras e orientações transmitidas.
199. O arguido tem 3 irmãos uterinos mais novos, de 15, 10 e 7 anos, que vivem com a progenitora em Albarraque, sendo poucos os contactos com a figura materna, tendo S tido conhecimento no decurso da reclusão que a mãe está em tratamentos devido a doença oncológica.
200. Ingressou na escola em idade regular, concluindo em Portugal o 6º ano de escolaridade.
201. A partir dos 12 anos começou e evidenciar problemas comportamentais no contexto escolar, que motivaram a intervenção da Comissão de Crianças e Jovens.
202. De modo a inverter esse percurso, a família optou pela sua emigração para França, para integrar o agregado constituído de uma tia materna onde permaneceu até cerca dos 18 anos, prosseguindo nesse país os estudos e habilitando-se com o 12º ano de escolaridade numa escola francesa, num curso profissional de comércio internacional, deslocando-se anualmente ao território nacional.
203. Quando terminou os estudos e, na sequência do diagnóstico de uma doença oncológica da avó materna, S optou por regressar definitivamente a Portugal para estar próximo da avó e ingressou no mercado de trabalho num callcenter de uma empresa francesa “Webhelp” onde permaneceu em funções durante cerca de 1 ano com vínculo contratual.
204. Posteriormente e, durante cerca de 6 meses, através de uma empresa de trabalho temporário, desenvolveu funções num armazém na empresa “Bimbo”.
205. Mais tarde, ingressou novamente num call-center, numa empresa francesa de cobranças “Armatis”, funções que manteve durante cerca de 8 meses com vínculo contratual até finais de 2019.
206. S encontra-se preso à ordem destes autos, pela primeira vez, no Estabelecimento Prisional de Caxias.
207. No contexto prisional mantém um comportamento cordato e conforme as regras, sem registo de incidentes disciplinares, mantendo-se inactivo e continuando a dispor do apoio familiar, recebendo visitas regulares sobretudo da namorada e da tia materna com quem vivia.
208. Em termos de perspectivas de futuro, S pretende reintegrar o mesmo agregado materno e retomar funções laborais de modo a reorganizar a sua vida e poder vir a constituir vida em comum com a namorada, que à semelhança dos seus familiares se mostra incondicionalmente disponível para continuar a apoiá-lo.
209. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 11.11.2021, pela prática em 31.05.2020, de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 60 dias de multa à razão diária de € 5 [Processo Abreviado 681/20.9SILSB do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido C
210. Único filho de um casal de modesta condição socioeconómica, C cresceu integrado no núcleo familiar de origem, à data constituído pelos progenitores e alguns dos sete irmãos uterinos, em zona residencial problemática.
211. Do seu processo evolutivo releva-se um quotidiano marcado pelas dificuldades económicas vivenciadas no lar familiar, subsistência numa primeira fase assegurada com o trabalho dos progenitores, situação que se veio a agravar com a separação conjugal, agora apenas assente nos rendimentos da progenitora, que trabalharia ao longo do dia como empregada de limpezas, ficando o arguido entregue a si mesmo.
212. A reduzida intervenção parental associada às características da zona residencial, já então fortemente conotada como zona ligada a produtos estupefacientes, foram dois factores de impacto significativo no percurso vivencial de C que, com apenas quinze anos, deu início à conduta aditiva, com consumos de heroína/ cocaína, via endovenosa, desenvolvendo ao longo dos anos um quadro de forte dependência.
213. Também o seu percurso escolar foi condicionado com a sua prática aditiva, tendo apenas concluído o 5º ano de escolaridade.
214. A manutenção de um estilo de vida desestruturado, centrado nos consumos de estupefacientes esteve na origem da sua primeira prisão em 1992, na altura com 21 anos de idade.
215. Colocado em liberdade, C aderiu com sucesso a tratamento num dos centros de dia do Centro das Taipas, o que determinou um quadro de abstinência durante quase duas décadas, tendo conseguido reorganizar-se aos vários níveis, apesar de manter residência na mesma zona.
216. Nesse período prolongado, o arguido trabalhou em diversos sectores profissionais, na sua maioria com vínculo laboral, designadamente durante cerca de doze anos, numa panificadora, entretanto extinta.
217. Exerceu, igualmente funções para outras empresas, nomeadamente em artes gráficas e em limpezas industriais, em barcos da marinha e em bombas da Galp, este último trabalho com alguma mobilidade de norte a sul do país.
218. Aos 33 anos de idade, por um quadro de saúde debilitado na sequência de um longo percurso ligado ao consumo de estupefacientes o arguido passou a usufruir de reforma antecipada, por incapacidade total.
219. Aos 38 anos de idade, C encetou um relacionamento afectivo com …, na altura, jovem com 23 anos de idade, união que viria a perdurar cerca de sete anos e do qual o casal tem uma filha, que vive com a mãe.
220. A separação afectiva foi um factor promotor de forte instabilidade emocional no arguido, tendo nesse contexto retomado a conduta aditiva (cocaína), passando a agravar os consumos (cerca de 2gr/dia).
221. C manteve os consumos de estupefacientes desde a data da separação com a companheira até à data da actual prisão, dependência aditiva diária.
222. C apresenta-se como um indivíduo com sinais de forte desgaste pessoal decorrente do seu já longo percurso como toxicodependente, avaliando de forma conformada os últimos anos como uma derrota pessoal, por se ter envolvido novamente nos consumos de estupefacientes após um período prolongado de abstinência de quase duas décadas, período que avalia como tendo sido o mais gratificante da sua vida, tanto a nível pessoal, mas também no plano afectivo e laboral.
223. Na eventual situação de liberdade, o arguido tenciona regressar à morada identificada nos autos, onde irá viver sozinho, ainda que com algum apoio disponibilizado pela ex-companheira, com quem mantém uma relação de amizade.
224. No plano económico, a sua subsistência será assegurada pela sua reforma de valor modesto, sendo que tem um custo de cerca de 70 euros mensais referente à habitação cedida pela Gebalis.
225. No contexto prisional, o arguido tem mantido uma conduta institucional correcta e após o ter solicitado, frequenta a escola com o intuito de concluir o 7º ano, ocupando o restante tempo na sua cela ou no pátio, valorando as visitas de que beneficia aos sábados por parte da ex-companheira.
226. O arguido não tem antecedentes criminais registados.
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido G
227. G nasceu em Lisboa, sendo o mais velho de uma fratria de três elementos.
228. A família apresentava vulnerabilidades a vários níveis, residindo em zona de Lisboa associada ao tráfico de estupefacientes (Casal Ventoso).
229. Embora existissem laços de afecto e solidariedade, a dinâmica do agregado era marcada pelos hábitos etílicos do progenitor.
230. Mais tarde, a família foi realojada na …, mantendo residência num bairro associado a situações de exclusão e tráfico de estupefacientes, apresentando o arguido consumos de haxixe.
231. O pai desempenhava a actividade profissional de motorista e a mãe não desenvolvia actividade laboral.
232. Durante a infância e pré-adolescência do arguido, o pai de G cumpriu duas penas de prisão pelo crime de tráfico de estupefacientes, tendo sido co-arguido de G no processo nº 20/16.3SWLSB, onde ambos foram condenados a penas de prisão suspensas na sua execução.
233. G estudou até ao 6º ano de escolaridade, não tendo vindo a conseguir integrar actividade laboral estável, desempenhando trabalhos (maioritariamente na área das mudanças) de forma irregular, sem períodos de descontos na Segurança Social.
234. Ao nível pessoal, G iniciou vida marital com a namorada, há cerca de oito anos, tendo o casal um filho em comum que tem quatro anos de idade.
235. A companheira tem duas filhas de um relacionamento anterior, sendo a dinâmica familiar positiva e ligação afectiva entre o arguido e o filho menor.
236. À data factos, G residia com a companheira, filho, enteadas e sogro em casa camarária atribuída ao pai da companheira, localizada na zona de São Bento, em Lisboa, mantendo a mãe do arguido residência na Quinta do Loureiro.
237. O sogro trabalhava na área da construção civil e a sua companheira na área das limpezas.
238. Ao nível laboral, G apresentava uma situação precária, realizando mudanças sem qualquer tipo de vínculo, sendo remunerado ao dia.
239. O pai de G faleceu em 2019, devido a problemas cardíacos.
240. G apresentando comportamento institucional adequado no Estabelecimento Prisional de Caxias, onde está desde o inicio de Agosto de 2021.
241. Não obstante, cumpriu sanção disciplinar por situação ocorrida no Estabelecimento Prisional de Lisboa.
242. O arguido beneficia do apoio da família, revelando impacto com o facto de não estar a assistir ao crescimento do seu filho.
243. O arguido foi condenado por decisão transitada em julgado em 22.06.2015, pela prática em 04.03.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 90 dias de multa à razão diária de € 5. A pena foi declarada extinta por prescrição [Processo Sumário 197/15.5SGLSB do JLP Criminalidade de Lisboa].
244. O arguido foi condenado por decisão transitada em julgado em 27.10.2016, pela prática em 13.01.2014 de um crime de furto, numa pena de 20 dias de multa à razão diária de € 5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Abreviado 113/14.1PYLSB do JLP Criminalidade de Lisboa].
245. O arguido foi condenado por decisão transitada em julgado em 26.05.2017, pela prática em 16.05.2015 de um crime de resistência e coacção sobre funcionário e de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova. Por decisão de 16.03.2020, transitada em julgado em 03.03.07.2020 foi prorrogado o prazo de suspensão da execução da pena [Processo Comum
Singular 346/15.3PVLSB].
246. O arguido foi condenado por decisão transitada em julgado em 03.10.2018, pela prática em 29.05.2013 de um crime de furto qualificado e um crime de furto de uso de veículo, numa pena de 11 meses de prisão, suspensa na sua execução por 11 meses, com sujeição a regime de prova. A pena foi declarada extinta, nos termos do disposto no artigo 57.º, n.º1 do Código Penal [Processo Comum Singular 508/13.8PBLRS do JL Criminal de Lisboa].
247. O arguido foi condenado por decisão transitada em julgado em 18.01.2017, pela prática em 16.02.2016 de um crime de tráfico de estupefacientes, numa pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova [Processo Comum Colectivo 20/16.3SWLSB do JC Criminal de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido T
248. T é o filho mais velho de uma fratria de dois, de origem Angolana, onde viveu com os pais até ao assassinato do pai em 1987.
249. Foi criado pela mãe e veio com a família aos 8 anos de idade para Portugal, tendo fixado residência em casa de familiares, na Cova da Piedade.
250. O relacionamento familiar era bom, sendo a mãe figura vinculativa, que discordava com o seu padrão de absentismo escolar e pertença a grupo de pares que possuía na adolescência.
251. Frequentou a escola até ao 6º ano de escolaridade, com 15 anos de idade, não manifestando interesse escolar, associando-se a grupo de pares com conduta similar.
252. Não desenvolveu ocupação laboral, sendo sustentado pela família.
253. No EP de Leiria, onde esteve entre os 16 anos e os 21 anos de idade, concluiu o 12º ano de escolaridade.
254. Em 2015, ano de morte da mãe, foi viver com o irmão e a companheira, sendo apoiado inicialmente por estes.
255. Tem historial de consumos etílicos, consumos de canabinóides desde os 15 anos, tendo cessado aos 34 anos, sem ter recorrido a tratamento especializado.
256. A nível afectivo, estabeleceu relacionamento com AD em 2017, que mantém.
257. Ao nível laboral, manteve ocupação com trabalhos esporádicos nas mudanças com amigos, conseguiu contrato de trabalho em 2018/2019, até ao encerramento da empresa.
258. Fez trabalho esporádico no ramo da manutenção de habitações.
259. T vive com a companheira na habitação herdada por esta, com os enteados de 14 e 8 anos e o filho de ambos de 1 ano de idade.
260. Tem planos para se casar após regularizar da sua situação documental.
261. Beneficia de apoio por parte da família da namorada.
262. T, trabalha desde há um ano numa empresa de catering, sem contrato de trabalho, e sem rendimentos fixos mensais, uma vez que só vai trabalhar quando há eventos e é solicitado pela empresa.
263. A companheira trabalha numa dependência bancária e aufere cerca de 1100 euros mensais.
264. A ocupação dos tempos livres é feita com a prática de desportos de combate, boxe, muay thai e jiu jitsu e à data do julgamento, mixed martial arts (mma).
265. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 15.11.2001, pela prática em 10.03.2000, de um crime de roubo qualificado, um crime de roubo simples e um crime de sequestro, na pena de 3 anos e 9 meses de prisão [Processo Comum Colectivo 421/00.9SPLSB da 1.ª Vara Criminal de Lisboa].
266. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 04.03.2002, pela prática em 03.10.2000, de um crime de roubo, na pena única [em cúmulo com a pena aplicada no Processo Comum Colectivo 421/00.9SPLSB da 1.ª Vara Criminal de Lisboa], de 4 anos e 9 meses de prisão [Processo Comum Colectivo 1509/00.1SPLSB da 2.ª Vara Criminal de Lisboa].
267. Por decisão de Cúmulo Jurídico transitada em julgado em 06.03.2003, foi condenado na pena única de 5 anos de prisão, que abrangeu os processos 2788/99.0PULSB do 4º Juízo Criminal de Lisboa e 1509/00.1SPLSB da 2.ª Vara Criminal de Lisboa. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo de Cúmulo Jurídico 243/02.2TCLSB da 3.ª Vara Criminal de Lisboa].
268. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 02.06.2008, pela prática em 19.02.2007, de um crime de roubo, na forma tentada, agravado pelo resultado morte, na pena de 8 anos de prisão [Processo Comum Colectivo 34/07.4PJAMD da 3.ª Vara Criminal de Lisboa].
269. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 11.03.2009, pela prática em 04.03.2007, de um crime de roubo, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão [Processo Comum Colectivo 369/07.6PBAMD da 4.ª Vara Criminal de Lisboa].
270. Por decisão de cúmulo jurídico, transitada em julgado em 23.08.2010, foi condenado na pena única de 10 anos de prisão, que abrangeu os processos 34/07.4PJAMD da 3.ª Vara Criminal de Lisboa e 369/07.6PBAMD da 4.ª Vara Criminal de Lisboa.
271. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 13.08.2018, pela prática em 2016, de um crime de detenção de arma proibida e de tráfico de estupefacientes, numa pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período. A pena foi declarada extinta, nos termos do disposto no artigo 57.º, n.º1 do Código Penal [Processo Comum Colectivo 3646/16.1T9LSB do JC Criminal de Loures].
272. O arguido esteve preso, além do mais, entre 05.03.2017 e 02.07.2015.
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido V
273. V, de 21 anos, integra o agregado dos avós, com quem se processou o seu crescimento, o que facilitava o desempenho laboral dos progenitores, o pai no ramo da segurança e a mãe como empregada de balcão.
274. Mantém contactos diários com os pais, que residem perto dos avós.
275. O arguido possui o 9º ano de escolaridade, tendo reprovado no 4.º e 5.º ano de escolaridade.
276. Concluiu o curso de Pasteleiro/Padeiro que decorreu de Setembro de 2018 a Julho de 2020, conferindo-lhe o 3.º Ciclo do Ensino Básico e uma qualificação profissional de nível 2.
277. V teve consumos de haxixe aos 17 anos que por iniciativa própria abandonou pouco depois.
278. À data dos factos em apreciação, mantinha o mesmo contexto vivencial, subsistindo com apoio económico da família.
279. Os avós residem numa habitação camarária, na qual pagam uma mensalidade de 156,28 euros.
280. A avó é cuidadora de uma senhora idosa e recebe cerca de 200 euros mensais, o avô encontra-se reformado e recebe cerca de 680 euros mensais.
281. Beneficia de apoio dos progenitores face às despesas de vestuário e economia diária.
282. V encontra-se inscrito numa empresa de trabalho temporário, onde apresenta uma trajectória profissional diversificada.
283. À data do julgamento encontra-se desempregado, mas aguarda nova colocação num supermercado.
284. O seu tempo livre é essencialmente ocupado com a namorada ou com os familiares.
285. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 15.10.2021, pela prática em 27.03.2021, de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 55 dias de multa à razão diária de € 5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Abreviado 193/21.3 PVLSB do JLP Criminalidade de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido N
286. Natural de Lisboa, N cresceu no agregado da progenitora com o irmão mais novo, sendo que os pais separaram-se quando o arguido tinha 5 anos.
287. A mãe, auxiliar de educação num colégio privado, proporcionou aos filhos um desenvolvimento estimulante e regrado, pautando-se por uma educação tradicional.
288. O arguido manteve um bom relacionamento com o pai até ao seu falecimento, no ano de 2021.
289. N tem o 7º ano de escolaridade, adquirido através da frequência de ensino regular.
290. Tentou prosseguir os estudos, mas reprovou duas vezes no 8º ano.
291. Acabou também por abandonar o curso de informática em que se tinha inscrito, para finalizar o 8º e 9º ano.
292. Aos 18 anos inicia funções na área da restauração, como estafeta de mota em regime de tempo parcial, auferindo um vencimento inferior ao ordenado mínimo.
293. Depois de obter a carta de condução continuou a trabalhar como estafeta, mas a fazer entregas de carro.
294. Aos 15 anos iniciou o consumo ocasional de substâncias ilícitas (canábis), em contexto recreativo e de forma esporádica, acabando por abandonar por iniciativa própria aos 22 anos sem necessidade de recorrer a tratamentos ou a ajuda especializada.
295. N habita numa casa da Gebalis, atribuída ao tio, encontrando-se a viver sozinho, uma vez que o tio faleceu há dois anos.
296. Está a negociar com a Gebalis uma transferência da casa para o seu nome, continuando a pagar a renda da casa no valor de 4 euros e todas as despesas inerentes.
297. Beneficia do apoio da mãe e é em casa desta que passa a maior parte do tempo, uma vez que mora nas proximidades.
298. N encontra-se a trabalhar a lavandaria da tia como estafeta na entrega/recolha da roupa, desde Abril de 2020, auferindo um salário mensal variável, entre os 500 e os 600 euros.
299. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 11.03.2016, pela prática em 20.08.2015 de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 80 dias de multa, à razão diária de € 5,5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Sumaríssimo 826/15.0SGLSB do Tribunal de Pequena Criminalidade de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido AA
300. AA é natural de Lisboa e é o mais novo de uma fratria de quatro elementos.
301. O seu percurso de desenvolvimento foi pautado pela morte prematura da mãe, vítima de problemática decorrente da toxicodependência, quando o arguido tinha cerca de três anos de idade.
302. O progenitor, que viria a ser detido pouco tempo depois, faleceu em meio prisional na sequência da mesma problemática.
303. Nessa sequência, o arguido ficou entregue à avó paterna e companheiro desta (ao qual se refere como se de um avô se tratasse), os quais se constituíram como as suas principais figuras de referência afectiva.
304. O seu processo de socialização decorreu num ambiente de grande fragilidade e instabilidade, aliadas a acentuadas carências de ordem socioeconómica, integrado no bairro do antigo Casal Ventoso, conotado com diversas patologias sociais.
305. O arguido foi criado pelos avós em conjunto com oito tios com problemática de toxicodependência e consequentes contactos com o sistema de justiça.
306. O arguido foi educado num ambiente caracterizado por alguma rigidez na imposição de normas e regras aludindo à ocorrência de episódios de violência doméstica perpetrados pelo avô em relação à avó.
307. AA foi-se revelando uma criança tímida, reservada e com dificuldades ao nível da expressão emocional que encontrou no grupo de pares uma garantia de pertença, confiança e segurança.
308. Progressivamente, foi revelando alguma permeabilidade à influência negativa deste, conotado com práticas desviantes, agravando-se o comportamento do arguido pelos 12 anos de idade, aquando do realojamento do agregado familiar no Bairro do Loureiro.
309. Em termos escolares, AA revela um percurso marcado pelo crescente desinteresse e envolvimento em práticas associais em contexto do grupo de pares.
310. Após algumas reprovações, completou o 9º ano de escolaridade através do ensino técnico-profissional, concretamente através do curso de Pastelaria, acabando por abandonar o processo de ensino-aprendizagem aos 16 anos de idade.
311. O abandono dos estudos coincidiu com o início de um percurso de consumos regulares de canábis e, mais tarde, pelos 18 anos, de cocaína, ainda que de forma ocasional.
312. Do ponto de vista laboral, o arguido iniciou actividade aos 17 anos em actividades indiferenciadas nas áreas da construção civil e restauração passando, por períodos de inactividade.
313. No plano afectivo, AA iniciou relacionamento com AB em 2009, com vivência marital sendo a relação descrita como gratificante e pautada por laços de afectividade e suporte.
314. O casal tem três filhos, à data do julgamento [Fev. 2022] com 11, 6 e 3 anos de idade, encontrando-se a companheira grávida, prevendo-se o nascimento do quarto filho para Fevereiro.
315. Entre Dezembro de 2019 e Maio de 2021, AA residia com a companheira e os filhos numa habitação social atribuída à avó paterna, que se encontra acamada e a residir com uns primos.
316. O avô faleceu em 2012.
317. O arguido chegou a residir no agregado familiar da companheira, numa dinâmica descrita como positiva.
318. AA esteve preso entre Setembro de 2019 e Março de 2021 permanecendo apenas durante cerca de quatro meses em liberdade até ter ocorrido a presente reclusão.
319. Nesse espaço de tempo o arguido não se terá conseguido reorganizar em termos do seu trajecto, não tendo conseguido integrar-se profissionalmente, vivenciando um quadro económico marcado por algumas restrições.
320. AA deu entrada no Estabelecimento Prisional de Caxias em 19/08/2021 vindo transferido do Estabelecimento Prisional do Linhó, onde deu entrada em 26/07/2021.
321. Em termos institucionais, AA tem mantido uma postura adaptada e um comportamento consentâneo com as normas vigentes, revelando um registo disciplinar isento de sanções.
322. Não se encontra integrado em qualquer actividade escolar, formativa e/ou laboral.
323. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 12.10.2009, pela prática em 27.03.2006, de um crime de ofensa à integridade física, numa pena de 120 dias de multa à razão diária de € 3. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Comum Singular 3144/07.4TDLSB do 1.º Juízo Criminal de Lisboa].
324. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 28.11.2011, pela prática em 03.06.2009, de um crime de tráfico de estupefacientes, numa pena de 3 anos de prisão. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Comum Colectivo 64/09.1SWLSB da 8.ª Vara Criminal de Lisboa].
325. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 03.09.2019, pela prática em 04.2018, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão [Processo Comum Colectivo 58/18.6SWLSB do JC Criminal de Lisboa].
326. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 15.11.2019, pela prática em 25.01.2018, de um crime de detenção ilegal de arma e um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, numa pena de 2 anos e 8 meses de prisão [Processo Comum Singular 16/18.0SWLSB do JL Criminal de Lisboa].
327. Por decisão de cúmulo jurídico, transitada em julgado em 01.07.2020, que abrangeu os processos 16/18.0SWLSB do JL Criminal de Lisboa e 58/18.6SWLSB do JC Criminal de Lisboa, o arguido foi condenado na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão,
Condições pessoais e antecedentes criminais da arguida AB
 328. A arguida vive com os 3 filhos de 11, 7 e 3 anos e com o companheiro, o coarguido, AA, que à data do julgamento se encontra detido.
329. A arguido é empregada de limpezas e encontra-se desempregada desde Março de 2021.
330. Recebe RSI no montante de € 450 e abono de família no valor de € 320.
331. Vive em casa arrendada da CML, pela qual paga € 52de renda mensal.
332. A arguida foi condenada, por decisão transitada em julgado em 19.09.2011, pela prática em 16.07.2009, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, numa pena de 20 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova. A pena foi declarada extinta, nos termos do disposto no artigo 57.º, n.º 1 do Código Penal [Processo Comum Singular 79/09.0SWLSB do 4.º Juízo Criminal de Lisboa].
333. A arguida foi condenada, por decisão transitada em julgado em 29.10.2012, pela prática em 07.04.2011, de um crime de tráfico de estupefacientes, numa pena de 5 anos de prisão. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Comum Colectivo 13/11.7 SWLSB da 7.ª Vara Criminal de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido B
334. O arguido encontra-se a trabalhar em França, como servente de construção civil.
335. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 17.06.2019, pela prática em 25.02.2019, de um crime de consumo de estupefacientes, numa pena de 60 dias de multa à razão diária de € 5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Sumaríssimo 71/19.6SCLSB do JLP Criminalidade de Lisboa].
336. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 13.01.2021, pela prática em 06.08.2020, de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 120 dias de multa à razão diária de € 5,5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Sumaríssimo 147/20.7SCLSB do JLP Criminalidade de Lisboa].
337. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 22.07.2021, pela prática em 03.06.2020, de um crime de tráfico de estupefacientes, numa pena de 4 anos e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova [Processo Comum Colectivo 57/20.8SWLSB do JC Criminal de Lisboa].
338. No âmbito do Processo Comum Colectivo 57/20.8SWLSB do JC Criminal de Lisboa], foi elaborado plano de reinserção ao arguido a 27.09.2021; o arguido foi convocado para comparecer na DGRSP a 29.10.2021, 19.11.2021 e 26.01.2022 e no compareceu, nem apresentou justificação; foi designada data para a sua audição no tribunal, não tendo o mesmo comparecido.
339. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 14.06.2021, pela prática em 12.09.2020, de um crime de condução sem habilitação legal e um crime de condução perigosa, numa pena de 150 dias de multa à razão diária de € 5,5 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor pelo período de 3 meses [Processo Abreviado 433/20.6GDALM do JC Criminal de Almada].
Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido R
340. R integra o agregado da bisavó, com quem se processou o seu crescimento, o que facilitava o desempenho laboral dos progenitores, o pai no ramo das mudanças e a mãe como auxiliar de educação.
341. Manteve contactos com os pais, que residiam perto da bisavó, tendo ocorrido entretanto a ruptura conjugal, na sequência da qual os seus três irmãos passaram a integrar o agregado paterno.
342. A família residia no bairro da Serafina, bairro associado a problemáticas sociais.
343. O arguido completou o 6º ano de escolaridade, num percurso pautado pelo absentismo e comportamentos disruptivos em contexto escolar.
344. Frequentou consultas de pedopsiquiatria na adolescência, com toma de medicação psicofarmológica, não beneficiando, entretanto, de qualquer acompanhamento a este nível.
345. Após o abandono dos estudos, fiou em situação de ócio e em convívio com pares na mesma condição, associados ao consumo de haxixe, sendo que a única experiência pré-profissional que teve foi a frequência de um curso no ramo da marcenaria.
346. R teve hábitos de consumos de haxixe, que por iniciativa própria abandonou.
347. À data dos factos que deram origem aos presentes autos, o arguido subsistia com apoio económico da família, concretamente a reforma da bisavó, encontrando-se o tio e o avô, que também integram o agregado, respectivamente, activo laboralmente e desempregado.
348. A família reside em casa própria.
349. À data do julgamento – Fevereiro de 2022 - também a namorada do arguido, …, se encontra a viver no agregado, encontrando-se a mesma grávida de 5 meses a trabalhar num supermercado, onde aufere o salário mínimo nacional.
350. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 26.11.2020, pela prática em 2018, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, numa pena de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova [Processo Comum Colectivo 134/18.5SWLSB do JC Criminal de Lisboa].
351. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 04.11.2021, pela prática em 01.02.2020, de um crime de tráfico de estupefacientes, numa pena de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova [Processo Comum Colectivo 11/20.0SVLSB do JC Criminal de Lisboa].
352. O arguido foi condenado, por decisão transitada em julgado em 21.10.2021, pela prática em 07.02.2020, de um crime de condução sem habilitação legal, numa pena de 100 dias de multa à razão diária de € 5. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento [Processo Comum Singular 38/20.1 PXLSB do JL Criminal de Lisboa].
Condições pessoais e antecedentes criminais da arguida AC
353. A arguida encontra-se inscrita na Segurança Social, datando a última remuneração registada de Fevereiro de 2015, no montante de € 87,21.
354. A arguida não tem veículos automóveis registados em seu nome.
355. A arguida não tem antecedentes criminais registados.
III.2.b) Factos dados como não provados pelo Tribunal de 1.ª Instância (transcrição):
Com relevo para a decisão da causa não se provou que:
a) Na ocasião referida de 1. a 14. o arguido C se tenha deslocado ao Lote 4 da X, trazendo uma ‘’bolsa” contendo embalagens com heroína.
b) Na ocasião referida em 7., D tenha entregue a quantia de 10 €.
c) Na ocasião referida em 9., E tenha entregue a quantia de 10 €.
d) Na ocasião referida em 11., F tenha entregue a quantia de 10 €.
e) Na ocasião referida em 21., H tenha entregue a quantia de 10 €.
f) Na ocasião referida em 22., R tenha entregue a quantia de 10 €.
g) Na ocasião referida em 28., J tenha entregue a quantia de 10 €.
h) Na ocasião referida em 51., M tenha entregue a quantia de 10 €.
i) Na ocasião referida em 68., O e P  tenham entregue a quantia de 10 €.
j) Na ocasião referida em 89., Q tenha entregue a quantia de 10 €.
k) Na ocasião referida em 119. tenha sido o arguido S a gritar “Uga!”.
l) Na ocasião referida em 120. os arguidos tenham alertado AA e AB, para a necessidade de abrirem a porta com sucessivos grito de “Uga!”.
*
III.2.c) Fundamentos do recurso:
Questões a decidir no recurso:
Constitui jurisprudência assente que o objecto do recurso, que circunscreve os poderes de cognição do tribunal de recurso, delimita-se pelas conclusões da motivação do recorrente (artigos 402.º, 403.º, 412.º e 417º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso do tribunal ad quem quanto a vícios da decisão recorrida, a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP[2], os quais devem resultar directamente do texto desta, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, a nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito), ou quanto a nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP).[3]
A exigência de conclusões nos recursos, quer no âmbito penal quer no contra-ordenacional, tem em vista a determinação precisa e clara por parte dos sujeitos processuais dos aspectos que, por considerados incorrectamente julgados, pretendem ver reapreciados, de modo a permitir ao Tribunal conhecer de forma sintética, mas precisa as razões do pedido que lhe é dirigido.
 Como se colhe dos ensinamentos do Prof. Alberto dos Reis as conclusões são a enunciação resumida dos fundamentos do recurso, «as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação», sendo elas que delimitam o objecto do recurso, como acima se referiu.
No recurso em apreciação, tendo em consideração as conclusões extraídas da motivação apresentada, através das quais o recorrente sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume as razões do pedido, cumpre apreciar:
A) se o arguido deverá beneficiar da aplicação do regime especial para jovens e consequentemente ser reduzido o quantum concreto da pena aplicada;
B) se a pena de prisão aplicada deve ser suspensa na sua execução.
A) [In] Aplicação  do regime especial para jovens
Pretende o recorrente, por via do presente recurso, beneficiar da aplicação da atenuação especial da pena prevista no artigo 4º do D.L. 401/82, de 22 de Setembro, que foi negada pela decisão recorrida, com fundamento no facto de à data em que foi referenciada a primeira prática do crime de estupefacientes ter 17 anos de idade, não tendo sido detido nesse momento nem admoestado, sendo-lhe permitido, sem qualquer advertência, que continuasse a actividade criminosa e ainda não serem particularmente altas as exigências de prevenção especial [ausência de antecedentes criminais e apoio familiar de que beneficia] e ter confessado os factos.
O regime penal especial aplicável aos jovens entre os 16 aos 21 anos, corporizado através D.L. 401/82, de 22 de Setembro, surge historicamente, como sabemos, inserido num quadro de política criminal mais amplo [e inovador], implementado pelo Código Penal de 1982, de combate ao carácter criminógeno das penas detentivas, com a particular injunção de introduzir, no sistema de reacção penal, um tratamento penal especializado que dê resposta à prática, por jovens adultos, de factos penalmente ilícitos numa fase da vida «de latência social – em que o jovem escapa ao controlo escolar e familiar sem se comprometer com novas relações pessoais e profissionais»[4], e que, por natureza, se perspectiva transitória.
Desenhado para dar tratamento penal a tal fenómeno social, o regime jurídico consagrado assenta numa matriz característica de um direito mais reeducador do que sancionador [sem descurar, contudo, os interesses fundamentais da comunidade, como se extrai do respectivo preâmbulo], estatuindo um conjunto de medidas de flexibilidade na aplicação da reacção penal [que não relevam no caso dos autos] e prevendo, no seu artigo 4º, uma atenuação especial da pena para os casos em que é aplicável uma pena de prisão [que não sendo de aplicação automática, nem obrigatória é de apreciação oficiosa – poder/dever – sempre que se verifique o pressuposto legal da categoria etária de referência].
No que concerne às circunstâncias em que a atenuação especial da pena de prisão deverá ter lugar, a aplicação do referido normativo legal não tem merecido tratamento uniforme por parte da jurisprudência, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça, perfilhando-se essencialmente duas orientações[5]:
- Uma que sustenta que só deve ter lugar o funcionamento da atenuação especial da pena quando se comprovem sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção do condenado [a atenuação não deveria acontecer a não ser em presença de circunstâncias positivas a acrescer à juventude do condenado][6];
- Outra que defende que a atenuação especial da pena facilita a reinserção social do jovem – traz vantagens para a reinserção social do jovem condenado, e só deve ser afastada (regime regra) quando circunstâncias concretas documentarem a sua incapacidade para introduzirem benefícios com vista a essa almejada ressocialização do jovem [a atenuação deveria operar sempre perante a juventude do condenado salvo em presença de factores negativos].
Perfilhamos o entendimento de que o comando normativo ínsito no artigo 4º do referido diploma legal «deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.» não dispensa, pelo contrário, impõe que se apure, casuisticamente, se a atenuação favorece a ressocialização do agente [o elemento literal e o propósito subjacente ao regime especial não autorizam outro entendimento - «[a] interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada» (n.º 1), sendo que, contudo,  «[n]ão pode (…) ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (n.º 2) - art. 9.º do Código Civil]. Tal não significa que as razões de ressocialização, se se verificarem, não devam prevalecer sobre as razões dos demais fins das penas[7], quando não se apresentem conciliáveis.
No caso dos autos, o Tribunal recorrido, após um conjunto de considerações jurídicas relativas às circunstâncias que concorrem para o apuramento das concretas condições de aplicação da atenuação especial da pena, que globalmente acompanhamos, afastou-a com base na seguinte asserção “Está-se perante criminalidade grave, reveladora de culpa elevada e relativamente à qual ocorrem considerações de prevenção geral elevadíssimas, que impõem o afastamento daquele regime”.
Não poderíamos estar mais de acordo com conclusão do Tribunal a quo quanto à impossibilidade de afirmação da existência de «razões sérias» de que da atenuação especial resultarão vantagens para a reinserção do recorrente.
Contrariamente ao sustentado pelo recorrente [que apelou a uma confissão dos factos, ao apoio familiar e ainda à inexistência de antecedentes criminais, fazendo decorrer destas circunstâncias a inexistência de elevadas exigências de prevenção especial], o que revelam os factos [analisados na sua globalidade: condutas praticadas, modo de execução, motivação subjacente ao cometimento dos ilícitos, condições pessoais, percurso de vida, características do respectivo agregado familiar], é um já elevado desajustamento do jovem arguido ao acatamento dos valores jurídicos e comunitários, uma elevada insensibilidade ao desvalor e gravidade das suas condutas [evidenciada pela dimensão da actividade de tráfico: que se prolongou por período considerável, com transações numerosas e detenção relevante, quer de doses de elevada danosidade, quer de dinheiro], e a inexistência de um meio familiar contentor e vigilante  – condições essenciais [cuja falta é inultrapassável] à formulação de juízo favorável à ressocialização.
Não se vislumbra [por ausência de qualquer dado/facto objectivo nesse sentido] como poderá, no caso dos autos, a atenuação especial da pena contribuir para inverter o percurso que os comportamentos gravemente desviantes adoptados pelo arguido evidenciam e relativamente aos quais não revela qualquer indício de autocensura [podendo até ter o efeito contrário, permitindo que o arguido encare a reacção penal fixada pelo Tribunal como reveladora de baixa gravidade dos respectivos comportamentos].
O facto [aduzido como fundamento de recurso] de ter confessado os factos também não e verifica na sua verdadeira acepção: como resulta da exposição motivacional, o arguido espontaneamente apenas admitiu ter começado a vender heroína e cocaína no dia 11.04.2021. Apenas quando confrontado com as imagens de fls. 242 a 250, é que confirma figurar nas mesmas e que se encontrava a vender estupefaciente na ocasião, sendo que o que vendia, era heroína e cocaína.
O seu percurso escolar foi marcado pelo insucesso e absentismo e nunca desenvolveu hábitos de trabalho ou exerceu qualquer actividade profissional [cfr. factos provados sob os pontos 167, 168 e 178].
O apoio familiar que convoca o recorrente é manifestamente insuficiente para refrear um potencial comportamento desviante, como espelha o seu percurso de vida jovem [que aponta para a necessidade de uma reacção penal contentora e adequada às necessidades de prevenção especial que o caso requer] e os factos provados sob os pontos 171 a 173 [171. Antes de ser preso preventivamente, o arguido residia há cerca de um ano com o pai, ...; 172. ... mantinha algumas discórdias com o arguido, pois tentava impor-lhe regras, que este nem sempre cumpria; 173. Por trabalhar por turnos, desconhecia algumas das rotinas do arguido, nomeadamente o absentismo e abandono escolar que apresentava e o grupo de pares com quem convivia.].
A ausência de antecedentes criminais, também não assume particular relevância atenuativa porquanto o mesmo praticou os factos com 17 anos [sendo apenas penalmente responsável apenas desde os 16 anos de idade].
Considerando que o factor idade, só por si e isoladamente, não constitui factor determinante de atenuação especial da pena, apenas poderá relevar como atenuante de carácter geral.
Inexistindo, no caso dos autos, factos objectivos que suportem um juízo de prognose favorável à reinserção social do recorrente e, nessa medida, determinem a aplicação de um tratamento penal especial, nenhuma censura há a fazer à opção do Tribunal recorrido de afastamento da atenuação especial da pena.
Pese embora o recorrente faça depender a pretensão de redução do quantum da pena da aplicação da atenuação especial da pena prevista no artigo 4º do D.L. 401/82, de 22 de Setembro, que como vimos não é de aplicar, também inexiste fundamento para alterar a dosimetria fixada, que se mostra conforme aos parâmetros legais e proporcional à gravidade dos factos.
Improcede este segmento do recurso.
B) Se a pena deve ser suspensa na sua execução
Por fim, pugna o recorrente pela suspensão da execução da pena de prisão aplicada, com fundamento no facto de à data da prática dos factos ter 17 aos de idade, tudo ter acontecido na sequência da separação dos pais, não ter antecedentes criminais, após detenção ter confessado os factos e ainda o tráfico praticado se traduzir na venda directa aos consumidores, pelo que os proventos dessas vendas não revertiam a seu favor.
O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição [nº 1 do artigo 50º do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 94/2017, de 23 de Agosto].
Estando a suspensão da execução da pena de prisão sujeita, como qualquer pena, à observância das finalidades da punição definidas no art.º 40.º do Código Penal (proteção dos bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade), a sua aplicação só pode e deve ter lugar quando a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizarem, de forma adequada e suficiente, tais finalidades, que assumem, como sabemos, natureza exclusivamente preventiva – prevenção geral e especial –.
 No caso dos autos, estando verificado o requisito formal da suspensão da execução da pena (condenação em pena de prisão não superior a 5 anos), afigura-se ser manifesta a impossibilidade, face as exigências de prevenção geral e de prevenção especial de (res)socialização que o caso requer - já expostas a propósito da ponderação da aplicação do regime legal previsto no D.L. 401/82, de 22 de Setembro -, de formulação de um juízo de prognose favorável: o de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão bastarão para afastar o arguido da criminalidade, atingindo-se dessa forma a finalidade precípua do instituto da suspensão.
Como bem explicitou a decisão recorrida, que acompanhamos, à opção pela suspensão da execução da pena de prisão são alheias considerações relativas à culpa do agente, valendo as exigências decorrentes das finalidades preventivas da punição.
Nenhum dos fundamentos recursórios invocados concorre positivamente para a formulação de um juízo de prognose favorável.
O juízo de prognose favorável ou desfavorável que o tribunal é convocado a fazer, na medida em que traduz o exercício de um poder vinculado[8], parte dos elementos factuais apurados que sejam susceptíveis de suportar a inferência sobre a aptidão da pena de substituição para alcançar o desiderato legal.
Convocando os factos relevantes para tal ponderação [entre os quais os pontos 163 a 182] não poderíamos estar mais de acordo com o juízo de ponderação explanado na decisão recorrida.
O quadro fáctico apurado, já atrás analisado, não evidencia, ao contrário do alegado pelo recorrente, quaisquer circunstâncias de vida ou alteração das existentes à data da prática dos factos que favoreça a sua integração, nomeadamente abandono do consumo de estupefacientes que iniciou na adolescência e a criação/procura de fontes de rendimento lícitas, factores que estão, na generalidade dos casos, associados ao início da actividade de tráfico.
A conjunção de necessidades de prevenção geral [elevadas] face aos bens jurídicos questionados e cuja validade das normas que os protegem tem de ser reafirmada, bem como de prevenção especial já enunciadas, igualmente elevadas, impedem o juízo de prognose favorável quanto à sua capacidade para não voltar a delinquir.
A circunstância de a pena privativa da liberdade surgir no nosso sistema punitivo sempre como a ultima ratio, não significa, porém, que não haja casos, como o dos autos, em que só essa pena é adequada a satisfazer os fins das penas, como espelha todo o comportamento anterior do arguido/recorrente.
Mostra-se, pois, absolutamente correcta e conforme aos parâmetros legais, a decisão do Tribunal a quo que concluiu pela impossibilidade da formulação de um juízo favorável, rejeitando assim a suspensão da execução da pena de prisão aplicada.
Inexistindo quaisquer motivos para alterar o decidido em 1ª instância, improcedem as alegações do recorrente e, em consequência, o recurso interposto.
O recurso improcede na totalidade.

IV. Decisão
Termos em que acordam os Juízes que integram a 9ª secção deste Tribunal da Relação de Lisboa:
1) Em julgar parcialmente procedente a reclamação e, em consequência, admitir o recurso interposto pelo arguido A;
2) Em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido A, mantendo-se a decisão recorrida.
Sem custas, no que se refere ao incidente de reclamação.
Custas do recurso pelo recorrente, fixando-se em 4 UC´s cada a taxa de justiça.
Notifique.

Lisboa, 12/01/2023
Simone Abrantes de Almeida Pereira
Lídia Renata Goulart Whytton da Terra
Maria José Cortes
_______________________________________________________
[1] Acórdão do Tribunal Constitucional nº 101/2016, processo nº 585/2015, relatado pela Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros.
[2] Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de 28.12.1995
[3] Acórdão do STJ de 29.01.2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB. S1, 5ª Secção.
[4] V. Proposta de Lei n.º 45/VIII, no “Diário da Assembleia da República”, II série-A, de 21 de Setembro de 2000, de alteração ao regime em vigor.
[5] V. a este propósito Ac. RP de 23.11.2016 (proc. 534/15.2 PWPRT.P1.L1) e Ac. STJ de 20.10.2021 (proc. 1441/19.5 PELSB.S1), publ. in www.dgsi.pt.
[6] (v. Souto Moura, A jurisprudência do STJ sobre fundamentação e critérios de escolha e medida da pena, Revista do CEJ, nº 13, pp. 112-113).
[7] Neste sentido Vide Ac. do STJ de 17.04.2013, relatado pelo Cons. Raúl Borges (processo nº 237/11.7 JASTB.L1.S1).
[8] Acórdão de uniformização de jurisprudência - Acórdão n.º 8/2012 -, proferido no âmbito do processo n.º 139/09.7IDPRT.P1-A.S1, da 3.ª Secção, de 12 de setembro de 2012, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 206, de 24 de outubro.