Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | MANUELA ESPADANEIRA LOPES | ||
| Descritores: | INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE DECISÃO SURPRESA NULIDADE | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/13/2025 | ||
| Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | Sumário: I- A prolação de despacho a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, sem que tenha sido dada oportunidade à autora de sobre ela se pronunciar, configura decisão-surpresa geradora de nulidade processual. II- Estando essa nulidade decorrente da violação do princípio do contraditório coberta por uma decisão judicial, pode a mesma ser arguida no recurso interposto da mesma decisão. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Decisão Singular Por se entender que a questão a decidir não reveste complexidade, ao abrigo do disposto no artº 656º do C.P.Civil, passa-se a proferir decisão singular. * I. Relatório Em 09/12/2016, AA, divorciado, apresentou-se à insolvência, tendo, em 09/01/2017, sido proferida sentença que que declarou a insolvência do mesmo. Em 10 de Fevereiro de 2017 foi elaborado “auto de arrolamento e apreensão de bens” pelo Administrador da Insolvência, constando do mesmo: “I- Bens Imóveis Verba Um Prédio Urbano, fracção autónoma designada pela letra "AG", correspondente ao 8° andar A, destinado a habitação com um lugar de estacionamento com o n° 1 na cave, com área bruta privativa de 119,00m2 e área bruta dependente de 12,00m2, tipologia/divisões: 5, sito na Rua …, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, da Freguesia de … e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de … sob o n° …Freguesia de …, com o valor patrimonial determinado no ano 2015 de € 81.360,00. (…) Observ: O imóvel acima identificado é apreendido na totalidade (não o direito à meação), sendo promovida a notificação do cônjuge para requerer a separação de bens, sob pena de prosseguir a sua venda na totalidade. A supra citada verba é detida em comum e sem divisão de parte com BB, ex-cônjuge do insolvente que será citada para, nos termos conjugados dos artigos 740° do CPC, 141° e 146° do CIRE, querendo, requerer a separação de bens. II- Bens Móveis Verba Dois Veículo ligeiro de passageiros, marca Wolkswagen, modelo Passat, com a matrícula …, do ano de 2008, a diesel, cor azul, 5 lugares, cilindrada 1968, a que se atribui o valor presumível de … O veículo encontra-se registado a favor do insolvente AA, com registo de propriedade n° 00931 em 30/12/2009 (…) a) O aqui signatário tomou conhecimento da existência do veículo, pelo levantamento efetuado junto do serviço de finanças e conservatória, pelo que não se pode no presente atribuir ao mesmo qualquer valor de apreensão em virtude de não se ter verificado o estado de conservação. Total Patrimonial Valor: € 81.360,00”. Tal fracção encontrava-se inscrita na Conservatória do Registo Predial a favor do insolvente pela AP 60 de 1999/02/19, “casado com BB no regime de comunhão de adquiridos”. Da certidão da Conservatória do Registo Predial consta que sob a aludida fracção incidiam os seguintes ónus: - inscrita pela Ap. 61 de 1999/02/19, hipoteca voluntária a favor do BANIF-BANCO INTERNACIONAL DO FUNCHAL, S.A., para garantia do CAPITAL: 19.980.000,00 Escudos; MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 27.792.180,00 Escudos; - inscrita pela Ap. 432 de 2014/01/15, penhora para pagamento da quantia exequenda de 83.044,88 Euros, tendo como sujeito activo BANIF-BANCO INTERNACIONAL DO FUNCHAL, S.A., penhora essa realizada à ordem do Processo nº … - 1º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores da Comarca de …; - inscrita pela Ap. 1403 de 2014/05/27, penhora para pagamento da quantia exequenda de 619,53 Euros, tendo como sujeito activo a Fazenda Nacional, penhora essa realizada à ordem do Processo de Execução Fiscal nº …728 - Serviço de Finanças de … e - inscrita pela AP. 1591 de 2017/04/24, Declaração de Insolvência, Insolvente AA, divorciado - NIF - … Processo nº … O Administrador da Insolvência enviou a BB carta registada com aviso de recepção, datada de 13/02/2017, notificando-a para, em virtude da apreensão do imóvel e se assim o entendesse, “requerer a sepração de bens da massa, ou juntar certidão comprovativa da pendência da acção em que a separação já tenha sido requerida, nos termos conjugados dos arts 740º do CPC, 141º e 146º do CIRE”. Tal carta foi recebida pela destinatária em 17/02/2017. Em 02/03/2017 realizou-se Assembleia de Credores para apreciação do relatório apresentado pelo Administrador da Insolvência, tendo aí sido determinado que os autos prosseguissem para liquidação do património do insolvente. Em 30/08/2017, BB, divorciada, instaurou, por apenso ao processo de insolvência, acção para separação de bens, contra a Massa Insolvente de AA, o insolvente e todos os credores da massa insolvente, peticionando que: a) se reconheça à Autora “o direito de separar da massa insolvente a sua meação; b) Serem os Réus condenados na separação da massa da meação da Autora; c) Ordenando-se que se proceda à respetiva partilha, com custas pelos Réus”. Citados os RR., pronunciou-se o insolvente no sentido à separação e partilha de bens. Em 26/09/2019, foi apresentado nos autos de insolvência requerimento, via e.mail, pela Agente de Execução CC com o seguinte teor: «CC, Agente de Execução, designada no processo número …, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de … - Juízo de Execução - Juiz …, vem, muito respeitosamente, expor e a final requerer a V.ª Ex.ª: Nos autos de execução são executados AA e ex-mulher BB, entre outros, o título executivo é uma escritura de mútuo com hipoteca sobre a fracção autónoma designada pelas letras AG do prédio urbano descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …, da freguesia de …; - cfr. doc. 1 Assim, pela AP. 432 de … foi registada a penhora sobre o dito bem; - cfr. doc. 2 Posteriormente a esse registo, o executado AA, divorciado, foi declarado insolvente neste processo e, consequentemente registado esse facto na ficha predial conforme se constata pela AP. 1591 de … - cfr. doc. 2 Em 19/12/2017, a ora signatária tomou conhecimento por requerimento apresentado pelo Ilustre Mandatário da Exequente que o imóvel tinha sido apreendido na sua totalidade nestes autos de insolvência e que, por conseguinte, aqui iria ser promovida a venda da totalidade do mesmo; - cfr. doc. 3 Em 29/04/2018, nos autos executivos supra mencionados, foi proferido o seguinte despacho: "Apenas são de suspender as diligências de execução relativamente ao executado declarado insolvente. Cabe à Sra. AE diligenciar pelo prosseguimento da execução com a venda da meação da executada, adequando-se a tramitação a tal facto superveniente. Notifique" - cfr. doc. 4 E assim se agindo em conformidade naqueles autos. Em 04/03/2019, aquando a publicação da venda no site e-leilões, procedeu-se à notificação do Ilustre Administrador Judicial - Dr. E…, nomeado nestes autos ao Insolvente, para se pronunciar quanto ao interesse da venda do bem em conjunto, na sua totalidade, na plataforma e-leilões, por ser mais eficiente dada a grande procura e de custo mais baixo para as partes, sendo certo que, posteriormente à venda seria o preço obtido repartido em partes iguais pelos dois processos – execução e insolvência. – cfr. Doc. 5 Face à ausência de resposta à comunicação enviada, expediu-se nova notificação em 13/05/2019, que também não obteve qualquer resposta. – cfr. Doc. 6 Apenas, e após contacto telefónico, foi a ora signatária informada de que o imóvel se encontrava à venda numa leiloeira com quem o Ilustre Administrador Judicial tem um contrato de prestação de serviços, pelo que não haveria interesse na inserção do imóvel na plataforma de e-leilões. Em consequência, volvidos cerca de 4 meses, e face à ausência de qualquer informação sobre o estado da venda, na presente data, procedeu a ora Agente de Execução ao envio de notificação a solicitar informação sobre o estado da venda do imóvel. Em resposta, foi recepcionada a comunicação que agora se junta como doc. 7; A qual foi respondida solicitando mais esclarecimentos uma vez que que continha algumas imprecisões, A esta última comunicação, teve o Ilustre Administrador Judicial a amabilidade de responder conforme doc. 8, que ora se junta para melhor entendimento; Face a tudo o aqui expostoetendo em consideração o Douto Despacho proferido naqueles autos de execução, Vem Requerer a V.ª Ex.ª Se Digne: Ordenar que seja rectificado o registo de apreensão para o direito à meação que o insolvente possui no imóvel bem comum do ex-casal, Ou, caso assim não se entenda, e prosseguindo a venda nos moldes estabelecidos, Ordenar que seja depositado à ordem dos autos executivos metade do valor obtido pela venda do imóvel património comum do ex-casal, em nome da ex-cônjuge, não insolvente». Em 10/10/2019 foi determinado que os intervenientes processuais fossem notificados para se pronuciarem relativamente ao requerimento que antecede e após essa notificação, em 08/01/2020 foi proferido o seguite despacho: «Na sequência do email de 26/9/19, apresentado pela agente de execução no processo executivo que corre contra a ex-mulher do Insolvente, em face do despacho judicial proferido em tal processo no sentido de a sra. Agente de execução realizar as diligências necessárias à venda da meação, existindo todo o interesse e conveniência na venda conjunta das meações, quer por motivos de valor económico do bem quer de simplificação do processado, notifique o AI para contactar esta e diligenciar pela venda do bem em conjunto com a sra. Agente de execução, preferencialmente através da plataforma e-leilões, a bem da transparência e redução de custos, informando os autos das diligências em curso no prazo de 8 dias. Notifique os vários intervenientes processuais, incluindo a agente de execução.» Notificado para informar acerca do estado da venda, o AI, em 01/07/2020, apresentou nos mesmos autos de insolvência requerimento com o seguinte teor: «1. O requerente não vê, nem viu nunca, qualquer inconveniente em que a venda se faça em conjunto e na modalidade de leilão electrónico. 2. É, de resto, isso mesmo que tem estado a acontecer: foram já feitos dois leilões e elaborados outros tantos relatórios de venda, em 24.07.2017 e 28.11.2018, respectivamente. 3. Do mesmo modo que não vê qualquer inconveniente em que a venda se faça no âmbito do processo executivo (Prº nº …, que corre termos pelo Juízo de Execução de … - Juiz 1), que foi intentado primeiro (em 2013, quando a insolvência é de 2016), sendo a Ilustre AE desse processo fazê-lo, até porque o exequente e credor hipotecário é o mesmo em ambos: Banco Santander Totta, S.A. 4. A questão não reside, nem nunca residiu, na venda conjunta, mas antes no facto de a executada, ex-mulher do insolvente, se recusar a desocupar a casa. 5. Nas diligências desenvolvidas para a venda do imóvel no processo de insolvência, através de leilão electrónico e de anúncios publicados na imprensa escrita, o credor hipotecário é o titular da melhor oferta: em 24.07.2017 ofereceu 81.360,00€, valor este que foi aceite. 6. Porque depois disso, em 28.11.2018, se fez um novo leilão em que a melhor oferta foi de 65.200,00€ apenas. 7. Todos estas informações se encontram detalhadamente expostas no apenso de liquidação do activo. 8. Aquilo que efectivamente está em causa não é, pois, nem nunca foi, a venda conjunta. Mas sim o facto de o ofertante pôr como condição para adquirir a casa que a mesma se encontre devoluta. 9. E também não se entende que, sendo o processo executivo de 2013 e executada a ocupante do imóvel, a Ilustre AE nada tenha feito com vista à respectiva desocupação. 10. Quando é a ela que compete tal tarefa, uma vez que o insolvente já não habitava a casa na data de declaração da insolvência. 11. Corre, além disso, uma acção de despejo contra os dois membros do casal, supõe-se: Processo nº … , do Juízo Local Cível de …. , em que é Autor DD … e Réus AA e Outros 12. Processo cujo teor se desconhece, mas terá naturalmente em vista a desocupação da casa.» Em 09/04/2021, o AI declarou nos autos de insolvência que não via «qualquer inconveniente em que a venda se faça no âmbito do processo executivo (Prº nº …, que corre termos pelo Juízo de Execução de … - Juiz …), que foi intentado primeiro (em 2013, quando a insolvência é de 2016), sendo a Ilustre AE desse processo fazê-lo, até porque o exequente e credor hipotecário é o mesmo em ambos: Banco Santander Totta, S.A. 4. Aquilo que efectivamente está em causa não é pois, nem nunca foi, que a venda se faça em conjunto, mas antes o facto de os ofertantes porem como condição para adquirir a casa que a mesma se encontre devoluta, e a ocupante usar de todo o tipo de manobras dilatórias para a não a desocupar». Em 30/05/2024 e após diligências várias foi proferido despacho substituindo o anterior Administrador da Insolvência pela Sra Dra EE e determinado que a mesma contactasse o anterior AI e os demais intervenientes processuais, com vista à conclusão da liquidação em 8 dias. Em 15/10/2024, a Administradora da Insolvência apresentou requerimento, invocando que a ex-mulher do insolvente se recusa a entregar o imóvel livre e devoluto e que requeria que o mesmo lhe fosse entregue no prazo máximo de 30 dias e que caso tal entrega não tivesse lugar, fosse autorizada “a tomada de posse do imóvel, com acompanhamento da força policial, permitindo assim a realização da venda do imóvel com a maior brevidade”. Foi determinado que a interessada procedesse à entrega do imóvel no prazo de 5 dias, sob pena de, nada sendo dito, se determinar a entrega coerciva, com arrombamento e o auxílio de órgão de Polícia. Em 17/01/2025 e após a apresentação de requerimento pela interessada foi proferido despacho, determinando, «por motivos de celeridade, e procurando uma solução amigável, existindo processo executivo em que estará penhorada para venda a meação da ex-cônjuge do insolvente e este processo, em que pode haver venda da meação do insolvente, deve a AI, após diálogo com o Agente de Execução, pronunciar-se sobre eventual venda separada das duas meações, pela AI e pelo Agente de Execução respetivamente, publicitando a venda no mesmo momento e com informação de que se encontra igualmente para venda a outra meação. A proposta de solução acima visa acelerar o processo, conciliando os interesses do insolvente e credores com os interesses da ex-cônjuge que poderá exercer os seus direitos na aquisição da meação, conforme alega pretender. Caso a AI entenda ser de avançar com a solução proposta, deverá vir comunicar que desiste da apreensão da totalidade do imóvel, sendo a mesma substituída por apreensão da meação do insolvente, dando-se por extinto por inutilidade o apenso de separação.» Em 20/01/2025, a AI declarou que “desiste da apreensão da totalidade do imóvel, substituindo-apela apreensão da meação do insolvente, caindo o apenso de separação de bens por inutilidade do mesmo. Continua, no entanto, a A.J. a entender que, com a autorização já existente da Ilustre agente de execução, a venda poderá ser efectuada pela totalidade nestes autos e com o consentimento do processo executivo, face à maior celeridade do processo de insolvência”. Em 26/02/2025, foi proferido o seguinte Despacho: «(…) Atenta a posição expressa pela Sra. AI e em face de penhora da outra meação em processo de execução, deve a AI realizar as oportunas diligências necessárias tendentes ao levantamento da apreensão da totalidade do imóvel, substituindo-a pela apreensão de meação do Insolvente no imóvel. Após realização destas diligências no apenso de apreensão, abra conclusão em tal apenso e no de restituição e separação de bens, para que se aprecie eventual inutilidade superveniente da lide. Juridicamente existem duas meações a executar e não um único bem. Porém, deve a venda das duas meações (meação do Insolvente e de ex-cônjuge) ser concertada entre AI e Agente de Execução, atento o requerido pela Agente de Execução com competência para liquidação da meação da ex-cônjuge, a concordância da AI e bem assim vantagens de celeridade, simplificação e obtenção do melhor preço de venda para satisfação dos interesses de credores e insolvente. Para total transparência e rigor jurídico, no anúncio de venda em leilão deve ser inclusa informação de que está em causa a venda de duas meações de património conjugal (que conjuntamente perfazem a totalidade do bem imóvel), a identificação da AI e Agente de Execução responsáveis, bem como dos processos judiciais respetivos.» Em 15 de Maio de 2025 foi proferido nestes autos de Separação de Bens o seguinte Despacho: «Notifique a Sra. AI para dar cumprimento integral ao resultante do despacho de 26/2/25, proferido nos autos principais, nomeadamente ao seu segundo parágrafo, de modo a lograr-se eventual inutilidade superveniente da lide neste apenso. (…)» Este despacho foi notificado unicamente à AI, a qual, em 16/06/2025, apresentou nestes mesmos autos requerimento com o seguinte teor: «EE, Administradora Judicial nomeada no processo acima referenciado, vem (…) INFORMAR V. Exa. que, conforme despacho proferido em 26/02/2025 promoveu a retificaçao de registo de apreensão do imóvel para a meação do insolvente, com vista à venda da totalidade do imóvel em conjunto com o processo executivo, estando acordado com a Agente de Execução que a venda será realizada no processo de insolvência com a repartição do valor por ambos os processos, conforme cópia da certidão predial que se anexa. Ora, sendo a ex-cônjuge do insolvente também executada no âmbito do processo executivo cuja meação do imóvel será vendida com a meação do insolvente, salvo melhor opinião constata-se que existe uma inutilidade superveniente da lide no presente apenso devendo em consequência ser o mesmo extinto.» Com esse requerimento juntou certidão da Conservatória do Registo Predial da qual resulta que pela AP. 3962 de 2025/05/15 foi inscrito o seguinte Averbamento - Rectificação “DA APRESENT. 1591 de 2017/04/24 - Declaração de Insolvência Objeto: MEAÇÃO no património do dissolvido casal (Processo nº 4598/16.3T8VFX - Comarca de Lisboa Norte - Juízo de Comércio de Vila Franca de Xira - Juiz 4)”. Este requerimento não foi notificado à A. e em 02/07/2025, foi proferido o seguinte Despacho nestes autos: “Atenta a apreensão da meação do Insolvente e não da totalidade do imóvel, julgo extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide (art. 277.º, al. e), do CPC, aplicado ex vi art. 17.º do CIRE)” * Inconformada, a A. BB interpôs recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: I - O douto Despacho de que se recorre foi proferido, na sequência de requerimento da Administradora de Insolvência que não foi notificado às partes, designadamente à Recorrente, nem o Tribunal o fez, oficiosamente. II - Deste modo, encontra-se violado o princípio do contraditório, constante no artigo 3.º do Código de Processo Civil. III - O contraditório é entendido como uma garantia de participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio. IV – O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo. V – No plano das questões de direito, o princípio do contraditório exige que, antes da sentença, às partes seja facultada a discussão efectiva de todos os fundamentos de direito em que a decisão se baseie. VI – Nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. VII - O desrespeito do princípio do contraditório, quando ele deva ser observado, constitui uma nulidade processual prevista no artigo 195.º do CPC, pois trata-se de omissão de uma formalidade que a lei prescreve. VIII - A Recorrente, em 30/08/2017 intentou, contra a Massa Insolvente de AA, o Insolvente AA e demais credores da referida Massa Insolvente, Acção de Separação de Bens, nos termos do n.º 1 do artigo 141.º n.º 2 do artigo 146.º, ambos do CIRE, peticionando: “a) Reconhecer-se à Autora do direito de separar da massa insolvente e a sua meação; b) Serem os Réus condenados na separação os Réus condenados na separação da massa da meação da Autora; c) Ordenando-se que se proceda à respetiva partilha, com custas pelos Réus.” IX – Quanto aos pedidos a) e b), veio o Tribunal pronunciar-se, através de Despacho datado de 26/02/2025, onde reconhece “existem duas meações a executar e não um único bem”. Ou seja, foi reconhecido o direito à meação, determinando a redução da apreensão inicial, que incidia sobre a totalidade do bem. X – Nessa medida, os pedidos formulados nas alíneas a) e b) foram atendidos. XI – Porém, quanto ao pedido c), o Tribunal não se veio a pronunciar, tendo decidido, através o douto Despacho de 02/07/2025, em apreço, pela extinção da “presente instância por inutilidade superveniente da lide”. XII - A extinção da instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide só se justifica quando se esvazia o interesse das partes em obter uma decisão de mérito, o que manifestamente não se verifica no caso dos autos. XIII – Ora, salvo o devido respeito, tal comporta denegação de justiça, por parte do Tribunal, na medida em que a Recorrente tem inquestionavelmente o direito à partilha dos bens comuns por divórcio que extinguiu a comunhão conjugal, o que está peticionado desde 30/08/2017. A terminar, “por violação dos artigos 3.º e 277.º do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do disposto no artigo 17.º do CIRE, e do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa”, pediu a revogação do Despacho recorrido, declarando a sua nulidade por inobservância do princípio do contraditório, ou, quando assim se não entenda, ordenando, por não haver inutilidade superveniente, o prosseguimento dos autos, com os actos que se mostrem adequados, incluindo a promoção da partilha. * Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações. * O recurso foi admitido pela 1ª instância, sendo que o recurso é admissível e foi recebido na forma e efeitos devidos. * II – Questões a decidir: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações do recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo Código). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido. Assim, face das conclusões apresentadas pela recorrente importa analisar e decidir se o tribunal a quo violou o princípio do contraditório e, em caso negativo, se se deve manter a extinção da instância decretada com fundamento em inutilidade superveniente da lide. * III – Fundamentação: A) De facto Atentos os elementos que constam dos autos, encontram-se provados, com interesse para a decisão a proferir, os factos que constam do relatório que antecede e cujo teor se dá por reproduzido. * B) De Direito Os presentes autos tratam-se de uma acção para separação de bens instaurada pela ex-cônjuge do insolvente contra a Massa Insolvente do mesmo, contra o próprio insolvente e todos os credores da massa insolvente e na qual é peticionando que: a) se reconheça à Autora “o direito de separar da massa insolvente a sua meação; b) Serem os Réus condenados na separação da massa da meação da Autora; c) Ordenando-se que se proceda à respetiva partilha, com custas pelos Réus”. Começou a A./recorrente por invocar, nas Conclusões do Recurso, que o despacho de que recorre foi proferido, na sequência de requerimento da Administradora de Insolvência que não foi notificado às partes e que nem tão pouco o tribunal a quo determinou a sua prévia notificação para se pronunciar no que concerne à inutilidade superveniente da lide que veio a ser decidida. Diz que foi violado o contraditório e que tal constitui nulidade processual nos termos do artigo 195.º do CPC. As nulidades processuais respeitam à prática de actos que a lei não admite, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreve. A prática de tais actos só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa – artº 195º, nº1, do C.P.Civil. Caracterizando esta nulidade, diz Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, 2º vol., p. 484 (anterior artigo 201º do C.P.C. revogado), que «O que (nelas) há de característico e frisante é a distinção entre infracções relevantes e infracções irrelevantes. Praticando-se um acto que a lei não admite, omitindo-se um acto ou uma formalidade que a lei prescreve, comete-se uma infracção, mas nem sempre esta infracção é relevante, quer dizer, nem sempre produz nulidade. A nulidade só aparece quando se verifica um destes casos: a) quando a lei expressamente a decreta; b) quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa». Relativamente às nulidades da sentença – aplicável aos despachos por via do disposto no artº 613º, nº3 -, estabelece o artº 615º, nº1, do C.P.Civil, que a sentença será nula: a) se o juiz não a assinar; b) se não especificar os fundamentos, de facto e de direito, que justificam a decisão; c) se ocorrer oposição entre fundamentos e decisão ou se verifique alguma obscuridade ou ambiguidade que torne a decisão ininteligível; d) se o juiz conhecer questões que não devia ou deixe de conhecer questões que tinha de conhecer; e) ou condenar em objecto diverso ou em quantidade superior ao pedido. Conforme se refere no Ac. da Relação de Lisboa, de 04/02/2021, relator: Desemb. Adeodato Brotas, Proc. nº 4739/18.6T8LSB.L1, ao que sabemos não publicado, diferentes destas nulidades são as nulidades processuais que “consistem em desvios ao formalismo processual prescrito na lei, quer por se praticar um acto proibido, quer por se omitir um acto prescrito na lei, quer por se realizar um acto imposto ou permitido por lei mas sem o formalismo estipulado e, a que a lei faça corresponder, ainda que de modo não expresso, uma invalidade, mais ou menos extensa, dos actos processuais (cf. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, reimpressão, 1993, pág. 176; Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 52). Assim, as nulidades da sentença respeitam directamente aos vícios da peça decisória e estão previstas no artº 615º, nº1, do CPC e resultam da violação da lei processual pelo juiz ao proferir alguma decisão circunscrevendo-se no âmbito restrito da elaboração das decisões judiciais e desde que essa violação preencha um dos requisitos previstos naquele artº 615º, nº1, do CPC. Já as nulidades processuais incidem sobre os restantes actos processuais e estão previstas nos arts 186º e segs do CPC. (…) importa também ter presente que, por regra, sem prejuízo das que são de conhecimento oficioso (artº 196º do CPC), das nulidades processuais reclama-se perante o juiz onde tenham sido (alegadamente) cometidas (artº 197º CPC), pela parte que revele interesse na eliminação ou na repetição do acto (artº 197º, nº1, CPC), estabelecendo a lei prazos para a respectiva arguição (artºs 198º e 199º, nº1). Arguida a nulidade perante o tribunal onde tenha tido lugar, compete ao juiz decidi-la e, dessa decisão cabe, então, recurso, embora com as limitações mencionadas no artº 630º, nº2, do CPC (Cf Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Processo Civil, 3ª edição, pág. 24). Esta solução de reclamação perante o juiz do tribunal onde foi cometida a nulidade deve ser igualmente aplicada nos casos em que tenha sido praticada uma nulidade processual que se projecte na sentença, mas que não se reporta a nenhuma das alíneas do artº 615º, nº1, do CPC. Assim, embora a mesma afecte a sentença, deve ser objecto de prévia reclamação que permita ao próprio juiz reparar as consequências que, precipitadamente, foram extraídas ainda que com prejuízo da decisão que foi proferida (Cf Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Processo Civil, 3ª edição, pág. 24, sublinhado nosso). Pensamos que um dos critérios que permite aferir se um desvio ao formalismo processual, ou a prática de acto proibido, ou a omissão de acto pescrito constitui uma nulidade processual – que deve ser reclamada perante o juiz do processo em que se verificou - ou se constitui uma nulidade da sentença – que deve ser arguida por via de recurso – passará por se perceber se a nulidade é intrínseca à própria sentença ou se se trata de uma nulidade extrínseca à sentença. E, como critério que ajuda (também) a definir se se trata de nulidade processual – que, repete-se, deve ser reclamada perante o juiz do processo em que se verificou – ou se de uma nulidade da sentença – a arguir por via de recurso – passa por ter em conta a oportunidade da arguição. Quer dizer, se a parte interessada na arguição da nulidade teve oportunidade de a invocar antes da prolação da sentença, não se trata de uma nulidade intrínseca da sentença; mas se, pelo contrário, a parte interessada na eliminação ou repetição do acto não teve processualmente oportunidade de arguir a nulidade antes da prolação da sentença, então, estamos perante uma nulidade intrínseca da sentença e, por isso, apenas pode ser impugnada por via de recurso.”. Como se refere no CPC Anotado, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Sousa (GPS), Vol. I, 2ª ed., p. 762: “Ocorre, porém, que nem sempre esta distinção é evidente, como sucede nos casos em que a omissão de determinada formalidade obrigatória (à cabeça, o cumprimento do contraditório) acaba por se traduzir numa nulidade da própria decisão, ajustando-se então a interposição de recurso no âmbito do qual essa nulidade seja suscitada.” Ora, in casu, invocou a recorrente que o facto de não ter sido notificada do requerimento da Administradora da Insolvência apresentado em 16/06/2025 – requerimento em que a mesma informou que tinha promovido a “… retificaçao de registo de apreensão do imóvel para a meação do insolvente, com vista à venda da totalidade do imóvel em conjunto com o processo executivo” e que “… sendo a ex-cônjuge do insolvente também executada no âmbito do processo executivo cuja meação do imóvel será vendida com a meação do insolvente”, se verificava uma situação de inutilidade superveniente da lide nestes autos - e tão pouco tendo o tribunal, previamente à prolação do despacho que julgou extinta a instância com esse fundamento, ouvido a mesma no que a tal concerne, se traduz na omissão de uma formalidade processual com influência na decisão da causa. Considerando o que fica referido, o vício invocado, consistente na preterição do contraditório, a verificar-se, traduzir-se-á numa nulidade que pode ser atacada por via de recurso. Prescreve o artigo 3.º, n.º3, do Código de Processo Civil, também subsidiariamente aplicável ao processo de insolvência por via do disposto no artº 17º, nº 1 do CIRE, que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. Em relação ao princípio do contraditório encontra-se o mesmo previsto no artº 3º do C.P.Civil e segundo Miguel Teixeira de Sousa, em anotação a este artigo em CPC ONLINE, versão de 09.2025, consultado em 12.11.2025, in https://blogippc.blogspot.com/: “4. (a) O princípio do contraditório é um dos corolários do processo equitativo (art. 20º, nº 4, e, no âmbito do processo penal, 32º, nº 5, CRP; art. 26º, nº 3, LOSJ; TC 1193/96; TC 358/98; TC 259/2000; TC 298/2005). (b) A garantia do contraditório exprime dois direitos fundamentais: (i) um direito de resposta de uma parte perante a outra parte, dado que qualquer das partes tem o direito a pronunciar-se sobre as alegações da parte contrária (nº 1 in fine); (ii) um direito à audição prévia da parte perante o tribunal, dado que, antes de decidir, o tribunal deve ouvir sempre ambas as partes (audiatur et altera pars; rechtliches Gehör: nº 3 1ª parte; no âmbito da prova, art. 415º). Este direito à audição prévia implica a proibição da indefesa, ou seja, a proibição do proferimento de uma decisão contra quem antes não teve a possibilidade de se pronunciar sobre a matéria (TC 298/2005). (c) Atendendo à importância do princípio do contraditório, só em casos excepcionais é possível proferir uma decisão contra alguém sem a sua auscultação prévia. É o que sucede, atendendo à necessidade da produção de um efeito-surpresa, no âmbito dos procedimentos cautelares (art. 366º, nº1, 378º e 393º), embora, naturalmente, esteja garantido um contraditório diferido (art. 366º, nº 6, 372º, nº1 e 376º, nº 1).” A propósito do vício em que se traduzirá a prolação de uma decisão surpresa, diz o mesmo autor e no mesmo local, no escrito de 22.9.2020 em comentário ao Ac. do STJ de 2.06.2020, proferido no Proc. nº 496/13.0TVLSB.L1.S1: “(...) A audição prévia das partes é um pressuposto ou uma condição para que a decisão não seja considerada uma decisão-surpresa. Quer dizer: a decisão-surpresa é um vício único e próprio: a decisão é uma decisão-surpresa quando tenha sido omitida a audição prévia das partes. Noutros termos: há um vício (que é a decisão-surpresa), e não dois vícios independentes (a omissão da audiência prévia das partes e a decisão-surpresa). Em concreto: há um vício processual que é consequência da omissão de um acto. Se assim é, claro que o que há que considerar é o vício em si mesmo (a decisão-surpresa), e não separadamente a causa do vício e o vício. Em parte alguma do direito processual ou do direito substantivo se considera a causa do vício e o vício como duas realidades distintas. A única distinção que é possível fazer é ontológica: é a distinção entre a causa e a consequência. Dado que a decisão-surpresa corresponde a um único vício e porque este nada tem a ver com a decisão como trâmite, o vício de que padece a decisão-surpresa só pode ser um vício que respeita à decisão como acto. Em concreto, a decisão-surpresa é uma decisão nula por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC), dado que se pronúncia sobre uma questão sobre a qual, sem a audição prévia das partes, não se pode pronunciar.” No plano das questões de direito, o princípio do contraditório proíbe as chamadas decisões-surpresa, ou seja, impede que o tribunal tome conhecimento de questões, ainda que de apreciação oficiosa, sem que as partes tenham tido prévia oportunidade de sobre elas se pronunciarem, a não ser que a sua audição se revele manifestamente desnecessária. A expressão «salvo caso de manifesta desnecessidade», utilizada no nº 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, deve ser interpretada e densificada, tendo presente o princípio geral da economia processual, o qual se encontra consagrado no artº 130º do C.P.Civil. Como se escreveu no Acórdão da Relação de Lisboa de 10/09/2020, Ana de Azeredo Coelho, Proc. 12841/19.08T8LSB.L2-6, in www.dgsi.pt: «Como determinar o que seja esta manifesta desnecessidade, conceito indeterminado que importa densificar? No ensino de Manuel de Andrade essa determinação do que é indeterminado impõe que o juiz desvele o/s princípio/s geral/is que o conceito visa prosseguir na sua indeterminação a fim de deduzir deles a interpretação da espécie. No caso vertente, a desnecessidade há-de verificar-se quando os valores que o contraditório salvaguarda, possam ser assegurados sem a intervenção judicial autónoma destinada a possibilitar a pronúncia. Ou seja, a desnecessidade do contraditório verifica-se quando a equidade e igualdade das partes e o imperativo da sua participação efetiva no processo que leva a decisões que impactem os seus interesses, se mantêm respeitados sem aquela intervenção autónoma. Dito de outro modo, a desnecessidade é uma desnecessidade funcional de audição porque sem esta audição nenhum dos valores que a mesma pretende salvaguardar saem violados. A desnecessidade não deve por isso ser compreendida ao nível da pretensa clareza da questão a dilucidar ou da suficiência dos elementos para a prolação da decisão. Em conclusão, é desnecessário o contraditório quando os valores que por ele se prosseguem, são salvaguardados sem a intervenção autónoma do juiz para pronúncia. É o caso das situações em que a parte se pronunciou, quiçá fora do esquema processual normal, em que a pretensão da parte contrária será indeferida liminarmente sem afetar os interesses da contraparte ou em que a questão, não tendo merecido consideração das partes, é de debate usual na jurisprudência em situações similares ou está implícita no requerimento apreciando. A esse respeito, a manifesta desnecessidade é vista à luz do princípio da proporcionalidade no acórdão desta Relação de 11 de Julho de 2019, proferido no processo 29624/13.4T2SNT-W.L1-1 (Rijo Ferreira). Lê-se no aresto: segundo o princípio da proporcionalidade, tal pronúncia é dispensável, no dizer do mesmo nº 3 do art.º 3º do CPC, em caso de manifesta desnecessidade; vislumbrando-se como tal, designadamente, aquelas situações em que o efeito pretendido resulta automaticamente da lei, o enquadramento fáctico relevante se mostra insuscetível de controvérsia, ou dados os contornos da lide a decisão era expectável para os seus destinatários.» Estarão em causa situações em que, atenta a finalidade do princípio do contraditório, a falta de audição das partes não poderá implicar a violação do mesmo. In casu, não se nos afigura que se verifique a excepção à regra do princípio do contraditório no desenrolar da tramitação processual. Através do requerimento apresentado em 16/06/2025, a Administradora da Insolvência introduziu no processo uma nova questão factual – a rectificação/alteração da inscrição registral de apreensão do imóvel para o registo da meação do insolvente – e de direito – que “… sendo a ex-cônjuge do insolvente também executada no âmbito do processo executivo cuja meação do imóvel será vendida com a meação do insolvente”, se verificava uma situação de inutilidade superveniente da lide nestes autos -, a qual veio a ser decretada, pelo que deve ser dada a oportunidade à autora de se pronunciar quanto a tal questão. Pelo exposto, antes de proferir decisão sobre o aludido requerimento, a 1ª instância deveria ter respeitado o princípio do contraditório, notificando a A. para, querendo, se pronunciar. Em consequência, a 1.ª instância violou o artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, tendo proferindo uma decisão-surpresa. Ora, a inobservância do princípio do contraditório, constitui uma nulidade processual, com influência no exame ou decisão da causa, nos termos previstos pelo artigo 195.º do Código de Processo Civil, que tem de ser arguida, de acordo com a regra consagrada no artigo 199.º do Código de Processo Civil. E estando a decisão-surpresa coberta por decisão judicial, nada obsta, como se viu, a que nulidade processual seja invocada e conhecida em sede de recurso. Pelo exposto, verificando-se a arguida nulidade processual, há que julgar o recurso procedente, devendo anular-se a decisão recorrida e determinar que seja respeitado o exercício do contraditório em relação ao requerimento da Administradora da Insolvência em 16/06/2025, designadamente com a prolação de despacho para esse efeito. Fica prejudicado o conhecimento do demais invocado pela apelante. * IV. Decisão Nestes termos, decide-se julgar o recurso procedente, e, em consequência, anula-se o despacho recorrido, determinando-se que seja facultado o exercício do contraditório em relação ao requerimento da AI entrado em 16/06/2025, designadamente com a prolação de despacho para esse efeito. * Custas pela recorrente – uma vez que tirou proveito do recurso e não houve oposição – artº 527º, nº1, in fine, do C.P.Civil -, sem prejuízo do apoio judiciário de que a mesma beneficia. Registe e Notifique. Lisboa, 13 de novembro de 2025 Manuela Espadaneira Lopes |