Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
21171/16.9T8LSB.L1-2
Relator: ANTÓNIO MOREIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS
AGENTE VINCULADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1- Há lugar à rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto quando não vêm especificados nas conclusões os pontos concretos da decisão que estarão errados, bem como quando falta igualmente a especificação da decisão que devia ser proferida sobre questões de facto.

2- O R. deve ser responsabilizado, nos termos do disposto no art.º 500º do Código Civil, pelos danos patrimoniais sofridos pelos AA. em consequência da actuação ilícita e culposa do agente vinculado daquele, correspondendo os mesmos danos ao valor de que se viram desapossados, e na medida em que os actos praticados por tal agente vinculado o foram no exercício das funções que lhe foram confiadas pelo R., ainda que em abuso das mesmas.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

Pedro F. e Sandra L. intentaram acção declarativa com forma comum contra B. – Banco, S.A., peticionando a condenação do R. no pagamento da quantia de € 70.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 8% desde Janeiro de 2016 até efectivo pagamento.
Alegam para tanto, que:
· Foram clientes do R., onde pretenderam efectuar investimentos em produtos financeiros por este disponibilizados através da sua plataforma electrónica, dos seus centros de investimento e dos seus Personal Financial Advisors;
· Desde o início da relação com o R., em 2012, e até Janeiro de 2016, os AA. sempre tiveram, como Personal Financial Advisor Ana P., que conheciam como funcionária do R., com quem reuniam, a pedido desta, num escritório do R. sito na R. Castilho, em Lisboa;
· Nos contactos que mantiveram com Ana P. (que para os AA. era a única pessoa com quem trataram todo e qualquer assunto relacionado com os seus investimentos), esta entregou aos AA. vários impressos e formulários do R. que estes preencheram segundo instruções da mesma, assim destinando a aplicação de parte das suas poupanças num depósito a prazo e num seguro de capitalização;
· Sempre a conselho da sua Personal Financial Advisor realizaram, nomeadamente, uma aplicação financeira correspondente a um seguro de capitalização junto da sucursal do Luxemburgo da Companhia de Seguros Império, no montante de € 70.000,00.
· A Ana P. ganhou a confiança dos AA. durante o período em que estes mantiveram o seu relacionamento comercial com o R., pois sempre se manifestou disponível para tratar de todas e quaisquer questões financeiras daquele, pelo que todas as suas sugestões e aconselhamentos eram aceites pelos AA., nunca estes tendo questionado as orientações por aquela fornecidas quanto à gestão das aplicações financeiras ou operações bancárias ou, quando o fizeram, sempre a Ana P. lhes garantiu que eram procedimentos normais;
· Os AA. recebiam os extractos bancários por correio, aí verificando o depósito dos juros de capitalização do seguro, semestralmente, nunca tendo desconfiado de qualquer irregularidade até que, em 21/1/2016, foram contactados telefonicamente por um outro colaborador do R., o qual os informou que a Ana P. tinha deixado de ser Personal Financial Advisor, por ter saído do R., sendo aquele, doravante, o gestor de conta daqueles;
· Só em Abril do mesmo ano os AA. tomaram conhecimento, através de informações veiculadas por outros clientes do R., que a apólice de seguro da Império, sucursal do Luxemburgo, era um documento forjado, à semelhança de outros subscritos por outros clientes do R., angariados pela Ana P., tendo assim os AA. ficado cientes, só nessa ocasião, que o seguro de capitalização por si subscrito, não só não era um produto financeiro comercializado pelo R., como nem sequer existia;
· Contactado o R., o mesmo escudou-se no facto de o produto financeiro em causa não ser da sua titularidade, desconhecendo e desresponsabilizando-se por todos e quaisquer actos praticados pela Ana P., que não reconheceu como sua funcionária;
· O R. deve, porém, responder pelos danos causados aos AA., na sua qualidade de comitente, sendo esta uma responsabilidade objectiva, portanto, independente de culpa, ainda que o comissário tenha agido intencionalmente ou contra instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada.
Citado, o R. apresentou contestação onde impugnou a factualidade alegada na P.I. e alegou, além do mais, que:
· A Ana P. actuou em nome pessoal, nunca tendo sido funcionária do R., com quem teve, apenas, um vínculo como prestadora de serviços, na qualidade de agente vinculado/promotora, cuja função, tipificada na lei, consiste na prospecção de investidores para intermediários financeiros, como o R., sem solicitação prévia, sendo-lhe vedado, nomeadamente no exercício da actividade, celebrar quaisquer contratos em nome do intermediário financeiro, receber ou entregar dinheiro, salvo autorização do intermediário, actuar ou tomar decisões de investimento em nome ou por conta dos investidores;
· O escritório onde a Ana P. receberia os AA. não é nem nunca foi escritório do R., sendo que aquela sempre desenvolveu a sua actividade de forma totalmente autónoma e independente da actividade do R., já que, também, nunca recebeu ordens ou instruções deste, nem este alguma vez lhas deu;
· A Ana P. não agiu, pois, no exercício das funções que lhe competiam no R. e com este contratadas, sendo que, ainda que o tivesse feito, sempre seria de produtos financeiros pelo mesmo comercializados, o que não foi o caso;
· Os AA. são pessoas de formação académica superior e com experiência empresarial, a qual envolve, necessariamente, experiência financeira e bancária, podendo e devendo estar familiarizados com o tipo de informação constante dos extractos bancários integrados que o R. mensalmente lhes enviou, dos quais nunca constou nenhuma informação relativa à aplicação financeira relacionada com uma apólice de seguro do Luxemburgo;
· Apesar disso, os AA. nunca questionaram tal situação junto do R., sempre a tendo considerado como normal, o mesmo acontecendo quanto à circunstância de, ao longo de vários anos, nunca ter constado desse extracto a remuneração correspondente, já que o pagamento de juros do seguro de capitalização, a ter tido lugar, nunca se fez através do R., não sendo verosímil que, caso tivessem subscrito um seguro de capitalização comercializado pelo R., o pagamento do valor do investimento não fosse feito por débito na conta à ordem sediada no próprio R.;
· Os AA. não agiram com os deveres de cuidado e diligência a que estavam obrigados, como investidores esclarecidos, ainda que não profissionais, que são, ao terem entregue valores directamente à Ana P., e não ao R., e não se certificando que os valores entregues tinham sido canalizados para a concretização do investimento, para mais na medida em que esse investimento nunca constou dos extractos bancários que receberam mensalmente;
· A remuneração associada ao investimento nunca poderia ter sido seriamente considerada pelos AA., por constituir uma rentabilização cerca de quatro vezes superior ao que seria possível obter, à época, num depósito a prazo numa instituição bancária no espaço comunitário europeu.
Conclui pela improcedência da acção com a sua absolvição do pedido.
Em audiência prévia foi proferido despacho saneador, aí se fixando o valor da causa, mais se fixando o objecto do litígio e enunciando-se os temas da prova, sem reclamações.
Após realização da audiência final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo o R. do pedido.
Os AA. recorrem desta decisão final, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
A. O B. – Banco, S.A. é uma sociedade anónima que tem por objecto o exercício de actividades permitidas por lei aos Bancos.
B. No exercício da sua actividade, o Réu disponibiliza produtos de investimento e poupança onde se incluem, para além dos produtos financeiros tradicionais, como as contas à ordem remuneradas, depósitos a prazo e operações de crédito, cerca de 2000 fundos de investimento nacionais e internacionais, produtos estruturados, produtos fiscais, seguros e acesso em tempo real aos principais mercados bolsistas.
C. O Réu não tem balcões de atendimento ao público e funciona por via electrónica, por contacto telefónico, através de atendimento em centros de investimento e por contacto dos seus “Personal Financial Advisors”.
D. Os Autores aqui Recorrentes foram clientes do B. – Banco, S.A. desde Outubro de 2012, foram classificados como investidores não profissionais e, à data da abertura da conta junto deste, tinham disponível para investir uma quantia que rondava os € 90.000,00.
E. Desde o início da sua relação com o Réu e até 21.01.2016, os Autores sempre mantiveram contacto com o Banco através da Sra. Ana P., que os informou que todos e quaisquer assuntos relacionados com o Banco deveriam ser tratados directamente consigo, e apresentou tal procedimento como apanágio do serviço personalizado que o Réu praticava e publicitava.
F. Os Autores reuniram com Ana P., a pedido desta, num escritório sito no Edifício Castilho, Rua Castilho, 13D – 6.º E, em Lisboa, cujo espaço físico qualificaram como se de um balcão de um qualquer Banco convencional se tratasse, atendendo à placa na porta com referência “Banco B.”, exposição de prémios e louvores atribuídos pelo Banco B. à gestora de conta e possibilidade de realizar qualquer operação bancária com acesso ao sistema operativo do Banco, aí entregando valores pecuniários.
G. A Ana P. falou sempre com muita desenvoltura sobre aplicações, depósitos, seguros, fundos de investimento, PPR’s e outros instrumentos financeiros, tendo, em razão do domínio que demonstrou dessa área, convencendo os Recorrentes de que era uma excelente gestora de contas.
H. Logo na primeira reunião, Ana P. entregou aos Autores vários impressos e formulários do Réu, que estes preencheram segundo instruções da mesma destinados à aplicação de parte das poupanças de que dispunham num depósito a prazo e num seguro de capitalização.
I. À conta de depósito à ordem foi atribuído o n.º 92..., na qual foi imediatamente creditado o valor de € 75.000,00.
J. Por conselho de Ana P., os Autores realizaram uma aplicação de depósito a prazo, que deu origem à conta no valor de € 20.000,00, e um seguro de capitalização junto da sucursal do Luxemburgo da Companhia de Seguros Império, no montante de € 70.000,00.
K. O referido seguro, titulado pelo Autor Pedro F., foi apresentado como uma aplicação pelo período de um ano, renovável, e teve atribuído o número 30-6....
L. A entrega dos valores para as aplicações foi efectuada, quer por transferência bancária, quer pela entrega de cheques, quer ainda em numerário, sempre sob orientação directa da Ana P..
M. Ana P. ganhou a confiança dos Autores durante o período em que perdurou a relação entre si, assumindo a função de Personal Financial Advisor/Gestora de conta, tratando de todas as questões financeiras relacionadas com os investimentos dos Autores/Recorrentes, quer por telefone por e-mail, quer no escritório da Rua Castilho ou mesmo no edifício do Réu sito na Praça Marquês de Pombal, sempre convencendo os Autores de que estes eram a conduta e o procedimento de acompanhamento personalizado aos clientes, adoptados pelo Réu, eu nunca indicou qualquer outro contacto pessoal.
N. No seguimento da aludida reunião, os Autores/Recorrentes transferiram, no dia 23.10.2012, para a sua conta à ordem sedeada no Banco B., com o n.º 92..., a quantia de € 75.000,00, tendo ficado nos dias seguintes de proceder a novo depósito de € 15.000,00, a fim de serem realizados os propostos investimentos – conta a prazo no valor de € 20.000,00 e subscrição de seguro no valor de € 70.000,00.
O. No mesmo dia 23.10.2012, após concretização do depósito de € 75.000,00, a Ana P. contactou os Autores explicando-lhes que a subscrição do seguro teria de ser efectuada em numerário ou depósito, mas proveniente de outra conta bancária, uma vez que se tratava de um produto de boa rentabilidade e condições de resgate, e por isso não acessível à maioria dos clientes do Banco B., devendo ser de proveniência externa.
P. No dia 24.10.2012, e sob orientações expressas de Ana P., os Autores realizaram os seguintes movimentos a partir da referida conta à ordem: transferência de € 20.000,00 para criação da conta de depósito a prazo; levantamento ao balcão de € 20.000,00 pelo Autor/Recorrente; transferência de € 34.900,00 para conta titulada pela Autora/Recorrente na Caixa Geral de Depósitos com o n.º 0000020....
Q. No mesmo dia 24.10.2012, os Autores/Recorrentes entregaram em mão a Ana P. € 35.100,00 em dinheiro e 34.900,00 através de quatro cheques todos descontados da conta da CGD.
R. Os Autores/Recorrentes foram recebendo semestralmente em conta domiciliada no Banco B. a quantia de cerca de € 5.000,00, a título de remuneração em juros pela subscrição do seguro de capitalização.
S. No início de Abril de 2016, os Autores/Recorrentes tomaram conhecimento, por informações veiculadas por outros clientes do Banco B., de que a apólice de seguro da Império – Companhia de Seguros, S.A., sucursal no Luxemburgo, subscrita em 24.10.2012, se tratava de um documento forjado e essa aplicação, como outras semelhantes eram falsas.
T. Contactada a Império – Companhia de Seguros S.A., em Portugal e na sucursal do Luxemburgo, veio a confirmar-se que nunca existiu naquela instituição uma apólice de seguro contratada em nome do Autor aqui Recorrente.
U. Os Autores desconheciam que o seguro de capitalização da Império não era comercializado pelo Réu.
V. As pessoas colectivas respondem pela prática de actos ilícitos dos seus representantes, mandatários ou agentes, estando sujeitas ao regime legal da responsabilidade civil por facto de outrem, seja ela contratual ou extracontratual, com base risco, nos termos dos artigos 165.º, 500.º e 998.º, n.º 1 do Código Civil.
W. Tratando-se de entidade financeira o Banco B. vê-lhe aplicado o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras -Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, sucessivamente alterado pelos Decretos-Lei n.os 246/95, de 14 de Setembro, 232/96, de 5 de Dezembro, 222/99, de 22 de Junho, 250/00, de 13 de Outubro, 285/2001, de 3 de Novembro, 201/2002, de 26 de Setembro, 319/2002, de 28 de Dezembro, 252/2003, de 17 de Outubro, 145/2006, de 31 de Julho, 104/2007, de 3 de Abril, 357-A/2007, de 31 de Outubro, e 298/92, de 31 de Dezembro, analisando-se no caso concreto, em especial, os artigos 73º, 74º e 75º.
X. Por razões óbvias, as instituições bancárias estão sujeitas à disciplina do Banco de Portugal, constituindo a confiança um elemento essencial da respectiva actividade, pois só se aquela existir é que alguém confiará o seu dinheiro a uma instituição.
Y. Neste domínio remetemos para o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21‑11-2005, no qual se pode que “Se há domínio da vida de relação, que postula comportamentos confiáveis, um é, sem dúvida, o exercício da atividade bancária, dada não só a desproporção dimensional dos contraentes, como também as regras próprias do comércio bancário como o sigilo profissional, que entre outros factores impelem os clientes dos bancos a confiar em quem administra e guarda as suas aplicações”.
Z. Daí que não é lícito ao Réu Banco B. aqui Recorrido exonerar-se de responsabilidade, por prática de actos ilícitos praticados por uma sua funcionária/colaboradora/prestadora de serviços, desde que tal se emoldure no quadro do exercício profissional da sua atividade e exprima atuação ilícita – a responsabilidade é objetiva, prescindindo de culpa, com a obrigação de ressarcir os danos causados.
AA. Resultando fora de dúvidas de que estamos no âmbito da actividade bancária e financeira, e resultando provado que Ana P. exercia funções de “Agente Vinculado”, figura regulada no Código de Valores Mobiliários (CVM), constante do Decreto-Lei n.º 486/99 de 13.11, na sua última redação, há que interpretar e aplicar também tais disposições legais.
BB. Dispõe expressamente o artigo 294.º-A com epígrafe “Actividade do agente vinculado e respectivos limites”:
1 -O intermediário financeiro pode ser representado por agente vinculado na prestação dos seguintes serviços:
a) Prospecção de investidores, exercida a título profissional, sem solicitação prévia destes, fora do estabelecimento do intermediário financeiro, com o objectivo de captação de clientes para quaisquer actividades de intermediação financeira; e
b) Recepção e transmissão de ordens, colocação e consultoria sobre instrumentos financeiros ou sobre os serviços prestados pelo intermediário financeiro.
2 -A actividade é efectuada fora do estabelecimento, nomeadamente, quando:
a) Exista comunicação à distância, feita directamente para a residência ou local de trabalho de quaisquer pessoas, designadamente por correspondência, telefone, correio electrónico ou fax;
b) Exista contacto directo entre o agente vinculado e o investidor em quaisquer locais, fora das instalações do intermediário financeiro.
3 -No exercício da sua actividade é vedado ao agente vinculado:
a) Actuar em nome e por conta de mais do que um intermediário financeiro, excepto quando entre estes exista relação de domínio ou de grupo;
b) Delegar noutras pessoas os poderes que lhe foram conferidos pelo intermediário financeiro;
c) Sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 1, celebrar quaisquer contratos em nome do intermediário financeiro;
d) Receber ou entregar dinheiro, salvo se o intermediário financeiro o autorizar;
Receber ou entregar dinheiro, salvo se o intermediário financeiro o não autorizar;
e) Actuar ou tomar decisões de investimento em nome ou por conta dos investidores;
f) Receber dos investidores qualquer tipo de remuneração.
4 -Na sua relação com os investidores, o agente vinculado deve:
a) Proceder à sua identificação perante aqueles, bem como à do intermediário financeiro em nome e por conta de quem exerce a actividade;
b) Entregar documento escrito contendo informação completa, designadamente sobre os limites a que está sujeito no exercício da sua actividade.
CC. Ficou provado nos autos que Ana P. recebia dinheiro dos cliente com o conhecimento e consentimento do Banco, que disponibilizava envelopes específicos para tal operação, tendo sido também provado que não foi entregue aos Recorrentes qualquer documento escrito contendo informação completa designadamente sobre os limites a que estaria sujeita no exercício da sua actividade, cujo controlo deveria ser realizado pelo Banco aquando da validação da abertura de conta destes clientes.
DD. Dispõe o artigo 294.º-B com epígrafe “Exercício da actividade” que o exercício da actividade do agente vinculado depende de contrato escrito, celebrado entre aquele e o intermediário financeiro, que estabeleça expressamente as funções que lhe são atribuídas, designadamente as previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 294.º-A.
EE. Ana P. tinha um escritório que era do conhecimento do Banco, o qual está obrigado a controlar a idoneidade e experiência profissional de quem contrata para o representar.
FF. Atenda-se ainda ao artigo 294.º-C com epígrafe “Responsabilidade e deveres do intermediário financeiro”:
1 -O intermediário financeiro:
a) Responde por quaisquer actos ou omissões do agente vinculado no exercício das funções que lhe foram confiadas;
b) Deve controlar e fiscalizar a actividade desenvolvida pelo agente vinculado, encontrando-se este sujeito aos procedimentos internos daquele;
c) Deve adoptar as medidas necessárias para evitar que o exercício pelo agente vinculado de actividade distinta da prevista no n.º 1 do artigo 294.º-A possa ter nesta qualquer impacto negativo.
2 -Caso o intermediário financeiro permita aos agentes vinculados a recepção de ordens, deve comunicar previamente à CMVM:
a) Os procedimentos adoptados para garantir a observância das normas aplicáveis a esse serviço;
b) A informação escrita a prestar aos investidores sobre as condições de recepção de ordens pelos agentes vinculados.”
GG. O intermediário financeiro deve adoptar as medidas necessárias para evitar que o exercício pelo agente vinculado de actividade distinta da prevista possa ter nesta qualquer impacto negativo, respondendo por quaisquer actos ou omissões do agente vinculado no exercício das funções que lhe foram confiadas, devendo controlar e fiscalizar a actividade desenvolvida, o que manifestamente não fez!
HH. O que se poderá conformar como abuso de funções de Ana P. exerce-se num quadro funcional da atividade prosseguida pela instituição bancária, criando, por conseguinte, a convicção nos Autores/Recorrentes (lesados) de que o preposto está a agir no exercício da função que lhe foi confiada por não existir razão alguma que permita supor o contrário.
II. Há como refere Sofia Galvão “uma aparência social que leva a confiar que a atuação do comissário se desenrola por conta e sob autoridade do comitente” (Reflexões acerca da Responsabilidade do Comitente no direito Civil Português, edição da AFDL, 1990, pág. 126).
JJ. Dessa aparência resulta a “presunção de que o empregado bancário se conduz no âmbito dos poderes, não sendo comum, nem exigível que os clientes os confiram” (cfr. ainda Acórdão do STJ de 2-3-1999 – Pinto Monteiro – C.J., Ano VII, Tomo I, pág 127 e Acórdão do STJ de 25-10-2007 – Salreta Pereira-C.J., 3, pág. 116, revista n.º 3034/07 – 6.ª secção).
KK. Nem se compreende que assim não seja, uma vez aceite que as relações entre as pessoas se pautam pela boa-fé, baseada na confiança.
LL. Será de responsabilizar a pessoa coletiva pelos actos dos seus representantes, mandatários ou agentes, que, na perspectiva do lesado, tenham com as funções destes uma conexão adequada, uma vez que foi a pessoa colectiva que os escolheu.
MM. Não é necessário que o acto seja praticado rigorosamente no exercício da função, bastando que se integre no quadro geral da respectiva competência. De outra forma ficaria praticamente excluída a responsabilidade das pessoas coletivas, pois todo o facto ilícito envolve, em certo sentido, uma extralimitação daquela competência (vide Prof. Manuel de Andrade, “Das Obrigações em Geral, pág. 152, e Prof. Vaz Serra BMJ n.º 85, pág. 487 ss).
NN. Deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos de que foi incumbido, quer pela dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontra numa posição especialmente adequada à prática de tal facto, o que se verifica sem margem para dúvidas no caso concreto dos autos.
OO. Dentro deste entendimento, refere o Prof. Mota Pinto (Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição, pág. 323) que será legítimo responsabilizar uma sociedade por actos dolosos dos seus agentes, praticados em vista de fins pessoais, mas integrados formalmente no quadro geral da sua competência, se o agente aproveita uma aparência social que cria um estado de confiança (boa fé) do lesado na lisura do comportamento daquele, como acontece, por exemplo, no caso de o empregado de um banco, receber uma quantia de um particular para fins de investimento, com a intenção de a dissipar em proveito próprio.
PP. Sendo assim e porque se verifica também o pressuposto da responsabilidade do próprio comissário quanto à obrigação de indemnizar os Autores/Recorrentes, dado o seu comportamento doloso que violou o direito de outrem – artigo 483.º CC -tem de se aceitar estarem preenchidos todos os requisitos da responsabilidade civil do Banco B., como comitente, nos termos do citado artigo 500.º CC conjugado com o artigo 165.º CC, sendo concretamente neste ponto que a Sentença da qual se recorre violou a lei a aplicar.
QQ. Pretendendo-se salvaguardar a boa-fé de terceiros sempre que estejamos perante uma situação que, objectivamente e com base na aparência, faça pressupor que a situação exteriorizada corresponde à situação real, importa que sejam observados determinados requisitos, quer de natureza objectiva, quer de natureza subjectiva para o seu respeito.
 RR. Na primeira vertente, importa que estejamos perante uma situação de facto que seja rodeada de circunstâncias que nos sejam apresentadas como se de uma situação segura se tratasse e, bem assim, que tal situação de facto assim seja tratada e considerada de acordo com a ordem natural e normal das coisas.
SS. Na vertente subjectiva temos como requisito essencial que quem interpreta a situação de facto em função da aparência e não pela situação real se encontre em erro.
TT. A Personal Financial Advisor não propôs aos Autores/Recorrentes que investissem em qualquer tipo de produto estranho à actividade normalmente desenvolvida pelos Bancos. Se tivesse sido proposto um investimento cuja tipologia e características fosse exógena à actividade bancária, poder-se-iam justificar especiais cautelas ou reservas.
UU. Em resultado do primado da confiança como matriz dos negócios bancários, a relação comercial e contratual estabelecida entre os bancos e os seus clientes determina para a instituição bancária, por força da sua específica competência, uma verdadeira obrigação de acautelar os interesses do cliente em todas as matérias de natureza bancária e financeira, ressarcindo-o dos danos causados pelos actos do seu funcionário.
VV. O facto de o legislador atribuir competências, mas também responsabilidades, às instituições financeiras que não são extensíveis a todos os ramos de actividade decorre, justamente, da seriedade e confiança que necessariamente devem constituir requisitos da actividade bancária.
WW. O acto ilícito foi praticado não meramente por ocasião do exercício de funções, como entendeu o Tribunal a quo, qualificação que com o devido respeito consideramos errada e redutora, mas sim em abuso de funções. E isto porque, por definição, o abuso de funções implica o seu uso, ou seja, uma prática excessiva das suas próprias funções, o que manifestamente determina a existência de uma relação causal entre as funções do comissário e o facto danoso.
XX. O critério a seguir deverá ser a tutela da normalidade das funções do comissário, e nessa estrita medida a tutela das aparências perante o terceiro, eventualmente lesado.
YY. E nesse sentido parece claro que o apontado critério da adequação causal entre o facto danoso e as funções exercidas pelo comissário será o que melhor garante aquela tutela do terceiro.
ZZ. A Ana P. cometeu o acto ilícito no âmbito material das funções que lhe foram cometidas. Apresentou um produto financeiro aos Autores e não qualquer outro produto não financeiro. A actividade praticada tem relação directa com o exercício das funções que lhe competiam! Afigura-se evidente que existe nexo de causalidade adequada entre o facto praticado e a função da comissária. Afigura‑se evidente que existe nexo de causalidade adequada entre o facto praticado e a função da comissária.
AAA. Não é necessário que o acto seja praticado rigorosamente no exercício da função, bastando que se integre no quadro geral da respectiva competência. De outra maneira ficaria praticamente excluída - ou pouco menos - a responsabilidade das pessoas colectivas, pois todo o facto ilícito envolve, em certo sentido, uma extralimitação daquela competência, isto é, em sair para fora dela.
BBB. Entre os critérios que a doutrina tem enunciado para definir o nexo que - para se dizer que o acto foi praticado pelo comitido no exercício das funções que lhe foram confiadas - deve existir entre esse acto e a função, a doutrina tem indicado como meios precisos os dos chamados nexo local e temporal (ou seja, o de que o comitente responde por tal acto se praticado no lugar e no tempo dos serviços a cargo do comitido) e nexo instrumental (isto é, o de que aquele responde pelo acto se foi facilitado pelas funções do comitido, ou seja, pelos meios postos à sua disposição em consequência delas).
CCC. Aderimos à orientação que os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela (" Código Civil Anotado", vol. I, 4ª ed., pág. 509) entendem ser a preferível, nos termos da qual o comitente deve ser responsabilizado pelos factos ilícitos do comissário que tenham com as funções deste uma conexão adequada, aplicando aqui, num problema de responsabilidade pelo risco, a teoria da causalidade adequada. Assim, "sempre que as funções do comissário, segundo um critério de experiência, favoreçam ou aumentem o perigo da verificação de certo dano, deverá o comitente arcar com a respectiva responsabilidade. Por outras palavras: deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos a que foi incumbido, quer pela dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontra numa posição especialmente adequada à prática de tal facto”. Dentro deste entendimento, refere o Prof. Carlos Mota Pinto ("Teoria Geral do Direito Civil", 3ª ed., pág. 323) que será legítimo responsabilizar uma sociedade por actos dolosos dos seus agentes, praticados em vista de fins pessoais, mas integrados formalmente no quadro geral da sua competência, se o agente aproveita uma aparência social que cria um estado de confiança (boa fé) do lesado na lisura do comportamento daquele, como acontece, por ex., no caso de o empregado dum banco, sem poderes suficientes, receber uma quantia dum particular para fins de investimento, com a intenção de a dissipar em proveito próprio.
DDD. Constituindo o objecto do litígio apurar o direito dos Autores/Recorrentes a serem ressarcidos pelo Banco Réu/Recorrido, nos montantes peticionados a título de responsabilidade objectiva ou pelo risco nos termos dos artigos 499.º e 500.ºdo Código Civil, dúvidas não subsistem quanto ao preenchimento dos requisitos de aplicação do artigo.
EEE. Estão preenchidos os três pressupostos da responsabilidade objectiva versada no artigo 500.º do Código Civil – a existência do vínculo entre Ana P. e o Banco B.; ter sido praticado o facto ilícito no exercício da função; e haver responsabilidade do próprio agente.
Pela R. foi apresentada alegação de resposta, aí concluindo pela improcedência do recurso.
***
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Novo Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem‑se:
a) Com a alteração da matéria de facto;
b) Com a verificação da responsabilidade do R. no ressarcimento aos AA. dos montantes entregues pelos mesmos a Ana P.
***
A sentença recorrida considerou como provada a seguinte matéria de facto:
1. Os AA. são casados entre si.
2. O R. é uma sociedade anónima que tem por objecto o exercício de actividades permitidas por lei aos Bancos.
3. No exercício da sua actividade o R. disponibiliza produtos de investimento e poupança onde se incluem, para além dos produtos financeiros tradicionais, como as contas à ordem remuneradas, depósitos a prazo e operações de crédito, cerca de 2000 fundos de investimento nacionais e internacionais, produtos estruturados, produtos fiscais, seguros e acesso em tempo real aos principais mercados bolsistas.
4. O R. não tem balcões de atendimento ao público e funciona por via electrónica, por contacto telefónico, através de atendimento em centros de investimento e por contacto dos seus “Personal Financial Advisors”.
5. Os AA. são clientes do R. desde Outubro de 2012, foram classificados como investidores não profissionais e, à data da abertura da conta junto deste, tinham disponível para investir uma quantia que rondava os € 90.000,00.
6. Desde o início da sua relação com o R., e até 21/1/2016, os AA. sempre mantiveram contacto com o Banco através da Sra. Ana P., que os informou que todos e quaisquer assuntos relacionados com o Banco deveriam ser tratados directamente consigo, e apresentou tal procedimento como apanágio do serviço personalizado que o Réu praticava.
7. Os AA. reuniram com Ana P., a pedido desta, num escritório sito no Edifício Castilho, Rua Castilho, 13D – 6ºE, em Lisboa.
8. Nessa reunião, a Ana P. falou sempre com muita desenvoltura sobre aplicações, depósitos, seguros, fundos de investimento, PPR’s e outros instrumentos financeiros, tendo, em razão do domínio que demonstrou dessa área, ganho a confiança dos AA. nos seus bons ofícios.
9. Nessa mesma reunião, Ana P. entregou aos AA. vários impressos e formulários do R., que estes preencheram segundo instruções da mesma, destinados à aplicação de parte das poupanças de que dispunham num depósito a prazo e num seguro de capitalização.
10. À conta de depósito à ordem foi atribuído o n.º 92..., na qual foi imediatamente creditado o valor de € 75.000,00.
11. Por conselho de Ana P., os AA. realizaram uma aplicação de depósito a prazo, que deu origem à conta no valor de € 20.000,00, e um seguro de capitalização junto da sucursal do Luxemburgo da Companhia de Seguros Império, no montante de € 70.000,00.
12. O referido seguro, titulado pelo A. Pedro F., foi apresentado como uma aplicação pelo período de um ano, renovável, e teve atribuído o número 30-6....
13. A entrega dos valores para as aplicações foi efectuada, quer por transferência bancária, quer pela entrega de cheques, quer ainda em numerário, sempre sob orientação directa da Ana P.
14. Ana P. ganhou a confiança dos AA. durante o período em que perdurou a relação entre si, pois sempre se manifestou disponível para tratar de todas as questões financeiras relacionadas com os seus investimentos, quer por telefone ou por e‑mail, quer no seu escritório da Rua Castilho ou no edifício do R. sito na Praça Marquês de Pombal, sempre convencendo os AA. de que estes eram a conduta e o procedimento de acompanhamento aos clientes, adoptados pelo R.
15. O escritório de Ana P., no edifício Castilho, tinha em exposição prémios e louvores atribuídos pelo R. àquela.
16. No seguimento da reunião aludida em 9., os AA. transferiram, em 23/10/2012, para a referida conta à ordem do R., com o n.º 92..., a quantia de € 75.000,00, tendo ficado nos dias seguintes de proceder a novo depósito de e 15.000,00, a fim de serem realizados os propostos investimentos – conta a prazo no valor de € 20.000,00 e subscrição de seguro no valor de € 70.000,00.
17. No mesmo dia 23/10/2012, após concretização do depósito de € 75.000,00, a Ana P. contactou os AA., explicando-lhes que a subscrição do seguro teria de ser efectuada em numerário ou depósito, mas proveniente de outra conta bancária, uma vez que se tratava de um produto de boa rentabilidade e condições de resgate, e por isso não acessível à maioria dos clientes do R.
18. Mais os informou que, para lhes serem concedidas outras condições especiais sobre novas aplicações que pudessem vir a subscrever, a primeira aplicação teria de ser de proveniência externa às contas tituladas pelos clientes do R., e não de conta já existente e registada no sistema operativo.
19. Em 24/10/2012, e sob orientações expressas de Ana P., os AA. realizaram os seguintes movimentos, a partir da conta à ordem referida em 10.:
· Transferência de € 20.000,00 para criação da conta de depósito a prazo aludida em 11.;
· Levantamento ao balcão de € 20.000,00 pelo A. marido;
· Transferência de € 34.900,00 para conta titulada pela A. mulher na Caixa Geral de Depósitos com o n.º 0000020....
20. No mesmo dia 24.10.2012, os AA. entregaram em mão à Sra. Ana P. € 35.100,00 em dinheiro e € 34.900,00 através de quatro cheques, todos descontados da conta da CGD titulada pela Autora mulher, concretamente, o cheque n.º 515..., no valor de € 11.200,00, o cheque n.º 425..., no valor de € 9.000,00, o cheque n.º 245..., no valor de € 5.900,00, e o cheque n.º 335..., no valor de € 8.800,00.
21. Tendo os AA. estranhado este procedimento e questionado a Ana P., esta referiu ser uma situação normal e que os valores inferiores a € 12.000,00 não exigiam quaisquer justificações bancárias, assim se minimizando os incómodos com a realização dessa operação de investimento.
22. Os AA. foram recebendo semestralmente em conta diferente da domiciliada no R. a quantia de cerca de € 5.000,00 a título de remuneração em juros pela subscrição do seguro de capitalização.
23. A relação contratual dos AA. com o R. foi ao longo dos anos quase sempre mantida através de e-mail, telefone ou no escritório de Ana P. no edifício Castilho.
24. Os AA. apenas se dirigiriam à sede do R. em situações pontuais, como aconteceu para execução de uma transferência, em Outubro de 2014, no valor de € 20.000,00 da sua conta pessoal para a conta da empresa da qual são sócios e, em finais de 2013, aquando da liquidação de um empréstimo que haviam contratualizado junto do R. ainda no final do ano anterior.
25. Em 21/1/2016 os AA. foram contactados telefonicamente por João G., o qual os informou que a Sra. Ana P. tinha deixado de ser Personal Financial Advisor deles, por ter saído do Banco, passando este doravante a ocupar a posição daquela, tendo os AA. recebido, no seguimento desse telefonema, um e‑mail confirmativo dessa alteração, no qual o mesmo João G. se apresentou como novo “PFA – Personal Financial Advisor” e disponibilizava todos os seus contactos.
26. No início de Abril de 2016 os AA. tomaram conhecimento, por informações veiculadas por outros clientes do R., que a apólice de seguro da Império – Companhia de Seguros, S.A., sucursal no Luxemburgo, subscrita em 24/10/2012, se tratava de um documento forjado e essa aplicação, como outras semelhantes, eram falsas.
27. Tal como é também falsa toda a documentação comprovativa do investimento realizado.
28. Contactada a Império – Companhia de Seguros, S.A., em Portugal e na sucursal do Luxemburgo, o A. veio a confirmar que nunca existiu naquela instituição uma apólice de seguro contratada em nome deste.
29. Os AA. desconheciam que o seguro de capitalização da Império não era comercializado pelo R.
30. A Sra. Ana P. tinha acesso e conhecimento das contas bancárias dos AA.
31. Consta do documento que titula a apólice de seguro subscrita pelos AA., além do mais, o seguinte: “CLAUSE PARTICULIERE: Les Taux d’interêt est de 8%”.
32. A Sra. Ana P. celebrou com o R., com data de 27/6/2002, um acordo escrito denominado “Contrato de Prestação de Serviços – Promotores/Prospectores”.
33. Em data não concretamente apurada, a Ana P. tinha um cartão atribuído pelo R. com a seguinte identificação no rosto: “M. P. Promotor”.
34. Ana P. assinou e remeteu ao R., e este recebeu, a carta datada de 15.01.2016 com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido, cf. cópia de fls. 69v.: “Assunto: Rescisão Contratual – Agente Vinculado”.
35. Ana P. nunca solicitou ao R. qualquer autorização para exercer actividade de promoção dos serviços e produtos daquele em instalações abertas ao público, mas podia fazê-lo em lugares públicos, em sua própria casa ou na casa/escritório das pessoas alvo da promoção.
36. Foi por intermédio da Sra. Ana P., que os AA. conheciam previamente, que estes se vieram a tornar clientes do R.
37. Os AA. são ambos licenciados e com experiência empresarial.
38. Os extractos bancários integrados emitidos mensalmente pelo R. apresentam, na primeira página, o “Resumo do Património Financeiro”, o qual contém sempre as seguintes rubricas: Activos, Outros Activos e Passivos.
39. Na rubrica Activos, constam as modalidades dessa categoria que tendem a abranger todos os possíveis activos detidos pelos clientes.
40. Entre 24/10/2012 e 31/7/2016 os AA. apenas tiveram no R. os seguintes activos: depósitos à ordem, depósitos a prazo e fundos de investimento.
41. No mesmo documento e rubrica “activos”, na modalidade do activo “seguros”, essa modalidade aparece, em todos os extractos, a zero.
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A sentença recorrida considerou como não provada a seguinte matéria de facto:
a) Que Ana P. fosse funcionária do R. (artigo 7º da P.I.);
b) Que o escritório do Edifício Castilho, na Rua Castilho, em Lisboa, fosse uma dependência do R. (artigo 9º da p.i.);
c) Que Ana P. fosse gestora de conta dos AA. (artigo 21º da p.i.);
d) Que os AA. tenham feito entregas de capital em cheque e numerário, para realização das aplicações contratualizadas, directamente à Sra. Ana P. por a organização inovadora do R. colocar à disposição dos seus clientes uma rede de Personal Financial Advisors (artigo 27º da p.i.);
e) Que os juros do contrato de seguro subscrito pelos AA. tenham sido sendo creditados semestralmente na conta destes sedeada no R. (artigo 38º da p.i.);
f) Que Marília C. tivesse sido apresentada aos AA. na qualidade de superior hierárquica de Ana P. (artigo 42º da p.i.);
g) Que os extractos bancários do R. enviados mensalmente por correio aos Autores evidenciassem o depósito dos juros de capitalização do seguro vencidos semestralmente (artigo 43º da p.i.);
h) Que o R. tenha revelado aos AA., em final de Abril de 2016, perante os contactos e insistências destes, que a Ana P. tinha sido alvo de procedimento disciplinar com vista ao despedimento (artigo 56º da p.i.);
i) Que a Sra. Ana P. em momento algum tivesse referido que a mencionada apólice de seguro não era um produto financeiro colocado em comercialização pelo R. (artigo 78º da p.i.).
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Da alteração da matéria de facto
Decorre da conjugação dos art.º 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 640º, nº 1 e 2, todos do Novo Código de Processo Civil, que quem impugna a decisão da matéria de facto deve, nas conclusões do recurso, especificar quais os pontos concretos da decisão em causa que estão errados e, ao menos no corpo das alegações, deve, sob pena de rejeição, identificar com precisão quais os elementos de prova que fundamentam essa pretensão, sendo que, se esses elementos de prova forem pessoais, deverá ser feita a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda o recurso (reforçando a lei a cominação para a omissão de tal ónus, pois que repete que tal tem de ser feito sob pena de imediata rejeição na parte respectiva) e qual a concreta decisão que deve ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.
A respeito do disposto no referido nº 1 do art.º 640º do Novo Código de Processo Civil, refere Abrantes Geraldes (in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 126 a 129):
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) (…)
d) O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou incongruente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto”.
E, mais adiante, afirma a rejeição, total ou parcial, do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto”, designadamente quando se verifique a “falta de especificação, nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados”, bem como quando se verifique a “falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”, concluindo que a observância dos requisitos acima elencados visa impedir “que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”.
Por outro lado, e impondo-se a especificação dos pontos concretos da decisão que estão erradamente julgados, bem como da concreta decisão que deve ser tomada quanto aos factos em questão, há-de a mesma reportar-se, em primeira linha, ao conjunto de factos alegados pelas partes, quer os que constituem a causa de pedir, quer aqueles que sustentam as excepções invocadas (e sem prejuízo do disposto no nº 2 do art.º 5º do Novo Código de Processo Civil).
Ou seja, é no confronto do elenco de factos provados e não provados com os factos alegados pelas partes que o recorrente que pretende impugnar a decisão relativa à matéria de facto deve dar cumprimento à exigência de especificação acima referida, indicando cada um dos concretos pontos de facto que, sendo integrantes da causa de pedir ou de cada uma das excepções alegadas, mereciam decisão diversa daquela tomada pelo tribunal recorrido, e sob pena de rejeição dessa impugnação.
Revertendo tais considerações para o caso concreto, constata-se que os AA. não cuidaram de cumprir o referido ónus de especificação a que aludem as al. a) e c) do nº 1 do art.º 640º do Novo Código de Processo Civil.
Com efeito, desde a conclusão acima identificada pela letra A. até à conclusão acima identificada pela letra U., os AA. limitam-se a alegar factos, sendo aqueles que constam das conclusões A. a F. (com exclusão das expressões “cujo espaço físico qualificaram como se de um balcão de um qualquer Banco convencional se tratasse, atendendo à placa na porta com referência “Banco B.”, e “possibilidade de realizar qualquer operação bancária com acesso ao sistema operativo do Banco, aí entregando valores pecuniários”), H. a M. (com exclusão das expressões “assumindo a função de Personal Financial Advisor/Gestora de conta” e “nunca indicou qualquer outro contacto pessoal”), N. a R. (com excepção da expressão “em conta domiciliada no Banco B.”), e S. a U. a mera reprodução dos factos que foram considerados como provados na sentença recorrida.
E, em relação a estes factos provados, os AA. não especificam se os mesmos devem ser dados como não provados, ou mesmo se devem ser dados como provados com outra formulação.
Já na conclusão CC. os AA. afirmam estar provado que:
· Ana P. recebia dinheiro dos clientes com o conhecimento e consentimento do R., que disponibilizava envelopes específicos para tal operação;
· Não foi entregue aos AA. qualquer documento escrito contendo informação completa, designadamente sobre os limites a que estaria sujeita (Ana P.) no exercício da sua actividade.
E em G. e EE. concluem factualmente que:
· Ana P. falou sempre com muita desenvoltura sobre aplicações, depósitos, seguros, fundos de investimento, PPR’s e outros instrumentos financeiros, tendo, em razão do domínio que demonstrou dessa área, convencendo os Recorrentes de que era uma excelente gestora de contas;
· Ana P. tinha um escritório que era do conhecimento do R.
Relativamente a estas três conclusões, as mesmas não correspondem a qualquer factualidade que tenha sido dado como provada na sentença recorrida. Mas também não correspondem a qualquer factualidade que tenha sido dado como não provada. E das restantes conclusões (ou mesmo do corpo da alegação dos AA.) não decorre a razão de ser da inclusão das três referidas alegações de facto, nas conclusões da alegação de recurso.
Do mesmo modo, relativamente às expressões factuais acima citadas (incluídas em F., M. e R.), apenas as referentes à posição de Ana P. como gestora da conta dos AA., e ao recebimento semestral em conta domiciliada no R. da quantia de cerca de € 5.000,00, correspondem a matéria de facto não provada (al. c) e e) dos factos não provados).
Mas em relação a estas duas questões de facto, também não dão os AA. cumprimento ao ónus de especificação que decorre dos nº 1 e 2 do art.º 640º do Novo Código de Processo Civil, desde logo porque não sintetizam nas conclusões apresentadas que tal matéria de facto não podia ser dada como não provada, faltando igualmente a expressão da factualidade que deveria ser dada como provada.
Aliás, tal síntese mostra-se tanto mais necessária quanto consta do ponto 22. dos factos provados que “Os AA. foram recebendo semestralmente em conta diferente da domiciliada no R. a quantia de cerca de € 5.000,00 a título de remuneração em juros pela subscrição do seguro de capitalização”. O que está em oposição com a afirmação do recebimento dessa quantia na conta domiciliada na R. Pelo que a afirmação desse recebimento só poderia fazer sentido como impugnação da matéria de facto na medida em que os AA. tivessem especificado que pretendiam que a factualidade constante do referido ponto 22. fosse considerada como não provada (o que não fizeram).
Assim, na medida em que os AA. não deram cumprimento aos preceitos legais acima mencionados, não fazendo constar das conclusões da sua alegação os pontos concretos da matéria de facto que estariam mal decididos e qual a concreta decisão que deveria ser tomada quanto aos mesmos, há lugar à rejeição imediata do recurso, nesta parte, assim se mantendo a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto.
***
Da verificação da responsabilidade do R. no ressarcimento aos AA. dos montantes entregues pelos mesmos a Ana P.
A decisão recorrida sustenta a improcedência da acção nos seguintes termos:
Ressalta para o caso, naturalmente, o regime da responsabilidade do comitente, consagrado no artigo 500º: aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar. Tratando-se de uma responsabilidade pelo risco, de nada adianta, por exemplo, a prova de que o comitente tenha agido sem culpa ou que os danos se teriam igualmente registado, ainda que não houvesse actuação culposa da sua parte.
A questão fulcral nos autos é, pois, a de caracterizar a ligação existente entre o Réu e a Sra. Ana P. – já que foram os actos a esta imputáveis, culposos, que causaram dano aos Autores.
Resulta fora de dúvidas que estamos no âmbito da actividade bancária e financeira, tendo resultado provado que aquela pessoa exercia funções de “agente vinculado”, uma figura regulada no Código de Valores Mobiliários (CVM), constante do DL 486/99 de 13.11, que sofreu várias alterações, entre as quais as introduzidas pelo DL 357-A/2007 de 31.10 a qual, para além do mais, transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva nº2004/39/CE relativa aos mercados de instrumentos financeiros, DMIF, visando a harmonização da legislação europeia sobre a criação de mercado único europeu de serviços financeiros. Assim, o artigo 294º-A deste Código consagra esta figura como um representante de um intermediário financeiro para (i) a prestação dos serviços de prospecção profissional de investidores, sem solicitação prévia destes, fora do estabelecimento do intermediário financeiro, bem como (ii) a recepção e transmissão de ordens, colocação e consultoria sobre instrumentos financeiros ou sobre os serviços prestados pelo intermediário financeiro. Consta definido pela própria Comissão de Mercado de Valores Mobiliários como «uma pessoa, singular ou colectiva, não integrada na estrutura organizativa de um intermediário financeiro, mas que, actuando em nome e por conta daquele, presta serviços aos investidores procurando angariá-los para determinados instrumentos financeiros ou actividade de intermediação financeira prosseguidos pelo intermediário financeiro perante o qual mantém um vínculo, designadamente o da recepção e transmissão de ordens, colocação de instrumentos financeiros e prestação de consultoria para investimento.»
 (…)
Aqui chegados, cumpre verificar se o Réu, enquanto intermediário financeiro ao serviço do qual o agente vinculado se encontrava, deve ou não ser responsabilizado pelos seus actos, em termos em tudo semelhantes à clássica responsabilidade do comissário face aos actos do comitente.
(…)
De facto, a responsabilidade do intermediário financeiro (tal como o clássico comitente) só existe em relação aos actos compreendidos no quadro geral da competência ou dos poderes conferidos ao agente vinculado, em relação aos factos danosos praticados por este no exercício da função que lhe foi confiada; mas não significa que não sejam da responsabilidade do primeiro os actos praticados por este último com abuso de funções ou contra as instruções – ou seja, os actos formalmente compreendidos no âmbito da comissão, mas praticados com um fim estranho a ela.
O que há a saber é, portanto, se os ilícitos – criminais – em que se traduziu a conduta da Ana P. (falsificando documentos, burlando os clientes do banco), foram cometidos no exercício/âmbito da função que lhe estava cometida e não por ocasião de tal função.
(…)
Preenchem, pois, este requisito os actos praticados pelo comissário «no quadro geral da competência ou dos poderes do dito comissário, que pertençam ao quadro da actividade adoptada para realizar o fim da comissão e que tenham sido praticados com o agenda da sociedade agindo em tal veste ou qualidade, isto é, por causa das suas funções.»
E é aqui que chegamos a uma resposta negativa à questão acima colocada.
Com efeito, percorrendo a factualidade provada, devemos concluir, em primeiro lugar, que a Ana P. agiu muito para além do âmbito funcional da sua actividade – desde logo, praticando actos que estão por lei vedados ao agente vinculado; por isso, nem sequer formalmente a sua conduta se poderia compreender no âmbito da sua actividade. Em segundo lugar, e atenta aquela primeira conclusão, a Ana P. aproveitou-se da sua posição, perante o Banco Réu e os clientes deste (entre os quais os ora Autores) para conseguir para si benefícios, apropriando-se de valores destes a coberto do seu vínculo ao banco – torna-se claro, portanto, que esta agiu não por causa das suas funções, mas apenas por ocasião de tais funções.
Por isso se deve concluir que não estão incluídos na relação de comissão aqueles actos do comissário que, «praticados no lugar ou no tempo em que é executada a comissão, nada tenham com o desempenho desta, a não ser porventura a circunstância de o agente aproveitar as facilidades que o exercício da comissão lhe proporcionava para consumar o acto.» Isto significa que «a lei abrange unicamente os actos ligados ao serviço, actividade ou cargo, embora exista apenas um nexo instrumental, excluindo os praticados por ocasião da comissão com um fim ou interesse que lhe seja estranho».
Ora, por muito que os Autores tivessem tentado demonstrar que, pelo menos aparentemente, a Ana P. agia como funcionária do Banco (que nunca foi, como estes tinham obrigação de saber) e no âmbito das suas funções, o certo é que a prova feita nos autos foi em sentido contrário. Na verdade, apurou-se que aquela pessoa agiu em violação clara do seu estatuto legal, muito para além do âmbito legal aí definido e totalmente à margem do banco, em seu próprio benefício ilícito, “vendendo” aos seus clientes uma apólice de seguro inexistente, apresentando‑lhes documentos falsificados, solicitando-lhes a entrega de valores à margem da conta aberta no Réu e entregando-lhes supostos rendimentos de tal investimento que nunca vieram expressos nos extractos bancários enviados mensalmente pelo mesmo Réu – tudo isto, sem que os Autores alguma vez tivessem questionado o Réu sobre a regularidade desses procedimentos, confiando apenas na própria Ana P. como sendo pessoa totalmente idónea a tomar todas as decisões sobre o destino dos seus investimentos.
A isto acrescentamos uma outra ideia: é que, independentemente do grau de vinculação ao Réu, por parte da Ana P., que os Autores pudessem ter demonstrado, era-lhes exigível, face ao seu grau de preparação e habilitações, bem como aos elementos objectivos de que na ocasião já dispunham, por em causa a actuação daquela pessoa, designadamente, interpelando o próprio Banco e aí procurando esclarecimentos. Não o fizeram, por razões que para o efeito não relevam; mas era exigível outra diligência e outro cuidado.
Tudo ponderado, concluímos que o Banco Réu não pode ser responsabilizado, ainda que objectivamente, pelos danos produzidos na esfera jurídica dos Autores, pelo que a acção é improcedente”.
Não se discute que a actuação de Ana P. configura uma actuação ilícita e culposa, geradora da obrigação de indemnizar os AA. pelos prejuízos a estes causados (correspondentes à perda de € 70.000,00).
Nem se discute tão pouco a ligação contratual entre a referida Ana P. e o R., de onde decorre que a primeira passou a exercer funções de agente vinculado para o segundo.
Mas já se discute em que medida é que a conexão entre a referida ligação contratual e os actos ilícitos praticados pela Ana P. conduz o R. a responder pelos danos causados aos AA.
Decorre do art.º 293º, nº 1, al. a) do Código dos Valores Mobiliários (CVM) que o R., enquanto instituição de crédito, está autorizado a exercer a actividade de intermediário financeiro.
E do art.º 294º-A do CVM decorre que pode o mesmo ser representado por agente vinculado na prestação dos serviços aí elencados, designadamente na prospecção e captação de clientes para a actividade de intermediação financeira e na recepção e transmissão de ordens.
Ou seja, o agente vinculado actua como representante do intermediário financeiro (no caso concreto, o R.), sendo este responsável por quaisquer actos ou omissões do agente vinculado no exercício das funções que lhe foram confiadas (al a) do nº 1 do art.º 294º‑C do CVM), e estando obrigado a controlar e fiscalizar a actividade desenvolvida pelo agente vinculado, adoptando as medidas necessárias para evitar que o exercício pelo agente vinculado de actividade distinta daquela prevista no nº 1 do art.º 294º-A possa ter nesta qualquer impacto negativo (al. b) e c) do mesmo nº 1 do art.º 294º-C).
No preâmbulo do D.L. 357-A/2007, de 31/10 (que alterou o CVM, aditando-lhe os art.º 294º-A a 294º-C, relativos à figura do agente vinculado) pode ler-se (com sublinhado nosso) que “No âmbito das entidades que exercem actividades de intermediação financeira, é consagrado um novo regime aplicável a agentes vinculados, que em comparação com o actual regime da actividade de prospecção, se caracteriza pelo potencial alargamento das funções abrangidas, pela admissibilidade de pessoas colectivas, adoptando a forma societária, exercerem esta actividade e pela aplicabilidade deste regime a todos aqueles que pretendam exercer tal actividade, em nome de intermediário financeiro sedeado em Portugal (…)”.
Ou seja, na relação entre o intermediário financeiro e o agente vinculado, este actua em nome e em representação daquele, sujeitando-se ao controlo e fiscalização da sua actividade por parte do intermediário financeiro, e tendo de se sujeitar às medidas que lhe forem impostas por este último, destinadas a assegurar que a sua actividade de agente vinculado do intermediário financeiro não se desvia daquela que a lei lhe possibilita. E, por seu lado, o intermediário financeiro responde pelos actos e omissões do seu agente vinculado, quanto ao exercício das funções que lhe confiou.
Do mesmo modo, decorre do art.º 165º do Código Civil que as pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários, nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários.
E o art.º 500º do Código Civil dispõe que aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar.
Na anotação a este preceito legal (Código Civil Anotado de Pires de Lima e Antunes Varela, vol. I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra, 1987, pág. 507-510) esclarece-se que “a objectividade da responsabilidade lançada sobre o comitente traduz-se, praticamente, em ela não depender de qualquer culpa (dolo ou negligência) na escolha do comissário, nas instruções que a este tenham sido dadas ou na fiscalização do exercício da comissão”. E mais se esclarece que “o termo comissão não tem aqui o sentido técnico, preciso, que reveste nos artigos 266º e seguintes do Código Comercial, mas o sentido amplo de serviço ou actividade realizada por conta e sob a direcção de outrem, podendo essa actividade traduzir-se num acto isolado ou numa função duradoura, ter carácter gratuito ou oneroso, manual ou intelectual, etc”, sendo que “a comissão pressupõe uma relação de dependência entre o comitente e o comissário, que autorize aquele a dar ordens ou instruções a este. Só essa possibilidade de direcção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos actos do segundo”.
Todavia, e porque do nº 2 do mesmo art.º 500º decorre que “a responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada”, a referida doutrina ensina que “o comitente não responde por actos do comissário que não tenham qualquer nexo com a sua comissão”.
Sendo que, para caracterizar o grau de conexão em questão, esclarece a mesma doutrina que “a orientação preferível consistirá, pois, em responsabilizar o comitente pelos factos ilícitos do comissário que tenham com as funções deste uma conexão adequada. Trata-se, afinal, de aplicar, também aqui, num problema de responsabilidade pelo risco, a teoria da causalidade adequada. Sempre que as funções do comissário, segundo um critério de experiência, favoreçam ou aumentem o perigo de verificação de certo dano, deverá o comitente arcar com a respectiva responsabilidade.
Por outras palavras: deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos de que foi incumbido, quer pela dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontre numa posição especialmente adequada à prática de tal facto”.
E, por último, na anotação em questão ensina-se ainda que “a nota mais característica da situação do comitente é a sua posição de garante da indemnização perante o terceiro lesado, e não a oneração do seu património com um encargo definitivo”, tendo presente que, à face do no nº 3 do mesmo art.º 500º do Código Civil “ele goza, em princípio, do direito de regresso contra o comissário, para se ressarcir de quanto haja pago”.
Ainda no que respeita à interpretação jurisprudencial do nº 2 do art.º 500º do Código Civil, afirma-se no acórdão do S.T.J. de 15/1/1992 (relatado por Cabral de Andrade e disponível em www.dgsi.pt):
Com esta fórmula - diz o Prof. Antunes Varela – quis a lei afastar da responsabilidade do comitente os actos que apenas têm um nexo temporal ou local com a comissão (Das obrigações em Geral, 2 ed., I, págs. 518).
Não basta, com efeito, um mero nexo local ou cronológico, externo ou incidental, entre o facto e a comissão, sendo necessária uma relação directa, interna, causal, isto é, que o facto seja praticado no desempenho da função, por causa dela e não apenas por ocasião dela (cf. Manuel de Andrade, Teoria Geral, I, pags. 151).
Assim, se os actos não se inserem no esquema do exercício da função, não há responsabilidade do comitente, mas ela verificar-se-á se os actos se mostrarem ligados à função por um nexo instrumental, desde que compreendidos nos poderes de que o comissário goza no exercício da comissão.
São, assim, da responsabilidade do comitente os actos praticados com abuso de funções, isto é, os actos formalmente compreendidos no âmbito da comissão, mas praticados com um fim estranho a ela - cf. A. Varela, ob. e vol. cit., págs. 519”.
Igualmente se afirma no acórdão do S.T.J. de 15/3/2005 (relatado por Nuno Cameira e disponível em www.dgsi.pt), relativamente à interpretação do mesmo preceito legal: “O que se retira da conjugação destes textos é que a relação de comissão exigida pela lei - comissão em sentido, muito amplo, de actividade levada a cabo no interesse e por conta de outrem, e não na acepção prevista no artº 266º do
Código Comercial - não fica afastada pela circunstância, aqui provada, de o segundo réu prestar serviços à primeira ré como economista, em regime de profissão liberal. Perante os autores, terceiros lesados, isso não releva, pois a responsabilidade de que se trata é objectiva, só funcionando em tais termos precisamente na relação externa; internamente (relação comitente/comissário), como está claro no nº 3 do artº 500º, pode o comitente exigir do comissário o reembolso de tudo o que tiver pago, salvo se ele próprio tiver culpa, caso em que se aplicará o regime da pluralidade de responsáveis pelo dano (artº 497º, nº 2). Decisivo e imprescindível é que o facto danoso tenha sido praticado no exercício da função confiada e que exista um nexo entre aquele e esta, pontos estes que, sem qualquer dúvida, estão comprovados na situação ajuizada, e bastam para configurar a relação de comissão. O artº 500º do CC não exige uma relação de dependência entre o comitente e o comissário como condição da responsabilidade do primeiro. Seria, parece, incoerente e ilógica semelhante exigência quando é certo que, como se deduz do referido nº 2, a responsabilidade objectiva do comitente subsiste mesmo que o comissário aja intencionalmente ou contra as suas instruções. De resto, desde que limitadas ao resultado a alcançar, as ordens ou instruções, por si só, não desfiguram o contrato de prestação de serviços, nem o transformam numa realidade jurídico negocial diversa
”.
E no acórdão do S.T.J. de 26/3/2014 (relatado por Souto de Moura e disponível em www.dgsi.pt) vem também afirmado:
A jurisprudência e doutrina têm-se debruçado sobre o sentido da expressão "no exercício da função que lhe foi confiada" e existe consenso sobre a exclusão de responsabilidade do comitente, em casos de atuação ilícita e danosa do comissário, simplesmente conexionada local e temporalmente com o exercício de funções. Também não tem merecido acolhimento a exigência de que a atuação do comissário se tenha desenrolado no interesse do comitente. Importante será, então, que o comportamento danoso tenha sido levado a cabo, fazendo uso, o comissário, dos meios colocados à sua disposição pelo comitente. Assim se aderindo a um critério instrumental para apuramento da responsabilidade do comitente.
É evidente que todo o ato ilícito pressupõe um exorbitar das funções que estão cominadas ao comissário. Caso contrário, haveria conluio entre o comitente e o comissário para a prática do ato ilícito, e a responsabilidade daquele deslocar-se-ia para o domínio da culpa, esvaziando-se por completo a possibilidade de incorrer em responsabilidade objetiva. Só que esse exorbitar das funções confiadas não implica a incompatibilidade com a prática no exercício das funções. Basta que, nas palavras de A. Varela, haja uma "conexão adequada" entre o ato ilícito danoso e a função. Explicitando o seu ponto de vista, este autor refere (in "Das Obrigações em geral", vol. I, 7.ª edição, pág. 637 e seg.):
"Com a fórmula restritiva adoptada, a lei quis afastar da responsabilidade do comitente os actos que apenas têm um nexo temporal ou local com a comissão.
Mas acentuando ao mesmo tempo que a responsabilidade do comitente subsiste, ainda que o comissário proceda intencionalmente ou contra as instruções dele, mostra-se que houve a intenção de abranger todos os actos compreendidos no quadro geral da competência ou dos poderes conferidos ao dito comissário. Ficarão, assim, excluídos os actos que não se inserem no esquema do exercício da função (como no caso do empregado desviar intencionalmente o veículo que conduz ao serviço da empresa para ferir ou matar uma pessoa), mas cabem na fórmula da lei os actos ligados à função por um nexo instrumental, desde que compreendidos nos poderes que o comissário disfruta no exercício da comissão (como no caso do empregado bancário, encarregado de prestar informações ao público, dar uma informação falsa para lesar outrem)".
Serão assim da responsabilidade do comitente os actos praticados pelo comissário com abuso de funções, ou seja, os actos formalmente compreendidos no âmbito da comissão, mas praticados com um fim estranho a ela."”.
Também no acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 10/11/2016 (relatado por Maria Manuela Gomes e disponível em www.dgsi.pt) se concluiu que “a responsabilidade civil das pessoas colectivas por actos ilícitos praticados por seus representantes, agentes ou mandatários está sujeita ao regime da responsabilidade extracontratual baseada no risco, nos termos dos artigos 165.º, 998.º, n.º 1 e 500.º, n.os 1 e 2 do Código Civil”, e que “a relação de comissão só responsabiliza o comitente pelos actos ilícitos do comissário se for adequada para a produção dos resultados e for susceptível de criar no lesado uma convicção de confiança na licitude da conduta daquele”.
Revertendo tais considerações doutrinárias e jurisprudenciais para o caso concreto dos autos, é possível verificar que a actuação da referida Ana P. ocorreu porque a mesma se aproveitou da sua posição de agente vinculado do R., no âmbito da actividade de intermediação financeira deste prestada aos AA.
Dito de outra forma, disponibilizando o R. serviços de intermediação financeira, enquanto instituição de crédito, designadamente na comercialização de produtos de investimento, produtos estruturados, produtos fiscais, seguros e acesso aos mercados bolsistas, e pretendendo os AA. investir a quantia que detinham (que rondava € 90.000,00), entre ambos estabeleceu-se a correspondente relação contratual.
E para o estabelecimento de tal relação contratual foi essencial a intervenção de Ana P., enquanto Personal Financial Advisor do R.
Com efeito, o contacto pessoal e directo do R. com os seus clientes (onde se incluem os AA.) não era possível, atenta a ausência de balcões de atendimento ao público, sendo feito através dos seus Personal Financial Advisors.
Que é o mesmo que afirmar que o R. tinha ao seu serviço agentes vinculados (como a referida Ana P.), para prosseguir a sua actividade bancária, em geral, e de intermediação financeira, em particular.
E foi no exercício dessas funções de agente vinculado que a referida Ana P. angariou os AA. como clientes do R. e os manteve como tal.
E, para tanto, a referida Ana P. utilizou, quando necessário, as instalações do R. (na Praça Marquês de Pombal) bem como os símbolos identificativos do R. (tal como resulta dos pontos 9., 14., segunda parte, 15. e 33. dos factos provados), tudo nos termos consentidos por este
Sucede, todavia, que a Ana P. se aproveitou desta forma de organização dos meios de produção da R., ganhando a confiança dos AA. e levando-os a entregar-lhe a quantia de € 70.000,00, sob o pretexto de ser aplicada num (inexistente) seguro de capitalização da Companhia de Seguros Império, pretensamente comercializado pelo R. e reservado a clientes “especiais”, apesar de lhe estar vedado, enquanto agente vinculado do R., receber ou entregar dinheiro ou instrumentos financeiros dos AA. (como decorre da al. d) do nº 3 do art.º 294º-A do CVM).
Todavia, a circunstância de o ter feito, como modus operandi dos actos ilícitos praticados, não significa que os mesmos foram praticados fora do desempenho da função que lhe foi confiada e apenas por ocasião dela, mas apenas e tão só que os mesmos foram praticados com abuso das funções que lhe foram confiadas pelo R.
É que a circunstância do R. não deter balcões de atendimento ao público, antes apoiando o seu negócio numa rede de Personal Financial Advisors, vocacionada para a “venda ao domicílio” por contacto pessoal e directo com os seus clientes (em substituição daquele modelo clássico de negócio de “venda em estabelecimento comercial”), significa que dependia dos referidos Personal Financial Advisors para o cumprimento das regras de conduta a que aludem os art.º 73º e seguintes do RGICSF (aprovado pelo D.L. 298/92, de 31/12), nas quais assenta o princípio da confiança ínsito à actividade bancária e financeira.
O que equivale a afirmar que o R. confiou à referida Ana P. (como certamente aos demais Personal Financial Advisors) as funções que não podia executar nos balcões de atendimento (por inexistentes), designadamente aquelas que a mesma Ana P. exerceu junto dos AA., relacionadas com a prestação de informação de todos e quaisquer assuntos relacionados com o R. (ponto 6. dos factos provados), com os produtos disponibilizados pelo mesmo para subscrição pelos AA. (ponto 8. dos factos provados), ou com o tratamento e acompanhamento das questões relacionadas com os investimentos dos mesmos (ponto 14. dos factos provados).
E foi por deter esse leque de funções, que lhe havia sido confiado pelo R., que a referida Ana P. logrou convencer os AA. a entregar-lhe a referida quantia de € 70.000,00, sob pretexto de estar a ser aplicada num produto financeiro disponibilizado pelo R. mas não acessível à maioria dos clientes do mesmo (ponto 17. dos factos provados).
Ou seja, foi através da criação de uma aparência do exercício regular das funções que lhe haviam sido confiadas pelo R. (a captação dos AA. como clientes do R. para a realização de aplicações financeiras), mas em abuso das mesmas (já que lhe estava vedada a recepção de dinheiro por parte dos AA.), que a mesma Ana P. logrou a prática dos actos ilícitos em questão (a apropriação da quantia de € 70.000,00 dos AA.).
Que é o mesmo que afirmar, como no referido acórdão de 10/11/2016 deste Tribunal da Relação de Lisboa, que a relação de comissão (estabelecida entre o R. e a referida Ana P.) foi adequada para a produção do resultado dos actos ilícitos (a apropriação indevida da quantia de € 70.000,00 dos AA.), dado ter criado nos lesados (os AA.) uma “convicção de confiança na licitude da conduta daquele” (o comissário, ou seja, a Ana P.).
Ou ainda, como no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12/11/2015 (relatado por Fernando Baptista e disponível em www.dgsi.pt) quando se conclui, após as correspondentes menções de interpretações doutrinárias e jurisprudenciais (para as quais se remete), que:
IX - Tendo havido abuso de funções por banda do funcionário bancário que praticou os factos ilícitos, nem por isso deixa de haver responsabilidade do comitente, pois pode dizer-se que as funções daquele se exerceram dentro dum quadro funcional da actividade prosseguida pela instituição bancária, criando a convicção razoável no cliente (lesado) de que estava a agir no exercício da função que lhe foi confiada (isto é, que, in casu, havia extensão dos poderes do empregado pelo comitente conferidos – pode, aqui, falar-se numa “aparência social” que leva a confiar que a actuação do comissário se desenrola por conta e sob a autoridade do comitente).
X - O que importa é, assim, que o facto danoso praticado esteja numa certa relação com a actividade que o comissário desempenhava na instituição de crédito, segundo uma conexão adequada.
XI - O princípio da boa fé (vulgarmente denominado de princípio da confiança – de aplicação geral a todos os domínios do jurídico, valendo para todo o comportamento juridicamente relevante das pessoas) significa que as pessoas devem ter um certo comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa dos outros”.
O que equivale a afirmar que a sentença recorrida merece censura, quando refere que Ana P. “agiu não por causa das suas funções, mas apenas por ocasião de tais funções”, mais concluindo que “o Banco Réu não pode ser responsabilizado, ainda que objectivamente, pelos danos produzidos na esfera jurídica dos Autores, pelo que a acção é improcedente”, antes havendo que concluir que o R. deve ser responsabilizado, nos termos do disposto no art.º 500º do Código Civil, pelos danos patrimoniais sofridos pelos AA. em consequência da actuação ilícita e culposa do agente vinculado daquele (Ana P.), e que correspondem ao valor de € 70.000,00 de que se viram desapossados, na medida em que os actos praticados por tal agente vinculado o foram no exercício das funções que lhe foram confiadas pelo R., ainda que em abuso das mesmas funções.
Pelo que, na procedência das conclusões dos AA., importa revogar a decisão recorrida e substitui-la por outra que, na procedência da acção, condene o R. no pagamento aos AA. da quantia de € 70.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação do R. e até integral pagamento, face ao disposto nos art.º 804º a 806º do Código Civil.

DECISÃO
Em face do exposto julga-se procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por esta outra que, julgando procedente a acção, condena o R. no pagamento aos AA. da quantia de € 70.000,00 (setenta mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação do R. e até integral pagamento.
Custas pelo R.

Lisboa, 8 de Novembro de 2018

António Moreira

Magda Geraldes

Farinha Alves