Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4387/13.7TBCSC.L1-8
Relator: ANTÓNIO VALENTE
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM
PROCEDIMENTO ESPECIAL DE DESPEJO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO EM PROCESSO COMUM ESPECIAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: – Estando vedado ao locador o recurso ao procedimento especial de despejo previsto no art. 15º do NRAU, por falta de contrato escrito e comprovativo da liquidação do imposto de selo, tal não o legitima a lançar mão do procedimento cautelar comum previsto no art. 382º do CPC.
– A falta de requisitos previstos no procedimento especial de despejo tem como consequência para o locador (ou sublocador) a necessidade de instaurar a (menos célere) acção de despejo prevista no art. 14º do NRAU.
– Por outro lado, não é admissível pedir a entrega judicial do locado, livre de pessoas e bens, no âmbito do procedimento cautelar comum, na redacção anterior à Lei nº 41/2013 de 26/06, já que tal representa uma decisão com efeitos definitivos e irreversíveis, quando o que está em causa deverá ser a tutela provisória do direito ameaçado. (sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

Veio A… deduzir providência cautelar comum contra S…., Unipessoal Lda pedindo que seja ordenada a entrega judicial, livre de pessoas e bens, da loja correspondente à fração A, integrante do prédio urbano sito na Rua …., freguesia da P…, concelho de C…, com recurso a arrombamento com substituição de fechaduras, se necessário for, ou colocando o requerente à disposição do Tribunal os meios adequados à sua realização.

A requerida deduziu oposição.

Foi proferido despacho designando para audiência final, com inquirição das testemunhas arroladas, o dia 5 de Setembro de 2013 pelas 14 horas.

No dia 5 de Setembro de 2013 foi aberta conclusão por ordem verbal, tendo o Mº juiz a quo proferido o seguinte despacho:

“Dou sem efeito a diligência agendada. Notifique.

Quando preparava a diligência para hoje agendada verifiquei que o requerente invoca um contrato de subarrendamento (a que se aplicam as regras do arrendamento) e pretende com a presente providência cautelar que lhe seja entregue o locado, por a sublocatária, alegadamente, não pagar as rendas do locado e por pretender entregar o locado à senhoria, por ter ocorrido denúncia do contrato de arrendamento, sem que, ao que consta dos autos, a subarrendatária ter sido chamada a intervir.

Do supra exposto resulta que estamos aqui face a problemática relativa a arrendamento e/ou subarrendamento, não sendo a providência cautelar em análise o meio próprio para resolver o diferendo, uma vez que existe meio próprio para o efeito no âmbito da lei relativa ao arrendamento.

 Acresce que aquilo que o requerente pretende com a presente providência cautelar não se consubstancia, como prevê o art° 381° nº l do CPC aplicável, em "providência, conservatória ou antecipatória, concretamente adequada para assegurar a efectividade do direito ameaçado ", pretendendo antes que seja entregue o locado, para por sua vez o entregar ao locador, ou seja, o requerente pretende que o Tribunal entregue definitivamente o locado, obtendo através da providência cautelar a decisão definitiva que só com a acção "principal" de que a presente providência deveria ser prévia deveria obter.      

Neste sentido, é manifesto que a presente providência cautelar deveria ter sido liminarmente indeferida. Não o tendo sido e sendo manifesto que não pode proceder, dispenso a inquirição das testemunhas, por a mesma se consubstanciar em acto inútil, vedado à prática judicial e, por o presente procedimento cautelar não ser o meio processual próprio para que o requerente obtenha o resultado que com ela pretende obter, absolvo a requerida do pedido.

Custas pela requerente.

Registe e notifique, com a máxima brevidade a fim de evitar a deslocação dos intervenientes processuais para a diligência para hoje designada.”

Inconformada, recorre a requerente concluindo e em síntese:

- Em sede de Peça Inaugural veio o Apelante alegar que, sendo "legítimo arrendatário de duas lojas, correspondentes às frações A  e B, integrantes do prédio Urbano" supra identificado e, tendo a faculdade de subarrendar, "por escrito intitulado "Contrato-Promessa de Subarrendamento", celebrado em 28 de Maio de 2009", cedeu o gozo da loja designada pela letra A, à ora Apelada, pugnando pela existência de um subarrendamento, e, bem assim, pela sua cessação por caducidade, derivada da denúncia contrato de arrendamento, ou, ainda, pela cessação do subarrendamento pela resolução derivada da falta de pagamento de rendas, operada por via de uma Notificação Judicial Avulsa.

- Mais alegou que até à presente data, não lhe foi restituído o subarrendado, o que pretendia por via da presente Providência Cautelar, atenta a existência de fumus boni juris e periculum in mora, o que pediu.

- Foi deduzida oposição por banda da ora Apelada, em sede da qual esta arguiu a ineptidão da petição inicial, ilegitimidade ativa, inutilidade superveniente da lide, e, bem assim, não impugnou a factualidade essencial, vertida pelo ora Apelante na p.i., admitindo, designadamente, que por "contrato promessa celebrado  em 28 de Maio de 2009, o Requerente prometeu dar de subarrendamento à ora Oponente o locado objeto dos autos, pela renda mensal de 1.500,00", "Promessa que, embora nunca tenha sido lavrada a contrato definitivo, se concretizou na realidade", tendo o ora Apelante notificado a Apelada da caducidade do contrato, bem como da resolução, confirmando ainda a não entrega do locado.

-  O ora Apelante notificado, para o efeito, respondeu às exceções deduzidas, tendo sido designado o dia 05 de Setembro de 2013, pelas 14h00m para realização da Audiência final com inquirição das testemunhas, a qual não se realizou porque nesse dia, foi proferida Sentença que não decretou a Providência Requerida.

-  Na qual a Mma Juiz a quo entendeu, ainda que de forma ininteligível, estarmos perante "problemática relativa a arrendamento e/ou subarrendamento, não sendo a providência cautelar em análise o meio próprio para resolver o diferendo, uma vez que existe meio próprio para o efeito no âmbito da lei relativa ao arrendamento", e que "é manifesto que a presente providência cautelar deveria ter sido liminarmente indeferida", e portanto, absolveu "a requerida do pedido".

-  Na opinião do apelante impunha-se o decretamento da Providência Requerida, sendo que ao não fazê-lo, o Tribunal a quo violou, pelo menos e, sem prejuízo do infra explanado, o disposto nos artigos 195°, nº 1, do CPC (art. 201°, do anterior CPC); 154° e 607°, aplicável ex vi artigos 365°, nº 3 e 295° do CPC (arts. 158° e 659°, do anterior CPC); 608°, do CPC, (art. 660°, do anterior CPC); 607°, n° 3, aplicável ex vi artigos 365°, nº 3 e 295° do CPC, (art. 659°, n° 2, do anterior CPC); 608°, n° 2, parte final, (art. 660°, n° 2, do anterior CPC); art. 615°, nº 1, als. b), e d), do CPC, (art. 668°, nº 1, als. b) e d), do anterior CPC); 465° e 574°, n° 2 do CPC (artigos 567° e 490°, do anterior Código de Processo Civil); artigo 362°, nº 1, do CPC (art. 381°, nº 1, do CPC anterior); arts. 154°, 253° e 607°, nºs 2 e 3, aplicável ex vi artigos 365°, nº 3 e 295° do CPC (arts. 158°, 259° e, 659°, nºs 1 e 2, do anterior CPC); 607°, nº 3, (art. 659°, nº 2); artigo 615°, n° 1, al. b), do CPC, (art. 668°, n° 1, al, b), do anterior CPC); 2° do CPC (art. 2°, do anterior CPC); 20°, da Constituição da República Portuguesa; 362° e ss do CPC, (arts. 381° e ss do anterior CPC); artigo 608°, 2, do CPC, (art. 660°, nº 2, do anterior CPC); arts. 3°, 552°, 1, al. e), (3°, 467°, n° 1, al. e), do anterior CPC) e art. 615°, 1, al. e), do CPC, (art. 668°, nº 1, al. e), do anterior CPC); artigo 8°, nº 2, do Código Civil; 154° e 607°, nºs, 3 e 4, aplicável ex vi artigos 365°, n° 3 e 295° do CPC, (arts. 158° e 659°, nºs 2 e 3, do anterior CPC); art. 6°, nº 2 e art. 7° do CPC, (arts. 265° e 266°, do anterior CPC); artigo 195°, n° 1, do CPC (art. 201°, nº 1, do anterior CPC); artigo 615°, nº 1, al. b), (art. 668°, nº 1, al. b), do anterior CPC);

- Efectuou uma leitura abreviada da factualidade apresentada na peça inaugural, que conduziu a um enquadramento legal incorrecto e redutor;

- Interpretou e aplicou indevidamente a única norma jurídica que plasmou na Sentença;

- Olvidou o ónus de fundamentação e indicação das normas jurídicas aplicáveis, que fundamentem a decisão final.

-  Produzindo decisão nula, ilegal e inconstitucional, conforme passaremos a demonstrar.

- De facto, a decisão proferida, - que é uma Sentença, nos termos do artigo 152°, nº 2 do CPC, - viola o disposto no artigo 607°, n° 2, aplicável ex vi artigos 365°, n° 3 e 295° do CPC, (correspondente ao art. 659°, do anterior CPC), não identificando as partes, não identificando corretamente o objeto do litígio e, não enunciando as questões que ao tribunal cumpre solucionar, portanto é, desde logo, nula, - nos termos do nº 1, do artigo 195°, do CPC, (correspondente ao art. 201°, do anterior CPC) -, por omitir questões essenciais que a constarem dela, conduziriam a um raciocínio lógico e jurídico que imporia exame diverso da causa, tendo a sua ausência afetado a decisão e determinado o seu sentido.

-  O  Tribunal a quo realiza leitura errada da factualidade que lhe foi apresentada, concluindo numa errónea aplicação do Direito, porquanto, sem o justificar, parte, desde logo, da premissa de um contrato de subarrendamento, formal e materialmente "perfeito", o que não corresponde ao alegado pelo Requerente na peça inaugural, nem ao documento apresentado sob o nº 2, (tão pouco vertido na Oposição), ignora a referência à caducidade e, não indica as normas legais aplicáveis, assim, violando o disposto nos artigos 154° e 607°, (aplicável ex vi artigos 365°, nº 3 e 295°) (arts. 158° e 659°, do anterior CPC); 608°, (art. 660°, do anterior CPC); e, 607°, nº 3, (ex vi artigos 365°, nº 3 e 295°), (art. 659°, nº 2, do anterior CPC), todos do CPC.

- Viola ainda o disposto no artigo 608°, nº 2, parte final, (art. 660°, nº 2, do anterior CPC), ocupando-se de questões que não lhe foram suscitadas, como sejam a incompreensível "intervenção" da subarrendatária no processo de denúncia do arrendamento.

-  Encontrando-se, mais uma vez, ferida de nulidade, cominada nas als. b), e d), do nº 1, do art. 615°, do CPC, (art. 668°, n° 1, als. b) e d), do anterior CPC).

-   A M.ma Juiz a quo  desenvolve raciocínio não fundamentado, não dando a conhecer o iter percorrido para chegar à decisão, quedando o Apelante sem saber se esta assentou incompreensão da realidade vertida nas peças processuais ou, não impugnação dos factos alegados pelo Requerente (ora Apelante), por banda da Requerida, o que configura violação do disposto nos artigos 465° e 574°, nº 2 do CPC (correspondentes aos artigos 567° e 490°, do anterior CPC), já que, o seu respeito, impunha decisão diversa.

-  No caso em apreço, a Providência Cautelar é o único meio apto a antecipar, com brevidade, a efectividade do direito do ora Apelante, pretendendo este, uma composição célere e provisória do litígio, a qual não se coaduna com as demoras inevitáveis de um Processo Judicial não urgente - artigo 362°, nº 1, (artigo 381°, do anterior CPC);

- De facto, não pode o aqui Apelante socorrer-se do Procedimento especial de despejo, regulado no Novo Regime do Arrendamento Urbano (doravante NRAU), na redação da Lei nº  31/2012, de 14 de Agosto, porquanto, o mesmo estabelece um conjunto de formalidades / requisitos, que limitam o seu emprego, importando com relevância para a causa, a exigência de contrato material e formalmente perfeito, - artigo 15°, nº 2, als. b), e e); e 15º B, nº 2, aç. e), do NRAU -, e a exigência de liquidação de imposto de selo, (que o Requerente não pode efectuar por não ter contrato), prevista no nº 4, do mesmo artigo 15°, do NRAU, sendo que a sua falta determina, nos termos da al. h), do nº 1, do artigo 15-C, do NRAU, a recusa do Requerimento.

-  De igual guisa, não pode o Apelante equacionar o recurso a uma Acção de Despejo ou, eventualmente, de Reivindicação, por, na sua opinião, não serem os meios adequados para a situação ora em crise e, ademais, não serem alternativa viável a uma Providência Cautelar, pois apresentam tramitação mais dilatada e morosa, bem como, pressupostos e finalidade diversos.

-  Destarte, não se vislumbra o "meio próprio [. . .] no âmbito da lei relativa ao arrendamento" para antecipar a efectividade do direito do ora Apelante, referido na decisão Proferida em Instância, ocorrendo manifesta falta, ou insuficiência fundamentação, Princípio fundamental de Direito e, bem assim, ausência da referência às normas jurídicas aplicáveis, em clara violação do disposto no artigo 607°, n° 3, (art. 659°, nº 2, anterior CPC), padecendo, mais uma vez, a Sentença de que se recorre, de nulidade, nos termos da al. b), do n° 1, do artigo 615°, do CPC, (art. 668°, nº 1, al. b), do anterior CPC).

- Além disso, a dita Sentença é ilegal  por consubstanciar clara violação do disposto no artigo 2° do CPC, (art, 2°, do anterior CPC), o qual determina que a "todo  o direito corresponde a ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparara violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação." e, inconstitucional, porquanto, viola o Princípio do Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, com assento Constitucional, plasmado no artígo 20‹, da Lei Fundamental, pois que, ao não decretar a providência, com fundamento na existência de outros meios próprios antecipatórios, adequados a assegurar efectivação do direito, que, conforme se expôs, não existem, nem são referidos na decisão, o Tribunal a quo vedou ao ora Apelante o acesso ao direito e aos tribunais para defesa do seu direito legalmente protegido.

- Ademais, ocorre interpretação errónea do art 381°, nº 1, do anterior CPC, (art. 362°, n° 1, do atual CPC), e deficiência na fundamentação, ao considerar-se na Sentença recorrida que o ora Apelante pretendia uma decisão definitiva que só com a acção principal deveria obter, porquanto, este, convicto da certeza do seu direito, não ignorava que apenas iria obter uma decisão provisória, antecipatória - artigos 381° e ss. do CPC de 1961 (art. 362° e ss do atual CPC) - limitando-se a alegar, sumariamente, os factos tendentes a demonstrar a aparência do direito ameaçado e justificativos do receio da lesão - art. 384°, do anterior CPC - apenas extraindo deles uma das várias consequências daí advindas, (a restituição do locado), cuja antecipação demandou.

-  Não ignorava, que caso não propusesse a acção principal, a Providência iria caducar, assim perdendo os efeitos desta advindos e que, sempre teria de lançar mão daquela acção para se ver ressarcido das quantias devidas pela Requerida, actuando no exercício da faculdade legal prevista nos artigos 383°, nº 1, e 389° do anterior CPC, - instaurar Procedimento Cautelar como preliminar da acção principal, dispondo, no limite, do prazo de 30 dias, contados da data em que lhe tiver sido notificado o decretamento da Providência, para propor a acção principal.

-  Sendo que, ainda que se admita o argumento aduzido pela M.rna Juiz a quo, de que se alcançaria uma decisão definitiva através de uma Providência Cautelar, o que não era, definitivamente, a pretensão do aqui Apelante, tal considerando, não deve chocar, porquanto, o legislador, no novo CPC - artigo 369°, nº 1 - veio criar a figura da Inversão do Contencioso, que prevê, precisamente, essa possibilidade, pelo que, embora tal não possa suceder no caso em apreço, em virtude de não lhe ser aplicável novo Código de Processo Civil - artigo 7°, n° 2, da Lei 41/2013 26/06, -, não deve o julgador ser alheio ao espírito conhecido do legislador, e, muito menos, hostilizá-lo.

-  Ao não entender o Procedimento Cautelar como único meio célere e antecipatório, adequado a efectivar o direito do aqui Apelante, o Tribunal a quo examinou para além do que lhe foi peticionado, o que lhe é vedado pelo nº 2, do artigo 608° do CPC, (art. 660°, nº 2, do anterior CPC), decidindo em clara violação do disposto no artigo 8°, nº 2, do Código Civil, por considerar injusto o resultado do decretamento de uma Providência Cautelar, Procedimento esse de que, o Apelante pode, legalmente, lançar mão.

-  Não fundamenta a Mma Juiz a quo, porque motivo deveria ter sido liminarmente indeferida a Providência, bem como, não fundamenta a aplicação "automática" do regime do arrendamento, nem especifica quais as normas jurídicas que determinam seja "manifesto que não pode proceder", dispensando, contra despacho anterior e horas antes da realização da mesma, a inquirição das testemunhas, por alegadamente consubstanciar ato inútil, sem indicar o fundamento legal, assim atropelando, reiteradamente, o disposto nos artigos 154° e 607°, nºs, 3 e 4, aplicável ex vi arts. 365°, n° 3 e 295° do CPC, (arts. 158° e 659°, nºs 2 e 3, do anterior CPC) e, derrubando, de forma grosseira, o Princípio de Colaboração entre o juiz e as partes (art. 6°, nº 2, do CPC) e o princípio da cooperação entre as mesmas (art. 7° CPC), (arts. 265° e 266°, respetivamente, do anterior CPC), produzindo decisão eivada de nulidade, por omissão de formalidades legalmente prescritas, susceptível de influir no exame e decisão da causa - artigo 195°, nº 1, do CPC, (art. 201°, nº 1, do anterior CPC) - não especificando os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - artigo 615°, nº 1, al. b), (art. 668°, nº 1, aI. b), do anterior CPC).

- Em face de tudo o supra exposto, dúvidas não subsistem que se impunha decretar a Providência requerida de restituição do locado, porquanto, estavam preenchidos todos os requisitos essenciais ao decretamento de uma Providência cautelar, quais sejam:

i)- a aparência do direito, que decorria, de forma clara, da própria Lei;

ii)- e a existência de perigo de lesão grave nos direitos do Requerente por via da demora da decisão judicial efetiva, perículum in mora - igualmente alegado;

-  Ademais, resulta claro, da mera leitura das peças processuais supra reproduzidas, a confissão dos factos essenciais integrantes do direito invocado pelo Requerente, como sejam, a existência de contrato, (ou, pelo menos, da concessão da fruição da loja mediante o pagamento de uma quantia monetária mensal), a ocorrência da caducidade, o não pagamento de rendas e consequente resolução do contrato e, finalmente, a entrega do sublocado, o que, só por si, impunha o decretamento da Providência requerida - artigos 46° e 465°, do CPC (correspondentes aos artigos 38° e 567° do Código de Processo Civil de 1961), afigurando-se desnecessária inquirição de testemunhas.

A requerida contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Cumpre apreciar.

A questão que aqui se coloca é a de saber se o recorrente, face ao objecto do seu requerimento, podia ter lançado mão do meio processual previsto nos artigos 381º e seguintes do CPC – procedimento cautelar comum.

No despacho recorrido entendeu-se que não e por duas razões distintas:

Existe outro meio processual para realizar a pretensão do requerente;

O requerente pretende obter uma decisão definitiva, que só com a acção principal poderia ter lugar.

Independentemente da copiosa série de nulidades que o recorrente assaca à decisão, o certo é que esta, embora sucinta, fundamenta e explicita claramente o pensamento do julgador e as suas conclusões. O juiz não tem de identificar todas as  normas aplicáveis, bastando que faça referência ao seu teor e com ele construa o raciocínio jurídico, o que foi feito. Tanto assim que o recorrente não tem a mais pequena dúvida sobre tal raciocínio, dele se defendendo ponto por ponto.
Por outro lado não foi violado qualquer direito de acesso à Justiça e aos tribunais, constitucionalmente consagrado, já que o que está em causa é aceder aos tribunais mediante o processo adequado ou culminando com pedido ajustado ao tipo de providência escolhida. Isto nada tem a ver com direitos fundamentais mas tão só com o respeito pelas normas do processo.
Diga-se ainda que é de conhecimento oficioso do tribunal, não carecendo de invocação pelas partes, o uso de meio processual impróprio, o que inclui a insusceptibilidade de ser alcançado o efeito jurídico peticionado no âmbito do tipo de processo por que o requerente optou  – artigos 199º nº 1 e 202º do CPC.

De qualquer modo, eventuais irregularidades que pudessem ter sido cometidas na decisão da 1ª instância não impedem que este Tribunal da Relação conheça do objecto da apelação, de acordo com a regra da substituição ao tribunal recorrido, art. 715º nº 1 do CPC.

O procedimento cautelar comum só pode ter lugar quando não exista, para satisfazer a concreta pretensão do requerente, um procedimento cautelar específico, sejam os referidos no nº 3 do art. 381º do CPC sejam os que integram outra legislação.
Como refere Lebre de Freitas - “Código de Processo Civil Anotado”, 2º, pág. 5 - “... a nova redacção acentua que não basta, para afastar a tutela cautelar comum, que haja um procedimento especificado formalmente  susceptível de integrar a situação concreta carecida de tutela; é preciso também que o risco de lesão que o procedimento especificado visa afastar coincida com o risco de lesão que concretamente se verifique. O procedimento cautelar comum continua, em princípio, a não poder servir de albergue a situações não tuteladas por um procedimento especificado por não estarem verificados todos os pressupostos da concessão da providência criada para especificamente prevenir a lesão de determinado direito (...) 
 “Mas se ocorrer o risco  duma lesão diversa daquela que a providência tipificada visa prevenir, já o direito pode ser acautelado por uma providência cautelar não tipificada”.

No caso em apreço, o requerente vem pedir a entrega judicial, livre de pessoas e bens, da loja sublocada, invocando a caducidade do contrato de sublocação por, entretanto, ter sido denunciado pelo senhorio o próprio contrato de arrendamento. Alega ainda a falta de pagamento de rendas do requerido.

O novo regime relativo ao arrendamento introduzido pela Lei nº 31/2012 de 14/08, prevê no seu art. 15º o procedimento especial de despejo, o qual é definido como “um meio processual que se destina a efectivar a cessação do arrendamento, independentemente do fim a que este se destina, quando o arrendatário não desocupe o locado na data prevista na lei ou na data fixada por convenção entre as partes”.
Como o recorrente alega, este procedimento especial não está ao seu alcance desde logo porque teria de juntar o contrato de arrendamento (no caso, subarrendamento) nos termos do art. 15º nº 2 e) do NRAU, bem como comprovar a liquidação do imposto do selo ao mesmo referente, art. 15º nº 3 do mesmo diploma. Ora, o requerente e o requerido nunca chegaram a celebrar por escrito um contrato de subarrendamento, limitando-se a celebrar um “contrato-promessa de subarrendamento” no qual se previa a celebração do “contrato definitivo de subarrendamento”, o que, como se disse, nunca ocorreu.
Sobre isto, e relembrando as considerações de Lebre de Freitas acima transcritas, diremos que a falta de um ou mais pressupostos para instauração do procedimento específico que ao caso caberia, não é motivo que legitime a aplicação do procedimento cautelar comum. Se tais requisitos não estão preenchidos, a parte interessada é sancionada pela impossibilidade de se socorrer da forma abreviada do procedimento especial de despejo. Não faria sentido que, não podendo instaurar este procedimento por não ter cumprido o conjunto dos pressupostos aplicáveis o requerente viesse a obter por outra via, no procedimento cautelar comum, o que a legislação específica aplicável à relação controvertida no seu caso proíbe.
Isto não significa que fique o requerente desprovido de meios para fazer valer o seu direito. Tem à sua disposição a acção de despejo prevista no art. 14º do NRAU, embora esta não esteja revestida das mesmas características de celeridade.

Como se referiu na decisão recorrida, existe ainda um outro problema. Ao instaurar um procedimento cautelar comum o requerente pede a desocupação do locado, com a sua entrega judicial, livre de pessoas e bens.
Ou seja, trata-se de um pedido que visa a entrega definitiva do locado. Como é evidente, uma vez entregue o locado livre de pessoas e bens, a detenção do mesmo pelo sublocatário ficou irremediavelmente destruída, criando-se, no âmbito de uma providência cautelar, uma situação irreversível.
O objectivo das providências cautelares é outro: é o de impedir que a violação pelo requerido do direito do requerente, venha a criar a este uma lesão grave e dificilmente reparável. Visa-se assim obter uma medida judicial que tutele provisoriamente o direito.

Invoca o recorrente o disposto no art. 369º nº 1 do CPC na redacção dada pela Lei nº 41/2013 de 26/06. Embora reconheça que este normativo não é aplicável ao caso dos autos por força do art. 7º nº 2 do mesmo diploma, o recorrente entende que o Mº juiz a quo “não deveria ser alheio ao espírito conhecido do legislador”. Sobre isto dir-se-à simplesmente que o espírito do legislador é exactamente o de não permitir a aplicação do novo regime de inversão do contencioso aos procedimentos cautelares instaurados antes da entrada em vigor do novo regime. E o tribunal recorrido esteve atento a tal comando.
Acresce que, face ao disposto no art. 362º do novo CPC, que define o âmbito das providências cautelares não especificadas, não existe uma diferença significativa com a legislação anterior, nomeadamente o já mencionado art. 382º do CPC.
A norma do novo art. 369º configura uma situação excepcional e que, logo à partida, depende de requerimento da parte no tocante à inversão do contencioso, requerimento que o ora recorrente não fez nem podia fazer, mesmo que o processo seguisse termos até à audiência final.
Não se percebe a que título devia a decisão recorrida levar em conta um normativo expressamente não aplicável ao caso dos autos e que não pode, de modo algum, funcionar como critério interpretativo do regime do procedimento cautelar comum anterior à Lei nº 41/2013 uma vez que cria uma situação completamente nova.

Conclui-se assim que:
Estando vedado ao locador o recurso ao procedimento especial de despejo previsto no art. 15º do NRAU, por falta de contrato escrito e comprovativo da liquidação do imposto de selo, tal não o legitima a lançar mão do procedimento cautelar comum previsto no art. 382º do CPC.
A falta de requisitos previstos no procedimento especial de despejo tem como consequência para o locador (ou sublocador) a necessidade de instaurar a (menos célere) acção de despejo prevista no art. 14º do NRAU.
Por outro lado, não é admissível pedir a entrega judicial do locado, livre de pessoas e bens, no âmbito do procedimento cautelar comum, na redacção anterior à Lei nº 41/2013 de 26/06, já que tal representa uma decisão com efeitos definitivos e irreversíveis, quando o que está em causa deverá ser a tutela provisória do direito ameaçado.
Assim e pelo exposto improcede a presente apelação.
Custas pelo apelante.
LISBOA, 16/01/2014
António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais