Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | SÉRGIO ALMEIDA | ||
Descritores: | DANOS NÃO PATRIMONIAIS MONTANTE DA INDEMNIZAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/25/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
Sumário: | Não é excessiva a indemnização de € 6.000,0o por danos não patrimoniais infligidos ao trabalhador pelo empregador que, na sequencia de uma negociação destinada a pôr fim à relação laboral que não chegou a bom porto, o descriminou, impondo-lhe nomeadamente uma mudança injustificada de local de trabalho, deixando de lhe pagar pontualmente o vencimento e suplemento remuneratório, mantendo-o desocupado, retirando-lhe instrumento imprescindível para poder trabalhar, mantendo-o à margem dos restantes trabalhadores, criando-lhe um ambiente hostil, tudo com a intenção de o perturbar, levando o trabalhador a sentir-se descriminado, isolado, atingido na sua dignidade, atitude discriminatória que durou quase um ano, até que o trabalhador se quedou de baixa por doença do foro psiquiátrico. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO: A) A. (autor): AAA R. (de ré) e recorrente: BBB O A. propôs a ação alegando que a R. não lhe pagou atempadamente os salários dos meses de Dezembro de 2010, Janeiro, Fevereiro e Março de 2011, bem como o subsídio de Natal de 2010; quando foi saber o porquê foi-lhe dito que, como não estava a produzir, não estava a desenvolver qualquer trabalho, não recebia. Procurou apoio jurídico e, assim, conseguiu que a R. lhe pagasse em Abril de 2011 os salários em falta. Todavia, durante o período de quatro meses em que não recebeu salário, o A. viu-se obrigado a utilizar o “plafond” de duas contas bancárias suas para poder fazer face às despesas, nomeadamente, pagar prestação da casa, do carro, comida e gastos correntes como água, luz, gás e telefone. Todavia, não conseguiu fazer face a todas as despesas e viu-se obrigado a contrair um empréstimo pessoal de € 3.500,00 junto do Banco (…) SA, que ainda está a pagar e a que acrescem juros, pelo que o valor total a pagar é de €4.268,08. O não pagamento pontual causou-lhe prejuízos que traduzidos em juros devidos pela utilização de cartão de crédito, pelo não pagamento atempado do crédito à habitação e respectivo reforço do crédito à habitação e juros que tem pago e que continuará a pagar até 2021 por se ter visto obrigado a contrair o empréstimo pessoal. A R. descriminou-o comparativamente com os restantes trabalhadores que exerciam a mesma função na empresa, nomeadamente não lhe dando trabalho e aos outros desenhadores não faltar trabalho; colocou-o noutra sala, que não a dos desenhadores, sendo ele foi o único a mudar de localização e sem que o seu lugar, na sala original, tenha sido ocupado por ninguém; proibiu-o expressamente de comunicar com os colegas, enquanto os colegas falavam uns com os outros; retirou-lhe material essencial ao desenvolvimento da actividade para o qual fora contratado, - o computador -, situação que não ocorreu com nenhum outro desenhador; retirou-lhe o acesso ao código do alarme e a chave de entrada nas instalações da R. enquanto os colegas mantinham os códigos do alarme e as chaves; e, por fim, transferiu-o temporariamente para outra ilha, invocando necessidade de cumprir trabalho de clientes que a R. tinha em S. Miguel, sendo certo que apenas lhe deram um trabalho para cumprir numa semana e desde a segunda semana de Maio de 2011, até fins de Junho de 2011 – data em que entrou de baixa médica -, não lhe terem dado mais nenhum serviço, nem o contactaram. Foi intenção da R. com os comportamentos descritos, perturbar o A.. O A. sentiu-se descriminado, afectado na sua dignidade, pois o ambiente em que trabalhava era hostil e degradante para a sua pessoa, o que culminou na situação de doença, que ainda se prolonga, mesmo após ter deixado de ser trabalhador da R. Com estes fundamentos pediu a condenação da R. a pagar-lhe: -a quantia que se apurar de juros e penalizações que este teve que pagar pelo facto de não lhe terem sido pagos, atempadamente os salários referentes aos meses de Dezembro de 2010, Janeiro, Fevereiro e Março de 2011, juros esses e penalizações que se reportam às prestações de crédito Habitação e crédito de reforço para habitação que o A. não pôde cumprir pontualmente nos referidos meses por não ter recebido o salário; no pagamento da quantia de juros e penalizações pela utilização do cartão de crédito do A. para pagamento de despesas correntes de água, luz, gás telefone e alimentação nos meses que não lhe foi pago salário pela entidade patronal; -os juros e despesas do contrato de crédito pessoal que se viu obrigado a contrair para fazer face às suas despesas, nos meses em que a Ré não lhe pagou o salário e cujo empréstimo termina apenas em 2021, -65.000,00€ (sessenta e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais; acrescido de juros vincendos à taxa legal, desde a data da propositura da acção até efectivo e integral pagamento. * A R. contestou, negando comportamentos discriminatórios, fundamentando-se em prerrogativas de gestão e organização do trabalho, negou que fossem devidas quantias por subsídio de quilómetros; imputou ao A. comportamentos negligentes e conflituosos; motivou a sua deslocação para a ilha de S. Miguel, mais desconhecendo a situação creditícia do Autor. O Autor veio apresentou articulado de resposta. * Efetuado o julgamento, o Tribunal julgou parcialmente procedente a acção e condenou a Ré Costa Poim - Fiscalização, Estudos e Projetos de Engenharia, Lda. a pagar ao A. Paulo Jorge Linhares Oliveira 6.000,00 € a título de danos morais, acrescida de juros de mora vincendos até integral e efectivo pagamento da quantia, contados da data da citação; e absolveu a Ré do demais peticionado. * A R. não se conformou e recorreu, formulando estas conclusões: a)Incumbia ao autor o ónus da prova dos danos no presente processo, assim como do respectivo grau; b)Assim como lhe incumbia a prova do eventual (mas indispensável) nexo de causalidade entre estes e o comportamento da ré ora recorrente; c)a verdade é que ficou provado apenas que o mesmo se sentiu incomodado, discriminado e afectado na sua dignidade nada mais se tendo provado do que isso; d)forçoso é concluir-se que o grau de incómodo e afetação foi pelo mínimo possível e tão reduzido que não terá ultrapassado o mero incómodo, sentimento de desconforto e afectação que (não se provou mais do que isso) não ultrapassou um certo mal estar mínimo dificilmente enquadrável na tutela jurídica. e)Tanto assim que nem demandou repouso, nem tratamento médico nem levou a qualquer estado depressivo ou qualquer outro de doença. f)Razão pela qual não ficaram provados danos que justifiquem a tutela direito, que mereçam ser indemnizados; g)Pelo que o Tribunal a quo ao condenar a ré a pagar indemnização ao autor, violou os artigos 28.º e 29.º do Código de Trabalho e artigos 483.º, 487.º, 562.º, 563.º do Código Civil; Caso assim se não entenda e se entenda que se justifica a condenação em indemnização, sempre se teria de concluir que: h)Os danos que ficaram provados são de diminuta amplitude e de tão diminuta gravidade que se encontram no limiar da não tutela pelo direito; i)Pelo que recorrendo à equidade, na total ausência de quaisquer elementos que permitam quantificar o grau de lesão quer dos direitos do autor que o grau ou dimensão dos danos indemnizáveis, o facto de não ter o autor sofrido danos patrimoniais nem tendo sofrido qualquer estado de doença imputável à ré ora recorrente, permitem concluir que o montante indemnizatório nunca poderá ser superior a 750,00€; j)Ao condenar a ré no pagamento de 6.000,00€ mais juros ao autor, o Tribunal a quo violou o princípio da equidade consagrado no nº 3 do artigo 566º do Código Civil e consequentemente este normativo. Findou pedindo seja revogada sentença recorrida, absolvendo-se a ré ora recorrente da totalidade do pedido; caso assim não se entenda, se se entender ser de condenar a ré ora recorrente, mesmo assim deverá ser revogada a sentença recorrida, reduzindo-se o montante da indemnização para montante nunca superior a 750,00€. * A R. contra-alegou, pedindo a confirmação da sentença e concluindo: 1.Tem sido entendido pela nossa doutrina e alguma jurisprudência que se deve afastar liminarmente a obrigatoriedade da verificação do dano, uma vez o “bem jurídico que é sempre lesado” pelo assédio “é a dignidade da pessoa humana”. 2.Ou seja, tem sido entendido que não é necessário demonstrar o dano. 3.A prova de comportamentos lesivos, por parte da entidade patronal, lesivos da dignidade da pessoa humana são por si suficientes. 4.O nexo de causalidade encontra-se demonstrado em virtude do que se considerou provado nos pontos 41 e 42 dos factos provados; 5.Não se tratam apenas de meros incómodos como quer fazer crer o recorrente; 6.Na verdade o comportamento do recorrente violou claramente o art.º 129.º do CT, bem como o artigo 127.º do mesmo Código. 7.Sendo que tais comportamentos são ilícitos; 8.E suscetíveis de condenação da entidade patronal em valores indemnizatórios 9.Nessa medida, o Tribunal não violou os artigos 28.º e 29.º do CT e os artigos 483.º, 487.º, 562.º, 563.º do CC; 10.Os comportamentos do recorrente para com o recorrido são merecedores de censura, 11.Lesaram a dignidade do recorrido, 12.O montante da indemnização deve ser calculado segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e do titular da indemnização, e deve ser proporcionado à gravidade do dano. 13.Assim, entendemos que o grau de culpabilidade do recorrente é intenso atenta a natureza da violação do dever de ocupação efetiva – factos provados 19),21),22) a 26) e pela transferência injustificada – factos provado 20) a 40). 14.O elevado grau de ilicitude da sua conduta que emerge das circunstâncias apuradas; 15.As consequências do comportamento ilícito do recorrente, traduzidas, em termos objetivos, na lesão de um bem jurídico essencial da personalidade, ligado à própria dignidade da pessoa humana; 16.Sendo que, da nossa parte, só merece censura o montante indemnizatório que o Tribunal a quodeterminou; 17.Por considerarmos que o montante mais justo, tendo em conta tudo o que foi dado como provado, seria sempre igual ou superior a 15.000,00 €; 18.Nunca o valor peticionado pelo recorrente no seu recurso, 19.Por ser um valor apurado sem atender a critérios de equidade e sem ter em conta a ilicitude do comportamento do recorrente. Pelo exposto, o recurso interposto pelo recorrente deve ser julgado improcedente por não provado, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo, nos seus precisos termos, execepto quanto ao quantitativo indemnizatório que deve ser superior nos termos peticionados pelo ora recorrido. * O DM do Ministério Público emitiu douto parecer pugnando pela manutenção da sentença. Não houve resposta ao parecer. Foram colhidos os competentes vistos. * A)É sabido e tem sido jurisprudência uniforme a conclusão de que o objecto do recurso se limita em face das conclusões insertas nas alegações do recorrente, pelo que, em princípio, só abrange as questões aí contidas, como resultado aliás do disposto nos artigos 635/4, 639/1 e 2, 608/2 e 663 do CPC do CPC. Deste modo o objecto do recurso consiste em saber se a indemnização por danos não patrimoniais se mostra adequadamente calculada. Factos assentes: C)De Direito: É óbvio que o A. foi descriminado por não ter chegado a determinado acordo com a R. (factos provados 13 a 15 e 8: 13. Como não foi possível entendimento entre A. e R. com vista à saída do A. da empresa, este continuou a ser empregado da R. e o seu local de trabalho continuou a ser a sala dos fiscais de obras (para onde fora mudado, 8, do local onde trabalhava juntamente com os seus outros colegas desenhadores, sendo colocado, numa sala, sozinho, ao lado da Secretaria), afastado de todos os seus colegas de trabalho, os desenhadores. 14. Sendo que o seu lugar na sala dos desenhadores não foi ocupado. 15. Estava vazio). Essa discriminação persistiu ao longo do tempo e assumiu formas caricatas, como a retirada de instrumentos de trabalho (o computador), a colocação durante dias e dias em situação de nada ter para fazer (o que é, note-se, frequente em casos de assédio moral ao trabalhador), o seu sancionamento retributivo, deixando de receber custo de deslocações que realmente não fazia porque não lhe era atribuído trabalho, não pagamento atempadamente, deslocando-o temporariamente para outra ilha onde a R. não desenvolvia atividade, tudo com (41) intenção de, com os comportamentos descritos, perturbar o A. Pelo exposto julga-se improcedente o recurso e confirma-se a sentença recorrida. Custas do recurso pela recorrente.
Lisboa, 25 de janeiro de 2017
Sérgio Almeida
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