Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | FÁTIMA GALANTE | ||
Descritores: | TESTAMENTO HERANÇA LEGADO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/03/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | PROVIDO | ||
Sumário: | 1 - Não pode buscar-se a interpretação do testamento no conceito jurídico que o testador utilizou, devendo o intérprete indagar qual era efectivamente a sua vontade, tendo ainda presente que não poderia este transmitir mais direitos ou direitos distintos daqueles que integravam a sua esfera jurídica. | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I – RELATÓRIO A e M vieram requerer se proceda a inventário por óbito de José e mulher, Maria, alegando ser a requerente herdeira de um dos descendentes do falecido. Dos filhos de José e Maria, apenas Maria é viva, mas devido à sua idade (tem mais de 90 anos), estado de saúde e ainda porque reside em Taunton Massachussetts, tal como sua filha mais velha, justifica-se que seja a requerente designada como cabeça de casal. Os restantes filhos dos inventariados já faleceram todos sem testamento, deixando como herdeiros os irmãos sobrevivos. Foi proferido despacho que entendeu ser a requerente, de acordo com os termos do testamento, legatária e não herdeira de José, filho de João, isto porque nos termos do referido testamento aquele deixou à requerente a metade indivisa do prédio e não qualquer herança e com fundamento na falta de legitimidade dos requerentes, indeferiu o requerido. Inconformados os requerentes agravam do despacho, apresentando as seguintes conclusões: 1. João, filho dos inventariados, nunca foi proprietário de ½ da casa, mas sim herdeiro de seus pais e irmãos pré-falecidos com direito a ½ da herança. 2. A herança foi e é constituída em exclusivo pela mesma casa. 3. O João quis deixar a Angela todos os direitos que detinha sobre a casa como herdeiro de seus pais e irmãos falecidos. 4. Esta interpretação encontra no testamento suficiente suporte textual. 5. A requerente Angela é herdeira e não legatária. 6. A classificação de um instituído como herdeiro ou legatário é o resultado de indagação feita pelo intérprete, não se impondo a feita pelo testamento. Não foram presentadas contra-alegações. Corridos os Vistos legais, Cumpre apreciar e decidir. II - FACTOS PROVADOS: Lucília, falecida em 25.12.1976, Manuel, falecido em 16.03.1981, José, falecido em 02.03.1984, João, falecido em 21.02.1995 e Maria, viúva.
II – O DIREITO 1. A qualificação dos sucessores como herdeiros ou legatários tem decisivo relevo no que respeita à aceitação beneficiária da herança a que são chamados, pois são diversos os direito e obrigações inerentes a cada um, designadamente porque são os herdeiros que têm o direito a exigir a partilha (art. 2101º do CC). Tendo presente o disposto no art. 2030º, nº 2 do CC, herdeiro é o que sucede na totalidade ou numa quota do património do falecido e legatário o que sucede em bens ou valores determinados. Assim, o legatário, mesmo que a herança não tenha sido partilhada, sabe aquilo a que tem direito, conhece o objecto ou o valor com que foi contemplado pelo testador, enquanto que o herdeiro só pela partilha vê concretizado o seu direito, tendo até lá uma mera porção ideal no montante hereditário[1].
Não pode buscar-se a interpretação do testamento no conceito jurídico que o testador utilizou, devendo o intérprete indagar qual era efectivamente a sua vontade, tendo ainda presente que não poderia este transmitir mais direitos ou direitos distintos daqueles que integravam a sua esfera jurídica. Ora, sendo certo que a herança dos inventariados apenas é constituída por um bem e que eram titulares dessa herança o testador e uma irmã, o que foi deixado à requerente, o que o testador lhe quis deixar, foi, não direito a ½ de uma casa, mas o direito e acção à herança de seus pais e irmãos pré-falecidos, herança essa que, por acaso, é constituída por uma casa. Portanto, a Requerente é herdeira dos inventariados, razão por que os Requerente têm legitimidade para requerer se proceda a inventário. (Fátima Galante) (Ferreira Lopes) (Manuel Gonçalves) [1] Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, Vol. I, 3ª ed. pag. 57. |