Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
16871/11.2T2SNT.L1-8
Relator: OCTÁVIA VIEGAS
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
ACTA DA REUNIÃO DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
PENAS PECUNIÁRIAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/02/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I-Relatório:


Condomínio do Prédio A instaurou acção executiva contra B e C, para pagamento da quantia de € 652,20 referente a prestações de condomínio e € 131, 10 de penalização, no total de € 783,30.
Juntou a acta nº13 e outras.

Foi proferido o seguinte despacho:
“Sendo as obrigações definidas e limitadas no título, desta não constando as penalizações peticionadas, não entrando na licitude substantiva da cláusula á luzo do que dispõe o art. 1434º n.º2 do Código Civil, deve indeferir-se liminar e parcialmente a execução quanto a penalizações exigidas, por falta de título, seguindo no demais.
Assim, indefiro liminar e parcialmente a presente execução no que concerne a penalizações liquidadas.
Custas, nessa parte, pelo exequente.
Notifique.
No mais, cite-se.”

Inconformado, o Condomínio do Prédio A recorreu, apresentando as seguintes conclusões das alegações:

I. O Douto Despacho recorrido indeferiu parcialmente in limine a execução no que respeita à penalização por considerar que inexiste título executivo, e embora se desconheça o motivo porque o Douto Tribunal a quo considera que há falta título.
II. De acordo com o Art.º 615.º/1 b) do CPC, a sentença está assim ferida de nulidade, pois que não se mostra devidamente fundamentada.
III. Uma vez que a acta que consubstancia título executivo quanto às penalizações é a acta 13, junta pelo Apelante em 29/06/2011, deveria o Douto Tribunal à quo ter esclarecido e fundamentado porque considera a falta de título.
IV. Uma vez que isso não foi feito, deverá antes da definitiva apreciação do presente recurso, o processo baixar à primeira instância para prolação de nova decisão expurgada de tal vício.
Por cautela, caso assim não se entenda,
V. Crê o Exequente que é entendimento do Douto Tribunal à quo que apenas constitui título executivo a acta que mencione expressamente o resumo da dívida vencida e não paga até à data da realização da Assembleia.
VI. Não pode o Agravante sufragar tal entendimento, porquanto, salvo melhor opinião, o Legislador, no Art.º 6.º/1 do Dec.-Lei 268/94 de 25/10, visou atribuir força executiva às actas de deliberações da Assembleia de Condóminos que fixem o valor das contribuições para as despesas de condomínio, despesas extraordinárias e outros pagamentos de interesse comum e/ou que não devam ser suportados pelo condomínio, mas sim que sejam responsabilidade dos condóminos.
VII. Até porque, o que tem força executiva é a deliberação reproduzida em acta, e pela sua própria natureza, uma deliberação pressupõe uma tomada de posição sobre determinado assunto, e como tal, neste caso é a fonte da obrigação para os Condóminos, e que nasceu do seu próprio acordo.
VIII. Cfr. Jurisprudência citada nas alegações, um relato que se limite a reproduzir um mero status quo, ainda que formalmente inserido no documento que se traduz na acta, não é uma deliberação, mas uma mera constatação. Desta não nasce qualquer obrigação jurídica para os condóminos.
IX. Logo, a força executiva conferida pelo Legislador, no caso sub judice, para as contribuições de condomínio está nas actas que determinam os valores das contribuições devidas pelos condóminos ao condomínio, e não na acta que reconhece a existência de uma divida de um qualquer condómino.
X. Caso assim não se entenda, então, sem prejuízo da deliberação constante da Acta 13, a penalização sempre será devida em virtude da mora, equivalendo nesta medida à obrigação de juros (Art.º 806.º do CC).
XI. E esta obrigação de juros é uma obrigação que decorre da lei e não do título executivo (Art.º 703.º/2 do CPC).
XII. O que significa que, os títulos não têm que prever os juros para que estes sejam “automaticamente” devidos (são-no ope legis).
XIII. Por outro lado, o regime da propriedade horizontal prevê a fixação de penalizações aos condóminos (Art. 1434.º/2 do CC) que não cumprem as suas responsabilidades, sejam estas de que natureza for.
XIV. Exigindo tal normativo apenas, que tal fixação seja efectuada em sede de Assembleia de condomínio e que não ultrapasse uma quarta parte do valor colectável da fracção, em cada ano.
XV. O conceito de valor colectável já não é o actualmente em vigor, no entanto, como melhor resulta das alegações este pode ser obtido pela aplicação do factor 15, desta feita como dividendo, sobre o valor patrimonial tributável da fracção (Art.º 6.º do Diploma preambular da antiga CA).
XVI. Ora, não se encontram preteridos, nem o requisito, nem o limite constante de tal norma.
XVII. Não estando por isso a deliberação “ferida” de nulidade ou anulabilidade.
XVIII. Para além que, ainda que o fosse, a sua não impugnação nos termos legais, sempre imporia a sua convalidação, já que a única forma de invalidade das deliberações da Assembleia de Condóminos é a anulabilidade, inexistindo casos de nulidade legalmente consagrados.
XIX. Assim, verificando-se a mora, é sempre devida a penalização em virtude das disposições conjugadas dos Art.ºs 804.º e ss e 1434.º/2 todos do CC.
Não obstante,
XX. Não se pode concordar que o Apelante tivesse de, conjuntamente com a apresentação da acção executiva, apresentar acção declarativa para ver reconhecido o seu direito de cobrar a penalização, direito esse que na realidade não oferece qualquer contestação, no que à sua legalidade, eficácia, existência e validade respeita. Principalmente, numa altura em que o legislador avança no sentido da “libertação” do Tribunal de assuntos burocráticos para o deixar para a sua verdadeira vocação – a aplicação do direito e a realização da justiça.

Termina dizendo que deverá ser dado provimento ao presente recurso e em consequência ser declarada a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação, devendo o Tribunal à quo cumprir esse desiderato. Caso assim não se entenda, então deverá ser julgado procedente o presente recurso em consequência sendo o despacho recorrido revogado e substituído por outro que receba o requerimento inicial in totum e ordene o prosseguimento dos autos para cobrança coerciva da totalidade da quantia exequenda,

Foram cumpridos os vistos legais.

Cumpre decidir.

A acção executiva tem necessariamente que se basear num documento com força legal suficiente para servir de base à execução, dispondo o art. 45, nº1, do CPC que toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.

O título executivo pressupõe necesssariamente a afirmação de um direito em benefício de uma pessoa e a constituição de uma obrigação a cargo de outra. ( cfr. A.Reis, in Processo de Execução, Vol. I, 3ª ed. - 147.

O art. 703 do CPC enumera taxativamente os títulos executivos.

O título executivo é um pressuposto formal para o exercício do direito de acção.(Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, vol.I, pág. 147)

O título consigna a obrigação, não se reduzindo à natureza de um simples meio de prova. (Cfr. Anselmo de Castro, A acção executiva, pág.15).

Nos termos do art.703, d) do CPC, podem servir de base à execução “ os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.

Por sua vez o art. 6, nº1, do DL 268/94, de 25.10 estipula que: “ A acta de reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação, fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”

É assim atribuída força executiva à acta da ser assembleia de condóminos, podendo ser instaurada execução`contra o proprietário da fracção, condómino devedor relativamente .à sua contribuição em falta para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de de serviços de interesse comum, sem que previamente tenha que lançar mão do processo declaração a fim de obter o reconhecimento do crédito,

O art. 1434, nº1, do C. Civil , diz que a assembleia de condóminos pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das suas deliberações ou das decisões do administrador, com os limites pecuniários referidos no seu nº2 e desde que respeitada a maioria dos votos a que alude o art. 1432, nºs 3 e 4 do CC.

Esta possibilidade radica no princípio geral de estabelecimento de cláusulas penais ( Pires de Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª edição, pág. 450

O art. 1º e 2º do DL 268/94, as deliberações consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções.

Sandra Passinhas, in Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, Almedina 2000, pág. 310 defende que deve entender-se de forma ampla a expressão “contribuições devidas ao condomínio” de forma a nela se integrarem as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, com inovações, contribuições para o fundo comum de reserva, seguro de incêndio e as penas pecuniárias fixadas nos termos do art. 1434 do CC.

A jurisprudência tem se divido quanto à inclusão das penas pecuniárias na previsão do art. 6º , nº1 do DL 268/94, de 25/10.

Consideramos que a penalização não se subsume ao conceito de despesa, consistindo numa indemnização acordada pelos condóminos para o caso de incumprimento, pelo que não está abrangida pelo preceituado no art. 6 do DL 268/94, de 25.10, porque não respeitam às despesas e pagamentos aí referidos.

Assim, a acta nº13, de 11.02.2004, que aprovou uma penalização correspondente a 10% da quota por cada mês em mora (fls. 36 a 41) não constitui titulo executivo no que concerne às peticionadas penalizações, sendo necessário, caso pretendam socorrer-se do aí deliberado nessa matéria, recorrer a acção declarativa de condenação com vista a ser reconhecido o direito às mesmas, com vista à obtenção de decisão e titulo executivo nos termos do art.703, nº1, a), do CPC.

Face ao exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.



Lisboa, 02.06.2016



Octávia Viegas
Rui da Ponte Gomes
Luís Correia de Mendonça
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: