Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
379/12.1YHLSB.L1-7
Relator: PIMENTEL MARCOS
Descritores: FIRMA
PRINCÍPIO DA NOVIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/15/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDÊNCIA
Sumário: 1. Firma é o nome sob o qual o comerciante exerce o seu comércio e que, portanto, o individualiza e designa nas suas relações comerciais.
2. No nosso ordenamento jurídico consagra-se o principio do exclusivismo ou da novidade, que impõe que a firma de cada comerciante seja distinta da dos outros comerciantes, assegurando-se assim a respectiva função distintiva, que consiste em individualizar ou distinguir o comerciante no exercício do seu comércio dos demais comerciantes (cfr. artigos 33.º do RNPC e 10.º, n.º 3, do CSC)
3. Firmas completamente distintas são aquelas que não são idênticas, nem por tal forma semelhantes com outra já registada que induza facilmente em erro ou confusão o público, não podendo este distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto.
4. Na apreciação do risco de confusão há que ter em atenção a força distintiva dos sinais em causa, pois os sinais fortes estão, por natureza, especialmente vocacionados para perdurarem na memória do público.
5. As firmas «PRF GTC, SA» e «P.R.F. - CVI, Lda» não são facilmente confundíveis, pois, além de o seu objecto social ser totalmente diferente, e estando sediadas em concelhos bastante distantes entre si, o único elemento comum é “PRF”, que não é um sinal impressivo, pouco dizendo à generalidade consumidor, e não sendo de fácil percepção, que perdure na memória dos interessados.
6. Para se aquilatar da confundibilidade ou do induzimento em erro entre sociedades, deverá atender-se também aos critérios auxiliares enunciados no artigo 33.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 129/98, de 13 de Maio, ou seja: i) ao tipo de pessoa; ii) ao seu domicílio ou sede; iii) a afinidade ou proximidade das suas actividades; e iv) o âmbito territorial de tais actividades.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa – 7ª secção.
I
“PR… S.A.”,…, ao abrigo do disposto no artigo 70.º do Regime do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (Regime do RNPC), instaurou a presente impugnação judicial do despacho do Senhor Vice-Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P. (IRN. I.P.), que concedeu provimento parcial ao recurso hierárquico interposto do despacho proferido pelo Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC).
Alega, em síntese, que, em 02-07-2012, apresentou no RNPC o pedido de certificado de admissibilidade n.º 2..., para alteração de entidade já constituída, indicando como firma pretendida “PRF – GTC, S.A.”, mantendo o objecto social “projectos e engenharia, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção”.
Na sequência do indeferimento do pedido de certificado de admissibilidade para alteração de entidade já constituída, com o fundamento de que a denominação proposta é confundível com “P.R.F. – CVI, Lda.” e com “PFR, SGU E.M., S.A.”, a requerente interpôs recurso hierárquico, no âmbito do qual foi proferido despacho que sustentou a reparação do despacho proferido, quanto ao fundamento da confundibilidade com a “PFR, SGU, E.M., S.A.”, e a manutenção quanto à confundibilidade com a primeira firma.
Sucede que a recorrente tem objecto social distinto do objecto da “P.R.F.– CVI, Lda.”, em nada alterando o facto de em ambos constar a palavra “construção”, dado que, em relação à primeira, a construção é decorrente das instalações eléctricas, mecânicas e redes de gás, enquanto a construção constante do objecto social da segunda se reporta à construção civil, em termos gerais.
A recorrente e a “P.R.F. – CVI, Lda.” têm CAE diversos, estão sediadas em locais distantes entre si (L… e F…, respectivamente) e exercem actividades perfeitamente distintas, não havendo fundamento para o consumidor médio, atento e diligente, as confundir.
Acresce que “PRF”, que a recorrente pretende usar na sua firma, advém das iniciais do administrador único da sociedade, …, encontrando-se essa denominação (PRF) registada como marca nacional, a favor da recorrente, sendo que tem também registado em seu nome o logótipo que inclui a sigla “PRF” e bem assim duas marcas comunitárias que contêm essa denominação.
Assim, a recorrente pede a revogação do despacho impugnado e a sua substituição por outro que lhe conceda o certificado de admissibilidade para alteração de entidade já constituída, com a firma “PRF – GTC, S.A.”
Notificada a terceira interessada “P.R.F. – CVI, Lda.”, com sede…, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 70.º, n.º 6, do Regime do RNPC, não apresentou contestação.
Em primeira instância foi decidido negar provimento ao recurso interposto por PRCF – GTC, S.A., e, em consequência, manter o despacho recorrido, que indeferiu o pedido de certificado de admissibilidade n.º …, para efeitos de alteração da sua firma para “PRF – GTC, S.A.”
Inconformada, apelou a requerente, formulando as seguintes conclusões:
1. A denominação em crise, PRF – GTC, SA, não é confundível com a firma P.R.F. - CVI, Lda.
2. Uma vez que a recorrente tem objecto social distinto da sociedade P.R.F.  CVI, Lda., sendo objecto da recorrente, projectos e engenharia, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção.
3. Em nada altera o facto de, segundo consta na sentença em crise, no objecto social de ambas as sociedades constar a palavra construção, dado que a construção constante do objecto social da recorrente é a construção decorrente das instalações eléctricas, mecânicas e redes de gás, conforme decorre da leitura daquele objecto social e a construção constante do objecto social da firma P.R.F. - Compra e venda de imóveis, Lda., se reportar à construção civil em termos gerais.
4. Igualmente os CAEs de ambas as firmas são distintos, em nada se confundindo.
5. A actividade exercida de facto por ambas as firmas é perfeitamente distinta
6. As sedes das firmas são em concelhos que distam entre si diversas dezenas de Kms.
7. Actividades que qualquer consumidor médio, atento e diligente não confunde.
8. Acresce, a denominação PRF, que a recorrente pretende usar na sua firma é uma palavra proveniente das iniciais do nome do administrador único da sociedade, ….
9. Denominação (PRF) que se encontra registada como marca nacional, a favor da Recorrente, sob o n.º …, tipo de sinal: verbal, no Instituto Nacional de Propriedade Industrial.
10. Igualmente a sociedade recorrente, detém registada a seu favor o logotipo n.º 13411, tipo de sinal: misto, no Instituto Nacional de Propriedade Industrial, logótipo, no qual se inclui o vocábulo PRF.
11. Do mesmo modo, a recorrente tem registada a seu favor, no Instituto de harmonização no mercado interno, marcas, desenhos e modelos, a marca denominativa/verbal, PRF, com o número ….
12. Igualmente, a recorrente tem registada a seu favor, no Instituto de harmonização no mercado interno, marcas, desenhos e modelos, a marca figurativa/logotipo, onde se inclui o vocábulo PRF, com o número .... Doc.
13. Este registo de marcas a favor da sociedade recorrente, levou a que esta venha a utilizar há diversos anos nas suas relações comerciais a denominação PRF, situação que também já ocorria anteriormente àqueles registos
14. O que sucede por exemplo, em todas os seus ofícios, comunicações e viaturas, onde consta o aludido logotipo.
15. O critério de distinção entre firmas, radica-se, fundamentalmente, na eventualidade de indução em confusão ou erro. Ac. STJ, processo 09B0554, de 25/03/2009.
16. Não há qualquer possibilidade de indução em confusão ou erro, dadas as distintas actividades, objectos, CAEs e locais de sede das sociedades envolvidas.
17. Haverá susceptibilidade de confusão ou erro sempre que se verifique uma situação em que um sinal seja tomado por outro, o que implica que uma sociedade seja tomada por outra. Ac. STJ, processo 09B0554, de 25/03/2009.
18. Do exposto, não existirá qualquer possibilidade que tal venha a acontecer, porquanto a sociedade recorrente detém uma actividade, objecto, CAE e local de sede, diferente e distinto da outra firma referida.
19. Haverá também susceptibilidade de confusão ou erro quando o público possa considerar que há identidade entre as realidades que os sinais visam distinguir ou que existe uma relação entre essas realidades – por exemplo, a existência e uma relação de grupo entre duas sociedades, quando tal não exista – podendo, assim, haver um benefício do prestígio e crédito de uma por outra. Ac. STJ, processo 09B0554, de 03/25/2009.
20. Firmas completamente distintas são, pois, firmas que não são idênticas, nem por tal forma semelhantes que possam induzir em erro ou confusão. Ac. STJ, processo 09B0554, de 03/25/2009.
21. Sendo a firma um sinal de identificação e distinção do comerciante, o respectivo juízo de confundibilidade, nomeadamente, quanto ao objecto do seu comércio, há-de ser aferido com respeito ao conteúdo global da mesma, que deve ser sempre distinta, não só de outras firmas, como de outros sinais distintivos.
22. A apreciação da susceptibilidade de confusão ou erro entre firmas há-de ser aferida em relação ao conteúdo global de cada uma delas. Ac. TRL, processo 3083/06.6TVLSB.L1-1, de 16/03/2010.
23. A possibilidade de confusão deve subsistir objectivamente e a circunstância de uma confusão ter ocorrido por ligeireza ou descuido de um consumidor não é suficiente, quando as firmas ou marcas se apresentam diferenciadas aos olhos de uma pessoa medianamente atenta e diligente.
24. Para que o princípio da novidade seja violado tem de haver uma possibilidade objectiva de confusão. Ac. TRL, processo 0032106, de 24/10/1991.
25. Não haverá confusão (entre a recorrente e a firma referida) quando observadas as expressões alusivas às suas actividades, bem diferentes umas das outras e sem a mínima afinidade ou proximidade. Ac. TRL, processo 0032106, de 24/10/1991.
26. Mais se diga que o juízo sobre a confundibilidade da firma deve aferir-se em função da opinião de um homem comum, medianamente ponderado e atento; um consumidor cauto, ou um fornecedor avisado, ante aqueles elementos parcialmente comuns na firma de duas sociedades, possa, com grau razoável de probabilidade, não as distinguir. Ac. STJ, processo 03A1914, de 10/06/2003.
27. A lei não proíbe que uma denominação social ou marca insira algum elemento já constante de outro, desde que pela sua natureza, estrutura ou composição seja insusceptível de gerar o erro ou confusão no comércio, tendo em conta o consumidor médio ou padrão. AC. STJ, processo 03B2771, de 16/10/2003.
28. Mais se diga que será ainda fácil encontrar no universo de denominações existentes e aprovadas pelo Registo Nacional de Pessoas Colectivas um sem número de casos idênticos e cuja firma é igual, sendo unicamente distinta a referência à actividade exercida pela sociedade em concreto.
E termina dizendo que deve dar-se provimento ao presente recurso e, como consequência, ser revogada a decisão de indeferimento do pedido .
II
Com interesse para a decisão impugnada, em primeira instância foram dados como assentes os seguintes factos:
1.- Em 02-07-2012, a recorrente PRCF – GTC, S.A., com sede no concelho de L… e com objecto “projectos e engenharia, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção”, apresentou no RNPC o pedido de certificado de admissibilidade n.º 2012028313, para efeitos de alteração da sua firma para “PRF – GTC, S.A.”
2.- Por despacho de 05-07-2012, proferido pela Senhora Directora do RNPC, foi o mencionado pedido indeferido, com fundamento na confundibilidade da denominação pretendida com as preexistentes “P.R.F. – CVIis, Lda.”, com sede em F…, e com “PFR, SGU, E.M., S.A.”, com sede em ….
3.- Em 08-08-2012, a recorrente apresentou recurso hierárquico do despacho proferido, referido em 2, no âmbito do qual o Senhor Vice-Presidente do IRN, I.P., proferiu decisão no sentido da reparação do mencionado despacho, quanto ao fundamento da confundibilidade com a “PFR, SGU, E.M., S.A.”, e a sua manutenção quanto à confundibilidade com a “P.R.F. – CVI, Lda.”
4.- A “P.R.F. – CVI, Lda.”, com sede no concelho de F…, tem como objecto “compra e venda de todo o tipo de bens imobiliários, indústria de construção, construção de edifícios”.
5.- A recorrente é titular das seguintes marcas:
a) marca nacional n.º …. “PRF”, com registo pedido em 17-06-2008 e concedido por despacho proferido em 09-09-2008, destinada a assinalar os seguintes serviços das classes 37 e 42 da Classificação Internacional de Nice: (classe 37) “construção, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânica, redes de gás e construção” e (classe 42)  “engenharia; projectos e engenharia de instalações eléctricas e mecânicas e redes de gás e construção”;
b) marca comunitária n.º … “PRF”, registada em 22-03-2011, destinada a assinalar os seguintes serviços das classes 37 e 42 da Classificação Internacional de Nice: (classe 37) “construção; reparações; serviços de instalação” e (classe 42) “serviços científicos e tecnológicos bem como serviços de pesquisas e concepção a ele referentes; serviços de análises e pesquisas industriais; concepção e desenvolvimento de computadores e de programas de computadores”; e
c) marca comunitária n.º … , registada em 30-05-2011, destinada a assinalar os seguintes serviços das classes 37 e 42 da Classificação Internacional de Nice: (classe 37) “construção; reparações; serviços de instalação” e (classe 42) “serviços científicos e tecnológicos bem como serviços de pesquisas e concepção a eles referentes; serviços de análises e pesquisas industriais; concepção e desenvolvimento de computadores e de programas de computadores”.
6.- A recorrente é ainda titular do registo do logótipo n.º …, com registo pedido em 15-10-2008 e concedido por despacho proferido em 07-04-2009.
7.- O logótipo refere-se ao Código de Actividade Económica 43221 “instalação de canalizações” e ao Código de Actividade Económica 43222 “instalação de climatização, construção, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção; engenharia; projectos e engenharia de instalações eléctricas e mecânicas e redes de gás e construção”.
8.- A sigla “PRF” corresponde às iniciais do nome administrador da recorrente, PRF.
III
Foram dispensados os vistos.
É pelas conclusões que se determinam o âmbito e os limites do recurso.
Assim, a questão posta no presente recurso consiste apenas em saber se a firma “PRF – GTC, S.A.”, pretendida pela recorrente, é susceptível de provocar erro ou confusão com a firma preexistente “P.R.F. – CVI, Lda.”
1. Firma é o nome sob o qual o comerciante exerce o seu comércio e que, portanto, o individualiza e designa nas suas relações comerciais[1].
No dizer de A. FERRER CORREIA (Lições de Direito Comercial, Coimbra, 1973, vol. I, p.258) a firma constitui um sinal distintivo do comerciante que se traduz no “nome por ele adoptado no exercício da sua empresa”, identificando-o na sua individualidade económica.
A actual disciplina do licenciamento das firmas e denominações, incluindo os princípios gerais a que deve obedecer a respectiva composição da inscrição no ficheiro central das pessoas colectivas, consta do Decreto-Lei n.º 129/98, de 13.05.
O artigo 10º do Código das Sociedades Comerciais, relativamente à firma das sociedades comerciais, continua a ser aplicável como direito especial, expressamente ressalvado pelo artigo 37º do Regime do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, anexo ao citado Decreto-lei 129/98.
O registo da firma de uma sociedade comercial confere à respectiva titular o direito ao seu uso exclusivo em todo o território nacional – artigos 3.º, 35.º, n.º 1 e 37.º, n.º 2 do Regime do RNPC.
Conforme dispõe o artigo 10.º, n.º 3 do Código das Sociedades Comerciais (CSC), “a firma da sociedade constituída por denominação particular ou por denominação e nome ou firma de sócio não pode ser idêntica à firma registada de outra sociedade, ou por tal forma semelhante que possa induzir em erro”.
Sobre o princípio da novidade ou exclusividade, que é o que está em causa, estabelece, por sua vez, o artigo 33.º do Regime do RNPC, n.ºs 1 e 2:
1. As firmas e denominações devem ser distintas e não susceptíveis de confusão ou erro com as registadas ou licenciadas no mesmo âmbito de exclusividade, mesmo quando a lei permita a inclusão de elementos utilizados por outras já registadas, ou com designações de instituições notoriamente conhecidas”.
2. Os juízos sobre a distinção e a não susceptibilidade de confusão ou erro devem ter em conta o tipo de pessoa, o seu domícílio ou sede, a afinidade ou proximidade das suas actividades e o âmbito territorial desta.
Este princípio “impõe que a firma de cada comerciante seja distinta da dos outros comerciantes, assegurando assim a respectiva função individualizadora, que consiste em distinguir o comerciante no exercício do seu comércio dos demais comerciantes” (Carlos Olavo, Propriedade Industrial, Sinais Distintivos do Comércio, Concorrência Desleal, 2.ª ed., Almedina, 2005, p.201).
«As firmas e denominações devem ser distintas e não suscpetíveis de confusão ou erro com as registadas ou licenciadas no mesmo âmbito de exclusividade, mesmo quando a lei permita a inclusão de elementos utilizados por outras já registadas, ou com designações de instituições notoriamente conhecidas» (Artº. 33.º, 1, do RRNPC)[2]
Consagra-se, pois, o principio do exclusivismo ou da novidade, que impõe que a firma de cada comerciante seja distinta da dos outros comerciantes, assegurando-se assim a respectiva função distintiva, que consiste em individualizar ou distinguir o comerciante no exercício do seu comércio dos demais comerciantes.
A questão está em saber quando se pode dizer se as firmas são ou não confundíveis.
2. A este respeito é citado (quer no tribunal recorrido, quer nas alegações de recurso) o acórdão do STJ de 25-03-2005 (disponível na Internet), no sentido de que o critério de distinção entre firmas radica, fundamentalmente, na eventualidade de haver confusão entre elas.
Foi com efeito referido nesse acórdão:
«Haverá também susceptibilidade de confusão ou erro quando o público possa considerar que há identidade entre as realidades que os sinais visam distinguir ou que existe uma relação entre essas realidades - por exemplo, a existência e uma relação de grupo entre duas sociedades, quando tal relação não exista – podendo, assim, haver um benefício do prestígio e crédito de uma por outra.
Firmas completamente distintas são, pois, firmas que não são idênticas, nem por tal forma semelhantes que possam induzir em erro ou confusão.
Para haver essa semelhança necessário é que a firma tenha tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética com outra já registada que induza facilmente em erro ou confusão o público, não podendo este distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto.
A comparação que define a semelhança verifica-se, pois, entre um sinal e a memória que se possa ter de outro.
É que o cidadão médio – que não é um técnico do sector - quase nunca se defronta com os dois sinais, um perante o outro, no mesmo momento.
A comparação que entre eles pode fazer não é, assim, simultânea, mas sucessiva.

Na apreciação do risco de confusão há que ter em atenção a força distintiva dos sinais em causa, pois os sinais fortes estão, por natureza, especialmente vocacionados para perdurarem na memória do público.
Há que ter em conta também que os sinais distintivos devem ser contemplados numa visão de conjunto, sendo irrelevantes os respectivos elementos não distintivos.
Para haver imitação não é necessária a semelhança entre todos os elementos do sinal. O que conta sobretudo é a impressão de conjunto, pois é ela que sensibiliza o público.
Desta forma, podem os vários elementos do sinal serem diferentes e no entanto, considerados em conjunto, induzirem em erro ou confusão.
Pode até haver apenas um elemento comum entre os sinais, mas esse elemento ser de tal forma predominante que dê lugar a confusão. Quando existe o mesmo elemento preponderante, as firmas não só não são completamente distintas, como são completamente idênticas».

Concorda-se com o que fica dito.
No caso decidido naquele douto acórdão do STJ, a ali recorrente apresentou no Registo Nacional de Pessoas Colectivas o pedido de certificado de admissibilidade de firma nº 373895 para as seguintes firmas-denominação: AAN SA, AANPORTUGAL, SA; FN PORTUGAL, SA.
Este pedido foi indeferido, invocando-se para o efeito a sua confundibilidade com a firma "N…- Investimentos Imobiliários, Lda", já admitida.
Esse despacho foi confirmado em 1ª instância e depois na Relação.
Neste Tribunal entendeu-se que, apesar de as firmas apresentadas pela recorrente respeitarem a ramos de comércio diferentes da firma preexistente, eram confundíveis com esta porque o elemento dominante em todas elas – o vocábulo NANTA – fazia com que, mesmo para uma pessoa medianamente sagaz, a distinção económico-juridica – a inexistência de uma relação de grupo – se tornava difícil.
E foi referido no aresto do STJ: «e evidente a identidade gráfica e fonética existente entre as denominações no que respeita ao sinal mais forte, ou seja, NANTA”. E foi ainda dito: na memória de um cidadão médio esse sinal, existente em ambas as denominações, não se distingue. Mas existem outros sinais que, embora mais fracos, têm suficiente força para, apreciados em conjunto com aquele, permitem a esse cidadão essa distinção:
-“Alimentação Animal”
-“Portugal”
- “Feed”
- “Investimento Imobiliários”.
Na verdade, aquele sinal forte não pode ser desligado destes sinais mais fracos».
E foi revogado o acórdão da Relação.
Assim, só haverá susceptibilidade de confusão ou erro quando se verifique uma situação em que um sinal seja tomado por outro, assim implicando que uma sociedade seja tomada por outra.
Por outro lado, a apreciação da susceptibilidade de confusão ou erro entre firmas há-de ser aferida em relação ao conteúdo global de cada uma delas.
A análise comparativa das firmas em confronto “deve ser feita pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a firma, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados e separadamente” (Carlos Olavo, ob. cit., p.206).
Neste contexto, como salienta COUTINHO DE ABREU[3], “uma firma (ou denominação) não é nova relativamente a outra firma ou denominação quando, atendendo à grafia das palavras, ao efeito fonético das expressões, ao núcleo caracterizante (ou “coração” da firma ou denominação), à forma “oficiosa” dos signos (e não apenas à forma “oficial”), o público “médio” (ou considerável parte dele) – o público de normal capacidade, diligência e atenção – as não consegue distinguir, as confunde, tomando uma por outra e um comerciante por outro ou, não as confundindo embora, crê erroneamente referirem-se a comerciantes distintos mas especialmente relacionados (crê, v.g., que duas sociedades com firmas semelhantes se encontram em relação de grupo).
3. Vejamos o caso em apreço.
Por um lado temos a firma preexistente “P.R.F. – Compra e Venda de Imóveis, Lda.”, respeitante a uma sociedade com sede no concelho de Fafe e que tem como objecto “compra e venda de todo o tipo de bens imobiliários, indústria de construção, construção de edifícios”. Por outro lado, a firma pretendida, “PRF – GTC, S.A.”, respeita à sociedade recorrente, com sede no concelho de L… e com objecto “projectos e engenharia, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção”.
Estão, pois, em causa duas sociedades comerciais que, embora sediadas em concelhos diferentes, gozam de um âmbito de exclusividade do uso da firma que se estende ao território nacional (artigo 37.º, n.º 2 do Regime do RNPC).
Parece-nos que as firmas “PRF – GTC, SA” e “P.R.F. - CVI, Lda” não são facilmente confundíveis.
O único elemento comum é PRF e, mesmo assim, esta tem um ponto a seguir a cada uma das letras, embora esta diferença não seja significativa, podendo mesmo não ter qualquer relevância para muitas pessoas.
A recorrente tem objecto social distinto da sociedade “P.R.F. CVI, Lda”., sendo o objecto da recorrente projectos e engenharia, execução e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas, redes de gás e construção.
Tal como consta da conclusão 3 das alegações de recurso, em nada altera o facto de, segundo consta na sentença em crise, no objecto social de ambas as sociedades constar a palavra construção, dado que a “construção” constante do objecto social da recorrente é a construção decorrente das instalações eléctricas, mecânicas e redes de gás, conforme decorre da leitura daquele objecto social e a “construção” constante do objecto social da firma P.R.F. - CVI Lda., se reportar à construção civil em termos gerais.
Os CAEs de ambas as firmas são distintos, não havendo qualquer confusão entre eles; a actividade exercida por ambas as firmas é totalmente distinta; as sedes das firmas situam-se em concelhos muito distantes entre si. Trata-se actividades que qualquer consumidor médio, atento e diligente não confunde.
Como se disse, o único elemento comum é “PRF” e, salvo melhor opinião, não se trata de um sinal impressivo, pouco dizendo à generalidade consumidor, não sendo de fácil percepção e que facilmente perdure na memória dos interessados.
Ora, vistas em conjunto, e salvo melhor opinião, não há a mínima hipótese de confusão para o comumente designado “bónus pater família”. Com efeito, temos, além do elemento comum, por um lado “CVI, Ldª” e, por outro, “GTC, S.A.”, ou seja, não só não há outros elementos comuns, como estes são totalmente diferentes entre si.
Dir-se-á que estes elementos do conjunto que caracteriza cada uma das firmas são essencialmente descritivos de actividades desenvolvidas pelas sociedades em causa, não ficando, por isso, retidos na memória do público consumidor.
Mas não deixam de ter alguma eficácia distintiva. E fazem parte da firma (e não, por exemplo, duma marca)
Se considerarmos que as sociedades em causa se dedicam a actividades completamente diferentes e que exercem a sua actividade em locais distantes entre si, não vemos que possa haver, para o “homem médio” hipótese de confusão entre as firmas em causa.
E tenha-se também em consideração o que consta das conclusões 8 a14 das alegações deste recurso.
De resto, como vimos, notificada a interessada “P.R.F. – CVI, Lda.”, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 70.º, n.º 6, do Regime do RNPC, não apresentou contestação, o que poderá ser sintomático.
4. COUTINHO DE ABREU[4] interroga-se se o princípio da novidade ou exclusividade vale para comerciantes não concorrentes, que exerçam catividades diversas, não idênticas nem similares, ou se vale tão só para comerciantes concorrentes. E responde que há quem defenda que este princípio não vale para comerciantes não concorrentes. «Na verdade, dizem, o risco de confusão entre firmas (…) em casos tais é inexistente ou quase…». Mas refere ainda que, para outros autores, o princípio vale também para comerciantes não concorrentes, declarando aderir a esta doutrina.
Mas, salvo melhor opinião, não parece ser o que resulta da lei, como tentaremos demonstrar.
A questão está em saber se pode ser tido em consideração para aplicação daquele princípio o objecto das sociedades e o local onde exercem a sua actividade.
Diz-se na sentença recorrida que atendendo às características do mercado actual, como se salientou no Acórdão da Relação de Lisboa de 05-06-2008, “a diferenciação geográfica das sedes das empresas é totalmente irrelevante face ao mercado global em que as mesmas exercem a sua actividade – no mínimo o correspondente à União Europeia”.
De forma diferente da decisão recorrida, foi entendido naquele acórdão do STJ quando se afirmou que o “facto de a sede das sociedades em causa se situarem em cidades diferente e distanciadas por centenas de quilómetros, é elemento que indicia que um cidadão médio as pode diferenciar facilmente”.
Assim, ao contrário do referido na douta sentença, pensamos que, não sendo a situação geográfica um elemento preponderante, não deixa de ter algum significado, sobretudo tratando-se de actividades que, em princípio, exercerão a sua actividade apenas em locais próximos da sede, e a generalidade das pessoas que conhece uma firma não conhece a outra.
Na verdade e embora as sociedades comerciais tenham o direito de exercer a sua actividade comercial em todo o território nacional – cfr. artigo 37º do citado Decreto-lei 129/98 - o certo é que está consagrado no nº2 do artigo 33º deste Decreto-Lei, como elemento coadjuvante para o juízo a fazer sobre a distinção e não susceptibilidade de confusão ou erro, o âmbito territorial das sociedades, pelo que há que ter a localização da sede como elemento coadjuvante para a distinção das firmas.
Para se aquilatar da confundibilidade ou do induzimento em erro, deverá atender-se também aos critérios auxiliares enunciados no citado artigo 33.º, n.º 2, ou seja: i) ao tipo de pessoa; ii) ao seu domicílio ou sede; iii) a afinidade ou proximidade das suas actividades; e iv) o âmbito territorial de tais actividades.
No caso posto à nossa consideração não existe qualquer afinidade ou proximidade das actividades das sociedades em causa, sendo certo que quanto maior fossem essas afinidades, maior seria o perigo de confusão entra elas.
Com efeito, nesta perspectiva, não há qualquer possibilidade de confusão entre as firmas em confronto. Ou seja, não há possibilidade de um homem medianamente diligente e informado, pretender dirigir-se a um local para tratar de compra e venda de um imóvel e, por confusão entre as firmas, se dirigir a um local onde se trata de instalações eléctricas, mecânicas e redes de gás.
**
Por todo o exposto acorda-se em julgar procedente a apelação e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida e o despacho impugnado, o qual deve ser substituído por outro que conceda o certificado de admissibilidade para alteração de entidade já constituída, com a firma “PRF – GTC, S.A.”
Sem custas.
Lisboa, 15.10.2013.
José David Pimentel Marcos
Manuel Tomé Gomes
Maria do Rosário Morgado.
[1]  Sobre “firmas e denominações”  pode ver-se JORGE MANUEL COUTINHO DE ABREU, in Curso de Direito Comercial, Vol. I, 7ª Edição, Almedina, págs. 154 e segs.
[2]  COUTINHO DE ABREU, ob. loc. cit. pág. 162.
[3]  Ob. loc. cit. págs. 165/166
[4] Ob. loc. cit. págs. 166/167.