Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3944/08.8TDLSB-B.L1-5
Relator: MORAES ROCHA
Descritores: GARANTIA DO PAGAMENTO
ARRESTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/04/2009
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: - Na actual redacção do art. 228º, nº1, do CPP, na redacção dada pela lei nº 59/98, de 25AGO a medida de garantia patrimonial de arresto preventivo, já não tem natureza subsidiária ou supletiva relativamente à caução económica, podendo ser decretada nos termos da lei civil, a requerimento do Ministério Público ou do lesado.
- Para que se verifique o justo receio de perda da garantia patrimonial a que aludem os art. 619º nº 1 do C. Cv. e 406º nº 1 do C.P.C. é necessário que se alegue e prove que o devedor já praticou ou se prepara para praticar actos de alienação ou oneração, relativamente ao seu património que, razoavelmente interpretados, inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à acção dos credores.
- Embora não seja necessária a certeza de que a perda da garantia se torne efectiva mas apenas que haja um receio justificado de que tal perda virá a ocorrer, não basta qualquer receio, sendo necessário, no dizer da própria lei, que o receio seja justificado. Significa isto que o requerente tem de alegar e provar factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação, não bastando o receio subjectivo, fundado em simples conjecturas, antes devendo basear-se “...em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva.”( Cfr. Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV vol., 2ª ed., pág. 187.)
Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência no Tribunal da Relação de Lisboa

O presente recurso vem interposto do despacho que indeferiu o arresto preventivo requerido pela Assistente P…, S.A., ora Recorrente, por se entender não estarem preenchidos os pressupostos necessários para decretação da providência cautelar em apreço, previstos no artigo 407.º, n.º 1 do CPC.
Das motivações extrai a Recorrente as seguintes conclusões:
a) «Em primeiro lugar, e salvo o devido respeito, saliente-se o facto de, incompreensivelmente, o Tribunal a quo basear a decisão ora em crise nos elementos constantes dos autos de inquérito principais, esquecendo que os procedimentos cautelares, não obstante serem dependência das respectivas acções principais, correm autonomamente relativamente a estas, designadamente no que se refere à produção e valoração da prova (artigo 383.º, n.º 4, do CPC);
b) Tal como expressamente resulta do artigo 408.º, n.º 1, do CPC, o arresto apenas deve ser decretado depois “examinadas as provas produzidas”, sendo que, no caso em apreço, como acima referido, não foi produzida prova antes de proferida a douta decisão recorrida, não obstante a apresentação de várias testemunhas por parte da ora Requerente (conforme documentado nos autos a fls.);
c) Por outro lado, não se pode deixar de salientar que resulta da fundamentação da douta decisão recorrida a ideia de que o decretamento ou não do arresto em causa poderá (ou poderia) vir a depender de eventuais desenvolvimentos da investigação em curso nos autos principais;
d) Ora, tal entendimento é, salvo o devido respeito e melhor opinião, desprovido de qualquer cabimento legal, em virtude de estar em causa um processo urgente – arresto – que, como é natural, corre autonomamente, e com necessidades de celeridade processual (cfr. artigo 382.º, n.º 2 do CPC) que a tramitação normal dos autos principais não satisfaz;
e) Considera a Requerente que, ao contrário do entendimento plasmado na decisão ora em crise, e atendendo ao exposto na petição inicial apresentada no âmbito do arresto preventivo, encontram-se preenchidos os pressupostos necessários para decretação da providência cautelar em apreço, como resulta do teor do requerimento inicial de arresto aqui em causa, documentado nos autos a fls.;
f) Atento o disposto no n.º 2 da Base II da Lei 4/73, de 4 de Junho, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 36/2000, de 14 de Março, os membros dos agrupamentos em apreço são solidariamente responsáveis pelo pagamento das dívidas dos ACE’s;
g) Dispõe, por sua vez, o artigo 78.º, n.º 1 do CSC que os gerentes respondem para com os credores da sociedade quando, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção destes, o património social se torne insuficiente para satisfação dos respectivos créditos;
h) Ora, tal como referido no requerimento inicial de arresto preventivo, face aos acima demonstrados montantes em dívida, a Requerente accionou os ACE’s devedores e os respectivos membros, atento o mencionado regime da responsabilidade solidária dos mesmos pelo pagamento das dívidas dos ACE’s de que são parte, tendo, porém, constatado que a sociedade comercial D… Lda., integrada num dos aludidos ACE´s devedores, havia sido dissolvida e liquidada (conforme cópia da respectiva Acta, juntas como Docs. 12 ao requerimento inicial de arresto apresentado em 29.10.2008);
i) Com efeito, a Assembleia-Geral da referida sociedade deliberou igualmente transferir a totalidade dos seus activos para a sócia única e, no caso, comum a ambas, designada A… Investments Limited, com sede em New Street St. …., Channel Islands (Cfr. Doc. 12 do requerimento inicial de arresto apresentado em 29.10.2008);

j) Por outro lado, saliente-se o facto de na referida cessão de quotas, bem como nos demais actos societários, o Denunciado L… de G… ter actuado em representação da A… Investments Limited (Cfr. Doc. 13 do requerimento inicial de arresto apresentado em 29.10.2008);
k) Ora, as declarações de inexistência de dívida são claramente falsas, atendendo ao exposto supra, uma vez que a sociedade D… Lda., gerida pelo Requerido e pelo Denunciado A… de R…, tinha, pelo menos para com as Requerentes, avultadas dívidas, decorrentes da participação das mesmas nos aludidos ACE;
l) Mais, o Denunciado A… de R… era ainda membro do Conselho de Administração do Agrupamento Complementar de Empresas L…, ACE, bem como gerente e, por inerência supletiva legal, liquidatário da sociedade comercial referida no parágrafo anterior, pelo que conhecia, não podendo desconhecer, a existência das dívidas cujo pagamento é pretendido pelas Requerentes (Cfr. Docs. 1 e 2 do requerimento inicial de arresto apresentado em 29.10.2008);
m) O mesmo se diga relativamente ao Requerido, o qual, enquanto gerente e liquidatário da sociedade D… Lda., conhecia também, não podendo desconhecer, a existência das aludidas dívidas, sendo de sublinhar que o mesmo se encontrava presente na Assembleia-Geral em que se deliberou a dissolução e liquidação daquela sociedade (Cfr. Doc. 12 do requerimento inicial de arresto apresentado em 29.10.2008);
n) Cumpre, aliás, salientar que a Requerente interpelou o ACE devedor e os respectivos membros, entre os quais a sociedade D…, Lda., para pagamento dos avultados montantes em dívida, através de missivas remetidas ao cuidado da respectiva gerência, na qual se incluía, conforme demonstrado, tanto o ora Requerido como o Denunciado A… de R…;

o) Na verdade, a partilha imediata do activo da mencionada sociedade, com a consequente transmissão da totalidade do património da mesma para a sócia única A…. Investments Limited só terá sido possível, atento o disposto nos artigos 147.º, n.º 1 e/ou 148.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), por ter sido falsamente declarado não existirem dívidas de qualquer natureza;
p) Dispõe ainda o n.º 1 do artigo 154.º do CSC que «Os liquidatários devem pagar todas as dívidas da sociedade para as quais seja suficiente o activo social», o que nunca sucedeu, sendo de sublinhar que os liquidatários da sociedade D…, Lda., eram os seus gerentes, isto é, o aqui Requerido e o Denunciado A… de R… (Cfr. artigo 151.º, n.º 1 do CSC);
q) Saliente-se ainda que o Denunciado L… de G…, mesmo perante a manifesta falsidade das declarações proferidas pelo Requerido e pelo Denunciado A… de R… – que não podia desconhecer, pois representava a sócia única das sociedades geridas por aqueles Requeridos –, confirmou-as e subscreveu-as, de modo a que estes lograssem atingir o seu desiderato: transferir todo o património das sociedades que dirigiam para a offshore A… Investments Limited, dificultando – e muito consideravelmente – a acção dos respectivos credores.;
r) Não é de somenos referir que o Requerido e o Denunciado A…de R…, enquanto gerentes e liquidatários da já identificada sociedade, estavam obrigados a prestar informações verdadeiras acerca da vida da mesma, de modo a que fosse possível proceder à respectiva dissolução, liquidação e partilha imediata (cfr. artigos 141.º, n.º 1, al. b), 147.º, n.º 1, e 151.º, n.º 1, todos do CSC), o que claramente não aconteceu.
s) Pelo que resulta evidente, nos termos do disposto no referido artigo 78.º, n.º 1 do CSC e Base II, n.º 2 da Lei 4/73, de 4 de Junho, que o Requerido se encontra obrigado a ressarcir a Requerente pelos créditos desta perante a sociedade que o mesmo representava;
t) De acordo com o disposto no artigo 407.º, n.º 1 do CPC, para a decretação da providência de arresto é necessário, para além da prova da existência do crédito, a justificação do receio de perda de garantia patrimonial daquele crédito;
u) Ora, conforme acima se demonstrou, o Requerido, em conjunto com os demais Denunciados dos autos principais, sabendo das dívidas do ACE para com a Requerente, e recorrendo a expedientes ilícitos, porque falsos e criminosos, transferiram dolosamente a totalidade dos activos da sociedade D…, Lda., membro daqueles ACE, para uma entidade distinta, in casu a sociedade offshore A… Investments Limited, com sede em solo estrangeiro, assim impedindo o legítimo exercício dos direitos dos credores.
v) Entende a Requerente que, muito possivelmente, se encontra perdido em definitivo o património que serve de garantia aos seus créditos sobre a sociedade D…, Lda., até mesmo porque a sociedade A… Investments Limited tem a sua sede em solo estrangeiro, num território com estatuto de paraíso fiscal (cfr. lista constante da Portaria n.º 150/2004, de 13.02.2004), com todas as nefastas implicações daí provenientes.
w) Em face do exposto, revela-se muito possível que o Requerido venha a proteger o seu património pessoal de forma similar, sobretudo depois de ser chamado a depor no âmbito dos autos principais, o que é de evitar a todo o custo.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, deverá ser proferido douto Acórdão que decrete o arresto requerido, assim se fazendo a tão costumada JUSTIÇA!»

Neste Tribunal da Relação a Exma. PGA apõe o seu visto.
Realizada a Conferência cumpre apreciar e decidir.

Importa conhecer o teor da decisão recorrida, assim:

«Nos presentes autos foi a fls. 728, pela P…, SA, deduzido arresto preventivo, contra o requerido L… de B….
Pede a requerente pelos motivos que invoca de fls. 728 a 736 dos autos que seja decretado o arresto preventivo de bens do requerido que refere a fls. 735 dos autos, alegando para o efeito terem um crédito sobre sociedades representadas por aquele, pelos quais os mesmo é solidariamente responsável, que tais sociedade foram dissolvidas e o seu património partilhado, devido a condutas ilícitas do requerido e que receia que o requerido delapide o seu património, designadamente que o transfira para um país estrangeiro, ficando assim impossibilitada de ressarcir os seus créditos.
Foram juntos documentos.
Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade da instância
cumprindo decidir.
Resulta do disposto no art° 228° do CPP, que a requerimento do lesado ou do Ministério Público, pode o Juiz decretar o arresto, nos termos da lei do processo civil.
Dispõe o art° 406° do CPC que o credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.
Importa assim apurar se verificam os pressupostos para decretação da providência requerida, nos termos da lei do processo civil, ou seja os pressupostos a que alude o art° 406° e 407° do CPC.
Compulsados os autos e tendo em conta os elementos nos autos reunidos, entendemos, pese embora o alegado pela requerente/denunciante, não estarem reunidos os pressupostos para que seja decretada a providência requerida.
Efectivamente da análise dos autos não resulta com um grau de certeza para decretação da providência requerida, a obrigação do requerido de ressarcir a requerente pelos alegados créditos daquela perante as sociedades que o mesmo representava. Por outro lado não são alegados pela requerente factos concretos donde resulte o alegado receio, da mesma não poder ressarcir os seus créditos com o património do requerido. Efectivamente não são alegados factos concretos donde tal resulte, por exemplo eventuais manobras do requerido com vista a desfazer-se do seu património, designadamente colocação daquele à venda etç... O alegado é uma mera conjectura e possibilidade, sem base factual que o suporte.
Cumpre ainda no âmbito do inquérito apurar se existem factos susceptíveis de integrar o preenchimento da tipicidade objectiva e subjectiva dos ilícitos denunciados ou de outros, bem como se se estará tão só perante um diferendo de natureza cível.
Por ora e face aos elementos existentes falecem os pressupostos referidos ou seja a probabilidade de existência de um crédito da requerentes sobre o requerido bem como a existência de um justificado receio daquela perder a garantia patrimonial do seu crédito. Efectivamente tais pressupostos in casu não existem com um grau de certeza que permita que seja decretada a providência requerida.
Assim sendo, tendo em conta o exposto não será decretado o arresto pretendido.
Decisão
Tendo em conta o exposto as disposições legais citadas e considerações expendidas, indefiro o requerido pelo que não decreto o arresto pretendido pela requerente.
Custas pela requerente, com TJ no mínimo.
Notifique.
Consigna-se que por motivos de celeridade se proferiram já os despachos supra, sem a prévia autuação dos requerimentos por apenso. Face ao exposto autue por apenso, cada um dos requerimentos que fazem respectivamente fls, 578 e 729 e seguintes bem como os documentos com os mesmos juntos e certidão dó presente despacho na parte em que a cada requerimento respeita. Deixe cópia nos autos dos requerimentos juntos e documentos, no local onde se encontram.
Após cumprimento do acima ordenado devolva o inquérito e respectivos apensos de Arresto ao DIAP».
Cumpre apreciar a questão nos seus termos gerais.
O Código do Processo Penal prevê duas medidas de garantia patrimonial:a caução económica (art. 227º) e o arresto preventivo (art. 228º), tendo ambas como finalidade processual garantir o pagamento da pena pecuniária, das custas do processo ou do pagamento de qualquer dívida, indemnização ou obrigação civil derivadas do crime, sendo aplicáveis no decurso do processo pelo juiz e desde que se verifiquem os pressupostos gerais de aplicação das medidas de coacção e de garantia patrimonial, e os pressupostos materiais que estão subjacentes à aplicação de tais medidas são os mesmos, isto é, desde que se verifique a probabilidade de um crédito sobre o requerido e fundado receio que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento.
Face à actual redacção do art. 228º, nº1, do CPP, na redacção dada pela lei nº 59/98, de 25AGO a medida de garantia patrimonial de arresto preventivo, já não tem natureza subsidiária ou supletiva relativamente à caução económica, podendo ser decretada nos termos da lei civil, a requerimento do Ministério Público ou do lesado. No caso de ter sido fixada previamente caução económica e não for prestada, o requerente do arresto fica dispensado da prova do fundado receio da perda da garantia patrimonial, sendo aplicáveis as normas dos arts. 406º e segs., do Código do Processo Civil, pelo que a prova do fumus boni iuri e do periculum in mora é feita no arresto e não no processo criminal (art. 408º, do CPC). Não é o caso destes autos, importa pois que se verifiquem os requisitos legais para o efeito, entre eles o justo receio de perda da garantia patrimonial. Ora, para que se verifique o justo receio de perda da garantia patrimonial a que aludem os art. 619º nº 1 do C.Cv. e 406º nº 1 do C.P.C. é necessário que se alegue e prove que o devedor já praticou ou se prepara para praticar actos de alienação ou oneração, relativamente ao seu património que, razoavelmente interpretados, inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à acção dos credores. Tal não sucede e é uma das razões alegadas pelo despacho recorrido, a de que não são alegados pela requerente factos concretos donde resulte o alegado receio, da mesma não poder ressarcir os seus créditos com o património do requerido. Para se apreciar da correcção do despacho recorrido importa, então, conhecer o teor do requerimento, no segmento pertinente ao assunto, sobre o qual este se pronuncia, assim:
« (…) IV — DO FUNDADO RECEIO DE PERDA DA GARANTIA PATRIMONIAL

45.
Pese embora a factualidade aqui relatada seja objecto de investigação em sede própria, no âmbito criminal, é nela que se funda o receio da ora Requerente de que o ressarcimento do seu crédito se torne impossível, por dissipação de património e perda da respectiva garantia patrimonial.

46.
Com efeito, e conforme se expôs supra, o Requerido socorreu-se de expedientes ilícitos — porque falsos — para concretizar o seu propósito: transferir a totalidade dos activos da sociedade D…, Lda., membro do ACE devedor, para uma entidade distinta, in casu a sociedade offshore A… Investments Limited, com sede em solo estrangeiro, assim impedindo o legítimo exercício dos direitos por parte dos credores.

53.
Tendo em conta a factualídade pregressa, teme a Requerente que seja perdido em definitivo o património que serve de garantia aos seus créditos, até mesmo porque a sociedade A… Investments Limited tem a sua sede em solo estrangeiro, num território com estatuto de paraíso fiscal (cfr. lista constante da Portaria n.° 150/2004, de 13.02.2004), com todas as nefastas implicações daí provenientes.

54.
Não é inverosímil temer, portanto, que o património do Requerido tenha o mesmo destino, isto é, seja transferido na sua totalidade para uma sociedade em país estrangeiro, longe da acção dos seus credores, ou subtraído à acção da Requerente por meio de mecanismos fraudulentos de natureza similar.

55.
Por tudo o que ficou acima exposto, encontram-se preenchidos os requisitos previstos no artigo 406.°, n.° 1 do Código de Processo Civil (CPC), para o qual remete o artigo 228.°, n.° 1 do CPP, ou seja, o justo receio de a Requerente perder a garantia patrimonial do seu crédito.

56.
Verificam-se, de igual forma, os demais requisitos comuns a todos os procedimentos cautelares (vide artigos 381.° e 387.°, ambos do CPC).
(…)».
Também nas conclusões de recurso se consigna «revela-se muito possível».
Das transcrições supra retira-se que o requerente teme a transferência do património da requerida. No entanto, como acima se refere, para que se verifique o justo receio de perda da garantia patrimonial a que aludem os art. 619º nº 1 do C.Cv. e 406º nº 1 do C.P.C. é necessário que se alegue e prove que o devedor já praticou ou se prepara para praticar actos de alienação ou oneração, relativamente ao seu património que, razoavelmente interpretados, inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à acção dos credores.
Com efeito, embora não seja necessária a certeza de que a perda da garantia se torne efectiva mas apenas que haja um receio justificado de tal perda virá a ocorrer, não basta qualquer receio, sendo necessário, no dizer da própria lei, que o receio seja justificado. Significa isto que o requerente tem de alegar e provar factos concretos que o revelem à luz de uma prudente apreciação, não bastando o receio subjectivo, fundado em simples conjecturas, antes devendo basear-se “...em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva.”( Cfr. Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, IV vol., 2ª ed., pág. 187.)
O justo receio de perda da garantia patrimonial ocorre sempre que o devedor adopte, ou tenha o propósito de adoptar, conduta, indiciada por factos concretos, relativamente ao seu património que, razoavelmente, interpretados inculquem a suspeita de que se prepara para subtrair os seus bens à acção dos credores (cfr. Alberto dos Reis, CPC Anotado, vol. II, págs. 19 e segs. e Rodrigues Bastos, ob. cit., vol. II, pág. 268).
Conforme se decidiu no Ac. do STJ de 26.01.2006 in www.dgsi.pt, o fundado receio exige a existência de uma situação de lesão iminente de um direito já em curso ou que se indicie que venha a ocorrer.
Ora, tal lesão surge como hipotética e não iminente, pelo menos de acordo com os elementos constantes dos presentes autos (o que não invalida que eles se venham a revelar no decurso da investigação), razão pela qual o recurso tem de improceder.

Termos em que, na improcedência do recurso, se confirma o despacho recorrido.

Custas a cargo do requerente, sendo a taxa de justiça em 5 UC’s.

Lisboa, 4 de Novembro de 2009

Moraes Rocha

Carlos Almeida (voto a decisão com os fundamentos, no essencial, constantes do acórdão proferido em 17/02/2009 pela 5ª Secção que apreciou o recurso interposto neste mesmo processo relativamente ao pedido de arresto dos bens dos outros dois denunciados.
De facto, o crédito referido pela recorrente não deriva do crime imputado ao denunciado, seja ele o de falsificação de documentos ou o de prestação de informações falsas mas sim dos contratos anteriormente celebrados entre a assistente e o ACE em que se integrava a Sociedade D… Lda)