Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5882/09.8TVLSB.L1-8
Relator: ANTÓNIO VALENTE
Descritores: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
REVOGAÇÃO DO MANDATO
JUSTA CAUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/03/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: - Celebrado um contrato pelo qual uma entidade bancária se obriga, enquanto “arranger”, a encontrar financiadores de um projecto de construção de um parque eólico, cabendo-lhe igualmente a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validade da estrutura a utilizar para a operação, tal contrato tem uma natureza mista de contrato de prestação de serviços e, mais especificamente, contrato de mandato sem representação.
- É livre a revogação do mandato pelo mandante, não sendo exigível que no próprio acto de revogação invoque os fundamentos integrantes de justa causa, podendo fazê-lo em resposta à comunicação do mandatário exigindo o pagamento de indemnização pela revogação.
- Verificando-se, que na montagem e estruturação da operação, o Banco mandatário estipulou condições que a Ré mandante não podia satisfazer em tempo útil, arrastando-se a operação por mais de três anos, sem que a Ré pudesse celebrar o contrato de financiamento e dar início à construção do parque, aproximando-se a data limite em que expiravam as licenças emitidas entre outras pela Direcção Geral de Energia, existe justa causa para a mandante revogar o mandato e celebrar um contrato de leasing com outra entidade que lhe permitiu, finalmente, proceder à construção do parque.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.


I-RELATÓRIO:


Vem nos presentes autos Banco ... pedir a condenação das Rés: S... SGPS e S… SA  no pagamento à Autora da quantia de € 183.350 a título de indemnização pelos prejuízos causados com a sua conduta ilícita e com a revogação sem justa causa do Contrato de Mandato entre ambas celebrado.

Pede também a condenação das Rés no pagamento da quantia de € 66.603,30 correspondente às despesas a suportar pela Autora no âmbito da execução do Contrato de Mandato com a consultoria jurídica e ao nível de seguros; no pagamento da quantia de € 204.382,61 a título de indemnização pelos danos causados com a rutura ilícita das negociações relativas ao financiamento acordado e no pagamento de juros de mora, calculados sobre as quantias acima mencionadas, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Pede também a condenação das Rés a pagar à Autora os custos em que a mesma irá incorrer por conta do patrocínio jurídico dos presentes autos, em montante a liquidar em execução de sentença.
Pede finalmente que se reconheça a validade do exercício, por parte da Autora, do direito de retenção sobre a quantia de € 60.000, como garantia do crédito de que é titular sobre as Rés e, em consequência, determine a compensação desta quantia no montante em que as RR vierem a ser condenadas a pagar à Autora.

As RR, por sua vez, deduziram pedido reconvencional, pugnando pela condenação do A nos seguintes termos:

- a restituir à A. S... 2 a importância de € 60.000 (sessenta mil euros), acrescida dos juros que, desde a notificação desta reconvenção e até integral pagamento, se vencerem, sobre tal quantia, às taxas resultantes do artigo 102.°, §§ 3.° e 4.°, do Código Comercial, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 32/2003, de 17 de Fevereiro, pedido formulado apenas para o caso de a R S... não vir a ser considerada parte ilegítima;
- a restituir à A. S... a importância de € 25.000 (vinte e cinco mil euros), acrescida dos juros, contados à(s) taxa(s) legal(ais), desde a notificação da reconvenção até integral pagamento, quantia essa entregue ao A por conta e em antecipação da comissão de montagem, que não é devida por não ter sido efetivamente concedido qualquer financiamento .                                                                                                    
- a pagar todas as despesas, incluindo honorários de Advogados, que as RR Reconvintes terão com a demanda, a calcular posteriormente.

A R S... foi absolvida da instância, por ilegitimidade, resultando sem efeito o pedido reconvencional por ela deduzido.

O processo seguiu os seus termos, realizando-se audiência final e vindo a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente provada e procedente condenando a Ré S... a pagar à Autora a quantia de € 150.600,00 acrescida de juros de mora e julgando totalmente improcedente o pedido reconvencional dele absolvendo a Autora.

Foram dados como provados os seguintes factos:

A-A Autora Banco ..., como instituição de crédito, desenvolve as atividades descritas no nº 1 do art. 4º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n°  298/92,  de 31 de Dezembro.
B-A Ré S... S.A. (doravante S...) é uma sociedade anónima que tem como objeto social a gestão de participações sociais de outras sociedades como forma indireta de exercício de atividades económicas.
C-A 30.07.2004, a referida R denominava-se S... SA, tendo por objeto a construção, exploração, desenvolvimento e comercialização de energias renováveis, hidráulica, eólica e solar, investigação e desenvolvimento, atividades de engenharia, de serviços, atividade de produção e comercialização de energia elétrica, calor e potência, mediante utilização de recursos renováveis, combustíveis nacionais, resíduos industriais, agrícolas ou urbanos e aproveitamentos hidroelétricos.
D-S... S.A., é uma sociedade anónima que tem como objeto social a produção e comercialização de energia através da exploração de empreendimentos de aproveitamento de energias renováveis, bem como de quaisquer outras atividades complementares ou acessórias daquela que eventualmente venham a ser necessárias ou ter relação com o objeto principal e ainda a prestação de serviços.
E-A S...  foi constituída em 26 de Abril de 2006 para explorar o Parque Eólico de Vila Franca de Xira.
F-A Ré S..., em Maio de 2003, contactou a Autora com vista ao financiamento do projeto de construção, operação e manutenção do futuro Parque Eólico de Vila Franca de Xira.
G-A instalação do referido parque eólico estava prevista para os concelhos de Vila Franca de Xira e Loures, nas freguesias de Vialonga e S. Julião do Tojal, respetivamente.
H-Estava previsto que a construção do parque eólico tivesse a duração de dez meses, após o que seria iniciada a exploração do mesmo.
I-Após contactos entre as partes para análise do projeto, da respetiva operacionalidade técnica e viabilidade financeira, a Autora apresentou à Ré S... uma proposta para a montagem e organização de um financiamento, em regime de project finance, para a construção do mencionado Parque Eólico de Vila Franca de Xira.
J-A Autora apresentou, em 30 de Julho de 2004, uma Proposta de Carta-Mandato e uma Proposta de Financiamento Indicativa, as quais foram expressamente aceites pela Ré S... - doc. de fls. 73 a 80.
L-Nos termos da referida carta mandato, a Ré S... "mandatou" a A para atuar como arranger exclusivo dos financiamentos em capitais alheios necessários ao Projeto - vd. ponto 2. do acordo.
M-Foi acordado entre A e R S... que, no âmbito da função de arranger,  a A seria remunerada através de uma comissão de montagem no valor de 1 % (um por cento) sobre o montante do financiamento que fosse efetivamente concedido ou angariado, numa base de best effort, pela Autora, comissão de montagem essa que seria liquidada mediante o pagamento de € 25.000 na data da assinatura da carta-mandato, e o remanescente na data da assinatura dos contratos de financiamento.
N-Na ficha técnica indicativa anexa à carta-mandato está prevista uma comissão de participação correspondente a 0,75% flat sobre o montante total de cada uma das linhas de financiamento, cobrada na data de assinatura do contrato - v. fls. 78.

O-De acordo com a Ficha Técnica Indicativa anexa à carta-mandato, o financiamento seria estruturado da seguinte forma:
(i) Financiamento de longo prazo até ao máximo de € 11.000.000;
(ii) Financiamento de IVA (conta corrente) at é ao máximo de €400.000;
(iii) Garantia bancária de € 757.918,11; e
(iv) Garantia bancária de € 60.000.

P-Foi acordado pelas partes que, atento o facto da estrutura contratual do projeto ainda não estar completamente definida, a proposta de financiamento apresentada pela Autora e aceite pela Ré S... era indicativa.

Q-Consta da carta-mandato (fls. 73 e 74) que a mesma carta e a respetiva ficha técnica indicativa anexa expressam formalmente o interesse da A em financiar a S..., no âmbito do Projeto, sujeito à verificação das seguintes condições:
-due diligence técnico, efetuado por consultor independente nomeado pela Autora, com emissão de parecer favorável à adequabilidade, fiabilidade, potência e qualidade de produção dos equipamentos que constituem o projeto;
-due diligence jurídico, efetuado por consultor independente nomeado pela Autora, com emissão de parecer favorável ao pacote contratual do projeto;
-Contratos de Financiamento e Garantias em termos satisfatórios para a A;
-Contratos de Construção e Fornecimento de equipamento em termos satisfatórios para a A;
-Contrato de Operação e Manutenção em termos satisfatórios para a A;
-Confirmação da obtenção das licenças necessárias à instalação, construção, exploração e outras necessárias à viabilidade do Projeto, a emitir pelas autoridades competentes;
-Confirmação da atribuição do ponto de ligação à rede e assinatura do Contrato de PPA ("Power Purchase Agreements") com a EDP - Energias de Portugal, S.A. e REN - Rede Eléctrica Nacional, S.A. após o Projeto estar construído;
-Confirmação da contratação das apólices de seguros e pagamento dos respetivos prémios iniciais;
-Finalização da modelização financeira e de análises de sensibilidade aos cash-flows; e
-outras ações de due diligence consideradas razoáveis para operações desta natureza.
Q-1 - De acordo com a Ficha Técnica Indicativa anexa à carta-mandato, todos os custos inerentes à formalização do financiamento e à montagem da operação de sindicação serão integralmente suportados pelo mutuário - fls. 80 e 272.

R-Na qualidade de arranger, competia à Autora a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validação da estrutura a utilizar para a operação, com a correspondente determinação do nível de endividamento máximo comportável, e a implementação da solução de financiamento selecionada.
S-A Autora procedeu à análise da informação preliminar sobre o projeto, nomeadamente à análise da informação sobre o local de implantação do parque eólico, condições e estado das licenças, especificações e custo do equipamento a adquirir, custos de operação previstos e custos de manutenção.
T-A Autora contratou com a sociedade de advogados Vasconcelos, F. Sá Carneiro, Fontes & Associados, posteriormente objeto de fusão na sociedade de advogados Uría & Menéndez, a assessoria e consultoria jurídica na operação de financiamento em causa.                                                                                                                                                                        U -A assessoria e consultoria jurídica em apreço consistiu na elaboração de documentos financeiros necessários - Contratos Financeiros - relativamente a:
- Contrato de Financiamento;
- Contrato de Garantias;
- Contrato de Opção de Compra;
- Acordo Direto com empreiteiros.

V-Bem como a revisão, análise e verificação das condições e alocação de risco pretendidas pelos bancos financiadores relativamente aos Contratos do Projeto, onde se incluíam:
- Contrato de Empreitada, Fornecimento e Montagem;
- Contrato de Operação e Manutenção;
- Contratos diversos relativos aos terrenos para a construção do parque eólico.

X-As minutas dos Contratos Financeiros foram elaboradas e a análise jurídica dos documentos relativos aos Contratos do Projeto foi efetuada.
Z-O início da construção do parque eólico não teve lugar na data prevista.

AA- A Autora, em nome e a pedido da Ré S..., emitiu em 6 de Setembro de 2004 a Garantia Bancária autónoma nº 02/2004, a favor da EDP - Distribuição Energia, S.A., no valor de € 60.000 tal como previsto.
AB- A R solicitou a emissão da garantia fazendo menção de que a mesma "está fora do âmbito do pacote que temos vindo a negociar com o Banco ..." - doc. de fls. 199.
AC- A mencionada Garantia Bancária visava garantir as obrigações da Ré S... perante a EDP-Distribuição Energia, S.A. referentes à conclusão dos trabalhos de instalação do ponto de receção de energia elétrica, conforme é exigido pelo Decreto-Lei nº 312/2001, de 10 de Dezembro.
AD- Em Dezembro de 2004, a Autora continuou a realização dos trabalhos acordados com a R.
AE- Teve lugar uma reunião entre a Autora e a Ré S... em 17 de Janeiro de 2005 onde foi efetuado um ponto de situação dos trabalhos relativos ao financiamento do parque eólico (doc. de fls. 207).

AF- Nessa reunião ficou definido que os próximos passos a desenvolver consistiam no seguinte:
- reporte dos trabalhos da auditoria referente aos contratos de seguro;
- obtenção da análise jurídica do Contrato de Estatutos da sociedade S... 2;
- agendamento de reunião para análise e discussão dos Contratos Financeiros; - análise, por parte da Ré S..., da minuta do Contrato de Acordo Direto a celebrar com o fornecedor do equipamento.

AG- Após negociação sobre o clausulado dos contratos subjacentes ao projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira, em 28 de Abril de 2005 teve lugar uma reunião entre a Autora e a Ré S..., assessoradas pelos respetivos consultores jurídicos, no âmbito da qual foi efetuado um ponto de situação do projeto.
AH- Em 30 de Maio de 2005, realizou-se urna reunião entre as partes, no âmbito da qual foram analisadas as consequências da introdução da nova fórmula de cálculo do tarifário elétrico no modelo financeiro acordado pelas partes.
AI- Em 30 de Agosto de 2005, a Autora enviou à R um relatório com as questões em aberto para a conclusão do processo de financiamento, solicitando informações sobre o andamento dos trabalhos pendentes - doc. de fls. 216.
AJ- Em reunião que teve lugar em 27 de Outubro de 2005, a R informou a Autora da emissão, por parte da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do parecer negativo relativo ao parque eólico dada a localização de um dos aerogeradores a menos de 300 metros de urna habitação; perante as soluções de colocar esse aerogerador atrás dos restantes sete ou mudar de fornecedor e instalar 6 aerogeradores com 2 MW cada, seguiu-se a 2.a opção - doc. de fls.217.
AL- Face a tal alteração, foi forçoso substituir o fornecedor dos aerogeradores de modo a garantir a capacidade de produção inicialmente prevista para o parque eólico.
AM- Nesta sequência, tornou-se necessário proceder à reformulação dos pareceres técnicos anteriormente emitidos.
AN- Os valores de investimento e custos, face às alterações ao projeto, sofreram alterações, tendo a Ré, em Outubro de 2005, acordado com a Autora no envio de toda a documentação financeira e técnica para reanalisar a proposta de financiamento acordada.
AO- Após o envio da mencionada documentação, foi necessário analisar as minutas dos contratos a celebrar com o novo fornecedor dos aerogeradores, bem como proceder à revisão do relatório de due diligence técnico.
AP- Em 4 de Novembro de 2005, a Ré remeteu à Autora, para análise, as minutas dos contratos a celebrar com a Repower, fornecedora dos equipamentos, bem como as novas minutas do contrato de fornecimento e respetivos anexos, e do contrato de operação e manutenção, alterados em função das alterações efetuadas ao projeto.
AQ- A Autora, naquela data, aguardava os comentários da R às novas minutas dos Contratos Financeiros, bem como a aceitação da proposta apresentada pela AEA Technology plc para a reformulação do relatório de due diligence técnico.
AR- Em 16 de Dezembro de 2005, a Autora enviou à R o novo relatório de due diligence, de acordo com o qual a produção anual estimada para o Parque Eólico de Vila Franca de Xira iria sofrer uma ligeira redução devido à disposição dos novos aerogeradores.
AS- Não obstante tal redução, a Autora comunicou que, considerando os atuais pressupostos de exploração, mantinha o rácio de dívida/capitais próprios já proposto, solicitando à R a confirmação da respetiva aceitação dos novos parâmetros de financiamento do projeto.
AT- Em 19 de Dezembro de 2005, R comunicou à Autora que aceitava os parâmetros de financiamento do projeto nas condições propostas pela Autora.
AU- Após isto e na sequência da análise da diversa documentação entregue pela R, a Autora, em 25 de Janeiro de 2006, solicitou o envio de um conjunto de documentação que se mostrava em falta e que era essencial para concluir a elaboração dos contratos finais.

AV- Em 6 de Fevereiro de 2006, teve lugar uma reunião entre a Autora e a R onde foi feito um ponto de situação do projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira, da qual resultaram, entre outras, as seguintes conclusões:
(i)Minutas dos Contratos de Fornecimento/Empreitada - a Ré S... ficou de enviar à Autora as sugestões e alterações ao mesmo;
(ii)Minutas dos Contratos Financeiros - a Ré S... ficou de apresentar à Autora questões que considerava pertinentes aos mesmos;
(iii)Documentos Societários - a Ré S... aguardava a publicação do Reconhecimento de Interesse Público para proceder à constituição da sociedade (a S... 2);
(iv)Minutas dos Estatutos (da S... 2) e Acordo de Realização de Fundos Próprios - a R iria rever os mesmos em função dos comentários apresentados pela Autora;
(v)Licenciamento Camarário - aguardava publicação do Reconhecimento de Interesse Público;
(vi)Licenciamento Ambiental - aguardava despacho sobre a correção de lacunas e incorreções destetadas;
(vii)Condições Arqueológicas - aguardava conclusão do Estudo Arqueológico em curso;
(viii)Reconhecimento de Interesse Público - faltava instruir o processo com a localização exata dos aerogeradores e as respetivas coordenadas, após o que o pedido seria apresentado.

AX- Após a negociação do Contrato de Fornecimento, e estando já acertado o preço dos novos aerogeradores, a Autora enviou um e-mail à R, em 11 de Julho de 2006, através do qual identifica as questões pendentes e solicita a indicação das ações desencadeadas e a data limite prevista para a respetiva resolução.
AZ- Em resposta, a R respondeu às diversas questões identificadas na mencionada check list.
BA- No que respeita à proposta de financiamento acordada entre a Autora e a R, a Autora, em 24 de Julho de 2006, enviou para a R as novas condições financeiras, alteradas em função das alterações do projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira.

BB- As novas condições financeiras propostas eram as seguintes:
(i)Financiamento de longo prazo até ao máximo de € 14.600.000;
(ii)Financiamento em conta corrente (referente a IVA) até ao máximo de € 400.000; e
(iii)Garantia bancária de € 60.000, a qual, à data, já se encontrava prestada no âmbito da estrutura de financiamento anteriormente definida e acordada.

BC- Em Outubro de 2006, enquanto decorria a análise dos contratos de fornecimento de equipamento e de operação e manutenção por parte do Consultor Técnico indicado pela Autora, os contratos de cariz financeiro foram concluídos e o respetivo clausulado fechado.
BD- Nesta data, a par da due diligence técnica ao Contrato de Fornecimento a celebrar com a Repower, a qual estava em curso, estava em aberto a validade do título que conferia à R o direito à utilização dos terrenos onde seria instalado o parque eólico.
BE- O prédio rústico destinado à instalação de torres de produção de energia eólica estava em estado de indivisão, sendo detido, em regime de compropriedade, por cerca de 117 titulares.
BF- O contrato de arrendamento do referido prédio foi celebrado entre a R e apenas dois dos referidos comproprietários.
BG- Tomou-se necessário assegurar a adequada instalação e exploração do parque eólico, de modo a limitar ao máximo os riscos decorrentes da denúncia pelos comproprietários não outorgantes do contrato de arrendamento.
BH- Foi necessário proceder ao estudo e análise jurídica dos riscos inerentes a tal situação e das possíveis soluções alternativas.
BI- Nessa sequência, e sendo aceite que não seria possível obter uma solução que implicasse a sanação da invalidade do contrato de arrendamento em apreço, a Autora apresentou uma proposta para mitigação do risco de crédito.
BJ- Em 9 de Fevereiro de 2007, a Autora e a R reuniram e, em conjunto, analisaram as diversas soluções possíveis para mitigar o risco de vir a ser arguida a invalidade do contrato de arrendamento referente aos terrenos destinados à instalação do parque eólico.
BL- Face  à morosidade inerente ao processo de permuta dos terrenos, a R solicitou à  Autora que tal processo de permuta fosse considerado como uma condição suspensiva ao primeiro desembolso do montante financiado, o que foi aceite pela Autora.
BM- No dia 16 de Outubro de 2007, com vista a proceder à elencagem exaustiva de todos os assuntos pendentes (financeiros, jurídicos e de seguros) por forma a ser traçado o caminho crítico para o fecho financeiro da operação de Project finance, teve lugar uma reunião entre a A, a R, Uría Menéndez e da A... - Corretores de Seguros, SA - doc. de fls. 291.
BN- Nesta reunião, foi referido pela R que as características dos equipamentos a adquirir à Repower sofreram uma evolução face ao equipamento anteriormente estudado, traduzindo-se num aumento de eficácia de cerca de 30%.

BO- Em 16 de Novembro de 2007, a R informou a Autora que:
(i)A licença de estabelecimento da Direção Geral de Geologia e Energia foi prorrogada até Outubro de 2008;
(ii)Os processos para emissão das licenças de construção por parte das Câmaras Municipais de Vila Franca de Xira e Loures estavam em fase de finalização;
(iii)A R encontrava-se em processo de negociação do preço dos aerogeradores com a Repower; e
(iv)A R estava a proceder à identificação do terreno disponível para a instalação da sexta torre eólica - doc. de fls. 293.

BP- Em 16 de Novembro de 2007, a R assegurou à Autora que era sua intenção concluir todos os assuntos pendentes até ao final do ano de 2007.
BQ- A Autora procedeu à análise das implicações jurídicas da alteração dos equipamentos do parque eólico de Vila Franca de Xira.
BR- Face ao aproximar do final do ano de 2007, a Autora insistiu junto da R com vista a confirmar o estado das questões em aberto, referentes ao parque eólico de Vila Franca de Xira, sugerindo o agendamento de uma reunião para esse efeito - doc. de fls. 294.
BS- Em 18 de Dezembro de 2007, a R informa que não via utilidade na realização da reunião sugerida em virtude do projeto apenas ter avançado em alguns dos pontos em aberto: mantinham-se as negociações com a Repower sobre o preço dos equipamentos e estavam agendadas reuniões com as Câmaras Municipais de Loures e Vila Franca de Xira sobre a emissão das competentes licenças de construção - doc. de fls. 295 e 296.
BT - Nesta sequência, a Autora sugere que a solicitada reunião tenha lugar em 11 de Janeiro de 2008.
BD- A R sugere que a sugerida reunião seja reagendada uma vez que "não existiram grandes avanços relativamente aos temas" em aberto - doc. de fls. 297.
BV- A Autora volta a insistir, em 28 de Fevereiro de 2008, pela atualização do status do projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira - doc. de fls. 298.

BX- Em resposta, através de e-mail remetido em 11 de Março de 2008, a R informa a Autora do seguinte:
- a Câmara Municipal de Loures já autorizou a edificação dos aerogeradores, estando apenas em falta a emissão da licença de construção;
- a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira ainda não autorizou a edificação dos aerogeradores porque está em falta a apresentação do plano final de acessibilidades da área e a autorização escrita do proprietário dos terrenos onde vai ser feita essa passagem, estando ainda em falta a emissão da licença de construção;
- quanto às negociações com a Repower, as mesmas não estavam concluídas, estando a R a analisar soluções alternativas relativamente ao sexto aerogerador; e
- estava a decorrer o processo de notificação dos comproprietários dos terrenos de Loures de forma a ser efetuado o destacamento de parte do terreno para colocação do 5º aerogerador - doc. de fls. 299.

BZ- A Autora e a R reuniram no dia 12 de Novembro de 2008, tendo a R comunicado à A que o projeto ia ser financiado por outra instituição bancária.

CA- A Autora endereçou a carta datada de 26 de Janeiro de 2009 à R, a S... SA e a M..., referindo:
"Como bem sabem V. Exas., o Banco ... não só não criou quaisquer dificuldades como desde o início procurou encontrar - e encontrou - soluções para as sucessivas questões, muitas delas anómalas neste tipo de processo e na fase concreta do mesmo, que foram surgindo.
Inexistem, portanto, quaisquer motivos imputáveis ao Banco ... que pudessem ter levado a S... e a S... II a não concluir o financiamento com o mesmo. ( ... )" - doc. de fls. 300 a 305.

CB- Nessa carta, a A reclama o pagamento do valor remanescente das comissões de estruturação e montagem e participação do financiamento do projeto, bem como o reembolso de todas as despesas suportadas pela Autora no âmbito do mesmo.
CC- Em resposta, a R remeteu à Autora uma carta datada de 27 de Março de 2009 (fls. 306 a 308), alegando que a concessão efetiva do financiamento não chegou a efetuar-se por razões diversas, relacionadas "com as exigências que esse banco, já no âmbito da concretização das condições expressas na carta para a concessão do financiamento, foi sucessivamente colocando", exigências essas que, no seu entender, "exorbitavam a letra o espírito do Acordo".

CD- A R procedeu ao pagamento de parte das despesas inerentes à realização dos trabalhos supra descritos, a saber:
a) € 59.013,37, referente às despesas e custos, até Dezembro de 2006, inerentes à consultoria legal prestada ao longo de todas as negociações pela sociedade de advogados Uría & Menéndez; e
b) € 28.112,20, referente às despesas relativas às auditorias técnicas efetuadas pela A... plc.

CE- O montante total do financiamento inicialmente acordado entre as partes ascendia a €13.517.918,11; em virtude das alterações que o projeto sofreu, tal valor foi revisto e fixado em €15.060.000.
CF- A EDP - Distribuição Energia, S.A. procedeu à devolução da mencionada Garantia Bancária em 15 de Julho de 2009.
CG- A A não procedeu à devolução do depósito-caução constituído para viabilizar a emissão da garantia bancária supra referida.
CH- Por carta datada de 24.07.2009, a A comunicou  à R e a S... SA que "( ... ) a Garantia Bancária em apreço foi emitida no âmbito do mandato concedido ao Banco ..., S.A. para proceder à  montagem e estruturação do pacote de financiamento do Parque Eólico de Vila Franca de Xira e visava garantir a conclusão das obras do mesmo." "( ... ) sendo V. Exas. devedores de diversas quantias para com o Banco ..., S.A., na sequência do incumprimento das obrigações decorrentes do mandato concedido este Banco, conforme resulta da nossa carta de 26 de Janeiro de 2009, vimos informar que a quantia depositada será e permanecerá retida até à liquidação integral das quantias em dívida".
CI- Consta da Ficha Técnica Indicativa anexa à carta-mandato (fls. 76) que "estas condições estão sujeitas aos resultados do due diligence técnico e legal, à necessária aprovação final pelos órgãos internos do Banco Financiador bem como à produção de documentação contratual em termos aceitáveis para o Banco Financiador que permita a adequada proteção do Banco Financiador relativamente aos riscos associados ao Projeto".
CJ- No elenco das "Condições Suspensivas à assinatura do Contrato" insertas na ficha técnica indicativa consta a menção ao "Due diligence ( ... ) de um Consultor Jurídico para elaboração do pacote contratual necessário à estruturação do financiamento em Project Finance",
CL- Consta da carta-mandato (fls. 74) que "não obstante as condições de financiamento expressas na presente carta e Ficha Técnica Indicativa anexa, as condições finais de financiamento serão estabelecidas após conclusão do processo de Due Diligence acima referido."
CM- A "adjudicação" da due diligence jurídica foi feita pelo A. depois de a 1ª R. ter sido consultada para o efeito, em reunião de 6 de Setembro de 2004.
CN-  Em 31 de Julho de 2002, L..., por si e enquanto gestora de negócios de sua mãe C..., bem como J... e respetiva mulher, ajustaram um contrato de arrendamento com a sociedade comercial anónima então denominada S...  S.A., ora R., pelo qual aqueles lhe concederam ("dão de arrendamento") o gozo de uns lotes de terreno, num loteamento não legalizado", em prédio inscrito na matriz predial rústica da freguesia de S. Julião do Tojal, sob o artigo 4º da secção C e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loures sob o nº 00270, em que aqueles, senhorios, " são donos e legítimos proprietários de 97567,10/161320 avos."
CO- Consta da cláusula 2.a do Contrato, "o referido prédio foi, em tempos, de facto, objeto de loteamento" não legalizado, "o qual vem sendo pacificamente aceite pelos respetivos comproprietários."
CP- Tal contrato tem por objeto mediato os lotes identificados no anexo sob os nº 194, 195, 196, 197, 198, 199,200,201,202,203,204,205,206,207,208, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 214, 215, 216, 217, que "ficaram a pertencer" aos referidos Senhorios, e foi celebrado pelo período de 30 anos, com início em 1 de Janeiro de 2002, suscetível de ser renovado, destinando-se à instalação, pela S..., de duas ou mais torres de produção de energia eólica.
CQ- A S..., na cláusula 20a do contrato de arrendamento, declarou que "tem conhecimento da não legalização do "loteamento" referido assumindo os riscos inerentes a esta situação."
CR- Com data de 24 de Janeiro de 2007, a Sociedade de Advogados "URlA e MENÉNDEZ" produziu uma "Análise Preliminar do Parecer sobre o Contrato de Arrendamento Celebrado em 31 de Julho de 2002, para Instalação Parcial do Parque Eólico de Vila Franca de Xira, e da Possibilidade da Mitigação dos Riscos Inerentes" (doc. de fls. 275 e ss).
CS- Tal "Análise" - inserida na Due Diligence Jurídica - teve por objeto ou referência um Parecer do Senhor Dr. Mário Oliveira e Costa, de 27 de Dezembro de 2006 (doc. de fls. 469 e ss), apresentado na sequência da reunião anterior e da apresentação de um documento, anterior, dos Consultores Jurídicos do Projeto, de 11 de Julho de 2006 (doc. de fls. 262 e ss).

CT- Da "Análise" de 25 de Janeiro de 2007, último documento escrito dos Consultores Jurídicos, no âmbito deste Projeto resultou que a Due Diligence apenas seria favorável se, em alternativa:
(a) a R. S... obtivesse o consentimento dos demais comproprietários para a convalidação do Contrato de Arrendamento (pág. 6); ou
(b) tivessem lugar medidas de mitigação do risco de crédito (decorrentes da possibilidade de vir a ser arguida a invalidade do Contrato de Arrendamento) - pág. 7.                                                                                                                                                             
CU- De entre as medidas de mitigação do risco de crédito contavam-se, entre outras, as seguintes:
(i) a "Repower" - empresa que, naquele momento, se dispunha a ser a fornecedora das torres eólicas - deveria comprometer-se a recomprar os aerogeradores (ou os seus componentes) num prazo razoável, pelo menos de acordo com o seu valor de mercado (e de acordo com fórmula previamente estabelecida) [e a mutuária obrigada a vender aquelas, nos termos referidos];
(ii) obtenção de garantias pessoais ou reais (sobre bens que não fossem propriedade da mutuária) que assegurassem adequadamente a posição dos Bancos, para garantia de uma obrigação de entrada de fundos, pelos acionistas, "na medida necessária ao reequilíbrio dos Rácios, de acordo com os valores definidos nos termos dos Documentos Financeiros para os valores revistos de investimento e de geração de cash-flow para o Projeto".

CV- A licença de estabelecimento, prorrogada por ofício de 22 de Outubro de 2007, para continuar em vigor, acarretaria a necessidade de a construção do Parque Eólico estar completamente concluída até 22 de Outubro de 2008.
CX- As licenças de construção foram emitidas em 31 de julho de 2008 (C. M. de Loures - doc. fls. 488) e em O5 de setembro de 2008 (C. M. de Vila Franca de Xira - doc. fls. 490).
CZ- O início da construção do parque eólico estava, na fase inicial dos contactos estabelecidos entre as partes, agendado para julho de 2004.
DA- Em face do elevado volume de investimento que o projeto em apreço envolveria, foi acordado entre as partes que a entidade mutuante seria um sindicato bancário a definir posteriormente, do qual faria parte a Autora.

DB- Com vista ao cumprimento das condições de financiamento acordadas, a Autora solicitou à AEA Technology ple a elaboração de due diligence técnico, o qual teve por objeto a análise das diferentes questões técnicas relevantes do Projeto, de onde se destacam:
(i) análise da compatibilidade, adequabilidade e fiabilidade dos parâmetros técnicos incluídos nos estudos efetuados pelas Rés;
(ii) análise e avaliação da conformidade do design/layout do parque eólico com as melhores práticas do mercado; e
(iii) análise e confirmação das questões técnicas constantes dos diferentes contratos, tais como a avaliação do estudo de potencial eólico do local previsto para a instalação do parque eólico e análise da adequabilidade do equipamento ao nível de desempenho e conformidade do mesmo com as normas europeias existentes - doc. fls. 81 e ss e 134 e ss.

DC- Neste âmbito, a A... pIe elaborou os relatórios que datam de Outubro/2004, Dezembro/2005 e Outubro/2006 - docs. fls, 81 e ss e 134 e ss.

DD- A Autora acordou com a AEA Technology plc a validação das questões técnicas relativas aos Contratos de Projeto, nomeadamente:
(i) Contrato de Operação e Manutenção - análise e confirmação:
a. dos preços anuais cobrados pela operação e manutenção do projeto, em comparação com as market best pratices;
b. dos níveis de qualidade do serviço exigido; e
c. da inclusão e adequabilidade de todas as tarefas relevantes ao projeto;
(ii) Contrato de Fornecimento do Equipamento - validação das questões técnicas, nomeadamente:
a.o preço cobrado pelo equipamento;
b.as condições de fornecimento, incluindo prazo, transporte, montagem e condições de aceitação;
c.os testes e garantias do equipamento, bem como as responsabilidades e seguros associados; e
d.a inclusão e adequabilidade de todas as tarefas relevantes ao projeto;
(iii) Contrato de Venda de Energia - validação das questões de índole técnica - docs. fls. 81 e ss e 134 e ss.

DE- A assessoria e consultoria jurídica referida nas als. U e V respeitou ainda ao seguinte:
-Acordo de Definições;
-Acordo sobre Regras de Cálculo e Projeções Financeiras;
-Contrato de Depósito Bancário;
-Carta de Comissões;
-Licença de estabelecimento;
-Documentos relativos ao licenciamento camarário e aos condicionalismos de ordem ambiental;
-Contratos ou documentos relativos ao projeto da subestação e respectiva construção.

DF- A Autora contratou os serviços da A... - Corretores de Seguros, S.A. para proceder à elaboração de um due diligence referente aos contratos de seguro, a qual incluiu a identificação, análise e avaliação dos riscos do projeto e a definição da estrutura do programa de seguros a contratar para as diversas fases do mesmo - doc. fls. 189 e ss.
DG- Nesta! sequência, a A... - Corretores de Seguros, S.A. elaborou o relatório de fls. 189 a 196.
DH - Em reunião ocorrida em 4 de Novembro de 2004, a Autora e a Ré S... analisaram as minutas dos Contratos Financeiros, bem corno o relatório sobre a análise jurídica dos Contratos do Projeto e respectiva documentação.       
DI- A data prevista para o início da construção do parque eólico não foi cumprida devido a atrasos na obtenção, pela R, das licenças necessárias à construção do mesmo, atenta a indefinição do projeto que ainda se verificava.
DJ- Corno a operação de crédito em curso ainda não estava finalizada, a Autora solicitou a constituição de um depósito caução de igual montante ao coberto pela garantia bancária (€ 60.000), o qual veio a ser constituído pela Ré S... junto da Autora de valor igual ao montante garantido na garantia bancária emitida em favor da EDP.
DK- Após a reunião de 28.04.2005, para a análise conjunta de todas as condições e trabalhos de que dependia a concretização do projeto e do financiamento acordado, foi elaborada pela A a check-list de fls. 208 e ss.
DL- Estava em falta a análise das sugestões apresentadas pela Autora aos contratos referentes ao projeto e a obtenção, pela R. da declaração de reconhecimento público e da licença de construção a emitir pelas Câmaras Municipais de Loures e de Vila Franca de Xira.
DM- A publicação do DL nº 33-A/2005, de 16/02 (diploma que introduziu um novo regime de cálculo da remuneração da eletricidade com redução de ratios), implicou a análise do seu impacto na estrutura de financiamento do projeto.
DN- A Autora procedeu aos cálculos da tarifa relativa à venda de eletricidade em conformidade com o mencionado diploma legal, apurando que os valores obtidos implicam uma redução das receitas projetadas para o parque eólico de Vila Franca de Xira.
DO- Não houve oposição da R à proposta de o financiamento ser concedido pela A e pelo B....
DP- Na reunião de 9 de Fevereiro de 2007 ficou decidido proceder-se à notificação de todos os comproprietários do referido terreno do objetivo de instalação do referido parque.
DQ- Posteriormente, a R desistiu da referida notificação e optou, de entre as soluções possíveis para a resolução desta questão, por adquirir, por permuta, os terrenos dos dois comproprietários outorgantes do contrato de arrendamento - doc. de f1s. 283.
DR- A Autora, de forma a não inviabilizar todo o projeto, informou a R, em 22 de Março de 2007, que abdicava da notificação de todos os comproprietários com vista à obtenção do respetivo consentimento para a instalação do parque eólico caso (i) se concretizasse a aquisição, por permuta, por parte da S... 2, de parte do terreno em causa e (ii) fossem incorporadas nos documentos financeiros as medidas de mitigação do risco de crédito constantes do memorando apresentado pela Autora.
DS- Entre Maio e Setembro de 2007, e não obstante as interpelações levadas a cabo pela Autora com vista à atualização das diligências em falta para conclusão do projeto, não houve qualquer resposta por parte da R.
DT- Em Setembro de 2007, na sequência de uma interpelação da Autora, a R informou que a escritura de permuta de parte dos terrenos de localização do parque eólico havia sido celebrada em final de Agosto e que aguardavam a receção da documentação necessária para avançar com o processo - doc. de fls. 287.
DU- A verificar-se a caducidade da licença de estabelecimento obtida pela R, importava apurar se seria aplicável o regime tarifário inicial.
DV- Esta questão assumia relevância pelo impacto financeiro decorrente da aplicação do tarifário mais recente e menos favorável ao projeto.
DX- A Ré já tinha solicitado a prorrogação da licença de estabelecimento.
DZ- Em 28 de Setembro de 2007, a Autora solicitou à R informações sobre o estado da atual licença do estabelecimento, emitida pela Direção Geral de Geologia e Energia, bem como sugeriu uma reunião de ponto de situação - doc. de fls. 288.
EA- Em 4 de Outubro de 2007, a R informou a Autora que a prorrogação da licença de estabelecimento ainda não tinha sido formalmente emitida mas que consideravam que a situação estaria "resolvida proximamente".

EB- Na reunião de 9 de Outubro de 2007 e no que respeita às questões pendentes, a R informou a Autora de que:
(i) estava assegurada a compra de duas alíquotas aleatórias dos terrenos, de forma a garantir o direito de participar em questões relacionadas com o destino dos mesmos;
(ii) o contrato com a Repower mantinha-se em vigor e era intenção da R incluir no mesmo todos os restantes contratos de empreitada, de forma a torná-lo num contrato "chave na mão";
(iii) sobre o preço de venda de energia, deveria ser aplicável a tarifa inicial, que é mais favorável, na medida em que o atraso do projeto era imputável ao facto de ainda não ter sido proferido despacho relativamente ao pedido de reconhecimento de interesse público; e
(iv) o pedido para a atribuição das licenças de construção continuava a aguardar despacho das respetivas entidades competentes - doc. fls. 291 e 292.

EC- Ainda nesta reunião, a Ré informou a Autora que a Repower tinha reconsiderado o número de torres eólicas a implementar no futuro parque eólico de Vila Franca de Xira, assumindo que agora só poderiam ser construídas 5 torres, ao invés das 6 torres inicialmente projetadas.
ED- A alteração do número de torres provocava alterações ao nível da capacidade do parque eólico, que passaria de um total de 12 MW para 10 MW.
EE- A R informou a Autora que tinha a intenção de construir a sexta torre inicialmente projetada, mantendo assim a intenção de construção de um parque com capacidade instalada de 12 MW.
EF- A redução do número de torres eólicas a implementar iria provocar alterações substanciais em todo o projeto.
EG- Tendo a Direção Geral de Geologia e Energia licenciado o projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira no pressuposto que seriam seis torres eólicas e, por conseguinte, que o parque teria a capacidade de 12 MW, duas alternativas se avistavam: (i) a manutenção da licença para os 12 MW mas a sexta torre, porque construída mais tarde, teria um tarifário diferenciado ou (ii) a licença seria ajustada para 10 MW e os restantes 2 MW remanescentes seriam rateados entre os produtores de parques eólicos adjacentes.
EH- Todas as questões abordadas na al. BX eram essenciars para que o relatório da due diligence fosse emitido favoravelmente e para que a A pudesse financiar o projeto.
EI- Para financiar o projeto, a A nunca abdicou da necessidade de estar definida a questão da sanação da invalidade do arrendamento ou da obrigação da Repower recomprar os aerogeradores - carta da A datada de 01.04.2009, fls. 309.
EJ- A partir de Março de 2008, não obstante as diversas tentativas de contacto efetuadas pela Autora, a R não mais reportou ou informou a Autora das diligências efetuadas e do ponto de situação das diversas questões em aberto no âmbito do projeto do parque eólico de Vila Franca de Xira.
EK- A R decidiu n ão concluir o processo financiamento do projeto de construção, operação e manutenção do futuro Parque Eólico de Vila Franca de Xira com a Autora.
EL- Até à mencionada reunião de dia 12 de Novembro de 2008, nunca a R mencionou ou alegou perante a Autora qualquer tipo de dificuldades criadas por esta.
EM- Sempre foi reconhecido entre as partes que, pelo menos até final de 2007, o atraso que se verificou na construção e exploração do parque eólico de Vila Franca de Xira se deveu a diversos fatores externos a ambas as partes.
EN- A R deliberadamente omitiu à A que se encontrava a negociar com outra entidade o financiamento do projeto.
EO- A execução do contrato pela A implicou (i) a avaliação do projeto; (ii) a negociação da estrutura do financiamento; (iii) a definição do montante a financiar e (iv) a elaboração dos documentos de suporte aos Contratos Financeiros.
EP- Com a concessão de financiamento pela A e utilização dele pela R, a A iria obter um retorno correspondente aos juros cobrados pela operação.
EQ- Não foi emitido relatório ou parecer positivo pelos Consultores Jurídicos do A relativamente aos diversos itens sobre os quais lhes era pedida opinião.
ER- A partir de fins de 2007 tornou-se evidente e certo para a R que não seria ultrapassável, em tempo útil (v. als. H) e CV), a questão relativa à ocupação dos terrenos onde pretendia implantar-se o parque eólico, nos moldes sugeridos pela A.
ES- A A esteve sempre consciente das dificuldades que a celebração daquele contrato de arrendamento acarretava - doc. fls. 274, 275 e ss.
ET- Na fase anterior à elaboração da "carta-mandato", de 30 de Julho de 2004, ou seja, na fase prévia do "PIM" - "Preliminary Information Memorandum" - a R. S... remeteu ao A., em 19 de Março de 2004, comunicação indicando a remessa de "dossier completo sobre o Parque Eólico de Vila Franca de Xira" - doc. fls. 466.
EU- Já depois da celebração da "carta-mandato", em 19 de outubro de 2004, a R remeteu à A, ao cuidado do Sr. Dr. Vitor Lopes, uma carta sob a epígrafe "Parque Eólico de Vila Franca de Xira Due Diligence Jurídica, indicando remeter o "dossier completo sobre o Parque Eólico de Vila Franca de Xira", documentação destinada "a satisfazer as necessidades da Due Diligence Jurídica" - doc. fls. 467.
EV- A insistência da A na resolução das questões relativas à situação dos terrenos onde ia implantar-se o projeto, à alteração das condições contratuais com a Repower e à obtenção das licenças camarárias de construção, impedia que as obras de construção do Parque Eólico terminassem antes de 22.1 0.2008.
EW- A R não dispunha de liquidez para custear a construção do Parque Eólico e os fundos que seriam necessários para pagar ao fornecedor, pelo menos parte do preço, dos equipamentos ainda antes do começo dos trabalhos de instalação.
EX- S ó após a celebração de todos os contratos de crédito e de todos os contratos relativos à aquisição, instalação, operação e outros, com todas as due diligence feitas é que seria possível dar início à construção.
EY- A S..., para não perder a autorização que lhe fora concedida, com o prazo a escoar-se, procurou outra solução, obtendo financiamento para o Projeto do Parque Eólico junto do BES - doc. fls. 487 e 1244 e ss.
EZ- Com data de 27 de junho de 2008, foi celebrado o contrato de locação financeira mobiliária entre B... SA e S... SA, relativo a 6 conversores de energia eólica fornecidos por M... SA - doc. fls. 1244 e ss.
FA- A A sabia que o Parque Eólico tinha que ser construído até 22/10/2008.
FB- Na reunião em 12 de Novembro de 2008, o A foi informado de já não havia nada para financiar, que o problema da necessidade de sanação da invalidade não estava resolvido, nem minorado (nem se previa quando estaria resolvido); que as licenças de construção foram emitidas após o financiamento ter sido obtido; que a construção começou (com tolerância das Câmaras Municipais) antes das licenças terem sido emitidas, que a "Repower" exigira a sinalização do contrato de fornecimento e que acabou por desistir de fornecer as torres eólicas; que, por este facto, à última hora, houve que optar pelas torres "Suzlon".
FC- O financiamento que a R. obteve não foi em regime de "Project Finance", mas em "leasing", que tem uma estrutura financeira completamente diferente da operação preparada pelo A.                                                                                                          
FD- Os aerogeradores adquiridos não foram os da "Repower"; os aerogeradores que foram instalados são da marca "Suzlon".
FE- O empreiteiro da obra foi a M... SA.
FF- A entrega da importância de € 25.000 ao A teve lugar na data da assinatura da carta-mandato, por conta da comissão de montagem, conforme previsto no ponto 2 da Carta-Mandato - ver fls. 75.
FG- A convalidação ou sanação da invalidade do Contrato de Arrendamento relativo ao terreno de S. Julião do Tojal teria que envolver a participação ativa de mais de cento e dezassete pessoas, comproprietários, num quadro de falta de indicações necessárias para o seu contacto.
H- Os consultores jurídicos da A expressamente admitiram "a subsistência de um risco muito considerável decorrente quer da manutenção do contrato de arrendamento nos moldes atuais quer da implementação de qualquer das soluções propostas"; ( ... ) "parece que os cenários decorrentes do Parecer ou não afastam o risco (considerável) de o projeto se tornar inviável (pelo menos no que respeita à parte a implementar sobre o imóvel) em virtude da indevida utilização do mesmo, ou são de difícil concretização." ( ... ) "uma das vias possíveis (não obstante a dificuldade inerente ao facto de serem cerca de cento e quinze proprietários) seria a obtenção do consentimento dos demais comproprietários para a convalidação do Contrato de Arrendamento".
FI- A R realizou diligências com vista à obtenção do consentimento dos restantes comproprietários - o que se revelou tarefa inglória.
FJ- Tentou soluções alternativas que pudessem merecer a aprovação dos Consultores Jurídicos e do A, a conduzir a Due Diligence a um resultado favorável - doc. fls. 469 e ss.
FK- A R pediu Parecer a Professor de Direito, consultou Advogados e Sociedades de Advogados, mandatou-os para tentarem soluções, obteve-se o concurso de uma Solicitadora, contactou Notário - doc. fls. 469 e ss.
FL- As medidas de mitigação do risco de crédito propostas pelos Consultores Jurídicos da A (v. fls. 281 e 282), nomeadamente a imposição ao fornecedor da obrigação de recompra dos aerogeradores para reembolso parcial do empréstimo com o valor da venda dos aerogeradores instalados no imóvel, não se mostravam exequíveis.
FM- À data dos factos, a produção de aerogeradores para parques eólicos como o de Vila Franca de Xira e a sua colocação do mercado era inferior à procura.
FN- A R, tendo abordado diretamente a "Repower" - a fornecedora com que estava a negociar a compra e instalação - recebeu a unânime e firme manifestação de indisponibilidade daquela em lhe venderem os aerogeradores com a obrigação de os recomprar (a eles e/ou aos seus componentes) em caso de surgir alegação de invalidade e/ou de ineficácia do Contrato de Arrendamento, posição partilhada por outros produtores de equipamentos para torres eólicas.
FO- A necessidade da prestação de garantias, apresentada como solução para mitigação do risco de crédito, para além das condições atinentes ao rácio Debt/Equity previsto nas Fichas Técnicas Indicativas (v. fls. 79 e 271), não tinham sido anteriormente exigidas.
FP- Não tendo a R a possibilidade de obter tais garantias - daí a opção clara inicial pelo Project Finance.
FQ- A viabilidade de concretização do financiamento nos moldes estruturados pelo A estava comprometida.
FR- Em dezembro de 2004, não estavam concluídos os trabalhos da due diligence jurídica.

Inconformada, recorre a Ré, concluindo que:

-Ao contrário do que, em face da matéria provada nos autos, a Senhora Juíza a quo considerou, sem que qualquer fundamentação, mínima que fosse, acompanhasse tal entendimento, nada permite a conclusão segundo a qual a A., ora recorrida, Banco ..., terá efectivamente angariado financiamento para o parque eólico, "por intermédio de si próprio e do B...".
-Desde logo, porque tal resulta do advérbio de modo "efectivamente" (alínea M), sendo certo que não ocorreu a celebração do contrato de financiamento, nem tão pouco as entidades que se disporiam a financiar se comprometeram a fazê-lo, designadamente através da tomada firme da operação.
-A questão terá que ser resolvida através da interpretação do seguinte trecho da chamada "carta-mandato", de 30.07.2004 (alínea J)): «Mediante a assinatura da presenta carta e respectivo anexo, o Banco considerar-se-á, para todos os efeitos legais, mandatado pela S... para actuar como Arranger exclusivo dos financiamentos em capitais alheios necessários ao Projecto. No âmbito dessa função de Arranger, o Banco será remunerado através de uma comissão de montagem no valor de  1% (um por cento) sobre o montante de financiamento que for efectivamente concedido ou angariado, numa base best effort, pelo Banco».
-A efectiva "angariação" do financiamento não se basta com a mera indicação, pelo "arranger  ", de instituição de crédito pretensamente disponível para ter participação nesse financiamento; contudo, dos autos resulta, apenas, provado que "não houve oposição da R. à proposta de o financiamento ser concedido pelo B...".
-Com efeito, se a «concessão» e a «angariação» são contratualmente configuradas como vias alternativas para a satisfação de uma mesma obrigação, parece claro que um dec1aratário normal, colocado na posição do real dec1aratário (artigo 236.°, nº 1, do Código Civil), entenderia necessariamente a referência à «angariação» como a obtenção, através da promoção pela A., da ef ectiva concessão de um contrato de financiamento em moldes de Project Finance, pela R. com uma outra instituição de crédito - o que exigiria a efectiva definição de todas as condições relevantes. Apenas desta forma a «angariação» do financiamento seria uma real alternativa à sua concessão directa pela A., e não um minus face à primeira alternativa de cumprimento da obrigação da A., enquanto arranger.
-Essa interpretação é, de resto, corroborada pelos usos do tráfego bancário.
-A angariação do financiamento pela R. pressuporia a efectiva celebração do contrato de financiamento ou, pelo menos, a definição e tomada firme ou efectiva pelo banco financiador do contrato de financiamento. Mas o financiamento nunca foi celebrado, nem os pretensos financiadores se vincularam a concercer o financiamento.

-Não é sequer dada como provada a disponibilidade  do B... para financiar o Projecto, mas, apenas, que :
(i) a A. comunicou à R. que o B... tinha essa disponibilidade - facto que com aquele não pode ser confundido; e
(ii) que a R. não manifestou qualquer oposição a que o financiamento viesse a ser concedido pela A conjuntamente com o B....

-E o mesmo se diga relativamente ao Banco ..., ora apelado, pois que, como o tribunal reconhece, o mesmo se aplica à própria A., a qual estava evidentemente vinculada, por efeito do Contrato, a actuar como arranger, mas não se encontrava sob qualquer vinculação jurídica de conceder  ela própria o financiamento (cfr. sentença - fls. 37).
-Por outro lado, os factos apurados em primeira instância mostram que ainda se estava longe  de obter a efectiva celebração de um contrato de financiamento dado que a respectiva celebração estava dependente da verificação das condições (de resto: de realização impossível) que a A. colocava e que «objectivamente vinham obstaculizando a concretização do projecto em tempo útil» (alíneas J, N, O, P e Q).

-Designadamente no momento da declaração que o Tribunal a quo entende como «revogação» do contrato celebrado entre a A. e a R., e consequentemente, como facto gerador de responsabilidade civil, não estavam definitivamente definidos aspectos tão nucleares a um contrato de financiamento como: a) o montante do financiamento, b) o prazo do financiamento, c) a taxa de juro aplicável, d) o modo de reembolso do capital; e) as garantias a prestar, f) mitigação de risco e seus reflexos no financiamento, e g) as comissões a pagar aos bancos financiadores.
-Mais ainda: nem o E..., nem o B..., se comprometeram, cada um deles, a financiar uma parte específica do montante do financiamento; para além da afirmação do A., manifestamente insuficiente, e que, por não envolver qualquer compromisso, admitiria sempre um recuo, nada há que demonstre a vinculação referida.
-Resulta ainda claro que nem o E..., nem qualquer outro banco (designadamente o B...) celebrariam os contratos que titulariam o(s) financiamento(s) se um número extenso de condições, perfeitamente determinadas de forma incontroversa nos autos, não se verificassem. Pelo que não se vê como é que se poderá afirmar que o(s) financiamento(s) estaria(m) angariado(s) sem que houvesse uma real e incondicionada disponibilização de fundos que constituíssem o objecto do (s) mútuo(s).
-Por último, a efectividade exigida para que a concessão ou angariação do financiamento desse lugar a remuneração do arranger, é veementemente rejeitada pela seguinte matéria de facto assente nos autos: (a) a proposta de financiamento era "indicativa" (JP); (b) a carta-mandato "expressa formalmente o interesse da A. em financiar ... sujeito a determinadas condições" (Q); (c) a ficha técnica que acompanhava a carta-mandato era indicativa (Q); (d) as condições de financiamento tinham "questões em aberto" para a conclusão do processo de financiamento (AI); (e) como o financiamento se destinava a financiar um projecto em concreto era decisiva importância saber que o projecto preenchesse todas as condições para ser implementado (BO), pois que sem estas questões reunidas não havia projecto aceite pelo banco e pela Ré e sem projecto, efectivamente aceite, não havia financiamento em 18 de Dezembro de 2007 o " ... preço dos equipamentos ainda continuava a ser negociado, como também estavam agendadas em reunião com a Câmara Municipal de Loures e Vila Franca de Xira as questões sobre a emissão das competentes licenças de construção) (BS); (f) "as condições finais do financiamento seriam estabelecidas após a conclusão do processo do Due diligence" (CL); (g) deveriam ser incorporadas nos documentos financeiros as medidas de mitigação de risco (DR), o que nunca foi feito conforme consta da prova; (h) para financiar o projecto a A. nunca abdicou da necessidade de estar definida a questão da sanação de inviabilidade do arrendamento ou da obrigação da Repower comprar os aerogeradores - carta de 1 de Abril de 2004 (BI)e sem projecto nenhum banco podia tomar firme efectivamente o financiamento;
(i) todas as questões abordadas na alínea BF) eram essenciais para que o relatório da Due diligence fosse emitido favoravelmente e para que a A. pudesse financiar o projecto (EH); G) "a viabilidade da concretização do financiamento nos moldes estipulados pela A. estava comprometida" (FQ); (k) as medidas de mitigação de risco a " proposta .... " não se mostrava exequível (FI);  
-Por outro lado, a não realização da prestação à qual a A. se encontrava vinculada, correspondente à angariação de financiamento para a realização do Projecto e montagem da respectiva operação - deveu-se à sua mera impossibilidade, sendo certo que a impossibilidade de uma obrigação não se verifica exclusivamente quando o comportamento devido pelo devedor se torna abstractamente irrealizável, mas ainda naqueles casos em que o «substracto da prestação» é atingido, deixando aquele comportamento de ser susceptível de satisfazer o interesse do credor.
-Ora, a partir do momento em que o tempo remanescente para a lícita construção do Parque Eólico se tornou inferior ao tempo necessário para a construção deste, a satisfação do interesse da R., enquanto credora da obrigação de angariar financiamento para o Projecto e montar a respectiva operação, à qual estava vinculada a A., tornou-se impossível.
-Ora, como foi julgado provado, o interesse da R. na celebração do Contrato consistia na construção de um Parque Eólico nos concelhos de Loures e Vila Franca de Xira - o que, aliás, é expressamente referido no próprio enunciado do Contrato (alínea I) e doc 4 junto com a PI) - daí decorrendo que, de acordo com o contratualmente estipulado, a obtenção de um financiamento em moldes de Project Finance, e a montagem da respectiva operação, não eram, em si mesmos, fins da R.: o interesse da R. prendia-se com estes viabilizarem a construção do Parque Eólico.

- Na sentença são dados como provados os seguintes factos:

(i) estava previsto que a construção do Parque Eólico tivesse a duração de dez meses, após o que seria iniciada a exploração do mesmo (al. H), (ii) o início da construção do Parque Eólico estava, na fase inicial dos contactos estabelecidos entre as partes, agendado para Julho de 2004 (al. C2), (iii) a construção do Parque Eólico não teve lugar na data prevista (al. Z), (iv) esse atraso ficou-se a dever, entre outros factores, à indefinição quanto à concessão do financiamento (al. DI), (v) a licença de estabelecimento, já depois da sua última prorrogação, para continuar em vigor, acarretaria a necessidade de o Parque Eólico estar completamente construído até 22 de Outubro de 2008, o que a A. bem sabia (als. CV e FA), (vi) as licenças de construção apenas foram emitidas pela Câmara Municipal de Loures e pela Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, respectivamente em 31 de Julho de 2008 e 5 de Setembro de 2008 (al. CX), (vii) a efectiva angariação do financiamento estava, entre outros factores, dependente da conclusão com resultados positivos de uma due diligence (al.CI);(vii) designadamente, no Contrato era estipulado como condição suspensiva a emissão de parecer favorável por um consultor jurídico (CJ), (viii) os consultores jurídicos contratados pela A. nunca chegaram a dar este parecer positivo e no último documento escrito dos consultores jurídicos responsáveis pela due diligence, a resposta favorável foi condicionada a, em alternativa, (a) a S... obter o consentimento da totalidade dos comproprietários do terreno onde seria construído o Parque Eólico ao respectivo arrendamento, ou (b) a adopção de um conjunto de medidas de mitigação do risco de crédito, entre as quais constava a alteração dos contratos celebrados pela R. com a fornecedora de torres eólicas (a Repower) no sentido de esta se «comprometer a recomprar os aerogeradores (ou os seus compoenentes) num prazo razoável, pelo menos de acordo com o seu valor de mercado (e de acordo com fórmula previamente estabelecida» no caso de a validade do contrato de arrendamento ser questionada (als. CT e CV) e (ix) sendo ainda certo que «a A. nunca abdicou da necessidade de estar definida a questão da sanação da invalidade do arrendamento ou da obrigação da Repower recomprar os aerogeradores» (al. EI).
-Contudo, estas nenhuma destas condições se veio a verificar, tendo-se a verificação de ambas mostrado inviável:  não obstante a diligência da R. para procurar o consentimento de todos os comproprietários, que totalizavam cerca de 117, esse empreendimento revelou-se impossível (als. BE e FI), (xi) a "Repower", fornecedora dos aerogeradores , transmitiu à R. uma «unânime e firme manifestação de indisponibilidade» para aceitar vincular-se a uma obrigação de recomprar os aerogeradores no caso de a invalidade ou ineficácia do contrato de arrendamento ser alegada (al. FN), (xii) e «só após a celebração de todos os contratos de crédito [ .. o] com todas as due diligence (favoráveis) feitas [o que pressupunha a prévia concessão das licencas de constmção pelas Câmaras Municipais de Loures e de Vila Franca de Xira] é que seria possível dar início à. construção» do Parque Eólico (al. EX).
-Daqui resulta que a 27 de Junho de 2008. data em que foi celebrado o contrato de locação financeira entre a B..., SA e a S... S.A. (aI. EZ), já a satisfação do fim da prestação à qual a A. se havia vinculado mediante a celebracão do Contrato se havia tomado impossível.
-A partir do momento em que o tempo remanescente até à data de 22 de Outubro de 2008 - data até à qual, como era conhecido da A., o Parque Eólico tinha de entrar em funcionamento - não era suficiente para (i) provocar o preenchimento das condições exigidas pelos consultores iurídicos, auxiliares da A., para a emissão de parecer posítivo sobre a auditoria iurídica e (ii) proceder à construção do Parque Eólico (o que não implicava apenas a construção do parque propriamente dito, mas também a construção pela Repower dos aerogeradores), a angariação de um financiamento não seria susceptível de viabilizar a instalação do Parque Eólico, dado que esta se depararia, então, com impedimentos legais, desigadamente com a caducidade da licença de estabelecimento  (alínea CV); desta forma, e tendo presente que, como salientado supra, a «frustação do fim da prestação» é uma modalidade especial da impossibilidade, a partir desse momento a prestação devida pela A. nos termos do Contrato tornou-se impossível, o que até é reconhecido peIo Tribunal a quo quando afirma que se «tornou claro e evidente que as questões em aberto, das quais a A nunca abdicaria, atento o modelo de negócio que se vinculou a conceber, não seriam solucionadas a tempo de construir o parque até à data em que ficaria salvaguardada a licença de exploração».

-Como a própria Senhora Juíza a quo  o reconhece, o atraso que se verificou na construção e exploração do Parque Eólico - o qual resultou na impossibilidade da construção atempada do Parque e, consequentemente, da impossibilidade da obrigação da R., por frustração do seu fim - «se deveu a diversos factores externos a ambas as partes» (al. EM): tal significa que essa impossibilidade deve ser considerada como não imputável a nenhuma das partes.

-Daqui decorrem dois corolários:

Em primeiro lugar, nos termos do artigo 790.°, nº 1, do Código Civil, o facto de a satisfação do interesse da R., enquanto credora da obrigação da A. de angariar o financiamento para o Projecto e montar a respectiva operação, se ter tornado impossível implica a extinção da obrigação da R.; Em segundo lugar,  existindo uma reciprocidade (sinalagma) entre a «obrigação de actuar como Arranger»   e a obrigação da R. de pagar à A. 1 % do montante de financiamento efectivamente concedido ou angariado, a impossibilidade da obrigação da A. implica também a extinção da obrigação da R . Isto decorre do artigo 795.°, nº 1, do Código Civil, nos termos do qual «quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contra prestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa». (Cfr. acórdão do STJ, de 22-04-2004, relatado pelo Cons. Salvador da Costa, no proc. nº 04B1201).

-Desta forma, ainda que ao Contrato celebrado entre A. e R. se devesse aplicar o regime do mandato, nunca se poderia aplicar ao caso em análise o artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil, como faz o Tribunal a quo, porquanto, no momento em que a R. comunica à A. que «já não havia nada para financiar» (12 de Novembro de 2008), as obrigações contratuais já se haviam extinguido, há muito, por efeito dos artigos 790.°, nº 1, e 795.°, nº 1, ambos do Código Civil, ou seja por caducidade do contrato.
-Consequentemente, dado que qualquer «revogação» pressupõe a vigência do contrato, é impossível considerar a declaração da R. como uma «revogação» do Contrato, para os efeitos do artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil.
-A qualificação do Contrato ajustado entre as partes, feita pela Senhora Juíza de primeira instância, segundo a qual "as partes firmaram entre si um contrato misto de prestação de serviço e mandato civil" releva-se, salvo o devido respeito, incorrecta, atenta a circusntância de a apelada não se ter vinculado à prática de qualquer acto jurídico, embora se assuma a atipicidade do mesmo Contrato, o que rejeita a aplicação mecânica e acrítica das normas que compõem o regime do contrato de mandato constante dos artigos 1156.° do Código Civil.
-Tendo em conta que os contratos atípicos devem «reger-se pelas disposições não excepcionais dos contratos nominados com que apresente maior analogia», (assim, inter alia,o  Ac. STJ, 05-06-1997, Costa Soares, proc.  nº 96B817) e que o juízo de analogia não pressupõe a identidade, mas apenas uma similitude relevante (cfr. PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, Contratos atípicos, cit., 94 ss), parece claro que o regime aplicável ao contrato em causa, deverá ser outro que não o do mandato, mas antes a Lei do Contrato de Agência, em tudo o que não pressupuser claramente a estabilidade da relação entre as partes.
-Significa isto que, caso se entendesse que o comportamento da R. a 12 de Novembro de 2008, consubstanciou uma resolução com justa causa objectiva do Contrato celebrado - como entendeu, ainda que incorrectamente, o Tribunal a quo'" - o regime aplicável seria o do regime jurídico da agência, e não o artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil.
-Mas, ainda que o Contrato sub judice  devesse ser regido pelas normas atinentes ao mandato, o disposto no artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil, nunca lhe seria aplicável, porquanto o artigo 1172. o do Código Civil apenas se aplica às extinções de contrato que correspondam a um exercício unilateral, incondicionado e discricionário (assim, Manuel Januário da Costa Gomes, Em tema de revogação do mandato civil, Almedina, Coimbra, 1989, 219).
- Por outro lado, a revogação (e a caducidade) não é (são) o(s) único(s) tipo(s) de acto(s) que permite(m) a extinção unilateral do contrato de mandato, sendo aplicáveis, também a este, as regras gerais relativas à extinção dos Contratos, de onde decorre que é admissível a cessação do mandato por resolução por justa causa, sendo, portanto, lícita, como previsto no artigo 1170.°, nº 1, parte final, do Código Civil, mesmo quando a justa causa é uma justa causa objectiva; quando assim ocorrer, ficará afastado o regime do artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil.
-Como sintetiza MANUEL JANUÁRIO DA COSTA GOMES (in Em tema de revogação do mandato civil, cit., 221): «uma vez que a ocorrência de justa causa não é requisito constitutivo do direito de denúncia (lato sensu) do mandato puro, a extinção do contrato opera-se com a mera declaração de revogação por qualquer das partes.
-Porém, a invocação duma justa causa para a revogação pode ter o efeito de exonerar o revogante da obrigação de indemnização a que, de outra forma, estivesse adstrito por força do disposto no art. 1172.°. A justa causa tem, assim, no mandato puro e simples, como bem nota Bavetta, um uma fisionomia particular, uma vez que não opera por referência à revogação em si, mas aos seus efeitos».
-O Tribunal a quo reconhece que «nos termos que temos em mãos, [. . .} é manifesto que era inexígivel que a R mantivesse a relação contratual que mantinha com a A, com vista à montagem e estruturação do financiamento do parque eólico em regime de project finance. Tornou-se claro e evidente que as questões em aberto, das quais a A nunca abdicaria, atento o modelo de negócio que se vinculou a conceber, não seriam solucionadas a tempo de construir o parque até à data em que ficaria salvaguardada a licença de exploração» (cfr. fls. 62-63 da sentença).
-A declaração dirigida pela R. à A., mediante a qual a informa de que o financiamento havia contraído junto de uma instituição de crédito não angariada pela A. (FB), não é um acto discricionário, desprovido de um fundamento legitimador da quebra da relação contratual pela R.
-Como o Tribunal a quo  bem reconhece, o facto de o processo de angariação de financiamento em moldes de Project Finance pela A. se ter demorado ao ponto de tornar inviável a concretização do Projecto, ainda que por factores externos às partes, tornaria inexigivel à R., face aos ditames da boa fé, a permanência da relação contratual estabelecida com a A. (cfr. fls. 62-63 da sentença). No caso sub judice existe, pois, uma justa causa para a extinção do mandato pela R.
-Isto é o mesmo que dizer que a declaração unilateral da A. não é puramente discricionária. Pelo contrário, a cessação do contrato encontra um fundamento objectivo no ordenamento jurídico: este traduz-se na inexigibilidade da sua permanência na relação contratual; tal significa que a declaração da R. não consubstancia uma denúncia do contrato, mas antes uma verdadeira e própria resolução, razão pela qual a extinção do contrato que se verificou no caso sub judice  exorbita o âmbito do artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil.
-Acresce que a interpretação do artigo 1172.° como aplicando-se também aos casos, não de revogação, nem de denúncia, mas de verdadeira e própria resolução mostrar-se-ia gravosamente incoerente face ao ordenamento jurídico.
-A interpretação feita pelo tribunal, segundo a qual o artigo 1172.° do Código Civil é aplicável a todas aquelas situações de resolução por justa causa em que esta se funda em razões não imputáveis à contraparte, coloca o mandatário numa posição mais favorável do que aquela que é estabelecida pelo regime geral, onde a resolução por justa causa, enquanto acto lícito, nunca implica a vinculação da parte que resolve o contrato a indemnizar a sua contraparte, esta interpretação vincula o  mandante a indemnizar o mandatário quando aquele resolva o mandato com fundamento numa justa causa objectiva, quando, por regra, a resolução por justa causa (subjectiva ou objectiva) não implica qualquer indemnização.
-Ao contrário do sustentado pelo Tribunal a quo,  o artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil, não se aplica nas situacões em que o mandante resolva o contrato de mandato com fundamento em justa causa objectiva ou subjectiva.
I- "O conceito de justa causa a que se reporta o artigo 1170º do Código Civil abrange as circunstâncias pelas quais, segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação obrigacional. incluindo o fàcto de fàzer perigar o fim do contrato ou a dificultação da sua obtenção. "
II- "Perante a frustração do fim da prestação do devedor sem culpa do credor, se o contrato de prestação de serviço não tivesse caducado por esse motivo, como caducou, podia o último denunciá-lo sem sujeição à obrigação de indemnização." (ac. STJ 22.04.2004, proc. 04B1201, relatado pelo Cons. Salvador da Costa).
-Não ocorre, por isso, motivo para condenar a R. a indemnizar a A., com fundamento em "revogação", sem "justa causa subjetiva", do "Contrato Mandato", pela pretensa mandante.
-Se é certo que, como reconhecido na sentença proferida pelo tribunal a quo, o regime constante do artigo 1172.° do Código Civil, encontra o seu fundamento na tutela da confiança, não menos certo é que, no caso dos autos, não se verifica terem sido preenchidos os respectivos pressupostos.  
- Na verdade, apenas se poderia considerar que um homem médio colocado na posição da A.  teria a expectativa de receber o pagamento da «comissão de montagem» no caso de (i) o financiamento ter sido efectivamente concedido ou angariado ou, não tendo essa concessão ou angariação ainda ocorrido, de (ii) se afigurar plausível que o financiamento viria a ser futuramente concedido ou angariado; nenhuma das situações se verifica: não só o financiamento nunca chegou a ser concedido ou angariado, como, à data da resolução do contrato de mandato pela R, mostrava-se ser «inviável» que viessem a verificar-se as condições que a A. exigia para a realização da prestação a que estava vinculada, mostrando-se incorrecta a condenação da R no pagamento de uma importância equivalente à comissão, com fundamento numa disposição legal de tutela da confiança.
-Também o pressuposto da imputação da confiança ao eventual lesante não se encontra aqui preenchido: afinal, ainda que a A. tivesse a expectativa de receber o pagamento da «comissão de montagem», apesar de o financiamento não ter sido efectivamente concedido ou angariado, e de essa conclusão se mostrar inviável, essa confiança nunca se poderia considerar como tendo sido causada pela R, dado que esta estipulou contratualmente que esse pagamento apenas seria devido no caso de o financiamento ser efectivamente concedido ou angariado.
-Resulta, assim, reforçada a conclusão de que, ainda que o artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil, fosse aplicável ao caso sub judice, não estariam preenchidos os pressupostos da responsabilidade pela confiança, da qual este preceito representa uma manifestação.
-Ainda que fosse de aplicar o preceituado no artigo 1172.°, alínea c), do Código Civil, que impõe ao revogante a obrigação de indemnizar em certos casos, não haveria, no caso dos autos, obrigação de indemnizar a A. pelo valor da comissão de 1 %, porque, não deixando de estar perante uma hipótese de responsabilidade civil, não há dispensa do requisito, ou pressuposto, da causalidade, ou seja, do nexo entre o facto e o dano, em termos de causalidade adequada, importando, por isso, como o determina o artigo 563.° do Código Civil, questionar se o contrato não tivesse sido resolvido pela ora recorrente a ora recorrida provavelmente receberia o valor correspondente à "comissão de montagem".
-Ora, os factos dados como provados na sentença recorrida impõem uma resposta negativa;  com efeito, a efectiva angariação do financiamento estava, entre outros factores, dependente da conclusão, com resultados positivos, de uma due diligence e, em particular, da emissão de parecer favorável por um consultor jurídico; tal parecer favorável em caso algum seria emitido sem prévia emissão dos alvarás de construção pelas Câmaras Municipais (Loures e Vila Franca de Xira); a emissão desse parecer favorável pelos consultores jurídicos da A. encontrava-se condicionada, em alternativa, (a) à obtenção pela R. S... do consentimento da totalidade dos comproprietários do terreno onde seria construído o Parque Eólico ao respectivo arrendamento, ou (b) à adopção de um conjunto de medidas de mitigação do risco de crédito, entre as quais constava a alteração dos contratos celebrados pela R. com a fornecedora de torres eólicas (a Repower) no sentido de esta se «comprometer a recomprar os aerogeradores (ou os seus compoenentes) num prazo razoável, pelo menos de acordo com o seu valor de mercado (e de acordo com fórmula previamente estabelecida» no caso de a validade do contrato de arrendamento ser questionada, o preenchimento de qualquer uma destas condições se mostrava «inviável» (nas palavras do Tribunal a quo, pois que, por um lado, desde cedo que foi aceite que «não seria possível obter uma solução que implicasse a sanação da invalidade do contrato de arrendamento», designadamente através do consentimento dos demais coarrendatários e porque, por outro, a fornecedora dos aerogeradores transmitiu à R. uma «unânime e firme manifestação de indisponibilidade» para aceitar vincular-se a uma obrigação de recomprar os aerogeradores no caso de a invalidade ou ineficácia do contrato de arrendamento ser alegada).
-Ou seja: a subsistência em vigor do "contrato de mandato" não era condição suficiente para que o financiamento fosse «efectivamente concedido ou angariado», era ainda necessário que suplementarmente se verificassem as condições intransigentemente colocadas pela A. e que, nas palavras do Tribunal a quo, «objectivamente vinham obstaculizando a concretização do projecto em tempo útil».
- Inexiste nexo de causalidade - na modalidade de causalidade adequada - entre a resolução do contrato de mandato e a não recepção da comissão de montagem pela A ..
-Falhando o preenchimento deste pressuposto da responsabilidade civil, o pedido de condenação da R. no pagamento de indemnização deveria improceder. A condenação decidida pelo Tribunal a quo mostra-se, pois, manifestamente incorrecta, impondo-se, por isso, também, a sua revogação, também por violação do artigo 563.° do Código Civil.
-Se é verdade que, na sentença, se afirma, interpretando o artigo 1172.° do Código Civil, que, aqui, a indemnização deve restabelecer o status quo ante, isto é, indemnizar o interesse contratual negativo da A. (cfr. fls. 64 da decisão recorrida), o certo é que: (a) a indemnização imposta à ora apelante, de € 150.600,00 e juros, não corresponde ao dano por violação daquele interesse (que deveria colocar o lesado como o contrato nunca tivesse sido celebrado); (b) por outro lado, não foram  alegados, nem provados, quaisquer danos que pudessem ser indemnizáveis pelo interesse contratual negativo.
-Não é, assim, devida a indemnização, da R. S..., ora recorrente, à A. E..., ora recorrida.
-Pelo contrário, aplicando-se, como deve aplicar-se, o disposto no artigo 795.°, nº 1, e nos artigos 473.° e seguintes do Código Civil, tendo-se tomado extinto, por caducidade, o contrato sinalagmático a que se refere os autos, deverá a Recorrida restituir à Recorrente a importância que, a título de antecipação da remuneração não devida, lhe foi entregue.
-A Senhora Juíza a quo violou, entre outros, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto nos artigos 236.°, nº 1, 473.°, nº 1, 475.°, 476.°, nº 1, 790.°, nº 1, 795.°, nº 1, 1170.°, 1172.°, alínea c) e 1181.°, todos do Código Civil, bem como o artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei 178/86, de 3 de Julho.
-Impõe-se, assim, a procedência desta apelação, revogando-se a sentença apelada, na parte em que nela se condena a ora recorrente a indemnizar a recorrida pela quantia de € 150.600,00 (cento e cinquenta mil e seiscentos euros) e correspondentes juros de mora à taxa legal prevista para os créditos de que sejam titulares as empresas comerciais, desde 01.10 .2009, bem como na parte em que a apelada é absolvida do pedido reconvencional, o qual deve ser julgado procedente e, em consequência, ser a A. apelada condenada a restituir à R. apelante a importância de € 25.000,00, acrescida dos juros, calculados às taxas acima referidas, desde a data da notificação da reconvenção até integral e efectvo pagamento.

A Autora contra-alegou sustentando a bondade da decisão recorrida.

Todavia, a recorrida veio igualmente pedir que sejam revistas, nos termos do art. 636 nºs 1 e 2 do CPC, as alíneas FQ) e FP) da matéria de facto por entender que se trata de juízos conclusivos e não de verdadeiros factos, o mesmo sucedendo com o teor das alíneas FL) e FQ). Além disso, entende não ter ficado provado que a construção do parque eólico fosse durar 10 meses.

Alega ainda, com base no mesmo preceito legal, que a responsabilização da R decorrente da sua responsabilidade contratual, com fundamento em violação culposa do contrato celebrado entre as partes bem como a “impossibilidade da prestação” deverá ser revista por este Tribunal da Relação. Assim deverá ser igualmente revista a questão do seu direito à indemnização no peticionado valor de € 204.382,61 pelos danos causados com a ruptura ilícita das negociações relativas ao financiamento acordado.

A Ré opõe-se à pretensão da Autora.

Cumpre apreciar.

Começando, como é lógico, pelo recurso da Ré.

Este assenta basicamente nos seguintes pontos:

A)Nunca foi celebrado um contrato de financiamento e nem mesmo ocorreu a vinculação dos pretensos financiadores a conceder o financiamento. Esta não realização da prestação à qual a Autora se encontrava vinculada, deveu-se à sua mera impossibilidade, dado o facto de as condições impostas para que tal financiamento pudesse efectuar-se não podiam ser cumpridas pela Autora, e muito menos no prazo em que o parque eólico deveria ser construído.
Assim, a obrigação da Ré extinguiu-se por se ter tornado impossível a angariação do financiamento e construção do parque no prazo de 10 meses.
B)A declaração da Ré não pode ser entendida como uma revogação do mandato, uma vez que, quando teve lugar, já não havia nada para financiar. De resto, o contrato entre as partes não deve reger-se pelo regime do mandato já que a Autora não se vinculou à prática de qualquer acto jurídico. Trata-se antes de um contrato atípico ao qual se deverá aplicar a Lei do Contrato de Agência.
C)A declaração da Ré não consubstancia uma revogação do mandato mas antes uma resolução contratual com justa causa (mesmo que esta seja objectiva). A declaração da Ré tem um fundamento jurídico que é o da inexigibilidade da sua permanência na relação contratual.
D)No caso dos autos não se verificam os pressupostos atinentes à tutela da confiança, no âmbito do art. 1172º do Código Civil.
E)Não existe no caso dos autos obrigação da Ré de indemnizar a Autora pelo valor da comissão de 1% na medida em que estamos perante uma hipótese de responsabilidade civil que não dispensa o requisito da causalidade, a saber, o nexo entre o facto e o dano em termos de causalidade adequada. Ora, se o contrato não tivesse sido resolvido pela recorrente, nem por isso, face à factualidade provada, viria a Autora a receber tal comissão, na medida em que a mesma dependia da efectiva angariação do financiamento, a qual não aconteceu nem poderia vir a acontecer, dadas as condições impostas pela Autora e que nunca poderia ser realizadas e muito menos em tempo útil para que o parque eólico pudesse ser construído. Sendo que o financiamente se destinava a tal construção.
Assim, mesmo que o contrato se mantivesse nem por isso se verificariam os fundamentos justificativos de atribuição da comissão de 1% à Autora.
F)Tendo-se extinto por caducidade o contrato celebrado entre as partes, nada tem a Ré a pagar à Autora, devendo esta restituir-lhe a importância que a Ré lhe entregou a título de antecipação dessa remuneração/comissão.

Por uma questão de ordem, convirá, antes do mais, definir o contrato não só em termos da sua caracterização como em termos do regime legal aplicável.
O contrato consta da chamada “carta-mandato” enviada pela Autora à Ré em 30/07/2004 (e aceite por esta) refere logo no seu início que, estando a estrutura contatual do Projecto ainda longe de se encontrar definida ou concluída, a proposta de financiamento é meramente indicativa.

Após mencionar uma série de condições a carta conclui nos seguintes termos:

Mediante a assinatura da presente carta  e respectivo anexo, o Banco considerar-se-à, para todos os efeitos legais, mandatado pela S... para actuar como Arranger exclusivo dos financiamentos em capitais alheios necessários ao Projecto.
No âmbito dessa função de Arranger o Banco será remunerado através de uma comissão de montagem no valor de 1% sobre o montante do financiamento que for efectivamente concedido ou angariado, numa base “best effort” pelo Banco. A comissão de montagem será liquidada da seguinte forma: € 25.000,00 na data de assinatura da presente carta-mandato e o remanescente na data de assinatura dos contratos de financiamento (...)”.

Ou seja,  pretendendo a Ré S... construir um parque eólico e carecendo do necessário financiamento, o Banco ..., no seguimento de diversas conversações, propôs-se actuar como angariador de tais financiamentos até ao limite máximo de € 11.000.000,00, em termos de constituição de um sindicato de bancos financiadores.

Para tal ficaram estabelecidas várias condições, das quais se destacam duas: o Banco ... procederia a uma “due dilligence” de natureza técnica por consultor independente com emissão de parecer favorável à adequabilidade, fiabilidade, potência e qualidade de produção dos equipamentos que constituíam o Projecto e a uma “due dilligence” de natureza jurídica efectuada também por consultor independente com emissão de parecer favorável ao pacote contratual do Projecto.

Ou seja, competia à Autora, como resulta provado em R), a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validação da estrutura a utilizar para a operação, com a correspondente determinação do nível de endividamento máximo comportável, e a implementação da solução de financiamento seleccionada.

No âmbito de tal leque de obrigações a Autora contratou uma sociedade de advogados para efeitos de acessoria e consultadoria jurídicas na operação de financiamento em causa.

A Autora emitiu ainda garantia bancária a favor da EDP visando garantir as obrigações da Ré perante a EDP referentes à conclusão dos trabalhos de instalação do ponto de recepção de energia eléctrica.

No âmbito do contrato celebrado, cabia à Autora angariar financiadores do projecto da Ré, além de analisar e propor as minutas dos contratos financeiros e enfim, analisar todos os aspectos atinentes à implementação do projecto.

No fundo, a vasta actividade que a Autora se propunha integra-se, de um modo geral numa prestação de serviços, art. 1154º do Código Civil, na especificidade de um contrato de mandato, ou seja, um contrato em que uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta de outra (art. 1157º).

A contratação da sociedade de advogados visa assegurar a “due dilligence” jurídica que será parte essencial não só na elaboração de propostas contratuais ou minutas relativas ao contrato de financiamento mas também no acompanhamento dos diversos circunstancialismos que rodearam o Projecto, elaborando minuta relativa ao acordo directo a realizar com o fornecedor do equipamento (o qual viria a ser substituído nos termos descritos na alínea AL) da matéria de facto), elaboração de pareceres técnicos e jurídicos, nomeadamente em 06/02/2006, na reunião tida entre Autora e Ré, em que a esta ficou de enviar à Autora as sugestões e alterações que entendesse relativamente às minutas dos contratos de fornecimento/empreitada e dos contratos financeiros.
Em Outubro de 2006, enquanto decorria a análise dos contratos de fornecimento de equipamento e de operação e manutenção por parte do consultor técnico indicado pela Autora, os contratos de cariz financeiro foram concluídos e o respectivo clausulado fechado.

Parece-nos evidente que a actividade que a Autora se propôs consiste numa multiplicidade de actos jurídicos desde elaboração e apresentação de propostas contratuais a análises técnicas e jurídicas que culminam em pareceres jurídicos e recomendações com vista a assegurar a efectivação do Projecto bem como a salvaguardar os interesses dos financiadores. Tal contrato, como se salienta na sentença recorrida, combina os elementos genéricos da prestação de serviços com o regime específico do mandato. Falamos de mandato sem representação pois o mandatário não recebeu poderes de representação para actuar em nome do mandante, nos termos do art. 1178º nº 1 do Código Civil.

Apesar de certos detalhes que apresentam alguma similitude com o contrato de agência, entendemos, contrariamente à recorrente, não ser o respectivo regime aqui aplicável, não só pelas razões adiantadas na sentença (não existe no contrato dos autos uma prestação de facto continuada visando a prática de actos materiais respeitantes à propaganda do comércio do principal e prospecção do mercado) mas acima de tudo porque a obrigação da Autora, resultante do contrato celebrado com a Ré, não consiste verdadeiramente em promover a celebração de contratos por conta do principal, mas a assegurar ao mandante um financiamento para lhe permitir a realização da construção do Parque Eólico que este pretendia. O próprio financiamento, a consumar contratualmente, como é óbvio, não visa exclusivamente o interesse da Ré/mandante mas também a salvaguarda dos interesses dos financiadores, o que justifica as condições estabelecidas pela Autora e o acompanhamento minucioso que esta fará, ao nível técnico e jurídico, das diversas fases do Projecto.

O termo “arranger” que as partes atribuíram à Autora remete para uma realidade que só superficialmente poderá adequar-se ao conceito de “agente”. A Autora, enquanto “arranger” não se limita a promover contratos para a Ré, como caberia a um agente, mas, pela análise técnica e jurídica de todas as circunstâncias relevantes que integram o Projecto do Parque Eólico, pelas sugestões e até imposição de condições à Ré, procura assegurar um modelo adequado de acordo a ser celebrado entre os financiadores e aquela.

A Autora não promove numa base continuada a celebração de contratos por conta da Autora. No limite, obriga-se apenas a encontrar financiadores para o Projecto da Ré, mas a realidade do contrato entre Autora e Ré mostra que é a própria Autora a delimitar as circunstâncias em que o mesmo poderá vir a ser celebrado e qual o seu teor, bem como toda a actividade técnica e jurídica que assegure a viabilidade desse contrato, circunstâncias e condições que pressupõem naturalmente o acordo da Ré.

Como refere Manuel Januário Gomes, “Da Qualidade de Comerciante do Agente Comercial”, BMJ nº 313 pág. 47, “ o agente comercial é um intermediário do comércio cuja figura apresenta notáveis pontos de contacto com outras (...) Não se confunde, porém, com elas, havendo necessidade de traçar as suas fronteiras em relação, nomeadamente, ao concessionário, ao cimissário, ao mediador, ao arranjador ocasional de negócios (...)” (sublinhado nosso).

Mais que promover a celebração de um contrato em benefício da Ré, a Autora assegura, nos termos do contrato, a montagem e organização de um financiamento. E, citando a alínea R) da matéria de facto, na qualidade de arranger, competia à Autora “a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validação da estrutura a utilizar para a operação, com a correspondente determinação do nível de endividamento máximo comportável, e a implementação da solução de financiamento seleccionada”. 

Entende-se pois como aplicável ao contrato dos autos o regime do contrato de prestação de serviços – art. 1154º e seguintes do Código Civil – e do contrato de mandato – art. 1157º e seguintes do mesmo diploma.

Posto isto, há que apreciar o recurso da Ré no tocante à condenação no pagamento à Autora da quantia de € 150.600,00 com acréscimo de juros.

Na sentença recorrida, entendeu-se não ter existido incumprimento contratual da Ré, na medida em que a viabilidade de concretização do financiamento, objecto do aludido contrato, se encontrava comprometida, o que levou a Ré a tentar obter o financiamento junto de outra entidade e em moldes contratuais diversos.

Assim, a condenação nada teve que ver com qualquer indemnização por incumprimento contratual, nos termos do art. 798º do Código Civil. Reporta-se, isso sim, a indemnização pelos prejuízos sofridos pela Autora com a revogação do contrato pela Ré.

Nos termos do art. 1172º c) do Código Civil, “a parte que revogar o contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta sofrer (...) se a revogação proceder do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que o mandato tenha sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto (...)”.

Tendo o Mº juiz a quo entendido que o prejuízo da revogação seria calculado em função da compensação que o mandato deveria ter proporcionado, normalmente, ao mandatário. Nesse sentido, pode ler-se na sentença recorrida:

“A ratio da previsão da al. c) do art. 1172º do CC é a tutela da confiança. Tutela-se o direito do mandatário à retribuição fo mandato, pois que um dos pressupostos da responsabilidade do mandante-revogante é que o mandato seja retribuído. Por isso, em ambas as situações da alínea c) o prejuízo do mandatário traduz-se na perda da retribuição a que tinha direito, procurando-se fixar o lucro cessante do mandatário. A indemnização deve restabelecer o status quo ante, isto é, indemnizar o interesse contratual negativo da Autora. Será na diferença entre o que teria gasto e o que teria recebido, deduzido do que ganhou por não ter de cumprir integralmente o contrato celebrado, que se encontrará a indemnização justa”.

Mais se refere na douta sentença que a Autora tinha já efectivamente angariado financiamento para o Parque Eólico, por intermédio de si própria e do B....

Assim, conclui-se que o direito à comissão/remuneração contratada existia já na esfera jurídica da Autora à data da revogação do contrato pela Ré, embora no contrato estivesse previsto que a respectiva liquidação ocorresse na data de assinatura dos contratos de financiamento.

Contrapõe a Ré, nas suas alegações de recurso que nunca foi celebrado qualquer contrato de financiamento, nem sequer ocorrendo qualquer vinculação dos pretensos financiadores a conceder o financiamento.

Provou-se que em 19/12/2005, a Ré comunicou à Autora que aceitava os parâmetros de financiamento do projecto nas condições propostas pela Autora.

Em 24/07/2006 a Autora enviou à Ré as novas condições financeiras, alteradas em função das alterações do projecto do Parque Eólico, sendo tais condições as constantes da alínea BB) da matéria provada.

Todavia, a concretização do financiamento, nos moldes estabelecidos em 24/07/2006, estava dependente da verificação de determinadas condições, consideradas como medidas de mitigação do risco de crédito (alínea CT).

Os problemas essenciais tinham a ver com o facto de o contrato de arrendamento celebrado pela Ré relativamente aos terrenos onde seria implantado o Parque Eólico poder vir a ser inviabilizado, na medida em que fora celebrado com apenas duas das 117 pessoas donas dos terrenos em regime de compropriedade. A Ré realizou diligências visando obter o consentimento da totalidade desses comproprietários, não tendo o tendo conseguido (alínea FI). 

Para mitigar os riscos que decorreriam da invalidade do contrato de arrendamento, a Autora pretendia além do mais que a empresa fornecedora das torres eólicas, a “Repower” se comprometesse a recomprar os aerogeradores ou os seus componentes, de acordo com o seu valor de mercado, caso a validade do arrendamento viesse a ser posta em causa. Ora a “Repower” manifestou a sua firme recusa em satisfazer tal pretensão. Mais, passou a exigir prestação de sinal no contrato de fornecimento e por fim decidiu não efectuar tal fornecimento, tendo a Autora que optar, à última hora, pelas torres “Suzlon”.

Estas questões, além de outras mencionadas na alínea BX) da matéria provada eram essenciais para que o relatório da “due dilligence” fosse emitido favoravelmente e para que a Autora pudesse financiar o projecto. Com efeito, para financiar o projecto, a Autora nunca abdicou da necessidade de estar definida a questão da sanação da invalidade do arrendamento ou da obrigação da Repower recomprar os aerogeradores (ver alíneas EH e EI).                                                                                                             
Saliente-se ainda que a licença de estabelecimento da Direcção Geral de Geologia e Energia foi prorrogada até Outubro de 2008, o que implicou a necessidade de a construção do Parque Eólico estar concluída em 22/10/2008. Por outro lado, as licenças de construção das Câmaras Municipais de Loures e Vila Franca de Xira foram emitidas em 31/07/2008 e 05/09/2008.

Assim, a situação que se nos depara é a de que a Autora não viabilizaria a efectivação do financiamento sem que as questões referidas estivessem solucionadas ou pelo menos mitigados os riscos nos termos definidos pela Autora. Sucedendo que a Ré não conseguia obter o consentimento dos restantes 117 condónimos relativamente ao arrendamento, até por nem sequer possuir a identificação de vários deles, não logrando igualmente obter acordo da fornecedora das torres eólicas para esta comprar de novo as mesmas em caso de ser suscitada a invalidade do arrendamento.

Por outro lado, sem tal financiamento, a Ré não tinha meios para iniciar a construção do projecto.

E este, sob pena de expirar a licença de estabelecimento, teria de estar concluído até 22/10/2008.

Na alínea R) da matéria provada, e seguindo os termos do contrato celebrado entre as partes, pode ler-se:

“Na qualidade de arranger, competia à Autora a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validação da estrutura a utilizar para a operação, com a correspondente determinação do nível de endividamento máximo comportável e a implementação da solução de financiamento seleccionada”.

Não parece que, de acordo com a vasta factualidade provada, a obrigação da Autora consistisse apenas em encontrar entidades dispostas a financiar o projecto. Cabia-lhe montar e estruturar toda a operação conducente ao financiamento. E se é verdade que os termos do financiamento foram definidos pela Autora e aceites pela Ré, tal financiamento esteve sempre dependente da solução dos problemas acima mencionados, solução que nunca foi alcançada na vigência do contrato.

Decoreram quatro anos entre a celebração do contrato e a sua revogação pela Ré, sem que o financiamento fosse concedido. E nem se vislumbra que viesse a ser concedido a curto ou médio prazo. As inúmeras reuniões, pareceres, troca de correspondência, mostram bem a extrema dificuldade de levar a operação a bom termo. Há que ter em conta que a Autora era, ela própria, um dos financiadores, juntamente com o B....

Tem sido entendido que a indemnização prevista no art. 1172º c) do Código Civil, no caso de revogação do mandato pelo mandante, se circunscreve aos lucros cessantes – ver Manuel Januário Gomes, “Em Tema de Revogação do Mandato Civil” pág. 273.

Tendo em atenção a natureza do contrato, a Autora encarregava-se de montar toda a operação ligada ao financiamento do Projecto, sendo que as condições em que tal financiamento poderia vir a ocorrer foram definidas pela Autora (igualmente uma potencial financiadora) e a Ré.

Contrariamente ao alegado pela recorrente o problema não consiste no facto de nunca ter sido formalmente celebrado um contrato de financiamento nem ter havido a vinculação dos financiadores a efectuar tal financiamento. Existiu na verdade um acordo relativo ao financiamento, à sua modalidade, condições de pagamento, juros. O problema situa-se nas condições que a Autora sempre apresentou como determinantes da efectiva concessão de tal financiamento.

A obtenção de consentimento dos 117 comproprietários do terreno, que sanasse os vícios do arrendamento, mesmo que se admita ser possível, seria sempre extremamente morosa e complicada. E existia um prazo para a construção do Parque Eólico,, que era o da vigência das licenças de construção até 22/10/2008.

A outra condição colocada pela Autora e que de certo modo visava associar a empresa fornecedora dos aerogeradores aos riscos decorrentes da possível invalidade do arrendamento, pretendendo que tal empresa se obrigasse a recomprar os aerogeradores a preço de mercado em caso de invalidade do arrendamento e assim da ocupação do terreno onde seria implementado o Parque Eólico pela Ré, foi firmemente recusada por essa empresa, que, de resto, e após exigir um sinal para efectuar o fornecimento acabou por não concretizar o negócio.

Em Outubro de 2008 as condições para financiamento ser efectivado não estavam realizadas nem se podia prever quando e se o seriam. Como se refere na alínea FQ) da matéria de facto, “a viabilidade da concretização do financiamento nos moldes estruturados pela Autora estava comprometida”.

E sem o financiamento a Ré não tinha condições para dar corpo ao projecto.

Estas circunstâncias que constituem o essencial das vicissitudes por que passou a relação contratual entre as partes, levam-nos à conclusão de que não era exigível à Ré manter tal relação. Para não perder as licenças  de construção, a Ré tinha de obter um meio que lhe permitisse realizar os trabalhos de construção do Parque Eólico até 22/10/2008. O financiamento para que fora mandatada a Autora, não seria efectivado sem o desbloqueamento de condições de modo algum exequíveis dentro de tal prazo.

Daí que na reunião com a Autora, em 12/11/2008 a Ré lhe comunique que “já não havia nada para financiar”. Até porque a Autora sabia que o Parque Eólico tinha de ser construído até 22/10/2008.                                                                                                       
Em resposta à carta do Banco ..., de 26/01/2009, reclamando o pagamento do valor remanescente das comissões de estruturação e montagem e participação do financiamento do Projecto, A Ré, também por carta, datada de 27/03/2009, recusa tal pagamento, alegando que as condições que foram sendo impostas pela Autora para concessão do financiamento puseram em risco a viabilidade do projecto de construção do Parque Eólico. Refere, nomeadamente que:

“Só quando o próprio projecto passou a estar em risco, fruto das já mencionadas exigências e consequente arrastamento do processo, factos exclusivamente imputáveis ao banco, é que a S... se viu obrigada a recorrer a outra entidade bancária financiadora da construção do parque.
E o que é certo é que, perante as mesmas circunstâncias de facto e de direito, a aprovação do financiamento foi aprovada e concretizada em dois meses, ou seja, aquilo que o V. banco não conseguiu, ou não quis, em mais de três anos”.

Em nosso entender, esta carta consubstancia uma imputação à Autora da responsabilidade pela não efectivação do contrato e consequente revogação pela Ré, o que implica a invocação de justa causa.

Aludindo à legislação italiana sobre esta matéria, refere Manuel Januário Gomes na obra já citada, pág. 273/274:

“ O 1º parágrafo do art. 1725º do codice ressalva a existência de justa causa para a revogação como circunstância que exonera o mandante da obrigação de indemnizar. Apesar do silêncio do nosso código a esse propósito, pensamos que é de aplicar idêntico regime, com a precisão já assinalada de que a justa causa relevante é sobretudo a que decorre de circunstâncias subjectivas, relativas à contraparte (neste caso o mandatário)  que tornem inexigível a continuação da relação contratual.”

Podendo igualmente ler-se a fls. 221 da referida obra:

“Uma vez que a ocorrência de justa causa não é requisito constitutivo do direito de denúncia do mandato puro, a extinção do contrato opera-se com a mera declaração de revogação por qualquer das partes. Porém (...) a invocação  duma justa causa para a revogação pode ter o efeito de exonerar o revogante da obrigação de indemnização a que, de outra forma, estaria adstrito por força do disposto no art. 1172º. A justa causa tem, assim, no mandato (...) uma fisionomia particular, uma vez que não opera por referência à revogação em si, mas aos seus efeitos.
“A eventual exclusão da obrigação de indemnização a que houvesse lugar não está dependente da invocação de justa causa aquando da revogação; tanto pode ser invocada na declaração revogatória como pode ser oposta posteriormente à contraparte quando esta pretenda obter indemnização com base em qualquer das alíneas do art. 1172º”. 
  
É nosso entendimento que a situação dos autos se enquadra inteiramente na doutrina formulada pelo ilustre tratadista.

Para evitar que expirassem as licenças de construção, a Ré lançou mão de um diferente tipo contratual (locação financeira) com outra entidade bancária, revogando o mandato da Autora. Não lhe sendo exigível, nesse momento – o da focada reunião de 12/11/2008 – invocar justa causa para a revogação, já que o mandato pode ser livremente revogável – art. 1170º nº 1 do Código Civil.

Só quando é instada pela Autora a pagar-lhe a comissão contratualmente prevista é que a Ré tinha o ónus de invocar factualidade constitutiva da justa causa, já que esta não opera ao nível do direito de revogar o mandato mas sim do dever de indemnizar o mandatário.

E em nosso entender, a Ré cumpriu tal ónus na carta de 27/03/2009.

Assim, o que está em causa, na nossa perspectiva, não é o facto de ter ou não ter sido celebrado um efectivo contrato de financiamento. A obrigação da Autora, enquanto mandante, consistia em organizar a montagem e estruturação da operação de financiamento – alínea R) da matéria de facto, já atrás mencionada. Assim, se tal montagem, bem como estruturação do financiamento estivessem concluídas, a Autora teria realizado a sua obrigação enquanto mandatária. Mesmo que o financiamento não viesse a ocorrer, por razões extrínsecas a tal montagem e estruturação, a Autora teria o pleno direito a ser remunerada pela sua actividade. A liquidação de tal remuneração ocorreria na data de celebração dos contratos de financiamento, mas o direito da mesma já integrava a esfera jurídica da mandatária.

O problema – e é aqui que discordamos da douta sentença recorrida -  é que o contrato de financiamento não chegou a ser celebrado pelas partes por razões próprias das condições colocadas pelo mandatário na operação de montagem e estruturação do financiamento. Já falámos de tais condições e de como a  Ré mandante não logrou obter êxito em satisfazê-las apesar de ser óbvio que o tentou fazer e por diversas vezes.

Portanto, não se pode dizer que o direito à comissão já integrava a esfera jurídica do mandatário Banco ... assim que ficaram estabelecidos os diversos parâmetros do financiamento, pois que, apesar de este ficar definido e com acordo da Autora, a sua implementação dependia da resolução dos já várias vezes mencionados problemas relativos ao arrendamento e à “recompra” dos aerogeradores pela empresa fornecedora.  
          
Esses problemas mantinham-se sem solução aquando da reunião em Novembro de 2008 – já posterior à data em que expirava a licença de construção, 22/10/2008 – quando a Ré comunicou finalmente à Autora que “já nada havia a financiar”.

Independentemente das razões da Autora para impôr tais condições, visando naturalmente minimizar os riscos do financiamento, o certo é que o impasse que as mesmas criaram na efectivação do financiamento, sem o qual a Ré não poderia realizar as obras do Parque Eólico, expirando a licença concedida pela Direcção Geral de Energia em 22/10/2008, acabaram por criar uma situação insustentável para a mandante. A razão de ser do mandato, a montagem da operação de financiamento, esbarrou em condições impostas pela mandatária e que, mesmo que compreensíveis, ameaçavam eternizar o objecto final do negócio ou até inviabilizá-lo.

Perante isto, é nosso entendimento que não era exigível à Ré manter o mandato concedido à Autora, até porque tinha de tentar encontrar uma solução, em tempo útil, que lhe permitisse construir o Parque Eólico, vindo a optar por um contrato de locação financeira com uma outra entidade. E esta solução excluía necessária e logicamente a opção pelo financiamento a que aludem os presentes autos.

Daí que consideremos que a revogação do mandato pela mandante S... é suportada por justa causa, fundada no comportamento contratual da mandatária E..., nomeadamente das condições que esta impôs para que o financiamento pudesse vir a ser efectivado.

É preciso ter em conta, além disso, que a mandatária era igualmente um dos financiadores por si angariados, juntamente com o B..., e que a sua actividade enquanto mandatária não pode ser desligada dos seus interesses enquanto financiadora, o que confere uma característica muito peculiar à situação dos autos.

Por outro lado, a Ré mandante procedeu a pagamentos relativos a despesas da mandatária com a sociedade de advogados que a mesma mandatária contratou para consultadoria jurídica ao longo da operação, bem como pagamentos relativos a despesas com consultadoria técnica pela empresa indicada pela mandante, a AEA Technology. Ao todo, tais pagamentos atingiram € 87.125,57. Estamos perante despesas que não conduziram a qualquer resultado, tendo em conta que aquilo que sempre esteve em causa foi a obtenção de um financiamento para construir o Parque Eólico.   
             
Neste quadro, a Ré não está obrigada a efectuar o pagamento da comissão à Autora, na medida em que, revogado o mandato com justa causa, não há lugar a indemnização ao mandatário.

Isto implica a devolução, pela Autora, da quantia de € 25.000,00 que lhe foi entregue pela Ré no acto de assinatura da carta-mandato e que representava uma primeira “tranche” nessa comissão de montagem, cujo remanescente seria pago no acto de assinatura dos contratos de financiamento.

Procedendo assim o recurso da Ré S...

Quanto ao recurso da Autora, Banco ....

As alíneas FL), FP) e FQ) não integram, contrariamente ao pretendido pela recorrente, matéria conclusiva.

Com efeito, quando na alínea FL) se escreve que “as medidas de mitigação do risco de crédito propostas pelos Consultores Jurídicos da Autora, nomeadamente a imposição ao fornecedor da obrigação de recompra dos aerogeradores para reembolso parcial do empréstimo com o valor da venda dos aerogeradores instalados no imóvel, não se mostravam exequíveis”, não se está a proceder a qualquer formulação de um juízo conclusivo mas tão só a retratar uma situação de facto: essa medida não se mostrava exequível porque a empresa fornecedora dos aerogeradores recusou terminantemente assumir tal obrigação de recompra.

Quanto à alínea FP) relativa à necessidade de prestação de garantias pessoais ou reais da Ré, a alínea limita-se a referir que a Ré não tinha a possibilidade de obter tais garantias, o que não integra qualquer matéria conclusiva.

No tocante à alínea FQ) quando se diz que “a viabilidade de concretização do financiamento nos moldes estruturados pela Autora estava comprometida”o tribunal a quolimita-se a constatar uma situação óbvia: ao fim de mais de três anos a concretização do financiamento continuava a ser inviabilizada pelas condições impostas pela Autora, sendo que as licenças de construção expiravam em 22/10/2008. Aliás, na reunião de Novembro de 2008, já após tal data, ainda pretende a Autora fazer o ponto da situação relativamente à satisfação de tais condições.

Não vemos que outra redacção poderia ser dada a esta alínea a qual de resto se conjuga inteiramente com a alínea EV) que, de forma mais detalhada, expressa a mesma realidade. 
Pelo que se mantém a decisão de facto proferida na 1ª instância.

Posto isto há que concluir que:

-Celebrado um contrato pelo qual uma entidade bancária se obriga, enquanto “arranger”, a encontrar financiadores de um projecto de construção de um parque eólico, cabendo-lhe igualmente a montagem e estruturação da operação, o que implicava a validade da estrutura a utilizar para a operação, tal contrato tem uma natureza mista de contrato de prestação de serviços e, mais especificamente, contrato de mandato sem representação.

-É livre a revogação do mandato pelo mandante, não sendo exigível que no próprio acto de revogação invoque os fundamentos integrantes de justa causa, podendo fazê-lo em resposta à comunicação do mandatário exigindo o pagamento de indemnização pela revogação.

-Verificando-se, que na montagem e estruturação da operação, o Banco mandatário estipulou condições que a Ré mandante não podia satisfazer em tempo útil, arrastando-se a operação por mais de três anos, sem que a Ré pudesse celebrar o contrato de financiamento e dar início à construção do parque, aproximando-se a data limite em que expiravam as licenças emitidas entre outras pela Direcção Geral de Energia, existe justa causa para a mandante revogar o mandato e celebrar um contrato de leasing com outra entidade que lhe permitiu, finalmente, proceder à construção do parque.

Termos em que se julga procedente o recurso da Ré, revogando-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 150.600,00 com acréscimo de juros, absolvendo-se assim a Ré deste pedido.

Em consequência, julga-se procedente o pedido reconvencional no tocante à restituição à Ré pela Autora da quantia por aquela adiantada de € 25.000,00 com acréscimo de juros à taxa legal contados desde a data do trânsito do presente acórdão e até efectivo pagamento.
Custas pela recorrida.


LISBOA, 03/12/2015


António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais-  Devido a essa indefinição, nunca estariam sequer definidas as condições em que o contrato de financiamento seria celebrado.  As comunicações realizadas entre a a A. e a R. quanto a este aspecto sempre se cingiram a fichas técnicas de carácter indicativo. O seu carácter indicativo tem como implicação que nenhuma das partes estava vinculada a essas condições.
Decisão Texto Integral: