Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9207/2006-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ACTAS
TÍTULO EXECUTIVO
IRREGULARIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/15/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A decisão em que se ajuíza que o documento apresentado pelo exequente não reúne os requisitos formais exigidos por lei para ter a força de título executivo constitui caso julgado meramente formal, ou seja, apenas é vinculativa no processo em que foi formulada.
II – Para os efeitos referidos em I, constituem processo diverso, relativamente à execução inicial, embargos de executado deduzidos contra execução instaurada em cumulação sucessiva.
III – Embora a sua falta não afecte a validade das deliberações da assembleia de condóminos, a acta é a única forma admissível para provar tais deliberações, pelo que a sua ausência torna-as ineficazes, em termos tais que, embora no ponto de vista teórico a acta se apresente como uma formalidade ad probationem, na prática a sua omissão tem a consequência prevista no art.º 364º nº 1 do Código Civil (não pode ser substituída por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior).
IV – Se tiver sido lavrada acta, mas faltarem as assinaturas de alguns dos intervenientes na assembleia de condóminos, ocorrerá uma irregularidade que o tribunal apreciará casuisticamente, com base na análise do documento e nos demais elementos pertinentes obtidos, nomeadamente outros elementos de prova, para dar ou não como demonstrada a situação factual que o documento se destina a comprovar.
(JL)
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
1. Em 13.12.2002 o Condomínio da Rua, em Algés, representado pela sua administração, propôs no Tribunal Judicial da comarca de Oeiras, contra diversos condóminos, entre os quais R. Lda, acção executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo ordinário, a fim de efectivar o pagamento das quotas de condomínio referentes aos anos de 2001 e 2002, no valor total, quanto à Ripe Lda, de € 1 532,00, a que acrescem penalizações no valor de € 2 321,56, tudo no valor total de € 3 854,46.
2. Indicou, como título executivo, actas de assembleias de condomínio (actas nºs 7 e 10).
3. A executada R.Lda deduziu embargos de executado (apenso A), alegando, em síntese e nomeadamente, que os títulos apresentados não preenchem os requisitos para terem força executiva, visto não conterem a assinatura de todos os participantes na respectiva assembleia, e além disso o art.º 6º do Dec.-Lei nº 268/94, de 25.10, não confere executoriedade à deliberação da assembleia geral de condóminos referente a cláusulas penais.
4. Em 18.9.2004 foi proferida sentença que julgou os embargos improcedentes.
5. O exequente apelou de tal sentença.
6. Em 18.3.2005 o exequente requereu, contra a R Lda e outros, cumulação sucessiva objectiva de execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo ordinário, nos termos do art.º 54º do Código de Processo Civil, afirmando ter em vista a efectivação do pagamento das quotas de condomínio vencidas em 2003 e 2004, ou melhor, as penalizações a elas correspondentes, tudo em valor que contabilizou em € 10 971,66.
7. Por acórdão proferido em 03.5.2005, a Relação de Lisboa revogou a sentença recorrida (supra referida em 4) e julgou os embargos procedentes.
8. Em 24.5.2005 a executada R Lda embargou a execução sucessiva (apenso F), alegando, em síntese, o seguinte:
a) O exequente não reclama as contribuições de condomínio referentes aos anos de 2003 e 2004, uma vez que a executada já procedeu ao pagamento das mesmas;
b) O exequente reclama as prestações relativas aos anos de 2001 e 2002, no montante de € 1 474,04, mas não podia fazê-lo, pois já havia peticionado tais prestações no requerimento executivo inicial e, por outro lado, o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que as respectivas actas não eram títulos executivos;
c) O exequente pede o pagamento de penalizações com base na acta junta como doc. nº 1 do requerimento executivo inicial (acta nº7), mas tal título não tem força executiva, pois a acta não está assinada por todos os condóminos que intervieram na respectiva assembleia – sendo que a Relação de Lisboa já proferiu acórdão nesse sentido;
d) Por outro lado, por a lei o não prever, o regulamento de condomínio e as deliberações da assembleia geral de condóminos atinentes a montantes devidos a título de cláusula penal não constituem título executivo.
9. O exequente contestou os embargos, nos seguintes termos (em que se inclui o que resulta dos esclarecimentos prestados pelo exequente após interpelação pelo tribunal a quo):
a) Por lapso, o exequente incluiu no requerimento de cumulação sucessiva de execução quotas de condomínio reclamadas no requerimento executivo inicial, pelo que reduz a quantia cumulada em € 1 474,04, fixando-se aquela quantia no montante global de € 9 497,62, valor esse apenas relativo a penalizações, sendo € 5 741,99 referente a penalizações correspondentes ao não pagamento das quotas peticionadas no requerimento executivo inicial e € 3 755,63 correspondente a penalizações sobre as quotas que se venceram em 2003 e 2004 e que foram pagas extrajudicialmente ao exequente em 23.02.2005;
b) Reitera a posição já assumida nos vários apensos dos autos, que se reconduziram à sua convicção de que a falta de assinaturas nas actas não retira a estas a força de título executivo;
c) A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa proferida no apenso A (acórdão supra referido sob o nº 7) não é vinculativa erga omnes, produzindo efeito de caso julgado apenas no processo onde foi proferida e não em qualquer outro, ainda que em tramitação simultânea ou conjunta;
d) No que respeita à ausência de título executivo no que concerne às penalizações, o embargado cita um acórdão da Relação de Lisboa, no qual se ajuizou que as penalizações por falta de pagamento atempado de contribuições cabem na expressão “contribuições devidas ao condomínio” que se encontra no nº 1 do art.º 6º do Dec.-Lei nº 268/94, e para que o seu pagamento seja obrigatório basta que a respectiva deliberação de aprovação tenha sido validamente aprovada e esteja consignada em acta.
10. Em 27.4.2006 foi proferido saneador-sentença, em que se decidiu:
a) Absolver a embargante da instância executiva, quanto à quantia de € 5 741,99, pedida a título de penalização pelo atraso no pagamento das quotas de 2001 e 2002, por se verificar a excepção de caso julgado;
b) No mais, julgar os embargos improcedentes, determinando que a execução prossiga quanto ao valor peticionado de € 3 775,63.
A embargante apelou desta decisão, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões:
1. A presente apelação tem por objecto a douta sentença de fls … que julgou parcialmente improcedentes os embargos apresentados pela ora apelante e, em consequência, determinou que a presente execução prossiga quanto ao valor peticionado de € 3.775,63, referente a penalizações pelo atraso no pagamento das quotas de 2003 e 2004.
2. A douta sentença ora recorrida contraria o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no âmbito do apenso A dos presentes autos que julgou inexequível a acta de 21-03-2001.
3. Essas penalizações foram fixadas na assembleia de condóminos de 21-3-2001, que o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito do apenso A dos presentes autos (Processo nº 1139/05-1) decidiu não ser título executivo.
4. Pelo que, não pode o Tribunal a quo determinar o prosseguimento da execução no que se refere a uma quantia que se baseia numa acta que não é título executivo e julgada como tal pelo Tribunal da Relação.
5. Verifica-se, neste caso, a excepção de caso julgado no que se refere a qualquer penalização, uma vez que este instituto foi fixado numa acta já julgada pelo Tribunal da Relação de Lisboa como inexequível.
6. A douta sentença ora recorrida, salvo o devido respeito, violou também o disposto nos artigos 1º do Dec.-Lei nº 268/94, de 25.10, e 220º, por força do 295º, ambos do Código Civil.
7. Atento o disposto no artigo 1º, nº 1 do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro parece-nos ter sido intenção do legislador criar uma forma legal específica e imperativa a observar na elaboração das actas das assembleias de condóminos.
8. Caso contrário, não faria sentido que fosse exigida uma forma legal específica para as actas das assembleias de condóminos para, mais adiante, permitir, contrariando essa norma, que as actas pudessem ser executadas sem respeitar tal imperativo legal.
9. Concluindo-se que, não podem ser dadas à execução actas que violem o disposto no nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei 268/94, de 25 de Outubro, conclui-se que as actas ora dadas à execução não possuem força executiva nos termos do artigo 6º do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro.
10. Por outro lado, as actas das assembleias de condóminos têm a natureza de actos jurídicos.
11. Assim, conjugando os artigos 295º e 220º, ambos do Código Civil, com o nº 1, do artigo 1º do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro, tem forçosamente, salvo melhor entendimento, de se concluir que as actas das assembleias de condóminos que não respeitem o requisito de forma aí prescrito são nulas.
12. Na presente execução e conforme se infere do ponto F) da matéria de facto assente, o Tribunal a quo deu como provado que “Apesar de nestas assembleias de condóminos estarem presentes diversos condóminos, todas as referidas actas só foram assinadas pelo seu presidente e pelos membros do concelho de delegados”.
13. Verifica-se assim que as actas onde foram aprovadas as comparticipações para 2003 e 2004, foram lavradas ao arrepio do nº 1, do artigo 1º do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro.
14. Por tal motivo, e salvo melhor opinião, as mesmas são nulas ao abrigo do disposto no artigo 1º do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro, conjugado com os artigos 220º e 295º do Código Civil.
15. A sentença ora recorrida determinou a prossecução da execução quanto às penalizações devidas pelo atraso no pagamento das comparticipações de 2003 e 2004.
16. Essas actas não possuem força executiva nos termos do artigo 6º do Decreto-Lei nº 268/94, de 25 de Outubro, por terem sido elaboradas ao arrepio do nº 1 do mesmo diploma legal.
17. Assim, as comparticipações de 2003 e 2004 foram estabelecidas numa acta nula, conforme razões supra.
18. Tal facto determinará que as penalizações devidas pelo atraso no pagamento dessas comparticipações também não são exequíveis.
19. Face a todo o supra exposto, deve a sentença ora recorrida ser revogada e substituída por um acórdão que julgue inexequível a quantia de € 3 775,63, referente a penalizações pelo atraso no pagamento das comparticipações de 2003 e 2004.
O exequente/embargado contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida.
Foram colhidos os vistos legais.
FUNDAMENTAÇÃO
É sabido que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 684º nº 3, 690º nº 1, 660º nº 2 e 713º nº 2 do Código de Processo Civil).
As questões a apreciar neste recurso são as seguintes: se a decisão, na parte recorrida, ofende caso julgado; se as actas dadas à execução não têm força de título executivo, por falta de assinaturas; se tais actas são nulas, por inobservância da forma legal. A eventual resposta positiva a alguma das referidas questões prejudicará a apreciação das restantes.
1ª questão (caso julgado)
Matéria de Facto
Levar-se-á em consideração, além do circunstancialismo supra descrito no relatório, a matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo:
A) A embargante é proprietária das seguintes fracções do imóvel sito na Rua, em Algés: no piso 1: Fracção "AP"; "AQ", “AR"; "AS"; "AT"; AU"; "AV"; "AX";”AZ”; “BA”; “B”, “BC”, “BD”, “BE”, “BF”, “BH”, “BI”, “BJ”; “BL”; “BM”, “BN”; e no piso =: Fracção DR; DS, DETERMINA, DU, DV, DX, DZ, EA, EB, EC, ED, EE, EF, EG, EH, EI, EJ, EL, EM. EN, EO, e EP.
B) No dia 21-3-2001 pelas 21 horas reuniu-se a assembleia geral de condóminos desse prédio, com a presença de condóminos na proporção de 18,764 do capital investido, tendo proferido deliberação no sentido de alterar o artigo 14° nº 8 do regulamento do condomínio para a seguinte redacção "Uma penalização contabilizada mensalmente à taxa de 16% por cada mês decorrido que esteja um trimestre", por maioria dos votos presentes, conforme consta do documento que se dá por reproduzido e que dos autos de execução é fls. 14.
C) As quotas de todo o ano de 2001 referentes a estas fracções perfaziam o montante de € 706,28 e o fundo de reserva do ano de 2001 de € 58.83
D) As quotas de todo o ano de 2002 referentes a estas fracções perfaziam o montante de € 767,76, conforme consta das respectivas actas das assembleias de condóminos que as fixaram.
E) Nas assembleias de condóminos de Fevereiro de 2003 e de Março de 2004 (acta nº 11 e adenda) e 109 a 113 (acta n012) foi deliberado fixar as quotas trimestrais para o ano de 2003 referentes a estas fracções no montante de € 188,40 e para o ano de 2004 no valor de € 202,26, conforme consta do documento que aqui dou por reproduzido e que dos autos é fls. 104 a 107.
E) Apesar de nestas assembleias de condóminos estarem presentes diversos condóminos, todas as referidas actas só foram assinadas pelo seu presidente e pelos membros do conselho de delegados.
F) No acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa nos autos de embargos de executado que correram, por apenso, com a letra A, transitado, decidiu-se que as actas de condomínio que fixaram as quotas de 2001 e 2002 não eram títulos executivos e em consequência julgaram-se aqueles embargos procedentes e absolveu-se a embargante da execução, onde era peticionado o pagamento das quotas de condomínio dos anos de 2001 e 2002.
O Direito
No supra referido acórdão da Relação de Lisboa foram julgados procedentes os embargos deduzidos pela executada R. Lda, que correram como apenso A. Tais embargos constituíam reacção contra a execução instaurada pelo Condomínio tendo em vista a efectivação do pagamento das quotas de condomínio reportadas aos anos de 2001 e 2002 e penalizações, pela mora no aludido pagamento, vencidas até à data da instauração da execução. O Condomínio apresentou, como títulos executivos, actas das assembleias de condóminos realizadas, respectivamente, em 21.3.2001 e em 15.02.2002 (acta nº 7, documento nº 1 junto com o requerimento executivo e acta nº 10, documento nº 3 junto com o requerimento executivo). A acta nº 7 é relativa à assembleia de condóminos em que se aprovaram as contribuições para as despesas de condomínio do ano de 2001 e se aprovou também a alteração do regulamento do condomínio, de forma a passar a ficar aí consignado que o atraso no pagamento das contribuições ao condomínio originaria uma penalização contabilizada mensalmente à taxa de 16% (ponto 8 do artigo 14º do regulamento). A acta nº 10 respeita à assembleia de condóminos em que se aprovaram as contribuições para as despesas do condomínio do ano de 2002.
No acórdão da Relação supra referido ajuizou-se que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que constitui título executivo é a que tiver sido assinada por quem tenha servido de presidente da reunião e que tiver sido subscrita por todos os condóminos que tenham participado na reunião (…)”. “Assim, não estando, no caso dos autos, subscritas por todos os condóminos que nelas participaram as actas das reuniões da assembleia de condóminos que servem de base à execução, tais actas não são títulos executivos.”
O título executivo constitui um pressuposto processual específico da execução (v.g, Anselmo de Castro, A acção executiva singular, comum e especial, 3ª edição, Coimbra Editora, páginas 14 e 15; José Lebre de Freitas, A acção executiva, 2ª edição, Coimbra Editora, páginas 25 e 26). É um documento que constitui a base da execução, ou seja, é ele que determina o fim e os limites da acção executiva (art.º 45º nº 1 do Código de Processo Civil). Daí que a sua falta ou insuficiência constitua fundamento para a rejeição do requerimento executivo pela secretaria (art.º 811º nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil) ou para o seu indeferimento liminar pelo juiz (art.º 812º nº 2 alínea a) do Código de Processo Civil; art.º 811º-A nº 1 alínea a) do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pelo Dec.-Lei nº 329-A/95, de 12.12), para ulterior rejeição oficiosa da execução (art.º 820º nº 1 do Código de Processo Civil) e para oposição à execução (art. 814º alínea a) e 816º do Código de Processo Civil - 813º alínea a) e 815º nº 1, na redacção anterior à introduzida pelo Dec.-Lei nº 38/2003, de 8.3).
A constatação de que o documento apresentado pelo exequente não reúne os requisitos formais exigidos pela lei para ter a força de título executivo determina a extinção da instância executiva (suposto que foi ultrapassado o momento da rejeição pela secretaria ou do indeferimento liminar pelo juiz), extinção essa que não é antecedida de uma decisão de mérito, ou seja, de uma decisão que se pronuncie sobre a existência do direito que o exequente pretende efectivar por meio da execução (situação equiparada à absolvição da instância, artigos 493º nº 2 e 466º, nº 1, do Código de Processo Civil – Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex 1997, 2ª edição, pág. 608). Assim, tal ajuizamento apenas constitui caso julgado formal, ou seja, apenas é vinculativo no processo em que foi formulado (artigo 672º, em contraposição com o artigo 671º, nº 1, do Código de Processo Civil).
No caso sub judice, está-se perante um acórdão da Relação que foi proferido num processo de embargos de executado (apenso A) que tinha por objecto a execução supra identificada, atinente a quotas de condomínio dos anos de 2001 e 2002 e penalizações vencidas até à data da propositura da execução. Tal decisão apenas produz efeitos de caso julgado no âmbito dessa execução: tanto assim é que a pendência dos embargos atinentes a essa execução não obstava, como não obstou, à instauração da execução sucessiva e ao conhecimento dos embargos que contra esta reagiram (que correm como apenso F), tendo sido por mero acaso que o teor do acórdão da Relação foi conhecido antes da prolação da sentença nos segundos embargos de executado.
Acresce que a pretensão objecto da cumulação sucessiva, pelo menos na parte a que se resume este recurso, incide sobre direito de crédito diverso do que foi objecto da execução inicial (na execução inicial pretendia-se o pagamento das quotas de condomínio atinentes aos anos de 2001 e 2002 e o pagamento da penalização pela mora vencida até à data da instauração da execução; na execução sucessiva reclama-se, na parte subsistente, o pagamento da penalização pela mora no pagamento das quotas de 2003 e 2004). Assim, mesmo que se entendesse que os efeitos do acórdão da Relação alastram à execução sucessiva, uma vez que esta se materializou no mesmo processo em que se instaurou a execução inicial, faltaria, para que houvesse a “repetição de uma causa” própria dessa excepção, identidade de pedidos (art.º 498º do Código de Processo Civil).
Conclui-se, pois, sem necessidade de mais considerações, que improcede a questão de caso julgado suscitada no recurso.
Segunda questão (se as actas não têm força de título executivo, por falta de assinaturas)
Permanece em discussão, na execução sucessiva instaurada, a pretensão do Condomínio em obter a efectivação do direito ao pagamento da penalização por mora no pagamento das quotas de condomínio dos anos de 2003 e 2004, penalização essa contabilizada até à data em que as quotas foram pagas.
O exequente fundamenta a sua pretensão nas deliberações das assembleias de condóminos de 01 de Fevereiro de 2003 e de 09 de Março de 2004, que deliberaram fixar as quotas de condomínio, respectivamente, para os anos de 2003 e 2004, conjugadas com a deliberação de 21.3.2001, supra referida, que aprovou a regra da imposição de penalização pela mora no pagamento das quotas de condomínio, correspondente à contabilização mensal de uma taxa de 16% sobre a quota em dívida. Como título executivo, foram apresentadas as actas das referidas assembleias (actas nº 11 e 12, além da acta nº 7, esta quanto à consagração da penalização).
Está provado que apesar de nestas assembleias de condóminos estarem presentes diversos condóminos, todas as referidas actas só foram assinadas pelo seu presidente e pelos membros do conselho de delegados (alínea E) da matéria de facto).
A acção executiva pressupõe a anterior definição dos elementos, subjectivos e objectivos, da relação jurídica de que é objecto. Tal definição (“acertamento”, na terminologia utilizada por Lebre de Freitas, extraída da doutrina italiana – v.g., A acção executiva, obra citada supra, pág. 32) está contida no título executivo, documento que constitui a base da execução por a sua formação reunir requisitos que a lei entende oferecerem a segurança mínima reputada suficiente quanto à existência do direito de crédito que se pretende executar. Entre esses documentos, além dos expressamente enumerados no artigo 46º do Código de Processo Civil, contam-se aqueles a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva (art.º 46º nº 1 alínea d) do Código de Processo Civil).
Uma dessas disposições especiais é precisamente o nº 1 do art.º 6º do Dec-Lei nº 268/94, de 25.10, o qual estipula que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo.”
Por sua vez o artigo 1º, nº 1, do mesmo diploma estabelece que “são obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado.” O nº 2 do mesmo artigo acrescenta que “as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções”.
Sandra Passinhas (“A assembleia de condóminos e o administrador na propriedade horizontal”, 2ª edição, Almedina, páginas 265 a 267) entende que a acta constitui um requisito essencial, uma formalidade imposta ad substantiam, para a validade das deliberações. Para tal invoca a circunstância de as deliberações da assembleia de condóminos serem, juntamente com a lei e o título constitutivo, elementos constitutivos do estatuto de um direito real, a propriedade horizontal, pelo que a formulação escrita “será um requisito mínimo indispensável para a certeza e segurança no tráfego jurídico. O valor ad substantiam da acta resulta, para nós, de uma exigência de certeza e segurança jurídica”, sendo certo que “do regime legal não se retira qualquer indicação no sentido de que a acta tenha valor meramente probatório.”
O Juiz Conselheiro Rui Vieira Miller (“A propriedade horizontal no código civil”, Almedina, 1998, páginas 262 e 263), embora sem abordar directamente a questão, aconselha a que se disponha as coisas de forma a que a reunião termine com a assinatura da acta por todos os presentes, de forma a que os inconvenientes derivados do prolongamento da sessão se apaguem “ante a vantagem de as deliberações tomadas assumirem logo a sua força vinculativa e de se eliminar o risco de não obter depois todas as assinaturas”.
O Juiz Conselheiro Aragão Seia (Propriedade horizontal, Almedina, 2ª edição, páginas 172 a 175) defende que a acta “é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular – artigo 376º. (…) A recusa de um condómino em assinar a acta não pode decretar a invalidade da deliberação. Se assim fosse, encontrado estava um meio de qualquer condómino obstar continuamente à validade das decisões da assembleia. Recusando-se um condómino a assinar deve ser isso consignado na acta, sendo assinada pelos demais que hajam participado na assembleia. É, aliás, o que acontece quando um condómino sai no decurso desta, antes de lavrada e assinada a acta. Se se recusa a assinar, depois de elaborada a acta e assinada pelos demais, deve-se lavrar um “em tempo”, assinado por todos os outros condóminos que participaram na assembleia. Se já não for possível colher a assinatura de todos os que assinaram a acta deve ser notificado como se de ausente se tratasse. Poderá, assim, vir a impugnar as deliberações, verificados os necessários pressupostos, ou a arguir a falsidade da acta em tribunal”.
A jurisprudência conhecida tem, quase unanimemente, defendido que a acta da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem e a falta de assinatura de condóminos que nela participaram é uma mera irregularidade que, não sendo oportunamente reclamada, não afecta a deliberação tomada nem a exequibilidade do título. Apela-se para o preâmbulo do Dec.-Lei nº 268/94, onde se diz que o mesmo teve como objectivo “procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros”. Defende-se que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no artigo 334º do Código Civil, porque a ela deu causa ou não quis remediar. Lembra-se que nos termos do disposto no art.º 1413º do Código Civil as deliberações contrárias ou não à lei ou regulamentos anteriormente aprovados tornam-se definitivas se não for requerida a anulação por qualquer condómino que as não tenha aprovado nos prazos e pelo modo aí referidos. Tornando-se definitivas, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções – nº 2 do art.º 1º do Dec.-Lei nº 268/94. Realça-se que a lei não sancionou expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia. Designadamente, não comina com a inexistência, ineficácia ou nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas. Mais se diz que não se compreenderia que a acta seja vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia (uma vez que lhes sejam comunicadas) e não se considerar a mesma válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta (cfr., v.g., acórdãos de Lisboa, de 02.3.2004, internet, dgsi-itij, processo 10468/2003-1; do Porto, 18.4.2006, processo 0621451, 18.12.2003, processo 0336205 – também in Col. Jur., ano XXVIII, tomo V, pág. 217 -, 06.3.2003, processo 0330883).
Que dizer?
No âmbito do regime das sociedades comerciais, área do direito privado onde a figura da acta mereceu desenvolvido tratamento, realça-se que a acta, definível como “o instrumento técnico em princípio usado para a documentação dos acontecimentos ocorridos nas reuniões dos órgãos colegiais das sociedades comerciais, como de um modo geral de todos os outros entes colectivos, tenham ou não personalidade jurídica” (Pinto Furtado, “A acta e o instrumento notarial de documentação das reuniões de assembleia das sociedades comerciais”, separata da RDES, ano XXV, nºs 1-2, 1980, pág. 1), “é um documento que serve de suporte ou instrui a historicidade contemporânea de uma acção” (Pinto Furtado, “A acta…”, pág. 5), cuja função é dar notícia das ocorrências na reunião e não dar forma a essas ocorrências, designadamente às deliberações sociais (Pinto Furtado, “A acta…, pág. 19).
Antes da publicação do Código das Sociedades Comerciais (CSC), a maioria da doutrina entendia que a regra, no domínio da documentação das deliberações sociais, era a da liberdade de forma e em face do disposto no art.º 397º do Código de Processo Civil (possibilidade da deliberação social ser suspensa sem apresentação da acta) a acta não era, em regra, sequer uma exigência de prova, de que dependia a eficácia das deliberações tomadas, mas apenas um meio normal de documentar os acontecimentos ocorridos na assembleia, sem interferir com a validade das deliberações (cfr., com menção da posição dos vários autores, v.g., Pinto Furtado, “A acta…”, páginas 46 a 52; Albino Matos, “A documentação das deliberações sociais no Projecto do Código das Sociedades”, Revista do Notariado, 1986, nº 1, página 43 e seguintes; Luís Brito Correia, Direito Comercial, 3º volume, AAFDL, 1989).
Com a publicação do Código das Sociedades Comerciais, passou a ficar estipulado que “as deliberações dos sócios só podem ser provadas pelas actas das assembleias ou, quando sejam admitidas deliberações por escrito, pelos documentos donde elas constem” (nº 1 do art.º 63º). Por outro lado, o art.º 59º nº 4 do CSC, atinente à acção de anulação das deliberações, mantém a solução de que a proposição da acção de anulação não depende de apresentação da respectiva acta (nº 4), bem assim que o prazo para a propositura da acção se conta, em regra, a partir da data em que foi encerrada a assembleia geral (nº 2, alínea a), independentemente da elaboração da acta.
A falta da acta não consta do elenco taxativo das nulidades das deliberações (art.º 56º do CSC), pelo que se confirma que essa omissão não acarreta a nulidade da deliberação. Por outro lado, os termos peremptórios do artº 63º, nº 1, do CSC, obstam a que se admita a possibilidade, própria da anulabilidade, da sanação do vício através da mera caducidade do direito de impugnar a deliberação (pelo que a falta da acta não constituirá um caso de anulabilidade da deliberação).
Por conseguinte, a falta da acta torna a deliberação ineficaz (Albino Matos, “A documentação…, páginas 73 a 75; Luís Brito Correia, “Direito Comercial, 3º volume, páginas 241, 346 e 348; Pinto Furtado, “Comentário…, páginas 668 a 674), ineficácia essa resultante da exigência legal de que a prova da deliberação se faça por meio da acta. A acta constitui, relativamente à deliberação, em teoria pura, uma formalidade ad probationem, mas como a lei exige que essa prova se faça exclusivamente através da acta, a situação é semelhante à da formalidade ad substantiam, acabando a destrinça em causa por não ter relevo para o efeito do disposto no art.º 364º do Código Civil (Castro Mendes, Teoria Geral de Direito Civil, III, FDL, 1973, páginas 100 e 101).
Reportando-nos às deliberações da assembleia de condóminos, afigura-se-nos que lhes são plenamente aplicáveis as considerações supra expostas quanto à distinção entre a formação das deliberações, a sua validade intrínseca, e a elaboração da acta, encarada como documento informativo do teor dessas deliberações. No dizer de Aragão Seia, já supra citado, “a acta é a documentação do deliberado, ou seja, o relato escrito dos factos juridicamente relevantes que tiveram lugar na assembleia, com menção das pessoas que estiveram presentes e intervieram nas deliberações, elaborada por aqueles com legitimidade para o fazer. Dela devem constar as deliberações tomadas, em nada contribuindo, contudo, para a sua formação ou validade; é um documento ad probationem, não se assumindo como elemento constitutivo, nem como pressuposto de validade da deliberação, tendo a força probatória de documento particular – artigo 376º” (Propriedade horizontal, pág. 180).
Às deliberações das assembleias de condóminos são aplicáveis as regras da suspensão das deliberações sociais (artigo 398º nº 1 do Código de Processo Civil), pelo que a suspensão pode ser requerida e até decretada sem que a acta contendo a deliberação seja apresentada. A própria acção de anulação de deliberação tomada pela assembleia de condóminos deve ser intentada no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação (para o caso dos condóminos que estiveram presentes) ou no prazo de 20 dias contados sobre a deliberação da assembleia extraordinária que tiver sido convocada, sem que a lei exija a prévia elaboração da acta (art.º 1433º do Código Civil).
Porém, o artigo 1º do Dec.-Lei nº 268/94 estabelece que são obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos (nº 1) e que as deliberações devidamente consignadas em actas são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções (nº 2).
As deliberações da assembleia de condóminos assumem manifesto relevo, pois provêm do órgão máximo do condomínio, que decide de todas as questões que têm a ver com as partes comuns do prédio. Essas deliberações são vinculativas não só para os condóminos que estiveram presentes como para os ausentes, posto que as não tenham impugnado. As deliberações estão sujeitas a determinadas maiorias, definidas na lei. Assim, assume especial relevância a certeza acerca do que se passou na assembleia, designadamente para que se saiba qual o exacto conteúdo das deliberações, quem, de entre os presentes, as aprovou e se foram respeitadas as necessárias maiorias. Tal certeza atinge-se, nos termos da lei, através da elaboração de uma acta, onde se relatará o que se passou na reunião e quais as deliberações tomadas.
Sandra Passinhas, supra citada, afirma que “do regime legal não se retira qualquer indicação no sentido de que a acta tenha valor meramente probatório” e defende que a acta é uma formalidade ad substantiam (“A assembleia de condóminos…, páginas 265 a 267).
Pelas razões supra expostas, afigura-se-nos que o regime tido em vista pelo legislador para a propriedade horizontal aproxima-se do das sociedades comerciais: embora a sua falta não afecte a validade das deliberações da assembleia de condóminos, a acta é a única forma admissível para provar tais deliberações, pelo que a sua ausência as torna ineficazes, em termos tais que, embora no ponto de vista teórico a acta se apresente como uma formalidade ad probationem, na prática a sua omissão tem a consequência prevista no art.º 364º nº 1 do Código Civil (não pode ser substituída por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior).
No caso dos autos, as deliberações em causa foram consignadas em acta. Porém, falta a assinatura de alguns dos condóminos que estiveram presentes nas reuniões.
Voltando ao domínio das sociedades comerciais, constata-se que, quanto às sociedades anónimas, “as actas das reuniões da assembleia geral devem ser redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido como presidente e secretário” (nº 2 do art.º 388º do CSC), mas “a assembleia pode, contudo, deliberar que a acta seja submetida à sua aprovação antes de assinada nos termos do número anterior” (nº 3 do art.º 388º).
Quanto às sociedades em nome colectivo e às sociedades por quotas, as actas das assembleias gerais devem ser assinadas por todos os sócios que nelas tenham participado (artigos 189º nº 5 e 248º nº 6 do CSC).
O art.º 63º nº 3 do CSC estipula que “quando a acta deva ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e alguns deles não o faça, podendo fazê-lo, deve a sociedade notificá-lo judicialmente para que, em prazo não inferior a oito dias, a assine; decorrido esse prazo, a acta tem a força probatória referida no nº 1, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na assembleia, sem prejuízo do direito dos que a não assinaram de invocarem em juízo a falsidade da acta.
Pinto Furtado critica a exigência, relativamente a algumas espécies de sociedades comerciais, de que a acta seja assinada por todos os sócios que tenham participado da reunião, considerando-a excessiva e injustificada. Excessiva, por originar as complicações resultantes de falta de assinatura. E injustificada porque, no fundo, não servirá para mais do que impedir que os sócios que efectivamente assinaram a acta depois arguam a sua falsidade não superveniente (Comentário…, pág. 696).
Seja como for, no que concerne às sociedades comerciais o legislador prevê o processo a adoptar para reagir relativamente à omissão de assinatura da acta, processo esse que acaba por levar à conclusão de que a exigência de assinatura de todos os sócios é meramente programática, convertendo-se na exigência menor de assinatura apenas pela maioria dos sócios presentes (Comentário…, pág. 698).
No caso da acta que não está assinada (sempre no domínio das sociedades comerciais), Pinto Furtado entende que a mesma fica ferida de nulidade (A acta…, pág. 52). Albino Matos parece incluir a falta de assinatura no conjunto de elementos da acta cuja omissão poderá acarretar a anulabilidade das deliberações, sendo a melhor solução “a de se remeter ao prudente arbítrio judicial a apreciação da relevância do vício para a integridade do documento e a validade ou eficácia das deliberações”, podendo conceder ou negar a anulação que se lhe peça com fundamento na falta de qualquer um desses elementos (A documentação… páginas 59 e 60). Brito Correia entende que a falta da assinatura do presidente da mesa ou do secretário, quando necessária, implica que a acta perde força probatória, ficando consequentemente afectada a eficácia das deliberações tomadas (Direito comercial… pág. 352). Moitinho de Almeida inclui as irregularidades da acta da assembleia na categoria das irregularidades do funcionamento da assembleia, as quais geram a anulabilidade das deliberações nelas tomadas, nos termos do art.º 58º nº 1 alínea a) do Código das Sociedades Comerciais (Anulação e suspensão de deliberações sociais, 3 edição, Coimbra Editora, 3ª edição, pág. 98).
No âmbito da propriedade horizontal o legislador estabelece que as actas das assembleias de condónimos serão redigidas e assinadas por quem neles tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado (nº 1 do artigo 1º do Dec.-Lei nº 268/94). Não incluiu nenhum preceito específico tendente a suprir a omissão de assinaturas de condóminos que tenham participado na assembleia. Também não prevê nenhuma consequência específica para tal omissão. Será de aplicar o disposto no art.º 366º do Código Civil (“a força probatória do documento escrito a que falta algum dos requisitos exigidos na lei é apreciada livremente pelo tribunal”). Tal preceito implica que o tribunal fará uma apreciação casuística do documento, com base nos demais elementos pertinentes obtidos, nomeadamente outros elementos de prova, para dar ou não como provada a situação factual que o documento se destinava a comprovar e daí extrair as possíveis consequências.
Ora, no caso dos autos, não existe uma total falta de assinaturas das actas. Pelo contrário, nas actas constam a assinatura do presidente da assembleia e as dos membros do conselho de delegados. A razão para a omissão da assinatura dos outros participantes na reunião figura na acta mais antiga junta aos autos, a acta nº 7, onde se lê “nada mais havendo a deliberar deu-se por encerrada a sessão lavrando-se a presente Acta, a qual à semelhança das anteriores irá ser assinada pelo Presidente da Mesa e pelos membros do Conselho de Delegados que se encontram presentes”, seguindo-se quatro assinaturas. Assim, figuram nos autos a assinatura de quatro pessoas que, através delas, atestam que a acta reproduz correctamente o que se passou na assembleia de condóminos, incluindo as deliberações tomadas, e bem assim que tal forma de certificação era uma prática corrente do condomínio. Aquela acta, bem como as que com ela se conjugam, eram bastantes para deixar prosseguir a execução, não havendo lugar a rejeição do requerimento executivo pela secretaria ou ao seu indeferimento liminar pelo juiz, por não ser manifesta a insuficiência do título (artigos 811º nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil e 812º nº 2 alínea a) do Código de Processo Civil) – rejeição e indeferimento liminar que, de resto, não ocorreram. Notificada a executada do requerimento executivo sucessivo, aquela não pôs minimamente em causa o rigor da narração do que se passou nas assembleias de condónimos, incluindo o que nelas se deliberou. A executada também não alegou nem demonstrou que alguma vez, a não ser no âmbito das duas execuções a que nos reportámos, questionou a administração do condomínio pela falta de assinaturas nas actas. Tal omissão é tanto mais de realçar quanto a assembleia em que foi aprovada a penalização pelo atraso no pagamento das quotas de condomínio realizou-se em 21.3.2001 e a primeira execução foi instaurada mais de um ano e meio depois (13.12.2002). Assim, no âmbito desta execução tem de se dar como boa a descrição das deliberações tomadas constantes das aludidas actas das assembleias de condóminos, deliberações essas que assim se mostram devidamente consignadas em acta, as quais valem como título executivo nos termos e para os efeitos previstos no art.º 6º nº 1 do Dec.-Lei nº 268/94, de 25.10.
Terceira questão (se as actas são nulas, por inobservância da forma legal)
A apelante defende que as actas das assembleias de condóminos dadas à execução foram lavradas ao arrepio do disposto no nº 1 do art.º 1º do Dec.Lei nº 268/94, de 25.10, pelo que, nos termos do artigo 220º do Código Civil, aplicável às actas por força do artigo 295º do Código Civil, as actas são nulas.
Esta questão está intimamente relacionada com a já supra apreciada e a resposta é, pois, negativa: a falta, na acta da assembleia de condóminos, da assinatura de alguns dos participantes nessa reunião não põe em causa a validade das deliberações aí tomadas e apenas afectará a eficácia dessas deliberações se o tribunal, pela análise casuística que fizer, não der tal irregularidade como irrelevante ou suprida, nomeadamente por outros elementos de prova que coadjuvem a regularidade da narração de factos constante da acta, já enunciada pelas restantes assinaturas nela apostas. Ora, como se viu, nas actas sub judice constam as assinaturas do presidente da mesa e dos três membros do conselho de delegados, conforme era prática no condomínio, segundo é referido na primeira dessas actas e não foi desmentido pela executada; por meio dessas assinaturas há quatro pessoas que atestam que as actas reproduzem fielmente o que se passou e foi deliberado nessas assembleias; na execução a executada não questionou a fidelidade das actas, nomeadamente que as deliberações foram efectivamente tomadas, nas circunstâncias consignadas nas actas; assim, no caso sub judice a ausência das referidas assinaturas assume-se como irregularidade irrelevante, devendo as deliberações ser consideradas como devidamente consignadas em acta, obrigando todos os condóminos, incluindo a executada, nos termos previstos no nº 2 do art.º 1º do Dec.-Lei nº 268/94, de 25.10.
Por conseguinte, e sendo certo que a assembleia pode fixar penas pecuniárias para a inobservância das disposições do regime legal do condomínio ou das deliberações da assembleia (art.º 1434º nº 1 do Código Civil) e que a respectiva pena pecuniária é enquadrável na expressão “contribuições devidas ao condomínio” (neste sentido, Sandra Passinhas, A assembleia…, páginas 274 e 275; implicitamente, Relação de Lisboa, 25.11.1999, CJ, t. V, pág. 105; Relação de Évora, 05.12.02, CJ, t. V, pág. 246), o que aliás a apelante nem questiona no seu recurso, improcedem todas as questões suscitadas pela recorrente.
DECISÃO
Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente e consequentemente mantém-se a decisão recorrida.
Custas da apelação pela recorrente.

Lisboa, 15.02.2007

Jorge Leal
Américo Marcelino
Francisco Magueijo