Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
33/13.7TFLSB.L1-3
Relator: JORGE LANGWEG
Descritores: PRESCRIÇÃO DAS CONTRAORDENAÇÕES AERONAUTICAS CIVIS
REGIME GERAL DAS CONTRAORDENAÇÕES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/10/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. São aplicáveis às contraordenações aeronáuticas civis as causas de suspensão e de interrupção da contagem do prazo prescricional do regime geral das contraordenações. 2. Fundamento: O Regime Geral das Contraordenações regula a prescrição do procedimento em três vertentes: a) Na definição do prazo de prescrição (artigo 2º/ RGC); b) Na previsão dos fatores de suspensão do prazo prescricional (artigo 27º-A, do RGC); c) Na concretização das causas de interrupção de contagem da prescrição (artigo 28º/RGC). A legislação especial aplicável às contraordenações aeronáuticas civis apenas regula o prazo de prescrição. O artigo 35° do Decreto-Lei n.º 10/2004 de 9 de Janeiro, estatui no regime das contraordenações aeronáuticas civis, que «em tudo o que não for expressamente regulado no presente diploma, aplica-se o regime geral das contra-ordenações». Considerando o teor do regime geral das contraordenações e não existindo regulação expressa – derrogando ou excluindo a sua aplicação - no regime legal das contraordenações da aeronáutica civil, são aplicáveis a estes procedimentos especiais as causas de suspensão e de interrupção da contagem da prescrição da lei geral.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa

Nos presentes autos acima identificados, em que figura como recorrente o Ministério Público e recorrida a A;

I - RELATÓRIO
1. O Ministério Público interpôs recurso da decisão proferida nos autos, que declarou a extinção do procedimento contraordenacional, com os fundamentos a seguir reproduzidos:
«(...) Na decisão administrativa consideraram-se provados os seguintes factos:
- No dia 29 de agosto de 2008, a arguida tinha uma faixa horária atribuída para aterragem no Aeroporto de Lisboa às 14 horas e 35 minutos UTC (STA 14 horas e 35 minutos) e tinha uma faixa horária atribuída para descolagem desse mesmo Aeroporto nesse mesmo dia para as 15 horas 35 UTC (STD 15 horas e 35 minutos);
- As operações só vieram a ser feitas no dia 29 de Agosto de 2008 às 22 horas e 38 UTC (ATA 22 horas e 38) e às 23 horas e 40 (ATD 23 horas e 40) respectivamente voos n°FB 6925 e FB 6926 com a aeronave de marca de nacionalidade e matrícula LZ-BOW.
A entidade administrativa condenou a arguida, pela prática destes factos, por três contra-ordenações, previstas e punidas pelos artigos 9o, n°2, al. c) do Drecreto-Lei n°l 09/2008, de 26.06, e 9o, n°l, al. d) do mesmo diploma legal - aterragem e descolagem em violação da faixa horária atribuída - e art. 12°, n°l al. a) do Decreto-Lei n°293/2003, de 19.11 - realização de descolagem em período nocturno.
Nos termos dos artigos supra mencionados e do artigo 17°, n°1 do Decreto-Lei n° 10/2004, de 09.01, o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenações de 5 (cinco) anos que se suspende e interrompe nos termos dos artigos 27°-A e 28°, ambos do RGCO, está ultrapassado pelo que ocorreu a prescrição do procedimento por contra-ordenações. (...)»


2. Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões:
«(…) Os factos que deram origem ao presente processo ocorreram em 29/08/2008.
Em 02/07/2012 foi proferida pela competente entidade administrativa decisão que imputou a A a prática de infrações previstas e puníveis pelo artigo 9.°, n.°l, alínea d), e n.°2, alínea c), do Decreto-Lei n.°l09/2008, de 26 de Junho e pelo artigo 2.°, n.°l, da Portaria n.°303-A/2004 de 22 de Março, tendo-lhe sido aplicada coima única de €100000,00. Tal decisão foi notificada a A por via postal registada, cujo aviso de recepção foi assinado em 11/12/2012, conforme decorre de fls. 124 a 131 e 148 dos presentes autos.
E em 24/09/2013 foi proferido despacho a proceder ao exame preliminar do recurso interposto da decisão proferida pela entidade administrativa, o qual foi notificado a A por ofício datado de 25/09/2013, conforme decorre de fls. 285 e 287 dos presentes autos.
O prazo de prescrição do presente procedimento por contra-ordenação é de cinco anos, nos termos do disposto no artigo 17.°, n.°l, Decreto-Lei n°10/2004, de 9 de Janeiro.
Ora, tendo ocorrido nomeadamente as causas de interrupção indicadas em 3.2. e previstas no artigo 28.°, n.°l, alínea a) e d) e 3, do Regulamento Geral das Contra-Ordenações e Coimas, o qual é aplicável aos presentes autos por força do disposto no artigo 35.° do Decreto-Lei n°l 0/2004, de 9 de Janeiro, o prazo de prescrição do presente procedimento por contra-ordenação é acrescido de metade.
E tendo ocorrido a causa de suspensão indicada em 3.3. e prevista no artigo 27.°A, alínea c), do Regulamento Geral das Contra-Ordenações e Coimas, o qual é aplicável aos presentes autos por força do disposto no artigo 35.° do Decreto-Lei n°l 0/2004, de 9 de Janeiro, o prazo de prescrição do presente procedimento por contra-ordenação suspendeu por seis meses.
Assim sendo, no presente caso, o prazo máximo de prescrição é de oito anos, pelo que o presente procedimento contra-ordenacional apenas prescreveria em 29/08/2016.
Pelo exposto, considera-se que o presente procedimento não se encontra extinto por prescrição, tendo o despacho em crise violado o disposto no artigo 17.°, n.°l, Decreto-Lei n°10/2004, de 9 de Janeiro e o disposto nos artigos 27.°A, alínea c) e 28.°, n.°l, alínea d), ambos Regulamento Geral das Contra-Ordenações e Coimas, aplicáveis por força do disposto no artigo 35.° do Decreto-Lei n° 10/2004, de 9 de Janeiro.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente revogar-se a decisão proferida em 03/06/2014 e constante de fls. 363 a 364 dos autos, prosseguindo o processo os seus ulteriores termos. (…)» 

3.  Notificada da motivação do recurso, a arguida apresentou contra-alegações, de forma fundamentada, concluindo pela improcedência do recurso, o que fez nos seguintes termos:
Os autos principais deste processo têm como objecto a apreciação da impugnação judicial da decisão que condenou a Recorrida, em sede de procedimento contra-ordenacional instaurado pelo INAC, ao pagamento de uma coima no valor de € 100.000,00, pela alegada prática de três contra-ordenações aeronáuticas civis.
Ainda antes de apreciar o mérito da impugnação judicial, a Recorrida foi notificada da Douta Sentença ora posta em crise, na qual foi declarado extinto o referido procedimento contra- ordenacional, por ter sido ultrapassado o prazo de prescrição, o que se teria verificado a 29.08.2013, ou seja, cinco anos após a prática dos factos, que ocorreram a 29.08.2008.
O Ministério Público recorreu dessa decisão, invocando que ao prazo de prescrição no Decreto- Lei n.9 10/2004, de 9 de Janeiro, se aplicam as condições de suspensão e interrupção previstas no RGCO.
Contudo, o regime aplicável às contra-ordenações aeronáuticas civis encontra-se plenamente regulado no Decreto-Lei n.e 10/2004, de 9 de Janeiro, que estabelece um regime próprio, especial, para a prescrição.
Com efeito, o artigo 17.9 do Decreto-Lei n.9 10/2004, de 9 de Janeiro, regula de forma uniforme e global os efeitos da prescrição para todas os actos ilícitos enquadráveis no regime de contra- ordenações por infracções aeronáuticas civis, sem que o seu prazo oscile conforme o valor máximo da coima a aplicar e sem estabelecer qualquer causa para a interrupção ou suspensão da contagem do prazo de prescrição.
Como refere o artigo 9.9, n.9 3 do Código Civil, "na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados."
De facto, a grande maioria dos demais regimes especiais de contra-ordenação apresentam um regime próprio de prescrição, no qual tanto é previsto (i) o prazo de prescrição; (ii) a existência (ou não) de causas para a interrupção do prazo de prescrição e (iii) a existência (ou não) de causas para a suspensão do prazo de prescrição.
Alternativamente, nos demais regimes especiais de contra-ordenação, nos quais não se considerou pertinente alterar as causas de interrupção e suspensão da prescrição face ao previsto no RGCO, existe remissão expressa sobre essa matéria.
Seja como for, em todos os regimes especiais nos quais foi previsto um regime próprio de prescrição, o Legislador regulou-o de forma perfeita, considerando a interrupção e a suspensão da instância, quer por regulação própria, quer por remissão expressa para o regime geral.
Note-se que a competente autorização legislativa, concedida pela Assembleia da República através da Lei n.9 104/2003, de 9 de Dezembro, cujo artigo 2.9, alínea n), autorizou apenas o Governo a fixar, em cinco anos, o prazo de prescrição do procedimento de contra-ordenação, nada tendo disposto quanto ao seu alargamento, em virtude de interrupções ou suspensões, ou causas ou efeitos destas.
Com efeito, sempre estará ferido de inconstitucionalidade, por violação do art. 165°, alínea d), da Constituição da República Portuguesa (aquando da autorização legislativa, anterior art. 161º alínea, a interpretação da norma do artigo 17º do Decreto-Lei n.9 10/2004, de 9 de Janeiro, no sentido de é de aplicar o RGCO quanto ao regime da interrupção e suspensão da prescrição, quando, em relação a tal matéria, a Assembleia da República, no âmbito do seu poder de reserva de lei relativa, não autorizou o Governo a tal.
Refere Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 4ª edição, página 264, que "a lei que rege a prescrição e reguia o respectivo prazo será aquela de que resulta um regime legal concretamente mais favorável ao Arguidd'.
O que não acontece na posição defendida pela aqui Recorrente, que recorre a um somatório de legislação geral e especial visando alargar, para além do expressamente previsto pelo Legislador, o prazo máximo da prescrição dos ilícitos imputados à Arguida.
Consequentemente, deve o recurso a que se responde ser considerado improcedente e, em virtude disso, ser confirmada a Sentença recorrida, declarando-se a prescrição do presente procedimento contra-ordenacional e devendo a Recorrida ser absolvida do mesmo.
Sem conceder, mais se dirá que:
O regime da prescrição constante no artigo 17.º do Decreto-Lei nº10/2004, de 9 de Janeiro, dispõe que o prazo de prescrição é de cinco anos para toda e qualquer contra-ordenação aeronáutica civil.
Significa isto que as contra-ordenações leves, graves e muito graves estão sujeitas ao mesmíssimo prazo prescricional.
Como refere o Código Penal, no seu artigo 118º, nº 2, "na determinação do máximo da pena aplicável a cada crime, são tomados em conta os elementos que pertençam ao tipo de crimé', obedecendo o regime da prescrição a uma lógica de proporcionalidade, no qual o prazo corresponderá ao tipo de crime.
Repudiando qualquer lógica de proporcionalidade, o regime do Decreto-Lei nº 10/2004, de 9 de Janeiro, considera que um Arguido que tenha cometido negligentemente uma contra-ordenação leve, sujeito a coima entre € 150,00 a € 300,00, vê o seu procedimento contra-ordenacional ter idêntico tempo para prescrever do que uma infracção praticada por grande empresa, de forma dolosa, sujeito a coima entre € 100.000,00 a € 250.000,00.
Uma vez que a questão da prescrição apenas está a ser suscitada neste momento - note-se que à data de apresentação do recurso de impugnação judiciai, a mesma ainda não tinha ocorrido -, a Recorrida não pode deixar de mencionar agora que, atendendo ao acima exposto, o regime legal previsto no artigo 17ºdo Decreto-Lei n.9 10/2004, de 9 de Janeiro, encontra-se ferido de inconstitucionalidade material, ao violar o princípio da proporcionalidade (consagrado no artigo 18º, nº 3, da CRP) e das garantias de defesa (artigo 32º, da CRP);
Pelo que, na eventualidade do recurso a que se responde ser considerado procedente (hipótese que se levanta por mero dever de cautela e patrocínio), sempre deverá a Recorrida ser absolvida quanto à prática das contra-ordenações que, sendo eliminado aquele regime especial de prescrição, teriam já prescrito nos termos gerais.


4. O recurso foi liminarmente admitido no tribunal a quo, subindo nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
5. Nesta instância, o Ministério Público teve vista dos autos, nada acrescentando à motivação do recurso.
6. Não tendo sido requerida audiência, o processo foi à conferência, após os vistos legais, respeitando as formalidades legais [artigos 417º, 7 e 9, 418º, 1 e 419º, 1 e 3, c), todos, ainda do mesmo texto legal].

Questões a decidir

Do thema decidendum dos recursos:

Para definir o âmbito do recurso, a doutrina [1] e a jurisprudência [2] são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, que o mesmo é definido pelas conclusões que a recorrente extraíu da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.

A função do tribunal de recurso perante o objeto do recurso, quando possa conhecer de mérito, é a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado à apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito.

Da questão a decidir neste recurso:

Atento o teor do relatório atrás produzido, importa decidir a questão substancial a seguir concretizada, que sintetiza as conclusões da recorrente, constituindo, assim, o thema decidendum:
Da não prescrição do procedimento contraordenacional.

Para decidir a questão, importará, primeiramente, concretizar os dados jurídico-processuais relevantes.

II – FUNDAMENTAÇÃO EM MATÉRIA DE FACTO

Tendo em conta o objeto do recurso, definido no relatório que antecede, torna-se essencial concretizar os factos provados e a fundamentação jurídica plasmada na sentença recorrida.

Em 2 de Julho de 2012 foi proferida pela competente entidade administrativa decisão que imputou a A a prática de infrações previstas e puníveis pelo artigo 9.°, n.° 1, alínea d), e n.°2, alínea c), do Decreto-Lei n.°109/2008, de 26 de Junho e pelo artigo 2.°, n.°1, da Portaria n.°303-A/2004 de 22 de Março, tendo-lhe sido aplicada coima única de 100.000,00 €.

Tais infrações são datadas de 29 de agosto de 2008.

Tal decisão foi notificada a A por via postal registada, cujo aviso de receção foi assinado em 11 de Dezembro de 2012, conforme decorre de fls. 124 a 131 e 148 dos presentes autos.

Em 24 de Setembro de 2013 foi proferido despacho a proceder ao exame preliminar do recurso interposto da decisão proferida pela entidade administrativa.

Esse despacho foi notificado a A por ofício datado de 25 de Setembro de 2013 (fls. 285 e 287 dos autos).

III – FUNDAMENTAÇÃO EM MATÉRIA DE DIREITO

Objeto do recurso:
Da prescrição do procedimento contraordenacional em causa;

O prazo de prescrição do presente procedimento contraordenacional é de cinco anos, a luz do disposto no artigo 17.°, n° 1, Decreto-Lei n°10/2004, de 9 de Janeiro.

Isso significa, à partida, que o procedimento por contraordenação aeronáutica civil se extingue, por efeito de prescrição, logo que tenha decorrido o prazo de cinco anos sobre a prática da contraordenação.

Este prazo é incontroverso nos autos, tendo sido considerado no despacho recorrido, na motivação do recurso e na resposta da arguida[3].

A matéria jurídica controversa nos autos é a aplicabilidade, ou não, às contraordenações da aeronáutica civil, dos fatores de suspensão e de interrupção da prescrição previstos no Regime Geral das Contraordenações. O despacho recorrido ignorou-os, a motivação do recorrente considerou-os e a arguida afastou a sua aplicabilidade à contraordenação aeronáutica civil.

Cumpre apreciar e decidir.

A legislação especial referente às contraordenações da aeronáutica civil apenas prevê o prazo de prescrição, sendo omissa em relação às causas de interrupção e de suspensão do prazo prescricional.

A Lei nº 104/2003, de 9 de Dezembro, autorizou o Governo a legislar sobre a criação do regime aplicável às contraordenações aeronáuticas civis (artigo 1º deste diploma), dando origem ao Decreto-Lei nº 10/2004, de 9 de Janeiro. Nos termos do estatuído na alínea n) do artigo 2º da citada lei, autorizou o Governo a fixar em cinco anos o prazo de prescrição do procedimento das contraordenações da aeronáutica civil.

A Lei de autorização legislativa em questão é omissa em relação às causas de interrupção e de suspensão da prescrição, o que significa que não permitiu mudar a lei geral[4], nesta matéria, mediante um regime especial que a derrogue.

O Regime Geral das Contraordenações regula a prescrição do procedimento em três vertentes:
a) Na definição do prazo de prescrição (artigo 2º/ RGC);
b) Na previsão dos fatores de suspensão do prazo prescricional (artigo 27º-A, do RGC);
c) Na concretização das causas de interrupção de contagem da prescrição (artigo 28º/RGC).

A legislação especial aplicável às contraordenações aeronáuticas civis apenas regula o prazo de prescrição.
O artigo 35° do Decreto-Lei n.º 10/2004 de 9 de Janeiro, estatui no regime das contraordenações aeronáuticas civis, que «em tudo o que não for expressamente regulado no presente diploma, aplica-se o regime geral das contra-ordenações».

Pelo exposto, considerando o teor do regime geral das contraordenações e não existindo regulação expressa – derrogando ou excluindo a sua aplicação - no regime legal das contraordenações da aeronáutica civil, tais fatores de suspensão e de interrupção da contagem do prazo prescricional são aplicáveis ao procedimento contraordenacional em causa nos presentes autos.

Assim sendo, conclui-se que o decurso do prazo de prescrição de cinco anos ainda não se mostra esgotado, uma vez que ocorreram – como decorre dos atos processuais já descritos neste acórdão - fatores de suspensão e de interrupção que se encontram previstos nos artigos 27º-A, 1, b) e c) e 2 e 28º, 1, alíneas b), c) e d) e 3 do RGC.

Estando as contraordenações que constituem o objeto deste processo datadas de 29 de agosto de 2008, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional só terminará no próximo dia 29 de Fevereiro de 2016, de acordo com a fórmula de cálculo seguinte:

DC + PP + PSP + PIP = DP

Sendo

DC = Data das contraordenações

PP = Prazo de prescrição;

PSP = Prazo de suspensão da prescrição;

PIP = Prazo de interrupção de prescrição

DP =  Data da prescrição

Transpondo para o caso concreto:

29/08/2008 + 5 anos + 6 meses + 2 anos e 6 meses = 29/08/2016

Importa, ora, decidir em conformidade com o exposto, revogando-se o despacho recorrido, devendo os autos prosseguir os seus termos.

*

Das custas processuais:

Sendo o recurso do Ministério Público julgado procedente, tendo havido resposta ao recurso por parte da arguida, pugnando pela sua improcedência, esta suportará as custas [artigos 513º, nº 1, al. a) do C.P.P. e 8º, nº 9, do R.C.P., tendo por referência a Tabela III anexa a este texto legal], fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (quatro unidades de conta), tendo em consideração o grau de complexidade mediano/reduzido da causa.

IV – DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar provido o recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, revogar o despacho impugnado, ordenando o prosseguimento dos autos.

Condena-se a recorrida A no pagamento das custas, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (quatro unidades de conta), ao abrigo do disposto artigos 513º, nº 1, al. a) do C.P.P. e 8º, nº 9, do R.C.P., tendo por referência a Tabela III anexa a este texto legal.
Nos termos do disposto no art. 94º, 2, do Código de Processo Penal, aplicável por força do art. 97º, 3, do mesmo texto legal, certifica-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo relator.

Tribunal da Relação de Lisboa, em 10 de Dezembro de 2014.
          O relator,

a) Jorge M. Langweg
          O adjunto,

a) Nuno N. P. R. Coelho


[1] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
[2] Como decorre já de jurisprudência datada do século passado, cujo teor se tem mantido atual, sendo seguido de forma uniforme em todos os tribunais superiores portugueses, até ao presente: entre muitos, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19 de Outubro de 1995 (acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória), publicado no Diário da República 1ª-A Série, de 28 de Dezembro de 1995, de 13 de Maio de 1998, in B.M.J., 477º,-263, de 25 de Junho de 1998, in B.M.J., 478º,- 242 e de 3 de Fevereiro de 1999, in B.M.J., 477º,-271 e, mais recentemente, de 16 de Maio de 2012, relatado pelo Juiz-Conselheiro Pires da Graça no processo nº. 30/09.7GCCLD.L1.S1, este pesquisável, nomeadamente, através do aplicativo de pesquisa de jurisprudência disponibilizado, pelo ora relator, em http://www.langweg.blogspot.pt.

[3] Não se verifica qualquer inconstitucionalidade material (v.g. por violação do princípio da proporcionalidade e das garantias de defesa) da norma, ao estabelecer um prazo único de prescrição, na medida em que resulta da opção política do legislador, expressa pela redação do artigo 2º, al. n), da Lei nº 104/2003, de 9 de Dezembro, considerar da mesma forma infrações da mesma natureza (contraordenações aeronáuticas civis), independentemente da sanção aplicável. Na verdade, o legislador estabeleceu o prazo de prescrição mais longo a todas as infrações aeronáuticas civis (ex vi dos arts. 27º, a)/RGC e 17º, 1, do Decreto-Lei nº 10/2004, de 9 de Janeiro), por considerar as mesmas, independentemente da sanção concreta, particularmente grave, dada a sua especificidade e o manifesto interesse público associado.
[4] Decreto-Lei n.° 433/82 de 27 de Outubro (RGC).