Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1587/16.1YRLSB-7
Relator: CONCEIÇÃO SAAVEDRA
Descritores: FRANQUIA
CESSAÇÃO
CLÁUSULA PENAL
CLAUSULA PÓS CONTRATUAL
NULIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/29/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: · A Relação não pode estar limitada à reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes, pelo que, não sendo possível sindicar toda a prova, designadamente a prova testemunhal que foi tida em conta na decisão por esta não ter sido registada, sempre será a mesma inalterável;
· No que respeita às causas de cessação do contrato de franquia aplicam-se, por analogia, as formas de cessação consagradas a respeito do contrato de agência;
· A justa causa baseada no incumprimento contratual terá de corresponder a um comportamento da outra parte violador dos deveres acordados que torne intolerável e inexigível ao contraente cumpridor a manutenção da relação contratual;
· A cláusula penal encerra uma dupla função, ressarcidora e coercitiva, sendo sempre exigível desde que o incumprimento seja imputável ao devedor; assim sendo, fixada a cláusula penal, fica o contraente cumpridor dispensado da alegação e prova dos danos sofridos com o incumprimento da contraparte e do valor de tais danos;
· É lícita a inclusão, num contrato de franquia, de uma cláusula proibitiva de concorrência pós contratual, desde que limitada, no tempo e no espaço, e indispensável a proteger o saber-fazer transmitido pelo franquiador ao franqueado;
· Proibindo uma das cláusulas do contrato de franquia a concorrência pós contratual sem limite temporal, será esta apenas parcialmente nula, sendo admissível a sua redução nos termos do art. 292 do C.C.;
· Não resultando, todavia, apurada a transmissão pelo franquiador ao franqueado de saber-fazer relevante, que deva considerar-se secreto, substancial e identificado, deve considerar-se inteiramente nula a referida cláusula por ser em si mesma contrária às normas comunitárias sobre concorrência.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I- Relatório:
R.G.-Gestão e Exploração de Franquias, S.A., requereu, em 30.1.2014, a constituição de Tribunal Arbitral, de acordo com a convenção de arbitragem estabelecida, para dirimir o conflito que, no âmbito de um contrato de franquia, a opõe a S.G.-Mediação Imobiliária, Lda, Sónia G. e Salvador G., tendo-se este Tribunal constituído em 18.9.2014.
Invoca a A., para tanto e em síntese, que tendo adquirido o direito exclusivo de licenciar, entre outras, o uso da denominação CENTURY 21 bem como o Sistema CENTURY 21 em todo o território de Portugal, celebrou, em 1.11.2011, com a Ré Sociedade, que tem como objeto social a mediação imobiliária e a administração de imóveis, um contrato de franquia em que os demais RR. se constituíram como fiadores e principais pagadores de todas e quaisquer obrigações do mesmo emergentes. Mais refere que a 1ª Ré procedeu à resolução ilícita do referido contrato, por carta de 28.11.2013, com o único intuito de passar a exercer a sua atividade de mediação imobiliária sob os sinais distintivos de outra marca e franquia concorrente da CENTURY 21, como efetivamente veio a fazer pelo menos 8 dias depois de expedida a referida carta de resolução. Diz que tal atuação causou prejuízos à A., nomeadamente pelos royalties e contribuições para o FNP que deixou de auferir, bem como pelo impacto negativo que a saída da 1ª Ré da rede da franquia CENTURY 21 teve entre os outros franquiados e potenciais franquiados, bem como junto da clientela. Pede, assim, seja declarada ilícita a resolução pela 1ª Ré do contrato de franquia e este julgado extinto, devendo os RR. ser condenados a pagar solidariamente à A.:
- a quantia de € 91.151,52 a título de cláusula penal por lucros cessantes, conforme estipulado na cláusula 19. A. (i), (ii) e (iii) do Contrato de Franquia;
- a quantia de € 112.500,00 a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual, conforme estipulado na cláusula 11. B. (vii) (e) do Contrato de Franquia;
- a quantia de € 10.000,00 a título de custos suportados pela A. com despesas e honorários do seu advogado na presente lide, nos termos do disposto na cláusula 20. do referido contrato de franquia e compromisso arbitral;
- a pagar as custas do processo nos termos do disposto na cláusula 25. B. (xiv) do referido contrato de franquia e compromisso arbitral.
Contestaram os RR., invocando a incapacidade judiciária da A. e impugnando em parte a factualidade alegada, mais sustentando, no essencial, que sempre cumpriram as suas obrigações contratuais e legais, sendo a A. quem não cumpriu nenhuma das obrigações e promessas subjacentes ao contrato de franquia, o que motivou a resolução do mesmo com justa causa. Pedem a procedência da exceção e a improcedência da causa, pedindo, em reconvenção, seja julgada verificada a justa causa de resolução do contrato e, em consequência, a A. condenada a pagar aos RR. indemnização no montante de € 88.155,23, respeitante aos valores médios pelas royalties e FNP devidos por todo o tempo que durou o contrato, indemnização no montante de € 4.522,81 que os RR. gastaram com a adaptação à imagem da Century21, indemnização em valor não inferior a € 2.500,00 por danos morais sofridos e, ainda, a quantia de € 10.000,00 com despesas e honorários dos seus advogados, bem como nas custas do processo e honorários dos
Árbitros.
A A. respondeu, a fls. 762 e ss., à matéria da exceção e da reconvenção, concluindo pela sua improcedência e pela procedência da ação.
A fls. 929, o Árbitro Presidente fixou ao processo o valor de € 308.829,56.
Por decisão do Tribunal Arbitral de 17.9.2015, a fls. 958/959, foi julgada “improcedente por não verificada a alegada excepção de ilegitimidade processual activa da Autora”, designando-se data para a “realização da audiência preliminar prevista no art. 28º, para os efeitos previstos nas als. a), b), e c), do nº 1, do art. 29º, ambos do Regulamento”.
Realizou-se audiência preliminar, em 20.10.2015 (fls. 972), sendo fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.
Procedeu-se ao julgamento, tendo sido proferida decisão arbitral em 22.4.2016, a fls. 1186 a 1271, a qual julgou improcedente o pedido reconvencional e a ação parcialmente procedente, nos seguintes termos:
“1. Declara-se ilícita a resolução do contrato de franquia, celebrado entre a Autora e os Réus no dia 1 de Novembro de 2012, pela sociedade Ré, com o consequente incumprimento por si do dito contrato, absolvendo-se, consequentemente, a Autora do pedido reconvencional contra si formulado pelos Réus;
2. Condenam-se os Réus, solidariamente, a pagar à Autora o montante de 91.151,52 € (noventa e um mil, cento e cinquenta e um euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de indemnização por lucros cessantes, ao qual acrescerão juros de mora, à taxa supletiva em vigor para as operações comerciais, a contar da data da presente decisão;
3. Condenam-se os Réus, solidariamente, a pagar à Autora a quantia que se vier a liquidar posteriormente referente aos encargos nos quais a Autora incorreu com honorários e despesas do advogado pelo patrocínio da presente acção;
4. Absolvem-se os Réus dos demais pedidos formulados pela Autora.
As custas da presente arbitragem serão pagas por ambas as partes, na proporção de 1/3 para a Autora e 2/3 para os Réus, sendo, com a presente decisão, remetidas às partes a conta final do presente processo.”
Tendo a A., entretanto, procedido à liquidação dos encargos incorridos com honorários e despesas do advogado (fls. 1512 e ss.), foi decidido, em 18.8.2016, a fls. 1573 a 1575, para além do mais, o seguinte: “(…) Este Tribunal condenou anteriormente os RR ao pagamento à Demandante do valor que aquela despendeu com a presente lide, a título de despesas e honorários de advogado, a liquidar em execução de sentença. Em aditamento, julga integralmente procedente o pedido formulado pela Demandante, em sede de incidente de liquidação, condenando os Demandados, solidariamente, ao pagamento da quantia peticionada pela Demandante, no montante de € 10.000,00 (dez mil euros).”
Inconformadas, interpuseram recurso ambas as partes.
A A., R.G.-Gestão e Exploração de Franquias, S.A., apresentou as respetivas alegações que culmina com as seguintes conclusões que se transcrevem:
   “
· Vem o presente recurso interposto da decisão de direito proferida e constante da Decisão Arbitral recorrida de fls. 1186 a 1271 dos autos, no segmento, de fls. 1264 a 1268, que julgou improcedente o pedido de condenação dos RR., ora Recorridos, no pagamento à A., ora Recorrente, da quantia de €112.500 (cento e doze mil e quinhentos euros) a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do contrato de franquia dos autos, declarando-a nula por falta de fixação de prazo para tal obrigação de não concorrência pós contratual, padecendo tal declaração, com o devido respeito e salvo melhor opinião, de erro de interpretação e aplicação da lei, em violação do disposto no artigo 5.º n.º 3 alínea d) do Regulamento UE n.º 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010, bem como do disposto nos artigos 236.º a 239.º e 292.º do Código Civil.
· Em síntese, com relevo para o segmento da douta Decisão Arbitral de que ora se recorre, considerou o Tribunal a quo como Factos Provados os constantes das alíneas F; G; H; T; U; V; W; X; Y e Z, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos.
· Importa referir que os RR., na sua douta e extensa Contestação, nos artigos 463.º a 476.º, afrontaram o pedido da A. na condenação destes no pagamento da quantia de €112.500 (cento e doze mil e quinhentos euros) a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do contrato, sem nunca terem questionado a validade de tal cláusula, ou sequer, invocado a nulidade da mesma, contestando tal pedido com o fundamento de que tal cláusula só era aplicável ao período de vigência do contrato (sem nunca se referirem à alínea (a) da cláusula 11. B. (vii)) e que o valor da mesma não podia ser o peticionado, uma vez que não pagaram qualquer direito de entrada, por disso terem sido isentados pela A., após negociações, como resulta da matéria dada como provada (cfr. ponto H).
· Importa ainda referir que a douta Decisão Arbitral recorrida, de fls. 1257 a fls. 1258, em sede de aplicação do direito, analisando o alegado pelos RR. quanto à Insuficiência / deficiência de formação contínua e inexistência de acompanhamento às agências no terreno, tece as seguintes considerações que pela sua pertinência para o presente recurso se passam a citar:
“Alega, ainda, a sociedade Ré, na sua comunicação de resolução do Contrato e na contestação, que apenas receberam formação no momento da integração na rede da Century21, e que a formação ministrada posteriormente revelou-se insuficiente, incipiente e despida de quaisquer conteúdos direccionados no âmbito de um contexto de evolução na formação contínua de todos os colaboradores da agência.
Diz também a sociedade Ré que não tem existido qualquer acompanhamento das agências no terreno, deixando a Autora as agências a laborar cada uma à sua maneira, sem que seja transmitido know-how específico da marca.
Em causa está, por conseguinte, o eventual incumprimento por parte da Autora das obrigações de assistência e transmissão do saber-fazer.
Dir-se-á desde já que, em sede de formação, na tese da sociedade Ré, estaria em causa não o incumprimento, mas o cumprimento defeituoso da obrigação, já que a sociedade Ré não nega que tenha existido formação, antes ou depois da celebração do contrato, mas antes, e ao invés, a deficiência da mesma.
Todavia, compulsada a factualidade assente, o que se verifica é que, na vigência do Contrato, a sociedade Ré, na pessoa da 2ª Ré e colaboradores, participou em diversas sessões / reuniões de trabalho e cursos de formação (cfr. docs. fIs. 286, e 806 a 829).
Mais, o questionário final de avaliação das formações ministradas à 2.ª Ré e seus colaboradores revela uma pontuação de 4/5 numa escala de 1 a 5, sendo que, numa destas formações (cfr. documento fIs. 828 e 829) é a própria 2.º Ré que afirma "de um modo global o balanço foi muito positivo".
Estamos em crer que era justamente nestes questionários que a gerente da sociedade Ré, aqui 2.ª Ré, e os seus colaboradores, estando descontentes com a formação que lhes era ministrada, deveriam expressar o seu desagrado, habilitando a Autora a melhorar a formação, diversificando os conteúdos ou até substituindo, fosse esse o caso, os formadores.
Nada dizendo na sede própria, contribuíram a 2.ª Ré e seus colaboradores para a justa convicção da Autora que a formação fosse adequada às suas expectativas, e isto a admitir que a valoração efectuada a posteriori pela 2.ª Ré e seus colaboradores, de si já subjectiva, tivesse fundamento.
Note-se que a sociedade Ré não logrou apresentar como testemunha nenhum franquiado ou ex-franquiado da Autora que corroborasse a sua versão, a qual foi, assim, apenas veiculada pelos colaboradores da sua própria agência, sendo infirmada por colaboradores de outras agências que depuseram sobre este tema.
O mesmo se dirá quanto à ausência de acompanhamento das agências e transmissão do saber-fazer.”
(sublinhado nosso)
· O pedido da A., ora Recorrente, de condenação dos RR., ora Recorridos, solidariamente, no pagamento à A., ora Recorrente, da quantia de €112.500 (cento e doze mil e quinhentos euros) a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do contrato, é apreciado pela a douta Decisão Arbitral recorrida, em sede de aplicação do direito, de fls. 1264 a fls. 1298.
· A cláusula objecto do presente recurso tem o seguinte teor:
"(vii) Conflito de Interesses e Não Concorrência
O Franquiado e qualquer das Afiliadas do Franquiado definidas infra não poderão, durante a vigência do presente Contrato, sem o consentimento prévio do Franquiador, prestado por escrito, directa ou indirectamente (incluindo como funcionário, administrador, accionista, sócio, Mediador Responsável ou a outro título) operar, gerir ou deter participação em qualquer mediadora imobiliária ou negócio relacionado (que não seja outra franquia CENTURY 21) que se encontre localizado no território português. A expressão Afiliadas do Franquiado inclui cada uma das entidades que a seguir se especificam, aplicando-se as restrições acima estabelecidas a cada uma dessas entidades: cada associado, Mediador Responsável, funcionário ou administrador; membro, ou qualquer sócio que detenha (ou seja beneficiário de) de qualquer percentagem de capital social do Franquiado, incluindo entidades que controlem, sejam controladas por, ou estejam sob o controlo conjunto do Franquiado ou suas outras Afiliadas;
(a) Como condição essencial à celebração do presente Contrato, o Franquiado declara expressamente que, no termo deste Contrato, qualquer que seja o fundamento, se obriga a não exercer ou explorar, por si ou por interposta pessoa, por qualquer forma, na localização da Agência, negócios ou actividades, conforme atrás definido.
(b)
(c)
(d)
(e) Pela violação do disposto nas alíneas anteriores, o Franquiado incorrerá em Responsabilidade Civil, estabelecendo-se desde já uma indemnização pecuniária, a título de cláusula penal, de valor não inferior a €100.000 (cem mil euros) ou ao quíntuplo do valor do Direito de Entrada estipulado na Cláusula 7, aplicável à data do incumprimento, conforme o que for mais elevado. "
(cfr. fis 192 e 193, dos autos)
· Sendo que o montante de €112.500, peticionado pela A. ora Recorrente a este título, corresponde ao quíntuplo do valor do Direito de Entrada estipulado na Cláusula 7, que, igualmente, se transcreve:
"7. Direito de Entrada
Em simultâneo com a celebração do presente contrato, o Franquiado pagará ao Franquiador, na sua sede, ou noutro local designado pelo Franquiador, em dinheiro (salvo se o Franquiador autorizar, por escrito, que o pagamento se faça de outra forma), um direito de Entrada no montante de vinte e dois mil e quinhentos euros (€ 22.500,00).
Este direito de entrada é devido na íntegra ao Franquiador com a celebração do presente Contrato e não é reembolsável."
(cfr. fis 183 dos autos)
· O Tribunal a quo considerou que aquela cláusula impõe à sociedade Ré uma obrigação de não concorrência, vedando o exercício ou exploração por qualquer forma, por si ou por interposta pessoa, na localização da Agência, de negócios ou atividades concorrentes de mediação imobiliária, sendo verdade que se provou que a sociedade Ré, após a resolução do Contrato, continuou a exercer a atividade de mediação imobiliária na localização da Agência, sob os sinais distintivos de comércio da "Remax", marca claramente concorrente da marca Century21 da titularidade da Autora, “pelo que dúvidas não existem de que a sociedade Ré efetivamente violou a obrigação de não concorrência pós-contratual estipulada no Contrato dos autos”.
· Analisando o quadro legal de suporte a tal tipo de cláusula, o Tribunal a quo, citando o douto acórdão do STJ de 05/02/2013 (proc. 3371/08.7TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt) concluiu “que é lícita a inclusão num contrato de franquia de uma cláusula proibitiva de concorrência, desde que limitada no tempo e no espaço e que respeite os limites e fins da indispensabilidade da protecção e salvaguarda do saber transmitido pelo franquiador.”
· Todavia, considerou o Tribunal a quo que “no caso concreto, não foi fixado qualquer prazo para a obrigação de não concorrência pós-contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii), do Contrato dos autos, e tanto basta para, sem mais considerações, declarar a sua nulidade (cfr. art. 280°, n.º 1, e 286°, do Código Civil).
Fica, consequentemente, prejudicado o pedido formulado pela Autora a este respeito já que a aplicação de uma cláusula penal estipulada para o incumprimento de uma obrigação pressupõe, como é evidente, a validade da obrigação cujo incumprimento se sanciona.
Improcede, assim, o pedido formulado pela Autora de condenação solidária dos Réus no pagamento de indemnização por violação da obrigação pós-contratual de não concorrência.”
· Ora, ainda que a referida cláusula seja omissa quanto ao prazo de duração da obrigação de não concorrência pós contratual, tal não pode ser interpretado como se tal prazo de duração fosse ilimitado no tempo ou de duração superior a um ano, já que por força do disposto na cláusula 25. A. do contrato de franquia dos autos (Lei Aplicável), ao contrato é aplicável a lei portuguesa, pelo que, em caso de omissão, supletivamente se devia ter como prazo da duração da obrigação de não concorrência pós contratual o prazo de 1 (um) ano, conforme estatuído no artigo 5.º n.º 3 alínea d) do Regulamento UE n.º 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010 e artigo 10.º n.º 3 da Lei da Concorrência (Lei 19/2012 de 8 de Maio), não sendo necessário estipular numa cláusula aquilo que já está estipulado na lei, prevalecendo os princípios de interpretação e integração do negócio jurídico (artigos 236.º e ss. Do CC.)
· A interpretação que Tribunal a quo fez da referida cláusula só se mostraria adequada no caso de nela se encontrar uma estipulação com um prazo de duração superior ao legalmente permitido, ou seja, um ano, o que não é, de todo, o caso, pelo que não podia o Tribunal a quo, de uma forma tão linear e simples, descartar a validade da referida cláusula, simplesmente por esta não estipular expressamente um prazo de duração de tal obrigação, declarando-a, consequentemente, nula.
· Todavia, caso assim não se entenda, por mera cautela de patrocínio sempre se dirá que caso se entenda que do teor do clausulado da referida cláusula resulta uma obrigação de não concorrência pós contratual com um prazo de duração indefinido ou indeterminado (como tal a ser entendido como superior a um ano) e assim, consequentemente, ferida de nulidade por força do disposto no artigo 5.º n.º 3 alínea d) do Regulamento UE n.º 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010 e do artigo 9.º n.º 2 ex vi  artigo 10.º n.º 3 da Lei da Concorrência (Lei 19/2012 de 8 de Maio) e 280.º n.º 1 do Código Civil;
· A verdade é que, ainda assim, tal cláusula não pode ser considerada intrinsecamente nula, já que as cláusulas de proibição de concorrência pós contratuais não são proibidas, mas sim parcialmente nula, pelo que o Tribunal a quo deveria ter procedido à respectiva redução, por força do disposto no artigo 292.º do CC.
· Com efeito, esse tem sido o entendimento da jurisprudência dominante, nomeadamente o douto aresto do STJ de 05/02/2013 (proc. 3371/08.7TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt) e citado na douta decisão arbitral a fls. 1267, e que se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos, sendo que no caso em apreço naquele douto acórdão do STJ, estava em causa uma cláusula de não concorrência pós contratual que excedia os limites territoriais, e no caso em apreço nestes autos o que está em causa é uma cláusula de não concorrência pós contratual que excede os limites temporais, pelo que o iter lógico do Tribunal a quo, ao citar e reproduzir aquele acórdão, não deveria ter parado nas considerações que os Venerandos Conselheiros doutamente fizeram sobre a admissibilidade de tais cláusulas restritivas da concorrência nos contratos de franquia, mas ter continuado a analisá-lo, ainda que criticamente, até ao fim, mormente quanto ao modo como o STJ concluiu e decidiu a questão de direito da validade da cláusula em apreço, que era em tudo semelhante à que está em causa nos presentes autos.
· No caso em apreço naquele citado douto aresto do STJ, os venerandos Conselheiros concluíram que “Sendo parcialmente nula, bem andaram as instâncias ao reduzi-la nos termos do preceituado pelo artº. 292º do CC.
A redução do negócio jurídico constitui a regra e só não deve ser opção se se mostrar que a transacção não seria celebrada sem uma tão excessiva cláusula de proibição de concorrência, o que não ocorreu.
Aliás, a parte que poderia insurgir-se contra a redução seria a recorrida, pois a redução da cláusula só a podia lesar a si, já que os recorrentes naturalmente subscreveriam um contrato que lhes fosse mais favorável, com uma cláusula de proibição de concorrência mais restrita em termos territoriais.
(...)
Há, no entanto, que não limitar o apelo ao instituto da redução do negócio jurídico, usando-o na sua plenitude e considerar que a cláusula de proibição de concorrência deve ser mantida, ainda que reduzida na área territorial de aplicação, em conformidade com o direito comunitário vigente.”
(Sublinhado nosso)
· No caso da cláusula em apreço nos presentes autos, mutatis mutandis, há que não limitar o apelo ao instituto da redução do negócio jurídico, usando-o na sua plenitude e considerar que a cláusula de proibição de concorrência deve ser mantida, ainda que reduzida quanto ao prazo de duração, em conformidade com o direito comunitário vigente.
· Pelo que a mesma deve ser declarada parcialmente nula e reduzida nos termos do preceituado pelo artigo 292.º do CC quanto aos seus limites temporais, ou seja, reduzido o prazo de duração da obrigação a um ano após o termo do contrato, qualquer que seja o fundamento.
· Sendo que a cláusula 11. B. (vii) (a) que impunha aos RR, ora Recorridos, uma obrigação de não concorrência pós contratual, depois de reduzida, é válida e foi culposamente violada por eles, havendo, assim, um ilícito contratual, gerador da obrigação de indemnizar (cfr. artigo 798.º do CC), estando o montante da indemnização previamente fixado através da cláusula penal 11. B. (vii) (e) (cfr. artigo 810.º do CC).
· Por todo o atrás expendido, não se mostra acertada a aplicação do direito por parte do Tribunal a quo, no segmento que declarou a nulidade da cláusula 11. B. (vii) (a) do contrato de franquia dos autos e que estipula uma obrigação de não concorrência pós contratual, e consequentemente não deu como procedente o pedido da A. e ora Recorrente, quanto à cláusula penal constante da cláusula 11. B. (vii) (e), padecendo a douta Decisão Arbitral de erro de interpretação e aplicação da lei, em violação do disposto no artigo 5.º n.º 3 alínea d) do Regulamento UE n.º 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010, bem como do disposto nos artigos 236.º a 239.º e 292.º do Código Civil.”
Pede a procedência do recurso e a revogação da decisão arbitral no segmento impugnado.
Em contra-alegações, defenderam os recorridos o acerto da decisão na parte indicada, mais sustentando, em síntese, a nulidade da referida cláusula 11. B. (vii) também à luz do DL nº 446/85, de 25.10.
Os RR., S.G.-Mediação Imobiliária, Lda, Sónia G. e Salvador G., apresentaram as respetivas alegações que culminam com as seguintes conclusões que também se transcrevem:
   “
· Há factos alegados pelos Recorrentes que deveriam ter sido dados como provados, por efeito das provas juntas aos autos, os quais, não constando da relação dos factos provados, resultam tacitamente não provados, por força da formulação da sentença recorrida que enuncia, de modo genérico, “a ausência de prova dos demais factos alegados pelas partes”. Para além destes, há outros que foram incorrectamente dados por provados, que, de seguida se elencam.
· A existência de erros e deficiências no software consta entre os factos dados como provados: II., NN., JJ., KK., LL., ou MM. Todavia, sem qualquer razão de ser, o texto destes factos dados como provados sugere que a Recorrida resolveu todos os problemas informáticos que lhe foram apresentados, o que não corresponde à realidade, conforme resulta dos elementos probatórios constantes dos autos.
· Decorre dos elementos probatórios constantes dos autos, que, no que diz respeito à primordial razão invocada pela Recorrente “S.G. – Mediação Imobiliária, Ld.ª” para a resolução do contrato de franquia – o facto de as ferramentas de software fornecidas e impostas pela Recorrida, essenciais para o exercício da actividade comercial prosseguida por esta Recorrente, revelaram graves deficiências, e não demonstrarem sinais de vir a melhorar nos próximos anos – existiam meios de prova que impunham decisão sobre a matéria de facto necessariamente diversa daquela constante da decisão posta em crise.
· Refere-se no Facto Provado JJ. que “O software/plataforma informática I.NET.C21 foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha inicialmente erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora, maioritariamente até Novembro de 2012 e com uma progressividade decrescente, e por esta sucessivamente resolvidos; para depois, o Facto Provado LL., elencar 16 (dezasseis) ocorrências relacionadas com erros de funcionamento no ano de 2013, 6 (seis) das quais sem indicação de resolução do problema; e, no Facto Provado MM., se elencar 12 (doze) datas diferentes em que a plataforma se encontrou indisponível;
· A afirmação de que os erros tiveram “uma progressividade decrescente”, e que foram “sucessivamente resolvidos”, não se acha suportada em prova documental, ao contrário do que acontece com os incidentes elencados no Facto Provado LL. (vd. documentos a fls. 535, 537, 538, 539, 540, 542v, 545, 546, 549, 550, 551, 551v, 552, 554, 555, 557 e 559).
· Dado que o Facto Provado JJ. não se encontra redigido de forma consentânea, tanto com os demais factos provados (LL. e MM.), como com a prova produzida nos autos, este deverá ser alterado, nos seguintes termos “O software/plataforma informática I.NET.C21 foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora” (cfr. alínea c) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC);
· Enuncia o Facto Provado KK. que “O referido software/plataforma esteve em desenvolvimento e melhoria com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades até, pelo menos, à saída da sociedade Ré da rede (cfr. docs. fls. 493, 534, 547) (…)”
· Porém, após as mensagens de correio electrónico a fls. 493, 534 e 547, enviadas por colaboradores da Recorrida, o referido software/plataforma continuou a originar problemas com elevada cadência, conforme decorre, designadamente, dos Factos Provados LL. e MM. (8 ocorrências posteriores a 24.05.2013, data da mensagem de correio electrónico de fls. 547 – vejam-se os docs. a fls. 549, 550, 551, 551v, 552, 554, 555, 557 e 559 dos autos), pelo que tais melhorias/desenvolvimentos não resolveram os problemas do referido software.
· É insólito, que, em face de três operações de desenvolvimento e melhoria dadas como provadas, tendo em conta todos os erros/deficiências identificados no software em momentos anteriores, intercalares e posteriores a tais mensagens de correio electrónico, se possa afirmar que o software “esteve em desenvolvimento e melhoria” durante todo o período entre a data da sua entrada em funcionamento (quatro meses antes daquela primeira operação) e a data da saída da 1.ª Recorrente da rede (seis meses depois daquela terceira operação).
· O mesmo Facto Provado KK. enuncia que a sucessão de tais operações de desenvolvimento e melhoria “implicou curtos períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização”. Ora, tais períodos de indisponibilidade compreenderam períodos de 17 horas (cfr. doc. 97 a fls. 536) e de 48 horas (cfr. doc. 109 a fls. 547), tendo existido, pelo menos, 16 períodos de indisponibilidade do software durante a vigência do contrato (vd. docs. a fls. 494, 497, 498, 500, 526, 527, 528, 536, 541, 541v, 544, 547, 548, 553, 556, 560). Dar, assim, como provado que tais períodos de indisponibilidade foram todos curtos – e não foram – não dar como provado que foram reiterados e sucessivos – que o foram – não é rigoroso, nem consentâneo com os elementos de prova dos autos.
· Como o Facto Provado KK. não foi julgado de acordo com os elementos probatórios constantes dos autos e demais factos provados, este deverá ser alterado, nos seguintes termos; O referido software/plataforma foi alvo de três operações de desenvolvimento e melhoria, com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades (cfr. docs. fls. 493, 534, 547), em simultâneo com a disponibilização da plataforma aos franquiados da rede Century21, o que implicou diversos e reiterados períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização (inoperacionalidade), os quais eram previamente comunicados aos franquiados” (cfr. alínea c) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC)
· O Facto Provado NN. enuncia que “O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, podendo existir pontualmente erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas”, quando resulta provado, dos documentos juntos aos autos, que existiram problemas de articulação em 03.02.2012 (a fls. 442), 29.03.2012 (a fls. 460), 09.07.2012 (a fls. 505) e 22.05.2013 (a fls. 546), pelo que não foi julgado de acordo com os elementos probatórios nos autos e demais factos provados, devendo ser alterado, nos seguintes termos; O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, verificando-se a existência de erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas.”
· O software I.NET.C21 apresentou vários problemas e deficiências, conforme o comprovam diversos documentos juntos pelos Recorrentes na sua Defesa, dando-se por reproduzidas as 85 (oitenta e cinco) ocorrências, suportadas por prova documental, registadas entre 02.02.2012 e 11.11.2013, e descritas nas alegações, que deveriam ter transitado para a matéria de facto provada nos seguintes termos:
JJ. O software/plataforma informática I.NET.C21 foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora
KK. O referido software/plataforma foi alvo de três operações de desenvolvimento e melhoria, com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades (cfr. docs. fls. 493, 534, 547), em simultâneo com a disponibilização da plataforma aos franquiados da rede Century21, o que implicou diversos e reiterados períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização (inoperacionalidade), os quais eram previamente comunicados aos franquiados
KK-A. O software I.NET.C21 apresentou vários problemas e deficiências no seu funcionamento, manifestadas por uma série de 85 (oitenta e cinco) ocorrências entre 02.02.2012 e 11.11.2013, as quais: [reprodução dos pontos 1. a 85. supra];                       
NN. O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, verificando-se a existência de erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas”.
· A própria Recorrida sabia, e sempre admitiu, que os sistemas informáticos fornecidos à 1.ª Recorrente (em particular, o sistema I.NET.C21), padeciam de defeitos graves, como decorre da mensagem de correio electrónico enviada pela 1.ª Recorrente à Recorrida, em 17 de Julho de 2012 (Doc. 70 junto com a Defesa, a fls. 508 dos autos), que foi proposta a “alteração ao prazo para pronúncia para cessação de contrato de franquia”, sendo que tal “alargamento de prazo justifica-se com o facto de, ainda, não ter visto cumpridos os requisitos mínimos exigidos/prometidos aquando da assinatura do contrato de franquia a 1 de Novembro de 2011”, proposta que foi aceite de imediato pela Recorrida, através da mensagem de correio electrónico a fls. 508v dos autos - facto que deveria ter transitado para a matéria de facto provada nos seguintes termos: “NN-A. A A. sabia que o sistema informático I.NET.C21 por si fornecido aos RR. não cumpria os requisitos mínimos exigidos/prometidos aquando da assinatura do contrato de franquia a 1 de Novembro de 2011 (cfr. docs. fls. 508 e 508v).
· Existem diversas reclamações formuladas pela 1.ª Recorrente no ano de 2013, que não tiveram resposta por parte da Recorrida, ou cuja resposta foi tardia, a saber, em 04.11.2013, doc. 121 a fls. 558, que não tem indicação de resposta; em 17.10.2013, doc. 118 a fls. 555, sem indicação de resolução; em 10.09.2013, doc. 115 a fls. 552, sem indicação de resolução; em 04.07.2013, doc. 114 a fls. 551, sem indicação de resolução; em 22.05.2013, doc. 108 a fls. 546, sem indicação de resolução; em 27.05.2013; em 19.10.2012, doc. 105 a fls. 543, sem indicação de resolução em 02.04.2013; em 26.05.2013, doc. 104 a fls. 542, sem indicação de resolução; em 23.03.2013, doc. 102 a fls. 540, com indicação de resolução a 27.03.2013; em 22.03.2013, doc. 101 a fls. 539, sem indicação de resolução; em 25.02.2013, doc. 100 a fls. 538, sem indicação de resolução; facto que deveria ter transitado para a matéria de facto provada nos seguintes termos: NN-B. “No ano de 2013, ano da resolução do contrato pelos Réus, verificaram-se diversas reclamações por parte dos Réus, correspondentes a 16 (dezasseis) erros no funcionamento do software I.NET.C21, sendo que destas reclamações, pelo menos 9 não tiveram resposta de resolução”
· Os factos constantes a “R” e “S” da matéria de facto provada, relativos ao segundo Tema da Prova, “Saber se existiu um acordo entre os contratantes para revogação do contrato”, não reflectem a realidade dos documentos juntos aos autos, devendo ser substituídos por transcrições desses documentos, de fls 432, 433, 434 e 435;
· A douta decisão recorrida descreve com exaustão o tipo contratual em causa – o contrato de franquia – análise abstracta que aqui não cabe reproduzir. Fá-lo, após enunciar (sic página 60) que “cabe caracterizar, sumariamente, o contrato celebrado entre a Autora e os Réus”, caracterização a qual, todavia, não procede, pois não analisa, de todo, o concreto contrato de franquia cujo incumprimento está no centro da lide, designadamente às circunstâncias, absolutamente específicas, da sua formação e execução, que se afastam, e muito, do típico contrato de franquia.
· Assim, não enuncia a douta decisão recorrida – sem o que, segundo entendem os Recorrentes, desvirtua toda a sua análise jurídica, bem como a justiça da sua decisão – que o contrato de franquia entre a Recorrida e a 1.ª Recorrente decorre da aquisição, pela Recorrida, da posição contratual que a sociedade “Netfran, Ld.ª” ocupava no contrato de franquia em vigor entre esta e a 1.ª Recorrente, nos termos do qual a 1.ª Recorrente integrava a rede de franquia de mediação imobiliária denominada “Fita Métrica” (cfr. Facto Provado J.), numa sucessão de contratos de franquia que tinham, em Outubro de 2011, data dessa transmissão da posição contratual da posição de franqueador, 8 (oito) anos de vigência;
· A formação do contrato de franquia “sub judice”, e como consta do aditamento outorgado juntamente com o mesmo que consta a fls. 276 e ss. dos autos, resulta (e é incindível) do facto de a rede imobiliária que a 1.ª Recorrente integrava ter sido adquirida pela Recorrida, e de que “As agências que trabalhavam na rede imobiliária “Fitamétrica” tinham de optar entre integrarem-se ou não na rede imobiliária Century21, detida em Portugal pela Autora”, circunstância que, aliás, consta também do elenco de factos provados nos autos (Facto Provado K.), mas não é relevada em qualquer outra parte do douto aresto recorrido.
· Resulta da experiência comum que essa “opção”, verdadeiramente, não o era, dado que as agências imobiliárias, no Século XXI, necessitam de operar integradas em redes que lhes assegurem visibilidade, antes de mais, na internet – seja em sítios próprios dessas redes (como dispunha a “Fita Métrica”), seja junto dos portais imobiliários – que é onde a quase totalidade dos consumidores recorrem para comprar, vender e arrendar imóveis. De igual modo, necessitam de conexões informáticas, em tempo real, com agências imobiliárias associadas (como dispunha a “Fita Métrica”), de modo a captarem clientes para a sua carteira de imóveis e imóveis para a sua carteira de clientes;
· A decisão de “optar” por não integrar a rede imobiliária Century 21 comportaria, necessariamente, uma séria e potencialmente fatal perturbação na actividade da 1.ª Recorrente, que se veria forçada a abdicar, de imediato, dos benefícios que colhia da integração na rede Fitamétrica, ficando sem acesso à divulgação informática da sua carteira de imóveis, e sem acesso à carteira de clientes e de imóveis dos seus parceiros desta rede. Logo, no quadro de tempo de que a 1.ª Recorrente dispôs, apenas a decisão de se manter na “sua” rede de mediação imobiliária – agora girando sob a marca Century 21 – permitia à 1.ª Recorrente manter a sua normal actividade;
· Assim, o interesse contratual da 1.ª Recorrente, perfeitamente conhecido da Recorrida, não correspondia, de todo, à típica motivação do franquiado. A 1.ª Recorrente já dominava todos os métodos e técnicas da sua actividade, já dispunha do “know-how” de 8 (oito) anos de actividade, já dispunha de uma carteira sólida de clientes e de imóveis, já dispunha de instrumentos informáticos que asseguravam os objectivos de desenvolver essas carteiras, seja mediante a divulgação dos imóveis, seja mediante a conexão com outras agências, conhecendo a respectiva oferta e procura;
· O interesse contratual da 1.ª Recorrente não era – primordialmente, como é evidente – o de obter novos conhecimentos ou métodos ou meios de trabalho, ou de beneficiar do “know-how” ou da imagem (especificamente) da Recorrida, mas sim, e como é reconhecido pela Recorrida nos termos do sobredito Aditamento a Contrato de Franquia, o de que se mantivessem as condições da sua normal actividade, que vinha desenvolvendo nos termos do contrato de franquia com a sociedade “Netfran, Ld.ª”, cuja posição contratual a Recorrida adquiriu;
· A avaliação da licitude dos fundamentos de resolução do contrato a que procedeu a decisão recorrida não foi correcta e justa, pois sem ponderar as circunstâncias específicas acima descritas – e por mera referência ao que é típico na formação e execução do contrato de franquia, que, no caso “sub judice”, não se verifica – não se pode proceder à justa avaliação da licitude dos fundamentos de resolução do contrato;
· Foi em reconhecimento de a 1.ª Recorrente não ser uma “típica” franquiada que se estipulou, no Aditamento ao Contrato de Franquia constante de fls. 276 e ss. dos autos, que esta ficaria isenta de uma série de pagamentos tipicamente exigíveis no contrato de franquia tipo da Recorrida (cfr. Cláusula 5.ª), nomeadamente, da prestação de garantia bancária e do direito de entrada – precisamente porque a 1.ª Recorrente não estava a iniciar uma actividade de mediação imobiliária no âmbito de uma rede de franquiados, estava apenas a assegurar que a sua actividade de mediação imobiliária no âmbito de uma rede de franquiados se mantinha, ainda que sob uma nova marca;
· Foi isso mesmo que foi incumprido, não só porque ficaram baldadas as legítimas expectativas da 1.ª Recorrente de que a sua nova franqueadora aportasse um valor acrescentado profissional e económico, como porque o único escopo da 1.ª Recorrente para contratar com a Recorrida – a manutenção das condições técnicas (ou seja informáticas) de exercício da sua actividade – não se concretizou; pelo contrário, esse escopo foi grave e reiteradamente incumprido.
· Assim, a migração de dados que a 1.ª Recorrente detinha na rede “Fitamétrica” nunca veio a ser efectuada (Facto Provado CC.), responsabilidade contratual que cabia à Recorrida, seja porque é a Franquiadora a responsável pela escolha, fornecimento e funcionamento dos sistemas informáticos a utilizar pelo Franquiado (Cláusula 11.ª, B., alínea (xii) e Cláusula 6.ª, G., alínea (ii)), seja porque esta, por efeito da aquisição da posição contratual de Franquiadora na rede de franquia de mediação imobiliária denominada “Fita Métrica”, era a possuidora, legal e física, dessa base de dados.
· Não é “admissível o entendimento que essa obrigação era da sociedade Ré”, ao contrário do que sustenta, sem qualquer escora na lógica, na experiência, e na boa-fé contratual, a douta decisão recorrida, numa tese, aliás, inédita ao longo da execução contratual, pelo contrário: a migração dos dados que a 1.ª Recorrente detinha na rede “Fitamétrica” era, para a 1.ª Recorrente, pressuposto fundamental para a celebração do contrato de franquia com a Recorrida, vd. o Aditamento ao Contrato de franquia de fls. 276;
· O incumprimento da obrigação contratual de garantir a migração automática dos dados por parte da Recorrida foi a causa necessária de graves limitações na actividade da 1.ª Recorrente, que se viu obrigada a afectar pessoal a inserir, manualmente, esses dados (vd. Factos Provados DD. e EE.), primeiro na plataforma informática Trans21, e mais tarde na plataforma informática I.NET.C21 – tarefa que implicou várias horas de trabalho, a desenvolver, de modo deficiente, uma tarefa que incumbia à Recorrida ter feito de modo pontual, causando-lhe, por tal, sérios prejuízos,
· A existência de erros e deficiências no software é pacífica, e consta entre os factos dados como provados da decisão arbitral, vd. os factos Provados II., NN., JJ., KK., LL., ou MM., sendo o elenco de erros e deficiências motivo suficiente para concluir pela legitimidade da resolução contratual, face às regras da lógica e da experiência, uma vez que não se concebe o exercício da actividade de mediação imobiliária moderna sem o acesso permanente às ferramentas informáticas, as quais incluem bases com os dados relativos a clientes, imóveis, contactos de potenciais compradores e arrendatários, condições contratuais, bem como as ferramentas de divulgação “online” da oferta imobiliária, que são, actualmente, quase a única porta de entrada de clientes.
· Sem acesso permanente a esses meios, o mediador não anuncia os seus produtos, não contacta os seus clientes, divulga informações desactualizadas, tudo circunstâncias cuja consequência é, num mercado saturado e competitivo, a imediata perda de clientela e de negócios, sendo notório o facto de um sistema informático que falha ou está indisponível (v.g. para “actualizações”) repetidas vezes ser, no contexto da actividade de mediação imobiliária, uma situação grave e decisiva, suficiente para pôr em causa, irreversivelmente, o exercício da respectiva actividade
· A comprovada frequência com que ocorriam erros e/ou estavam indisponíveis os sistemas fornecidos e impostos pela Recorrida à 1.ª Recorrente (vd. documentos de fls. 441 a 560 dos autos), maxime o software I.NET.C21, conformava uma grave e culposa violação de obrigações da Recorrida, previstas, v.g., nas Cláusulas 6.ª, G., alínea (ii), e 6.ª, A. do Contrato de Franquia, pois, prevendo estas a obrigação da Franquiada adquirir e usar os sistemas informáticos fornecidos/impostos pela Franqueadora (“(1) obter todos os equipamentos, produtos ou serviços que o Franquiador considere necessários para a utilização de tal produto ou serviço, incluindo hardware e software; e (2) começar a utilizar tal produto ou serviço dentro do prazo de noventa (90) dias a contar da recepção pelo Franquiado da referida notificação escrita”), correspectivamente impunha à Franquiadora a obrigação de fornecer sistemas informáticos susceptíveis de serem utilizados, nas melhores condições, pela Franquiada, ou seja, de assegurar que “tal produto” seria apropriado, funcional, e que não enfermava de deficiências ou imperfeições.
· Considerando apenas o ano de 2013, o que resulta dos autos é que, sem contar com os períodos de indisponibilidade, de 16 (dezasseis) ocorrências verificadas em 2013, pelo menos 9 (nove) não tiveram indicação de resolução (cfr. Conclusão 15. supra), tendo-se dado ocorrências como a inacessibilidade de acesso ao I.NET.C21, (doc. 100 a fls. 538), a contínua inoperacionalidade de exportação para portais imobiliários (doc. 108 a fls. 546), a persistência dos problemas relacionados com e-mails (doc. 114 a fls. 551), ou a impossibilidade de introdução de dados no sistema (doc. 118 a fls. 555) – todas sem indicação de resolução, que todas elas, como é notório, lesaram o exercício da actividade da 1.ª Recorrente;
· Várias dessas ocorrências repetiam-se, v.g., as ocorrências relativas aos problemas com e-mails (doc. 51 a fls. 487, doc. 94 a fls. 533, e doc. 114 a fls. 551), à reserva de imóveis sem que aparecesse a faixa de “reservado” (doc. 32 a fls. 463, doc. 71 a fls. 509, e doc. 102 a fls. 540), ou a imóveis vendidos/arrendados sem que fossem eliminados do site (doc. 73 a fls. 511 e doc. 117 a fls. 554);
· Em 2013 o sistema esteve inoperacional durante mais de 48 horas em 25/26.05.2013, 17 horas em 05.02.2013, 1h30 em 04.06.2013, e 1 hora em 09.04.2013 e em 16.09.2013, tendo estado indisponível meia hora nas restantes datas, períodos durante os quais a 1.ª Recorrente se viu privada de exercer a sua actividade, e mais do que suficientes para os seus clientes, ou potenciais clientes, “clicarem” noutro imóvel ou noutra agência, e assim serem perdidos, por causas exclusivamente imputáveis à Recorrida;
· Assim, ao contrário do decidido no douto aresto recorrido, a Recorrida incumpriu, reiteradamente e com culpa, obrigações que lhe cabiam nos termos do Contrato de Franquia junto aos autos a fls. 173 e ss., e, bem assim, os Aditamentos ao Contrato a fls. 276 a 282, obrigações essas que, dadas as circunstâncias em que o contrato foi outorgado – que eram garantir a manutenção das condições do exercício pela 1.ª Recorrente da sua actividade comercial, na sequência da compra da franqueadora da rede “Fita Métrica”, que a 1.ª Recorrente integrava há 8 (oito) anos – revestem gravidade suficiente para fundamentar a resolução, por esta, do sobredito contrato;
· No caso, é perfeitamente patente a reiteração do incumprimento / cumprimento defeituoso, pela Recorrida, das suas obrigações, registando-se pelo menos 85 ocorrências de problemas informáticos provocados pelos produtos fornecidos/impostos por esta ao longo de 21 meses, num registo que se tornou insuportável para a 1.ª Recorrente, e que tornou inexigível a subsistência do vínculo contratual
· Havendo justa causa de resolução, não era, assim, necessária qualquer interpelação admonitória pela 1.ª Recorrente – que, aliás, já tinha reiteradamente interpelado a Recorrida para o incumprimento e/ou cumprimento deficiente das suas obrigações contratuais, sem sucesso – uma vez que também aqui se encontra em causa uma relação obrigacional duradoura, no âmbito da qual ocorreu uma justificada perda de interesse na relação contratual, pelo que a resolução através da carta de 28 de Novembro de 2013, junta aos autos com a Petição Inicial como Doc. 23 (fls. 352 a 354), foi lícita, ao abrigo do disposto nas alíneas a) e b) do art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho, aplicável analogicamente aos contratos de franquia;
· Acresce que, no juízo que deve incidir sobre a legitimidade da 1.ª Recorrente para resolver o sobredito Contrato de Franquia, não pode deixar de relevar o sucedido nas semanas que antecederam essa resolução;
· Resultando manifesto da leitura dos documentos de fls 432, 433, 434 e 435, que houve um acordo substancial entre os legais representantes da 1.ª Recorrente e da Recorrida – e, por tal, entre as suas representadas – em como a respectiva relação contratual era insustentável, em como havia interesse mútuo em revogá-la, e em que deveria haver uma contrapartida dessa revogação, mas sem qualquer relação com o valor da cláusula penal estipulada no contrato de franquia;
· Tendo a recepção, no dia 20 de Novembro de 2013, de uma mensagem em que o mesmo Administrador da Recorrida reconhece que “A posição dos nossos advogados e do Franquiador, que não conhecem a relação de trabalho que temos tido contigo” era a de impor o “pagamento de uma compensação no montante mínimo de €88.000,00”, ou seja, um valor compensatório onze vezes superior aos “pontos acertados na nossa reunião de dia 05 de Novembro”, terá de ser considerada no “iter” da decisão de revogar o contrato, pois, sem margem para dúvidas, tal sequência de eventos, fez desaparecer toda a confiança da 1.ª e da 2.ª Recorrentes na Recorrida e nos seus legais representantes, indispensável para manter uma relação contratual.
· Admitindo – por mera cautela – que a resolução, pela 1.ª Recorrente, do Contrato de Franquia não tivesse sido lícita e justificada, ou seja, aderindo, por absurdo, à conclusão, a este respeito, da douta decisão recorrida, ainda assim não se detecta como pôde ser arbitrada a indemnização peticionada pelo incumprimento contratual;
· A existência de danos causalmente derivados de um (suposto) acto contratual ilícito tem de ser expressamente alegada pelas partes e sucessivamente provada, para que se possa considerar como devida qualquer indemnização correspondente. Mesmo a existência de uma cláusula penal não dispensa a alegação de danos pelo incumprimento, não se concebendo que a aplicação de um tal cláusula seja automática, independentemente do seu valor, absoluto ou comparado com as prestações das partes, cumpridas, incumpridas, ou por cumprir à data da cessação.
· Sem a alegação e prova do prejuízo concreto suportado em resultado de um (pretenso) incumprimento, o julgador não pode determinar se a aplicação da cláusula penal é proporcional e justificada, em particular quando, como sucede no presente caso, a mesma consta de um contrato de adesão, ou quando, como é o caso, a cláusula consiste no recebimento da contrapartida pecuniária de prestações que nunca se vão ter de cumprir, ou seja, cujos custos nunca irão suportar.
· Inexistindo alegação de danos e/ou prejuízos por parte da Recorrida, e sendo manifesto que a cláusula penal não pode ser aplicada, por ser nula, por corresponder ao pagamento de prestações vincendas de cuja execução a Recorrida ficou desonerada, nunca poderia, licitamente, o Tribunal Arbitral ter condenado os Recorrentes no respectivo pagamento.”
Pedem a revogação da decisão arbitral.
Em contra-alegações, defende a A./recorrida, por sua vez, a manutenção do julgado.
Os recursos foram recebidos como de apelação, sendo o da A. com efeito meramente devolutivo e o dos RR. com efeito suspensivo atenta a caução prestada (cfr. fls. 2088 e 2100).
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

                                                 ***
II- Fundamentação de Facto:
A decisão arbitral fixou como provada a seguinte factualidade:

· A Autora é uma sociedade comercial cujo objecto consiste na gestão e exploração de franquias, formação profissional e representações – cfr. Certidão Permanente do Registo Comercial com o código de acesso 6384-2670-7417, a fls. 121 a 127, que se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais;
· A Autora celebrou, em 17 de Março de 2004, com a “Century 21 Real Estate LLC” um contrato de “Master Franquia”, através do qual adquiriu o direito exclusivo de licenciar o uso de certas denominações comerciais, marcas comerciais e marcas de serviço, incluindo a denominação “Century 21”, bem como o “Sistema Century 21”, em todo o território de Portugal (cfr. doc. a fls. 128 a 132, que se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
· A referida licença foi averbada aos respectivos registos junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), conforme documentos de fls. 133 a 172, que se dão aqui por integralmente reproduzidos, sob o número e designação seguintes:
a) Marca Nacional verbal nº 190.308 – Century 21 – Classe 16
b) Marca Nacional mista nº 270.646 – Century 21- Classe 16
c) Marca Nacional mista nº 270.647 – Century 21 – Classe 36
· A sociedade Ré é uma sociedade por quotas cujo objecto social é a mediação imobiliária e administração de imóveis por conta de outrem, – cfr. Certidão Permanente do Registo Comercial com o código de acesso 7237-6083-4074, a fls. 273 a 275, que se dá aqui por integralmente reproduzida;
· A 2ª Ré é sócia e única gerente da sociedade Ré, bem como é o mediador responsável designado por esta sociedade nos termos e para os efeitos do contrato de franquia que celebrou com a Autora, e o 3º Réu é sócio da sociedade Ré (cfr. documento de fls. 273 a 275);
· Em 1 de Novembro de 2011, Autora e Réus celebraram um contrato de franquia para a Rede Century 21®, doravante apenas designado por Contrato, pelo prazo de cinco anos, nos termos do qual a Autora concedeu à sociedade Ré o direito não exclusivo de utilizar o Sistema Century 21®, e certas marcas Century 21, para o funcionamento de uma agência de mediação imobiliária na Rua José Malhoa n.º 35 A, Parque dos Poetas, em Oeiras, conforme cópia do Contrato de fls. 173 a fls. 239, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
· A 2ª e o 3º Réus outorgaram o Contrato em nome pessoal, assumindo solidariamente entre si e com o Franquiado, todas as obrigações, garantias e compromissos para com a Autora nos termos do referido contrato, e constituíram-se também solidariamente, sem reservas, como fiadores e principais pagadores de todas e quaisquer obrigações emergentes do contrato de franquia e da sua execução, incluindo as decorrentes do respectivo incumprimento, obrigando-se, com expressa renúncia ao beneficio da excussão prévia, a efectuar o cumprimento integral de todas as referidas obrigações, incluindo, nomeadamente, honorários de advogados e obrigações de indemnização que decorram do Contrato (cfr. Anexo VIII cláusula 7º, do Contrato – fls. 237);
· A minuta do Contrato, bem como as condições particulares das quais a sociedade Ré beneficiaria, foi facultada pela Autora à sociedade Ré em 7 de Setembro de 2011, tendo existido negociações e alterações à dita minuta (cfr. Considerandos 4, 5 e 6, do Aditamento, a fls. 277);
· Até 31 de Outubro de 2011, a sociedade Ré integrava a rede de franquia de mediação imobiliária denominada Fitamétrica no âmbito de um contrato de franquia celebrado com a sociedade Net..., Lda, em 7 de Maio de 2008 (cfr. Considerando 1, do Aditamento ao Contrato de Franquia a fls. 276), sociedade da qual era sócio-gerente Paulo F.;
· A Autora, em 17 de Outubro de 2011, assumiu a posição contratual da Net... Lda., no referido contrato de franquia (cfr. Considerando 1, do Aditamento ao Contrato de Franquia a fls. 276, e Doc. a fls. 430);
· As agências que trabalhavam na rede imobiliária “Fitamétrica” tinham de optar entre integrarem-se ou não na rede imobiliária Century21, detida em Portugal pela Autora (admissão por acordo – arts. 25º contestação e 12º réplica);
· No final do ano de 2011, a Autora submeteu à sociedade Ré uma proposta de candidatura à exploração de uma unidade franquiada “Century21” (admissão por acordo – arts. 27º contestação e 12º réplica);
· O contrato de franquia seria alterado de forma a dispensar/isentar:
a) A entrega da garantia bancária constante do Anexo VII ao contrato de franquia;
b) Do pagamento dos direitos de entrada de 22.500€ previsto na cláusula 7ª do Contrato;
c) Do pagamento dos royalties previstos no artigo 8º relativo aos dois últimos meses do ano de 2011;
d) Do pagamento do FNP previstos no artigo 8º, até 31 de Janeiro de 2012;
e) Do pagamento da quantia de 1.000€ previsto no artigo 10º do Contrato;
f) Do pagamento de todos os direitos de royalties ou FNP quanto aos contratos já celebrados até 31 de Outubro de 2011.
(admissão por acordo – arts. 29º Contestação e 12º Réplica);
· Por Aditamento ao Contrato celebrado entre as partes em 1 de Novembro de 2011, a Autora e a sociedade Ré “resolveram” de comum acordo este contrato de franquia relativo à rede Fitamétrica, resultando dos seus termos que a sociedade Ré não se tinha oposto à cessão da posição contratual da Net..., Lda, para a Autora (cfr. cláusula 2ª e Considerando 1, do Aditamento ao Contrato de Franquia a fls. 276 a 277);
· No referido Aditamento, Autora e a sociedade Ré estipularam que a sociedade Ré poderia “cessar unilateralmente o Contrato de Franquia produzindo a aludida cessação efeitos a partir de 01 de Novembro de 2012”, sem haver lugar a qualquer penalização para a sociedade Ré desde que o comunicasse à Autora até ao dia 1 de Agosto de 2012 (cfr. cláusula terceira, números 2 e 3, do referido Aditamento a fls. 278);
· Em 18 de Julho de 2012, a Autora e a sociedade Ré celebraram novo aditamento ao Contrato, por via do qual prorrogaram o referido prazo de denúncia do Contrato por dois meses, passando a sociedade Ré a poder denunciar o Contrato até ao dia 1 de Dezembro de 2012, produzindo a denúncia os seus efeitos a 31 de Dezembro de 2012 (cfr. cláusula primeira, do Aditamento a fls. 282, e doc. fls. 431, repetido a fls. 508);
· Em 31 de Agosto de 2013, a Autora e a sociedade Ré celebraram um novo aditamento ao Contrato, com vista a permitir à sociedade Ré a alteração da designação comercial pela qual a sociedade Ré actuava no mercado, passando de “Century 21 Fitamétrica 02” para “Century 21 Da Linha” (cfr. cláusula primeira, do Aditamento a fls. 284);
· Em 5 de Novembro de 2013, o Administrador da Autora e a 2ª Ré tiveram uma reunião na qual falaram sobre a cessação do Contrato de Franquia (admissão por acordo – 50º Contestação e 21º réplica);
· Entre 12 de Novembro e 20 de Novembro de 2013, a Autora e a sociedade Ré trocaram correspondência electrónica sobre a cessação por acordo do Contrato que consta dos docs. a fls 432, 434 e 435;
· Por carta registada com aviso de recepção datada de 28 de Novembro de 2013, expedida por advogado da sociedade Ré à Autora, a sociedade Ré procedeu à resolução, com efeitos imediatos, do Contrato, nos termos e com a fundamentação que consta da respectiva cópia a fls. 352 a 354;
· Em 09 de Dezembro de 2013, a sociedade Ré enviou um e-mail à Autora a informar o último relatório dos processos abertos no âmbito do contrato de franquia Century21, bem como que já havia descontinuado o uso da referida marca, e providenciado pela retirada de todos os contactos, imóveis e consultores do sistema Century21 (admissão por acordo – arts. 57º contestação e 12 réplica);
· Por carta registada com aviso de recepção datada de 12 de Dezembro de 2013, expedida pela sociedade Ré à Autora, a fls. 360 e 361, a sociedade Ré ratificou o conteúdo da supra referida carta, na sequência de interpelação para o efeito que lhe foi efectuada pela Autora por carta registada com aviso de recepção datada de 9 de Dezembro de 2013 (cfr. documentos a fls. 355 a 359);
· Após a resolução do contrato, a sociedade Ré passou a usar a marca Remax (confissão – arts. 467º e 475º contestação, aceite no art. 13º da réplica), sendo que, pelo menos, na segunda semana de Dezembro de 2013, o local onde antes a sociedade Ré operava como franquiada da Autora e sob os sinais distintivos de comércio da franquia de mediação imobiliária Century 21, tinha a respectiva sinalética substituída pela da franquia de mediação imobiliária Remax.
· A maquete da loja da sociedade Ré com a referida sinalética tem aposta a data de “02-11-2013” (cfr. fls. 1033 dos autos);
· As partes convencionaram no Contrato, como condição essencial à sua celebração, que o Franquiado se obrigava a, no seu termo, qualquer que fosse o fundamento, a não exercer ou explorar, por si ou por interposta pessoa, por qualquer forma, na localização da Agência, negócios ou actividades concorrentes, devendo entender-se como tal a actividade de mediação imobiliária (cfr. cláusula 11 B. (vii) (a)), a fls.193.);
· Na vigência do Contrato, a sociedade Ré, na pessoa da 2ª Ré e colaboradores, participou em sessões/reuniões de trabalho e cursos de formação (cfr. docs. fls. 286, e 806 a 829), nas reuniões de zona denominadas GOAL (realizadas de 4 em 4 meses e direccionadas para os gestores), nos Team Building (anuais), nas Convenções Anuais da Rede (Janeiro) e no SIL, eventos estes promovidos e organizados pela Autora;
· O consultor da Autora Bruno Torres visitou a agência da sociedade Ré, pelo menos, nove vezes no ano de 2012, e quatro vezes no ano de 2013 (8 de Fevereiro, 12 de Abril, 22 e 28 de Maio), para além de ter tido sete reuniões com a 2ª Ré na sede da Autora e outras quatro reuniões com a colaboradora da sociedade Ré, Dulce Ataíde;
· O software/plataforma informática fornecido pela Autora aos franquiados da Rede Century21 à data da celebração do Contrato, denominado Trans21, foi substituído pelo software /plataforma informática I.NET.C21, que entrou em funcionamento em 5 de Março de 2012 (cfr. doc. fls 446), tendo a sociedade Ré, na pessoa da 2ª Ré, tido acesso à versão de testes a partir de 1 de Fevereiro de 2012 (cfr. docs. a fls. 441 e 447);
· A migração da base de dados que a sociedade Ré detinha na rede Fitamétrica não foi efectuada;
· Os imóveis da sociedade Ré foram, por esta, inseridos, manualmente, no Trans21;
· A exportação dos dados existentes no Trans21 para o I.NET.C21 foi efectuada pela Autora, mas as referências tiveram de ser inseridas manualmente;
· A base de dados FMStereo da marca Fitamétrica esteve disponível para uso pela sociedade Ré, pelo menos, até ao dia 30 de Abril de 2012 (cfr. doc. fls. 468), e as contas de e-mail afectas ao domínio fitamétrica.pt, pelo menos, até ao final de Julho de 2012 (cfr. doc. fls. 504), não tendo sido efectuada a migração dos respectivos dados para o Trans21 ou para o I.NET.C21;
· O detentor e responsável pela conservação da referida base de dados FMStereo é Paulo F., sócio-gerente da Netfran, base de dados essa cuja informação continua disponível para consulta mediante solicitação para o efeito;
· Em 5 de Maio de 2012, a 2ª Ré, na sequência de uma proposta que lhe foi efectuada por Luís Paulos (ex-Fitamétrica) para garantir o alojamento do sistema FMStereo num ISP até ao final desse ano, respondeu que o alojamento só era necessário para acesso remoto, podendo passar-se a base para o servidor e aceder na loja (cfr. doc. fls. 477);
· A plataforma Trans21 não era “user friendly” e os campos de pesquisa existentes tinham limitações atenta a sua matriz francesa;
· O software/plataforma informática I.NET.C21 foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha inicialmente erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora, maioritariamente até Novembro de 2012 e com uma progressividade decrescente, e por esta sucessivamente resolvidos;
· O referido software /plataforma esteve em desenvolvimento e melhoria com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades desde a sua entrada em funcionamento até, pelo menos, à saída da sociedade Ré da rede (cfr. docs. fls. 493, 534, 547), em simultâneo com a disponibilização da plataforma aos franquiados da rede Century21, o que implicou curtos períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização (inoperacionalidade), os quais eram previamente comunicados aos franquiados;
· No ano de 2013, a sociedade Ré reportou à Autora incidentes na plataforma I.NET.C21 e no site Century21 nas seguintes datas:
· 05.01.2013 (Sábado), às 18h, com resposta de resolução a 07.01.2013 (Segunda), 9h56m (cfr. doc. fls.535);
· 17.01.2013, 10h01m (remoção imóvel site), com resposta a 22.01.2013, 17h20m (cfr. doc. fls. 540);
· 19.02.2013, 12h50, com resposta de resolução por update da versão em 21.03.2013, 17h14m (cfr. doc. fls. 537);
· 25.02.2013, 10h20m, com resposta 26.02.2013, 16h17m (cfr. doc. fls. 538);
· 15.03.2013, 16h40m, com resposta de resolução por update da versão em 21.03.2013, 15h06m (cfr. doc. fls. 542v);
· 20.03.2013, 15h30m, (remoção imóvel site), com resposta de resolução 22.03.2013, 9h55m (cfr. doc. fls. 539);
· 12.04.2013, 16h50m, com resposta de resolução 12.04.2013, 18h20m (cfr. doc. fls. 545);
· 22.05.2013, 11h41m (exportação 2 referências sites Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário), com resposta em 27.05.2013, 10h00m (reencaminhamento Dep. Informático) (cfr. doc. fls. 546);
· 26.06.2013, 18h40m, (remoção imóveis site), com resposta de resolução em 28.06.2013, 10h50m (cfr. doc. fls. 549);
· 29.06.2013 (Sábado), 11h30m, com resposta de resolução 02.07.2013, 10h39m (cfr. doc. fls. 550);
· 04.07.2013, 18h04m (falha recepção e-mails por clientes hotmail), com resposta em 05.07.2013, 10h23m (reencaminhamento Dep. Informático), e em 10.07.2013, 18h39m, (erro servidor Hotmail) (cfr. doc. fls. 551 e 551v);
· 10.09.2013, 11h14m, com resposta em 10.09.2013, 18h23m (confirmação erro e reencaminhamento Dep. Informático) (cfr. doc. fls. 552);
· 21.09.2013 (Sábado), 16h27m, (remoção imóvel site), com resposta de resolução 23.09.2013, 12h29m (cfr. doc. fls. 554);
· 17.10.2013, 11h15m, com resposta de reencaminhamento Dep. Informático em data e hora indetermináveis (cfr. doc. fls. 555);
· 31.10.2013, 10h56m (erro site), com resposta de resolução em 1.11.2013, 18h03m (cfr. doc. fls. 557);
· 08.11.2013 (Sexta), 18h20m, com resposta de resolução em 15m em data e hora indetermináveis (cfr. doc. fls. 559).
· No ano de 2013, a Autora comunicou aos franquiados que a plataforma I.NET.C21 estaria inoperacional para actualizações nas seguintes datas:
· 05.02.2013– entre as 18h00m e as 20h00m, tendo-se prolongado até às 11h do dia seguinte (cfr. doc. fls.536);
· 09.04.2013 – entre as 12h40m e as 13h40m (cfr. doc. fls. 544);
· 25/26.05.2013 – upgrade do I.NET (cfr. doc. fls. 547);
· 28.05.2013 - entre as 17h30m e as 18h00m (cfr. doc. fls. 541);
· 04.06.2013 – entre as 13h00 e as 14h00 e entre as 18h07 e as 18h37 (cfr. doc. fls. 541 e 541 v);
· 14.06.2013 – entre as 13h00m e as 13h30m (cfr. doc. fls. 548);
· 19.06.2013 – entre as 13h00m e as 13h30m (cfr. doc. fls. 544v);
· 16.09.2013 – entre as 10h18m e as 11h30m (cfr. doc. fls. 553);
· 28.10.2013 – entre as 13h e as 13h30 (cfr. doc. fls. 526, repetido a fls. 556);
· 11.11.2013 – entre as 13h00 e as 13h30 (cfr. doc. fls. 528, repetido a fls. 560);
· 12.11.2013 – entre as 13h00m e as 13h30m (cfr. doc. fls. 560v).
· O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, podendo existir pontualmente erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas;
· A sociedade Ré usou, pelo menos, até 17 de Maio de 2012, o software de gestão FmStudio, em uso pela Netfran e disponibilizado on-line através de uma aplicação Web, para a emissão de facturas, software que, a partir de 1 de Janeiro de 2012, deixou de cumprir com as obrigações impostas pela Autoridade Tributária no que diz respeito à certificação e assinatura digital, impossibilitando extrair ficheiros SAF-T – (cfr. doc. fls. 485);
· A Autora não disponibilizou à sociedade Ré um software de facturação;
· A Autora investiu em marketing e publicidade no ano de 2011 o montante de € 313.578, no ano de 2012 o montante de € 334.372, e no ano de 2013 o montante de € 238.394 (cfr. docs. de fls. 240 a 260);
· As campanhas foram distribuídas por diversos meios publicitários, incluindo nomeadamente, televisão e outdoors (cidade) (cfr. docs. de fls. 781 a 805);
· A Autora participa anualmente no SIL (Salão Imobiliário de Lisboa), que tem lugar no mês de Outubro, com um stand cuja dimensão é, normalmente, de 108 metros quadrados e em boa localização, feira na qual a Autora organiza sempre um evento para a rede (seminário no auditório multiusos) e cocktails;
· O departamento de marketing da Autora é acompanhado pela Administração, tendo um prazo de 15 dias para responder aos pedidos dos franquiados;
· Nos anos de 2012 e 2013, trabalharam neste Departamento, pelo menos, Ivo Vassalo, Mariana Pinto, substituída temporariamente por Cláudia Lima por licença de parto, e, posteriormente, por Mário Xavier;
· O orçamento e planeamento do marketing é feito anualmente, sendo comunicado aos franquiados na Convenção do início do ano e colocado na intranet;
· Em meados de 2012, a Autora contratou a agência de meios denominada Media Gate – Agência de Comunicação e Media, SA, que tem por Director Paulo Santos, com a função de criar instrumentos de comunicação da marca aos consumidores (consumidor final, proprietários de imóveis e agências), utilizando estatísticas e estabelecendo estratégias de comunicação, adquirindo espaços nos media, com um orçamento anual que, em média, varia entre os montantes de € 140.000 e € 300.000 líquidos;
· No final de cada campanha é feita a monitorização dos resultados, tendo a marca Century21 uma notoriedade de 98,5% (7.400 portugueses que durante o ano ouviram falar 42 vezes na marca Century21), não sendo possível fazer idênticos estudo de mercado em relação às agências por os estudos da Marktest não o permitirem;
· Para além do budget gerido por esta empresa, a Autora contrata directamente meios com o grupo Impresa, o jornal Público e, às vezes, em caixas multibanco;
· A Autora propôs aos franquiados a aquisição de um pacote de exportação de imóveis para alguns Portais na área do imobiliário pelo preço anual de 295,00 €, acrescido de IVA (cfr. Doc. fls 445 e 489 verso);
· Por duas vezes (3 de Fevereiro e 29 de Março de 2012 – cfr. docs. a fls. 442 e 460, os imóveis da rede Century 21 deixaram de estar visíveis no Portal Lar Doce Lar;
· Em 10 de Fevereiro de 2012, a Autora, na pessoa de Cláudia Lima, enviou à 2ª Ré uma imagem utilizada pela marca para uma campanha referente a “imóveis com financiamento a 100%”, uma vez que a sociedade Ré pretendia que fossem produzidas lonas alusivas aos imóveis com 100% de financiamento, as quais, por motivos não apurados, em 2 de Março de 2012 não estavam executadas (cfr. doc. fls. 578);
· Os Porta Folhetos Century21 A5 produzidos pela gráfica “Ondagrafe” encontravam-se produzidos em, pelo menos, 14 de Outubro de 2013 (cfr. doc. fls. 581);
· A agência da Century21 do Algarve, denominada “Reality Art”, anunciou no Facebook, uma campanha de angariação de imóveis em regime aberto a ter lugar no período compreendido entre Outubro a Dezembro de 2013, na qual dava a oportunidade aos seus clientes de desistir de um contrato em regime de exclusividade nos primeiros trinta dias após a sua celebração, campanha esta para a qual não foi solicitada autorização à Autora, tendo esta, após o seu conhecimento, enviado uma carta à dita agência com vista ao cancelamento da campanha;
· Numa reunião na qual, entre outros, estiveram presentes o responsável desta agência, de nome Paulo Silva, e a 2ª Ré, ocorrida antes da campanha mas em data não concretamente apurada, foi, entre outros assuntos, abordada a possibilidade de realização desta campanha, tendo a 2ª Ré manifestado a sua oposição;
· No período de 2010, o volume de negócios da sociedade Ré foi de 437.171,94 € (quatrocentos e trinta e sete mil, cento e setenta e um euros e noventa e quatro cêntimos), com um rendimento total no período de 461.672,94 € (quatrocentos e sessenta e um mil, seiscentos e setenta e dois euros e noventa e quatro cêntimos) (cfr. doc. a fls. 601 a 606);
· No período de 2011, o volume de negócios da sociedade Ré foi de 230.813,92 € (duzentos e trinta mil, oitocentos e treze euros e noventa e dois cêntimos), com um rendimento total no período de 230.845,32 € (duzentos e trinta mil, oitocentos e quarenta e cinco euros e trinta e dois cêntimos) (cfr. docs. a fls. 287 a 291 e 607 a 611);
· No período de 2012, o volume de negócios da sociedade Ré foi de 297.933,81 € (duzentos e noventa e sete mil, novecentos e trinta e três euros e oitenta e um cêntimos) (cfr. doc. a fls. 292 a 321);
· No período de 2013, o volume de negócios da sociedade Ré foi de 794.533,94 € (setecentos e noventa e quatro mil, quinhentos e trinta e três euros e noventa e quatro cêntimos) (cfr. doc. a fls. 322 a 351);
· A sociedade comercial “P.R...- Urbanizações e Construções, S.A.” é, desde 2008, cliente da sociedade Ré;
· Esta sociedade foi, entre outros, a construtora de dois empreendimentos, denominados um V.M. e o outro T.M.;
· O empreendimento V.M. ... foi entregue à sociedade Ré para comercialização em Dezembro de 2011 (cfr. fls. 652 a 686);
· O empreendimento T.M., sito em ..., foi entregue à sociedade Ré para comercialização a partir de Janeiro de 2013, com a concordância do credor hipotecário BBVA para a qual contribuiu a Autora, na pessoa de Manuel R. (cfr. doc. fls. 1109), estando anteriormente entregue à agência Remax Cidadela;
· A Autora promoveu a entrega à sociedade Ré de 13 imóveis da Banca para comercialização nos anos de 2012 e 2013, sendo quatro imóveis da carteira da CGD, três imóveis da carteira do BES e seis imóveis da carteira do Millennium BCP (cfr. docs. de fls. 1111 a 1122);
· A partir de 2011, a Autora, na pessoa do seu colaborador Manuel R., encetou contactos com Bancos com vista a estabelecer parcerias para comercialização em exclusivo de imóveis que aqueles tivessem em carteira;
· A partir de 2012, a Autora decidiu que este tipo de produto só poderia ser comercializado pelas agências franquiadas que fizessem uma formação específica para o efeito, denominada “Certificação de Especialistas em Imóveis de Desinvestimento”, que a 2ª Ré frequentou em 14/15 de Fevereiro de 2012 (cfr. Doc. a fls. 828 e 829) e o colaborador da sociedade Ré, Paulo Antunes, frequentou em 4 de Abril de 2013 (cfr. doc. fls. 286);
· O Franchising da marca Century21 tem obtido bons lugares no concurso anual efectuado pela “Revista Negócios & Franchising” (admissão por acordo – arts. 365º contestação e 12 réplica);
· Nos anos de 2012/2013, a Rede Century21 em Portugal integrava cerca de 70 lojas;
· A sociedade Ré pagou à AUTORA, durante a execução do contrato, os seguintes royalties:
FA       2012    204      2012-02-06     € 1 000,00      ROY 01 2012
FA       2012    400      2012-03-05     € 1 000,00      ROY 02 2012
FA       2012    538      2012-04-05     € 1 000,00      ROY 03 2012
FA       2012    694      2012-05-07     € 1 000,00      ROY 04 2012
FA       2012C 844      2012-06-05     € 1 113,30      ROY 05 2012
FA       2012C 1 011   2012-07-06     € 1 204,50      ROY 06 2012
FA       2012C 1 167   2012-08-06     € 1 443,90      ROY 07 2012
FA       2012C 1 385   2012-09-06     € 1 368,24      ROY 08 2012
FA       2012C 1 554   2012-10-09     € 1 345,26      ROY 09 2012
FA       2012C 1 711   2012-11-07     € 1 986,25      ROY 10 2012
FA       2012C 1 951   2012-12-06     € 2 448,75      ROY 11 2012
FA       2013C 99        2013-01-08     € 6 980,70      ROY 12 2012
NC      2013C 1          2013-01-08     -€ 114,45        ROY 12 2012
FA       2013C 239      2013-02-14     € 1 144,95      ROY 01 2013
FA       2013C 366      2013-03-06     € 1 823,25      ROY 02 2013
FA       2013C 532      2013-04-08     € 2 132,78      ROY 03 2013
FA       2013C 630      2013-04-30     € 240,00         ROY 03 2013
FA       2013C 662      2013-05-08     € 2 013,75      ROY 04 2013
FA       2013C 779      2013-06-06     € 4 951,50      ROY 05 2013
FA       2013C 906      2013-07-08     € 3 259,50      ROY 06 2013
FA       2013C 1 052   2013-08-06     € 7 638,75      ROY 07 2013
FA       2013C 1 167   2013-09-06     € 5 977,33      ROY 08 2013
FA       2013C 1 304   2013-10-08     € 2 984,25      ROY 09 2013
FA       2013C 1 482   2013-11-06     € 2 530,00      ROY 10 2013
FA       2013C 1 688   2013-12-10     € 3 320,63      ROY 11 2013
Total    € 59 793,14   
Media mensal (€59.793,14 / 23 meses)          € 2 599,70     
· A sociedade Ré pagou à Autora, durante a execução do contrato, as seguintes contribuições para o Fundo Nacional de Publicidade (FNP):
FNP002   FA   2012    369     2012-03-05    € 500,00 FNP 02 2012
FNP002   FA   2012    539     2012-04-05    € 500,00 FNP 03 2012
FNP002   FA   2012    695     2012-05-07    € 500,00 FNP 04 2012
FNP003   FA   2012C 845    2012-06-05    € 556,65   FNP 05 2012
FNP003   FA   2012C 1 062  2012-07-06    € 602,25 FNP 06 2012
FNP003   FA   2012C 1 217  2012-08-07    € 721,95   FNP 07 2012
FNP003   FA   2012C 1 386  2012-09-06    € 684,12   FNP 08 2012
FNP003   FA   2012C 1 555  2012-10-09    € 672,63   FNP 09 2012
FNP003   FA   2012C 1 712  2012-11-07    € 993,13 FNP 10 2012
FNP003   FA   2012C 1 952  2012-12-06    € 1 224,38 FNP 11 2012
FNP003   FA   2013C 100   2013-01-08  € 3 490,35 FNP 12 2012
FNP003   FA   2013C 240      2013-02-14   € 572,48  FNP 01 2013
FNP003   FA   2013C 367     2013-03-06    € 911,63    FNP 02 2013
FNP003   FA   2013C 533     2013-04-08    € 1 066,39 FNP 03 2013
FNP003   FA   2013C 629     2013-04-30    € 120,00    FNP 03 2013
FNP003   FA   2013C 663    2013-05-08    € 1 006,88 FNP 04 2013
FNP003   FA   2013C 780    2013-06-06   € 2 475,75 FNP 05 2013
FNP003   NC  2013C 32     2013-06-06   -€ 475,75   FNP 05 2013
FNP003   FA   2013C 907      2013-07-08    € 1 629,75 FNP 06 2013
FNP003   FA   2013C 1 053  2013-08-06    € 2 000,00 FNP 07 2013
FNP003   FA   2013C 1 168  2013-09-06  € 2 000,00 FNP 08 2013
FNP003   FA   2013C 1 305  2013-10-08  € 1 557,00 FNP 09 2013
FNP003   FA   2013C 1 483 2013-11-06   € 1 320,00 FNP 10 2013
FNP003   FA   2013C 1 689  2013-12-10   € 1 732,50 FNP 11 2013
Total    € 26 362,09   
Média Mensal (€26.362,09 / 22)        € 1 198,28     

***
III- Fundamentos de Direito:
Como é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.
Em causa estão dois recursos. Compulsadas as conclusões de cada um deles, cumpre apreciar:
Apelação da A.:
· Da cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do contrato de franquia.
Apelação dos RR.:
· Da impugnação da matéria de facto;
· Da justa causa de resolução;
· Do montante indemnizatório.
Por evidentes razões de ordem lógica, começaremos pela apreciação do recurso dos RR..

        A) Apelação dos RR.:
        - Da impugnação da matéria de facto:
Os RR./apelantes impugnam no seu recurso a matéria de facto.
Requerem a alteração dos pontos II, NN, JJ, KK, LL, MM, NN, R e S, e o aditamento dos novos pontos KK-A, NN-A, NN-B. Invocam, para tanto, vários documentos juntos aos autos e o confronto entre os factos provados.
A A./apelada sustenta, por seu turno, a versão acolhida na sentença.
A Lei de Arbitragem Voluntária (LAV) aprovada pela Lei nº 63/2011, de 14.12 (que entrou em vigor em 14.3.2012), estabelece no nº 1 do art. 39 que: “Os árbitros julgam segundo o direito constituído, a menos que as partes determinem, por acordo, que julguem segundo a equidade”. De resto, a sentença arbitral só será recorrível se as partes nisso tiverem acordado e desde que a causa não tenha sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável (nº 4 do aludido art. 39 da LAV).
No caso, as partes acordaram que em caso de litígio este seria decidido por Tribunal Arbitral, constando da convenção de arbitragem, designadamente, que “O processo correrá perante o Tribunal Arbitral de acordo com o Regulamento do Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa / Associação Comercial de Lisboa e da Associação Comercial do Porto / Câmara de Comércio e Indústria do Porto e, supletivamente, de acordo com as normas do Código de Processo Civil” e que “Das decisões do Tribunal Arbitral, que são tomadas sempre por maioria, cabe delas recurso em última instância para o Tribunal da Relação de Lisboa” (Cláus. 25.B, als. viii) e xi), do “Contrato de Franquia”, datado de 1.11.2011, a fls. 173 e ss.).
Do que se deixa dito resulta que decisão arbitral foi proferida segundo o direito constituído, sendo a essa luz que deve analisar-se o processo e o recurso agora interposto.
Feito este esclarecimento, vejamos, então, o que dizer da impugnação da matéria de facto.
De acordo com o princípio consagrado no art. 607, nº 5, do C.P.C. de 2013, o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que haja firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada. As provas são assim valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização nem preocupação do julgador quanto à natureza de qualquer delas.
Os poderes do tribunal da Relação de alteração da decisão de 1ª instância sobre a matéria de facto foram, por seu turno, largamente ampliados e reforçados pelo C.P.C. de 2013, como decorre do seu atual art. 662, no confronto com o anterior art. 712 do C.P.C. 1961.
No entanto e ao mesmo tempo, a impugnação da decisão relativa à matéria de facto obedece a determinadas exigências que surgem agora mais precisas que no anterior C.P.C. de 1961 e cuja observância não pode deixar de ser apreciada à luz de um critério de rigor().
Assim, de acordo com o atual art. 640, nº 1, do C.P.C.: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios, incumbe ainda ao recorrente “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (art. 640, nº 2, al. a)).
Finalmente, tais regras terão de compaginar-se com aquela outra já indicada de que as conclusões delimitam o âmbito do recurso (art. 635, nº 4).
Assim, e em síntese, ao recorrente que impugne a matéria de facto caberá indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (aos quais deve aludir na motivação do recurso e sintetizar nas conclusões), especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que, em seu entender, impunham decisão diversa quanto a cada um desses factos e propor, ainda, a decisão alternativa sobre cada um deles. A não observância de tais regras implicará a rejeição imediata do recurso.
O primeiro aspeto a realçar, desde logo, é que os apelantes não dão rigoroso cumprimento ao disposto nas disposições citadas, nem sempre deixando claro qual a decisão alternativa proposta, como resulta das conclusões do seu recurso acima transcritas, o que bastaria para, ao abrigo do referido art. 640 do C.P.C., rejeitar o recurso na parte correspondente.
Mas, para além deste, um outro argumento obsta, no caso, à alteração da matéria de facto, posto que, tendo sido ouvidas testemunhas em audiência, não resulta dos autos que tais depoimentos tenham sido registados ou gravados. Afirma, de resto, expressamente a A./recorrida em contra-alegações que as partes “não requereram a gravação da prova, nem colocaram à disposição do Tribunal os meios para tal”.
Tal circunstância inviabiliza, irremediavelmente, a reapreciação dessa prova testemunhal.
Ora, a Relação não pode estar limitada à reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes, como resulta dos arts. 640, nº 1, e 413 do C.P.C., pelo que, não sendo possível sindicar toda a prova, designadamente a prova testemunhal que foi tida em conta na decisão, sempre será a mesma inalterável.
E não se diga que os depoimentos prestados em audiência são, no caso, irrelevantes (como parecem entender os RR./apelantes) posto que na sentença se afirma em geral, para justificar a convicção do Tribunal Arbitral, que foram tidos em conta os documentos juntos aos autos e os depoimentos das testemunhas inquiridas em julgamento (cfr. fls. 1228) e ainda que: “Atentou-se cuidadosamente aos termos do Contrato celebrado, tanto mais que foi remetido aos Réus para análise, tendo estes tido tempo de o analisar e propor alterações, como resulta do Aditamento celebrado na mesma data.
Atentou-se igualmente ao clausulado pelas partes nos 3 Aditamentos que efectuaram ao Contrato, bem como foram devidamente examinados e ponderados, em conjugação com a prova testemunhal efectuada, todos os documentos juntos aos autos pelas partes.
Através da conjugação destes meios de prova, e tendo em atenção as regras do ónus da prova e do demais direito probatório, com especial relevância para o disposto no art. 394º, do Código Civil, na interpretação dominante, resultou a prova dos factos assim declarados (tendo-se referido, para melhor compreensão, nos factos julgados provados, quando aplicável, os documentos tidos por relevantes para o efeito), e a ausência de prova dos demais factos alegados pelas partes.” (sublinhado nosso).
Na verdade, o que está em causa é a possibilidade que o tribunal de recurso tem de aceder aos mesmos meios de prova que ajudaram a formar a convicção sindicada.
Sem perder de vista esta inevitável perspetiva, vejamos, todavia, se algum dos reparos dos apelantes se justifica por decorrer, exclusivamente, de contradição entre os factos provados, como se menciona, ou dos documentos juntos aos autos.
Pontos II, NN, JJ, KK, LL e MM
“A plataforma Trans21 não era “user friendly” e os campos de pesquisa existentes tinham limitações atenta a sua matriz francesa” (II)
“O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, podendo existir pontualmente erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas” (NN)
“O software/plataforma informática I.NET.C21 foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha inicialmente erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora, maioritariamente até Novembro de 2012 e com uma progressividade decrescente, e por esta sucessivamente resolvidos” (JJ)
“O referido software /plataforma esteve em desenvolvimento e melhoria com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades desde a sua entrada em funcionamento até, pelo menos, à saída da sociedade Ré da rede (cfr. docs. fls. 493, 534, 547), em simultâneo com a disponibilização da plataforma aos franquiados da rede Century21, o que implicou curtos períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização (inoperacionalidade), os quais eram previamente comunicados aos franquiados” (KK)
“No ano de 2013, a sociedade Ré reportou à Autora incidentes na plataforma I.NET.C21 e no site Century21 nas seguintes datas: (….)” (LL)
“No ano de 2013, a Autora comunicou aos franquiados que a plataforma I.NET.C21 estaria inoperacional para actualizações nas seguintes datas: (…).” (MM)
Invocam os RR./apelantes que o texto destes pontos sugere que a A./apelada resolveu todos os problemas informáticos que lhe foram apresentados e que tal não teria gerado qualquer dano, o que não corresponde à realidade, como resulta dos documentos juntos aos autos e do confronto entre tais factos.
Propõe redação alternativa aos pontos NN, JJ e KK e o aditamento dos novos pontos KK-A, NN-A, NN-B.
Desde logo, porque os apelantes nenhuma resposta propuseram para os pontos II, LL e MM seriam sempre estes de manter, ainda que este Tribunal pudesse socorrer-se de todos os meios de prova em que se fundou o Tribunal Arbitral.
Ainda assim, verificamos que não existe, entre os factos indicados, a incoerência assinalada pelos recorrentes, designadamente quanto aos pontos JJ, LL e MM.
Na verdade, se o ponto JJ se refere a erros de funcionamento no software/plataforma informática I.NET.C21 reportados pela sociedade Ré à A. desde 2012 (“erros que foram reportados pela sociedade Ré à Autora, maioritariamente até Novembro de 2012 e com uma progressividade decrescente, e por esta sucessivamente resolvidos”), não se vê que a evolução aí referida se encontre contrariada nos pontos LL e MM onde se alude apenas a incidentes ocorridos em 2013, sejam os reportados pela Ré (quanto à plataforma I.NET.C21 e ao site Century21), sejam os avisos antecipados feitos pela A. sobre a previsível inoperacionalidade da plataforma I.NET.C21 com vista a atualizações.
Acresce que a circunstância de certos erros de funcionamento descritos no ponto LL não mencionarem a resposta de resolução não significa, forçosamente, que essa resolução não tenha efetivamente acontecido.
Por fim, e segundo resulta da motivação da resposta à matéria de facto na decisão arbitral, várias testemunhas terão sido ouvidas sobre os problemas do aludido sistema informático da A. – como as testemunhas Bruno T.,  ou Margarida S. – não estando em causa matéria que só por documento possa provar-se.
Aliás, mencionou-se expressamente, como acima transcrevemos, na motivação da resposta à matéria de facto que “foram devidamente examinados e ponderados, em conjugação com a prova testemunhal efectuada, todos os documentos juntos aos autos pelas partes”, o que vale por dizer que os documentos foram valorados no contexto da prova testemunhal.
Também no que respeita ao ponto KK não se vislumbra a respetiva contradição com os pontos LL e MM, como invocam os RR./apelantes.
Desde logo porque os “curtos períodos de indisponibilidade de acesso” que ali se referem são apenas os referidos no ponto MM, necessários para atualização de software, num total de 11 entre 5.2.2013 e 12.11.2013, com períodos de duração de cerca de meia ou uma hora cada, e dois únicos períodos de duração superior a duas horas (parte em período noturno), num dos casos (25/26.5.2013) abrangendo um sábado e um domingo.
Depois porque no ponto KK se refere que o referido software/plataforma esteve em desenvolvimento e melhoria não se afirmando ali que todos os problemas ficaram imediatamente resolvidos. Uma vez mais, para concluir que haveria contradição entre esses factos e que não houve, afinal, desenvolvimento ou melhoria do sistema desde a sua implementação, como se propõe, seria necessário comparar com dados anteriores a 2013 que não constam dos ditos pontos LL e MM.
Acresce que, uma vez mais, não se trata de matéria que só por documento possa provar-se.
Quanto ao ponto NN, insurgem-se os RR./apelantes quanto à referência a erros pontuais de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas, uma vez que resulta dos docs. de fls.  442, 460, 505 e 546, segundo dizem, que existiram problemas de articulação em 3.2.2012, 29.3.2012,  9.7.2012 e 22.5.2013, respetivamente.
Muito embora não corresponda à melhor técnica o uso, reportado à factualidade provada, de adjetivos ou advérbios, não cremos que, no caso, possa considerar-se que a verificação assinalada pelos RR./apelantes de episódios de falta de articulação entre as ditas plataformas informáticas por quatro vezes no período de mais de um ano, resulte desajustada na redação do ponto NN – “O I.NET.C21 permitia a exportação directa dos imóveis, pelo menos, para o portal Imovirtual e para os portais Lar Doce Lar e BPI Expresso Imobiliário, este último detido pelo Grupo Impresa, podendo existir pontualmente erros de articulação entre as plataformas informáticas envolvidas” (NN) (sublinhado nosso). Isto é, a redação do ponto NN é compatível com a existência de quatro episódios de erro reportados no indicado espaço de tempo, sempre sem prejuízo, já se vê, de estarmos perante matéria cuja prova não se faz apenas por documento.
São, assim, de manter, pelos motivos indicados, os Pontos II, NN, JJ, KK, LL e MM supra.
        Ponto KK-A
Pretendem os RR./apelantes ver aditado à matéria de facto um ponto KK-A com a seguinte redação: “O software I.NET.C21 apresentou vários problemas e deficiências no seu funcionamento, manifestadas por uma série de 85 (oitenta e cinco) ocorrências entre 02.02.2012 e 11.11.2013, as quais: [reprodução dos pontos 1. a 85. supra].”
Descrevem, no ponto proposto, 85 episódios que, no seu entender, tiveram lugar por deficiência do software e que dizem estar patenteados nos documentos que indicam a propósito de cada caso.
Constatamos, em primeiro lugar, que os recorrentes justificam a respetiva prova com documentos por si juntos com a contestação os quais, no essencial, a A. impugnou na resposta (ver artigos 15º a 18º desse articulado de resposta - fls. 765/766).
Por outro lado, e de novo, está em causa matéria cuja prova não se faz apenas por documento, não podendo este tribunal aceder à prova produzida em audiência.
Acresce que parte dos 85 episódios descritos já consta do ponto LL ou do ponto MM, e 58 dos enunciados reportam-se a um período compreendido entre 2.2.2012 e 29.11.2012, logo, de pouca relevância para a decisão sobre a justa causa de resolução do contrato de franquia, posto que se provou terem a A. e a Sociedade Ré acordado, em aditamento de 18.7.2012, que a mesma Ré poderia denunciar, sem qualquer penalização, o dito contrato até 1.12.2012, produzindo a denúncia efeitos a 31.12.2012 (cfr. pontos N a P supra).
Finalmente, os pontos BB, II e JJ a PP mencionam já, de forma suficiente, o funcionamento do sistema informático.
Indefere-se, pois, o aditamento do Ponto KK-A.
          Ponto NN-A
Pretendem os apelantes ver ainda aditado o seguinte facto NN-A: “A A. sabia que o sistema informático I.NET.C21 por si fornecido aos RR. não cumpria os requisitos mínimos exigidos/prometidos aquando da assinatura do contrato de franquia a 1 de Novembro de 2011 (cfr. docs. fls. 508 e 508v)”
Invocam, para tanto, o teor do doc. de fls. 508 e 508v (troca de emails).
Aproveita aqui toda a argumentação acima exposta.
Para além de estarmos, uma vez mais, perante um documento apresentado pelos RR. com a contestação (doc. 70) que a A. impugnou na resposta, não está aqui sequer em causa a reprodução do respetivo teor mas uma interpretação que os RR. dele fazem.
Como é evidente, e pelas razões já sobejamente referidas, está este Tribunal impedido de aceder a todos os meios probatórios que fundaram a convicção do Tribunal Arbitral, não podendo avaliar os documentos no contexto da prova testemunhal, como seria mister.
Indefere-se, também, o aditamento do Ponto NN-A.
            Ponto NN-B
Pretendem os apelantes ver ainda aditado o seguinte facto NN-B: “No ano de 2013, ano da resolução do contrato pelos Réus, verificaram-se diversas reclamações por parte dos Réus, correspondentes a 16 (dezasseis) erros no funcionamento do software I.NET.C21, sendo que destas reclamações, pelo menos 9 não tiveram resposta de resolução”
Aludem os apelantes a vários documentos por si juntos com a contestação dos quais não consta, segundo mencionam, a indicação de resolução ou resulta que houve uma resposta tardia.
São, de novo, documentos que a A. impugnou na resposta à dita contestação e não se trata, uma vez mais, de reproduzir o teor dos mesmos mas de uma interpretação que os RR./apelantes deles fazem.
Contudo, e para além de quanto acima deixamos dito e aqui reiteramos sobre a reavaliação dos meios probatórios, sempre se dirá que a circunstância desses documentos não conterem a indicação de resolução não significa que os problemas informáticos reportados não tenham tido resposta e não tenham sido efetivamente resolvidos.
Indefere-se, igualmente, o aditamento do Ponto NN-A.
            Pontos R e S
Pretendem os apelantes que o teor dos pontos R e S não reflete a realidade dos documentos juntos aos autos, devendo ser substituídos por transcrições desses mesmos documentos de fls. 432, 433, 434 e 435.
Ora, deu-se como provado:
“Em 5 de Novembro de 2013, o Administrador da Autora e a 2ª Ré tiveram uma reunião na qual falaram sobre a cessação do Contrato de Franquia (admissão por acordo – 50º Contestação e 21º réplica)” (R)
“Entre 12 de Novembro e 20 de Novembro de 2013, a Autora e a sociedade Ré trocaram correspondência electrónica sobre a cessação por acordo do Contrato que consta dos docs. a fls 432, 434 e 435” (S)
Não se entende, em rigor, a pretensão dos RR./apelantes.
O Ponto R respeita, como no mesmo expressamente se menciona, a facto admitido por acordo das partes e não justificado por qualquer documento apresentado.
Quanto ao ponto S limita-se a remeter para o teor dos ditos documentos, o que significa que os dá por reproduzidos para todos os efeitos, não dispensando, naturalmente, a sua leitura no contexto dos factos assentes quando tal se mostre necessário à decisão do pleito.
São de manter, por isso, os Pontos R e S supra.
Em conclusão, uma vez que este Tribunal da Relação não pode aceder a todos os meios de prova considerados pelo Tribunal Arbitral (dado que não há registo dos depoimentos prestados em audiência), sempre seria de rejeitar o recurso quanto à decisão da matéria de facto, cumprindo salientar, por outro lado, que não se verificam as invocadas contradições entre os factos assentes.
Deve, por isso, manter-se inalterada a factualidade fixada pelo Tribunal Arbitral, improcedendo o recurso dos RR./apelantes nesta parte.

  - Da justa causa de resolução:
Aqui chegados, passemos à subsunção jurídica.
Defendem os RR./apelantes, em síntese, que o Tribunal Arbitral não teve em conta o interesse da Sociedade Ré na celebração do contrato de franquia e, designadamente, na manutenção das condições técnicas de que esta já dispunha no âmbito do contrato de franquia anterior estabelecido com a Net..., Lda, (cuja posição contratual a A. assumiu em 17.10.2011) na rede Fitamétrica. Referem que tal constituiu condição fundamental para a celebração do contrato com a A., como decorre do aditamento de fls. 276, e que a migração de dados da referida Fitamétrica para a rede Century21 competia à A. de acordo com a claus. 11.B, al. xii), e cláus. 6.G, al. ii), sendo que era esta a detentora, legal e física, dessa base de dados.
Afirmam que o incumprimento pela A. dessa obrigação de garantir a migração automática dos dados por parte da Sociedade Ré foi a causa necessária de graves limitações na actividade desta última, que se viu obrigada a afectar pessoal a inserir, manualmente, esses dados (Pontos DD e EE), primeiro na plataforma informática Trans21, e mais tarde na plataforma informática I.NET.C21, tarefa que implicou várias horas de trabalho, causando-lhe sérios prejuízos.
Mais referem que os erros e deficiências do software verificados, pela sua natureza e frequência, se revestem de uma enorme gravidade no âmbito de uma atividade comercial como a mediação imobiliária, constituindo violação pela A., reiterada e com culpa, das obrigações que lhe incumbiam, nos termos das cláus. 6.G, al. ii), e 6.A do Contrato de Franquia.
Concluem que tais circunstâncias tornaram inexigível a manutenção do vínculo contratual, constituindo justa causa de resolução por parte da Sociedade Ré, com dispensa de qualquer interpelação admonitória à contraparte, contra o que se entendeu na decisão recorrida. Mais referem que deve ainda atentar-se no teor dos emails trocados entre as partes que antecedeu a remessa da carta de resolução (Ponto S) e que, segundo dizem, ilustra que a relação contratual era insustentável, havendo interesse mútuo em revogá-la com uma contrapartida que nada teria que ver com a cláusula penal estipulada no contrato.
Em contra-alegações, a A./apelada sustenta o acerto da decisão na parte impugnada, salientando que a Ré poderia ter denunciado livremente o contrato até 31.12.2012.
Vejamos.
Em causa está um contrato de franquia celebrado entre a A. e os RR. em 1.11.2011, com um aditamento na mesma data, outro em 18.7.2012 e ainda um outro em 31.8.2013 (Pontos F a H e N a Q supra), a que a Sociedade Ré veio pôr termo em 28.11.2013, elencando motivos que, no seu entender, comprometiam o equilíbrio contratual, para o que invocou as alíneas a) e b) do art. 30 do DL nº 178/86, de 3.7, nos termos que melhor constam de fls. 352/353. Funda-se a presente demanda na invocada ilicitude desse procedimento da Ré, ilicitude que o Tribunal Arbitral confirmou na decisão sob recurso analisando, ponto por ponto, cada um dos fundamentos invocados pela Sociedade Ré na referida carta de resolução de 28.11.2013.
Trata-se, naturalmente, de apurar aqui se os factos indicados pelos RR./apelantes constituem ou não justa causa de resolução do contrato, nenhuma dúvida havendo de que este se rege pela lei portuguesa, conforme foi estipulado (cfr. cláusula 25.A do contrato de franquia).
Como se refere no Ac. do STJ de 11.7.2013(), também citado na decisão recorrida, o contrato de franquia (franchising) não se encontra regulamentado de forma expressa na lei, correspondendo a um contrato atípico que se rege pelas normas do Código Civil que consagrem regras gerais e pelas disposições reguladoras dos contratos nominados com as quais apresente maior afinidade, designadamente o contrato de agência. Define-se no dito aresto, citando-se António Pinto Monteiro (“Contratos de Distribuição”),  “o «franchising» como o contrato, pelo qual alguém (franquiador) autoriza e possibilita que outrem (franquiado), mediante contrapartidas, actue comercialmente, (produzindo e/ou vendendo produtos ou serviços), de modo estável, com a fórmula de sucesso do primeiro (sinais distintivos, conhecimentos, assistência…) e surja aos olhos do público com a sua imagem empresarial, obrigando-se o segundo a actuar nestes termos, a respeitar as indicações que lhe forem sendo dadas e a aceitar o controlo e fiscalização a que for sujeito.”
No que respeita às causas de cessação do contrato de franquia aplicar-se-ão assim, por analogia, as formas de cessação consagradas a respeito do contrato de agência().
Refere o art. 30 do DL nº 178/86, de 3.7 (com as alterações introduzidas pelo DL nº 118/93, de 13.4), diploma que estabelece o regime jurídico do contrato de agência, sob a epígrafe “Resolução”, que: “O contrato de agência pode ser resolvido por qualquer das partes:
a) Se a outra parte faltar ao cumprimento das suas obrigações, quando, pela sua gravidade ou reiteração, não seja exigível a subsistência do vínculo contratual;
b) Se ocorrerem circunstâncias que tornem impossível ou prejudiquem gravemente a realização do fim contratual, em termos de não ser exigível que o contrato se mantenha até expirar o prazo convencionado ou imposto em caso de denúncia.”
Na sua carta de resolução, a Sociedade Ré invoca, como dissemos, as duas als. a) e b) do mencionado art. 30, mas, uma vez que apenas alude ao incumprimento do contrato por parte da A., pretenderia reportar-se apenas à primeira, pois a al. b) respeita a um fundamento objetivo, baseado em circunstâncias alheias aos outorgantes, a “uma situação de «justa causa», não por força de qualquer violação dos deveres contratuais, mas por força de circunstâncias não imputáveis a qualquer das partes, que impossibilitem ou comprometam gravemente a realização do escopo visado. (…).”()
A al. a) do art. 30 do DL nº 178/86 remete-nos, assim, para uma noção de justa causa de resolução fundada no incumprimento contratual.
No entanto, como refere o autor que vimos citando a propósito desta al. a) do art. 30 do DL nº 178/86, “não é qualquer situação de não cumprimento, tout court, de uma ou mais obrigações, que legitima a outra parte, ipso facto, a resolver o contrato (sem prejuízo, contudo, da indemnização que ao caso couber, pelos danos daí resultantes). A lei exige que a falta de cumprimento assuma especial importância, quer pela sua gravidade (em função da própria natureza da infracção, das circunstâncias de que se rodeia, ou da perda de confiança que justificadamente cria na contraparte, por ex.), quer pelo seu carácter reiterado, sendo essencial que, por via disso, não seja de exigir à outra parte a subsistência do vínculo contratual. (…).”()
No geral, a justa causa para a resolução do contrato, enquanto conceito indeterminado cujo conteúdo pode ser livremente apreciado pelo tribunal, deve entender-se como toda a circunstância que torne contrário aos interesses de uma das partes o prosseguimento da relação jurídica, ou, como afirma Baptista Machado(), “qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual, todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim (...)”.
Em suma, a justa causa baseada no incumprimento contratual terá de corresponder a um comportamento da outra parte violador dos deveres acordados que torne intolerável e inexigível ao contraente cumpridor a manutenção da relação contratual.
Revertendo para a situação em análise, invocam os RR./apelantes no recurso o incumprimento pela A. da obrigação de garantir a migração automática dos dados e os graves erros e deficiências verificados no software, concluindo que se trata, em ambos os casos, contra o entendido no acordão recorrido, de violação pela A. das obrigações que lhe incumbiam e que tornaram inexigível a manutenção do vínculo contratual, constituindo justa causa de resolução.
Quanto ao primeiro, afirmou-se no Acordão Arbitral: “a) Migração da base de dados que a sociedade Ré possuía enquanto franquiada da “Fita Métrica”:
Alega a sociedade Ré na comunicação em questão e, de forma desenvolvida, na sua contestação, que a Autora não cumpriu com a obrigação de proceder à migração da base de dados que detinha na rede “Fitamétrica”.
É facto assente que não foi efectuada a migração da referida base de dados, pelo que a questão a equacionar é se a Autora tinha esta obrigação contratual.
Ora, não se provou que a Autora tivesse contratualmente a obrigação de efectuar a migração da base de dados que a sociedade Ré detinha na rede “Fitamétrica”.
É, ao invés, admissível o entendimento que essa obrigação era da sociedade Ré.
Na verdade, o que resulta a este respeito contratado entre as partes é o que consta nas als. c) e d), da Cláusula Quarta, do Primeiro Aditamento ao Contrato celebrado na mesma data do Contrato (cfr. documento de fls. 276 a fls. 280), referido no seu conjunto a obrigações do franquiado, a saber, “Até Julho de 2012 utilização do CRM Fitamétrica com exportação automática para o site century21.pt” e “Até 30 de Abril de 2012 serão integralmente exportados para o site century21.pt, a base de dados de imóveis existentes no CRM Fitamétrica”.
Mais, da factualidade assente resulta que, por não ter existido migração, a sociedade Ré inseriu manualmente na plataforma informática inicialmente facultada pela Autora, denominada Trans21, manualmente os imóveis da sua carteira, posteriormente exportados pela Autora para a plataforma que lhe sucedeu, denominada I.NET.C21.
Acresce que, igualmente se provou que, após a celebração do Contrato, a sociedade Ré continuou a ter acesso à base de dados da Fitamétrica, denominada FMStereo, pelo menos, até 30 de Abril de 2012, sendo crível admitir, atenta a resposta dada pela 2ª Ré a um ex-franquiado Fitamétrica que propôs o alojamento da mesma num ISP nos Estados Unidos, que a 2ª Ré tenha copiado a base de dados para o servidor da sociedade Ré (cfr. doc. fls. 477).
Diga-se, ainda, a este respeito, que o detentor e responsável pela conservação da referida base de dados FMStereo é Paulo F., sócio-gerente da Netfran, e não a Autora, sendo que a informação constante da base de dados contínua disponível para consulta mediante solicitação para o efeito.
Dito isto, a sociedade Ré manteve o acesso à base de dados da Fitamétrica e, por acordo com o seu titular, poderia ter efectuado a migração dos respectivos dados, pelo que, se tal não sucedeu, não se vê como possa ser imputada a falta de migração à Autora, quanto é certo que contratualmente esta não tinha essa obrigação.
É, assim, entendimento do Tribunal não se verificar o alegado fundamento em apreço para resolução do contrato. (…).”
Defendem os RR./apelantes, como vimos, que a manutenção das condições técnicas de que a Sociedade Ré já dispunha no âmbito do contrato de franquia anterior estabelecido com a Net..., Lda, (cuja posição contratual a A. assumiu em 17.10.2011), na rede Fitamétrica, constituiu condição fundamental para a celebração do contrato dos autos, como decorre do aditamento de fls. 276, e que a migração de dados da referida Fitamétrica para a rede Century21 competia à A. de acordo com a claus. 11.B, al. xii), e cláus. 6.G, al. ii), e porque era esta a detentora, legal e física, dessa base de dados.
Nenhum reparo nos merece neste ponto o acordão recorrido.
Com efeito, se é facilmente compreensível o interesse da Ré na manutenção das condições técnicas de que já dispunha no contrato de franquia anterior quando outorgou o contrato dos autos, não decorre deste nem do primeiro aditamento ao mesmo (a fls. 276 a 280) que tal tenha constituído condição fundamental para a sua celebração.
De resto, no referido aditamento, essencialmente respeitante à assunção pela A. da posição contratual da Net..., Lda, e à integração da rede Fitamétrica na rede de mediação imobiliária Century21, tal como bem se salientou na decisão recorrida, o que consta é que a Sociedade Ré se compromete “a implementar integralmente o conceito de Loja CENTURY21: (…) c) Até Julho de 2012 utilização do CRM Fitamétrica com exportação automática para o site century21.pt”; d) Até 30 de Abril de 2012 serão integralmente exportados para o site century21.pt, a base de dados de imóveis existentes no CRM Fitamétrica; (…)” (cláusula 4ª, als. c) e d) do referido Aditamento de 1.11.2011).
Também a cláus. 6.G, al. ii), do contrato, estabelece que, caso o franquiador (A.) determine que um determinado produto ou serviço deve ser utilizado pelo franquiado (Sociedade Ré), este, o franquiado, tem a obrigação de, a expensas próprias, obter os equipamentos, produtos ou serviços necessários à sua utilização, e começar esse uso num prazo de 90 dias.
Já a cláus. 11.B, al. xii), estabelece que: “O Franquiado deverá adquirir e utilizar equipamentos, software, meios de comunicação e de reporting que sejam compatíveis com os sistemas informáticos utilizados em cada momento pelo Franquiador e assegurará que os seus sistemas informáticos são compatíveis com o do Franquiador para o efeito de poder transmitir electronicamente informações sobre listagens de imóveis e imagens digitais para a matriz de informação do Franquiador (i.e. Trans 21) e para o website do Franquiador. O Franquiado transmitirá, de forma adequada e contínua, ao Franquiador as respectivas informações relativas a listagens de imóveis e a transacções concluídas, assegurando ainda a edição e eliminação de todas as imagens obsoletas de forma a garantir a exactidão de tais dados no website do Franquiador e outros sites da Internet que o Franquiador utilize para promoção dos negócios CENTURY21, autorizando expressamente o Franquiador a ter livre acesso e a tratar e utilizar livremente os dados que o Franquiado lhe fornecer.”
Nenhuma obrigação decorre de tais cláusulas para a A., nomeadamente de migração de dados da referida Fitamétrica para a rede Century21, nem de qualquer outra cláusula, não obstante as especificidades do contrato de franquia celebrado entre as partes.
Por outro lado, se num primeiro momento podemos ser levados a crer que era a A., enquanto sucessora da posição contratual da Net..., Lda, a entidade que detinha a base de dados da Fitamétrica, o que se provou foi que o detentor e responsável pela conservação da base de dados FMStereo da marca Fitamétrica é Paulo F., sócio-gerente da Netfran, tendo a mesma base de dados estado disponível para uso pela Sociedade Ré, pelo menos, até ao dia 30.4.2012, e as contas de email afectas ao domínio fitamétrica.pt, pelo menos, até ao final de Julho de 2012, base de dados essa cuja informação continua disponível para consulta mediante solicitação para o efeito (Pontos FF e GG).
Acresce dizer que, ainda que estivessemos perante um incumprimento da A. que a factualidade assente não confere, o certo é que a Sociedade Ré começou a trabalhar com o sistema informático da A. pelo menos no início de 2012 (Ponto BB supra), dispondo de um longo período até ao final desse ano para avaliar das condições da migração da base de dados da rede Fiatmétrica e ponderar, também nessa perspetiva, sobre o interesse na manutenção do contrato. Com efeito, provou-se que as partes acordaram, no aditamento de 18.7.2012, que a Ré poderia denunciar o contrato, sem qualquer penalização, até 1.12.2012, produzindo a denúncia efeitos a 31.12.2012 (cfr. pontos N a P supra).
Em suma, nem é possível concluir que a migração de dados da rede Fitamétrica incumbisse à A., nem é razoável admitir que, tendo tido os RR. a possibilidade de verificar a impossibilidade dessa migração durante o ano de 2012, quando podiam denunciar livremente o contrato (até 1.12.2012), tenham vindo a invocar tal circunstância como justa causa de resolução em 28.11.2013.
No que respeita ao segundo fundamento invocado pelos apelantes, afirmou-se no acordão arbitral: “b) Deficiências no funcionamento do software fornecido pela Autora:
Sustenta, igualmente, a sociedade Ré na sua comunicação de resolução do Contrato e, de forma minuciosa, na sua contestação, que o software fornecido pela Autora era deficiente e ineficiente.
Alegou, para tanto, resumidamente, que as ferramentas informáticas existentes não permitiam a sincronização de informação, a exportação eficiente de imóveis para os diferentes portais imobiliários, a partilha de imóveis entre a rede por ausência de uma rede eficiente de intranet, bem como que se encontrava desligado frequentemente e sem possibilidade de acesso.
Em causa está, por conseguinte, a eventual violação da obrigação de assistência da Autora à sociedade Ré, obrigação esta inerente ao contrato de franquia.
Entende, contudo, o Tribunal que, da factualidade provada, não se retira esta conclusão, bem ao invés.
Com efeito, o que se provou quanto ao fundamento em apreço foi que, após a entrada da sociedade Ré na rede Century21, o software /plataforma informática inicialmente fornecido pela Autora aos seus franquiados, denominado Trans21, foi, num espaço de 4 meses, substituído pela Autora por um outro software /plataforma informática, denominado I.NET.C21, justamente para obstar às deficiências do anterior software e dotar a plataforma das funcionalidades necessárias aos serviços de mediação imobiliária prestados pelos franquiados.
Provou-se também que, nesta fase de transição e durante o período de testes, foi facultada à sociedade Ré, na pessoa da 2ª Ré, a possibilidade de testar o software, colaborando com a Autora para a correcção dos erros detectados e melhoria do software /plataforma.
É certo que, na implementação e desenvolvimento desta nova plataforma informática ocorreram erros (Bugs), como é certo que várias vezes a plataforma esteve offline para correcções ou upgrades.
Todavia, não menos certo é que a sociedade Ré dispôs sempre do acompanhamento, resposta e solução por parte da Autora para as anomalias detectadas em tempo que não pode deixar de ser considerado como manifestamente razoável.
Na verdade, no ano de 2013, ano da resolução do contrato pelos Réus, da documentação por estes junta, resulta claramente que, na sequencia das comunicações da 1ª Ré alegando incidentes, a Autora respondia sempre através dos seus serviços (inexistem referências a ausência de respostas neste período), com resposta de resolução ou de reencaminhamento, verificando-se a existência de reduzidas comunicações – muito diferentes em género, qualidade e intensidade que as verificadas no ano de 2012 -, aceitação do reporte e diligência para resolução da deficiência comunicada.
Para além disso, tais comunicações, de um modo geral, não se mostram repetidas pelos Réus, o que permite concluir que: ou as apontadas anomalias teriam ficado resolvidas ou não tinham a dimensão e a importância suficiente para voltarem a ser comunicadas à Autora pela sociedade Ré.
Importa, a este respeito, assinalar que os “bugs” e períodos “offline” foram diminuindo progressivamente, conforme se pode constatar dos factos supra assentes em KK e LL.
Aliás, no que aos períodos offline da plataforma respeita, também no ano de 2013, verifica-se dos factos provados que a Autora teve o cuidado e a diligência de comunicar antecipadamente aos franquiados quando a plataforma I.NET.C21 estaria inoperacional para actualizações nas datas e pelos períodos que constam dos respectivos factos assentes, cujos períodos, tendo em conta o lapso de tempo decorrido 8 entre Fevereiro e Novembro de 2013, são reduzidos e tendencialmente em horários fora de expediente.
Dir-se-á, ainda, que não se provou que as anomalias efectivamente verificadas quer com a plataforma I.NET.C21, quer com o site Century21, pudessem ter comprometido o desenvolvimento pela sociedade Ré da sua actividade de mediação imobiliária.
Finalmente, acrescenta-se que, ao invés do pugnado pela sociedade Ré, entende-se que os factos que a sociedade Ré alegou a este respeito poderiam, eventualmente, configurar, não o incumprimento da obrigação de assistência pela Autora, mas o seu eventual cumprimento defeituoso, o qual, todavia, atenta a factualidade provada e pelas razões supra aduzidas, entende o Tribunal que não se verificou. (…).”
Neste tocante, argumentam os apelantes  que os erros e deficiências do software verificados se revestem, pela sua natureza e frequência, de enorme gravidade no âmbito de uma atividade comercial como a mediação imobiliária, constituindo violação pela A., reiterada e com culpa, das obrigações que lhe incumbiam, nos termos das cláus. 6.G, al. ii), e 6.A do Contrato de Franquia, o que tornou inexigível a manutenção do vículo contratual.
Está, sem dúvida, em causa a assistência devida pela A. à sociedade Ré no âmbito do contrato de franquia.
Questão é saber se os erros e deficiências do software verificados terão comprometido, pela sua gravidade ou reiteração, a subsistência do vínculo contratual, constituindo justa causa de resolução.
Cremos, também aqui, que as conclusões da decisão recorrida são compatíveis com a factualidade apurada.
Sem perder de vista que a Ré terá podido denunciar livremente o contrato, sem qualquer penalização, até 1.12.2012 (pontos N a P supra), é intuitivo que reveste especial interesse o ocorrido nesta matéria a partir de 1.12.2012 até à carta de resolução de 28.11.2013.
Ora, o que se provou foi que o software/plataforma informática Trans21 fornecido pela A. no início do contrato (Novembro de 2011) foi substituído pelo software/plataforma informática
I.NET.C21 que entrou em funcionamento em 5.3.2012, tendo a Sociedade Ré tido acesso à versão de testes a partir de 1.2.2012 (Ponto BB supra). Este último software foi criado de base na Cloud da Microsoft e continha inicialmente erros no funcionamento de algumas das suas funcionalidades, erros que foram reportados pela Sociedade Ré à A., maioritariamente até Novembro de 2012 e com uma progressividade decrescente, e por esta sucessivamente resolvidos (Ponto JJ). Por outro lado, o referido software esteve em desenvolvimento e melhoria, com vista a garantir estabilidade à plataforma e implementação progressiva de novas funcionalidades, desde a sua entrada em funcionamento até, pelo menos, à saída da Sociedade Ré da rede, em simultâneo com a disponibilização da plataforma aos franquiados da rede Century21, o que implicou curtos períodos de indisponibilidade de acesso à mesma para actualização (inoperacionalidade), os quais eram previamente comunicados aos franquiados (Pontos KK e MM).
Por conseguinte, havendo mais erros no funcionamento do sistema até Novembro de 2012 que a 1ª Ré entendeu não comprometerem a relação contratual, não será razoável aceitar que a dimuição dos episódios a partir de então tenha justificado, em Novembro de 2013, a resolução do contrato.
De resto, não se retira do Ponto LL da matéria assente, onde se enunciam 16 incidentes na plataforma I.NET.C21 e no site Century21 reportados pela Ré à A. em 2013, que estes se tenham revestido de especial gravidade e/ou que a A. não procurasse resolvê-los em tempo útil.
Do mesmo modo, também não decorre do Ponto MM, onde se refere que a A. comunicou antecipadamente aos franquiados que a plataforma I.NET.C21 estaria inoperacional para realização de atualizações, que esteja em causa grave violação dos deveres de assistência da A. à Sociedade Ré. Para além de não se discutir a necessidade de realização dessas atualizações, estão em causa 11 paragens, entre 5.2.2013 e 12.11.2013, que foram anunciadas antecipadamente pela A., e que tiveram períodos de duração de cerca de meia ou uma hora cada, e dois únicos períodos de duração superior a duas horas (parte em período noturno), num dos casos (25/26.5.2013) abrangendo um sábado e um domingo.
Por outro lado, e tal como se concluiu na decisão recorrida, não se provou que as anomalias verificadas com a plataforma I.NET.C21 ou com o site Century21 tenham causado concretos prejuízos à Sociedade Ré.
Dizem ainda os apelantes que do teor dos emails trocados entre as partes, a fls. 432 a 435, logo antes da remessa da carta de resolução (Ponto S), se retira que a relação contratual era então insustentável, havendo interesse mútuo em revogá-la com uma contrapartida que nada teria que ver com a cláusula penal estipulada no contrato.
Não cremos que a referida troca de emails consinta tal interpretação.
Na verdade, os referidos emails documentam negociações extrajudiciais havidas entre as partes para chegar a um acordo sobre a cessação do contrato, tendo a Sociedade Ré apresentado uma proposta (a fls. 433 consta uma minuta de acordo proposta pela Ré) que a A. não aceitou nos moldes em que foi apresentada, declarando-se, aliás, no final do email de resposta a essa proposta (email de 20.11.2013, a fls. 434), dirigido pela A. à Ré Sónia: “(…) preferimos mil vezes manter o contrato de franquia contigo a receber qualquer compensação, indemnização ou o que lhe quiserem chamar. Da nossa parte consideramos que o excelente trabalho que temos vindo a desenvolver em conjunto nestes dois últimos anos é fruto do modo como facilmente temos interagido e colocado em prática várias ideias cujos resultados, pelo comparativo do volume de vendas alcançado são disso bom exemplo.
Assim, reitero que preferíamos reunir contigo para discutir oportunidades de negócio, condições operacionais e planos de acção que possam ainda mais potenciar e estimular a tua capacidade e força de vendas, em que toda a rede Century 21 seria beneficiada, ao invés do que aconteceria com a tua saída, ou com a de qualquer outro franquiado da rede. (…).”
Assim, mesmo sem cuidarmos de ponderar sobre a relevância de tais comunicações recíprocas para a solução do litígio, facilmente concluímos que delas não é possível retirar que a relação contratual fosse insustentável e/ou que havia um interesse mútuo em pôr-lhe cobro. Pelo menos esse interesse não seria inequívoco por parte da A..
Dizem também os apelantes que reconhecendo o administrador da A., no dito email de 20.11.2013, que “A posição dos nossos advogados e do Franquiador, que não conhecem a relação de trabalho que temos tido contigo” era a de impor o “pagamento de uma compensação no montante mínimo de € 88.000,00”, corresponde a um valor compensatório onze vezes superior aos pontos acertados na reunião anterior das partes ocorrida em 5.11.2013, o que foi de molde a quebrar toda a confiança dos RR. na A..
Salvo o devido respeito, entende-se mal o argumento.
De acordo com o referido email da A. de 20.11.2013, a proposta apresentada pela Ré teve de ser sujeita à apreciação superior do Franquiador nos EUA e não terá sido aceite nessa sede. Qualquer que tenha sido o conteúdo da dita reunião de 5.11.2013 (Ponto R supra), desconhecido do Tribunal, não se vislumbra de que modo o não entendimento das partes quanto à cessação do contrato nas condições atrás indicadas poderá corresponder a um procedimento indevido da A. ou será revelador de má-fé da sua parte, como referem os apelantes.
Muito menos se poderá entender que tal tenha constituído depois justa causa de rescisão do contrato que, de resto, não se mostra sequer enunciada na carta de rescisão de 28.11.2013 (a fls. 352/353).
Do mesmo modo, é totalmente indiferente ao desfecho da causa saber qual o valor indemnizatório apresentado por cada uma das partes no âmbito de negociações extrajudiciais, nem tal constitui, naturalmente, qualquer limite ao Tribunal.
Em suma, não se configura que, com a atuação descrita na factualidade assente, tenha a A. violado, de forma grave, os seus deveres para com a Sociedade Ré que justificassem a resolução do contrato.
Neste contexto, ocioso se mostra abordar a questão de saber se, existindo justa causa de resolução, deveria ainda a Sociedade Ré interpelar a A. antecipadamente para cumprir(), questão que fica assim prejudicada.

  - Do montante indemnizatório:
Aqui chegados, e no que toca à indemnização arbitrada, sustentam os RR./apelantes que a A. não alegou nem provou ter sofrido danos com a resolução do contrato pela Sociedade Ré e que a existência de uma cláusula penal não o dispensa, posto que não é de aplicação automática, sob pena do julgador não poder determinar se esta é proporcional e justificada. Dizem que, no caso, a mesma consta de um contrato de adesão e consiste no recebimento da contrapartida pecuniária de prestações que nunca se vão ter de cumprir, ou seja, cujos custos nunca irão suportar, pelo que a mesma é nula.
Em contra-alegações, sustenta a A. que o contrato dos autos não é de adesão, tendo sido negociado entre as partes, que a cláusula penal estabelecida no contrato não corresponde aos meses de execução em falta e que os RR. nunca a questionaram, e ainda que a fixação de uma cláusula penal dispensa a alegação e prova dos prejuízos sofridos.
No acordão arbitral, concluindo-se pela resolução ilícita do contrato de franquia, decidiu-se condenar, solidariamente, os RR. a pagar à A. o montante de € 91.151,52, a título de indemnização por lucros cessantes, com juros acrescidos, discorrendo-se nos seguintes termos: “(…) Deve, por conseguinte, a sociedade Ré indemnizar a Autora pelo prejuízo que lhe causou (cfr. art. 798º, do Código Civil), prejuízo que a Autora faz coincidir com a cláusula penal a título de lucros cessantes fixada para o efeito no Contrato.
Resulta do disposto no art. 810º, do Código Civil, que, na cláusula penal, há uma fixação antecipada da indemnização, indemnização essa que, em princípio, actuará nos termos acordados, dispensando a alegação e prova por parte do credor dos prejuízos sofridos, bem como a sua quantificação, o que se explica não só por essa ter sido a vontade que os contraentes expressaram como, principalmente, pela função sancionatória da própria cláusula.
In casu, as partes convencionaram, no que ora interessa, que, na eventualidade de o franquiado promover a cessação do contrato antes do seu termo contratual, este se constituiria na obrigação de pagar ao franquiador os lucros cessantes deste último, considerando-se, como tal, “todas as quantias que o FRANQUIADO teria de pagar ao FRANQUEADOR, tais como royalties e contribuições para o FNP, desde a data da resolução antecipada até à Data da Cessação, caso não tivesse ocorrido a resolução antecipada”. “Os lucros cessantes corresponderão à média mensal de royalties e à média mensal de contribuições para o FNP devidos pelo FRANQUIADO ao FRANQUEADOR, sem tomar em consideração qualquer renúncia ao pagamento de royalties, desde a Data de Início do presente Contrato até à data da resolução antecipada, multiplicada por 24 ou, caso seja menor, pelo número de meses completos ou incompletos que restariam até ao termo da vigência normal do presente Contrato” (cfr. cláusula 19. A. (i), (ii) e (iii), do Contrato a fls. 210 e 211).
Há, assim, que quantificar o montante devido a este título à Autora pela sociedade Ré e, atento o regime de solidariedade nas respectivas obrigações contratualmente estipulado, também pelos 2ª e 3º Réus.
Resulta da factualidade provada que a resolução ocorreu quando faltavam 35 meses para o termo do Contrato, pelo que, a média mensal de royalties e de contribuições para o Fundo Nacional de Publicidade pagos à Autora pela sociedade Ré, desde o início do Contrato (1.11.2011) até ao seu termo por resolução (29.11.2013), terá de ser multiplicada, em conformidade com a cláusula penal estipulada, por 24.
Da factualidade assenta resulta que a média mensal de royalties e de contribuições para o Fundo Nacional de Publicidade pagos à Autora pela sociedade Ré no período em questão foi, respectivamente, nos montantes de 2.599,70 € e de 1.198,28, pelo que a indemnização a pagar solidariamente pelos Réus à Autora pelo incumprimento culposo do Contrato dos autos é no valor de 91.151,52 € (noventa e um mil, cento e cinquenta e um euros e cinquenta e dois cêntimos) (€2.599.70 + €1.198,28) x 24), quantia esta que corresponde justamente ao montante peticionado a este título pela Autora. (…).”
Analisando.
A cláusula penal destina-se, em regra, a reforçar o direito do credor ao cumprimento da obrigação e, portanto, a tornar a indemnização exigível pelo incumprimento mais gravosa do que em princípio seria, podendo ser fixada apenas para o atraso da prestação (arts. 810 e 811 do C.C.).
O conceito amplo de cláusula penal engloba cláusulas penais indemnizatórias e cláusulas penais compulsórias. Nas primeiras, o acordo das partes tem por fim liquidar a indemnização devida em caso de incumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, enquanto nas segundas, o acordo das partes propõe-se compelir o devedor ao cumprimento e/ou sancionar o não cumprimento().
Diz-nos Calvão da Silva sobre o tema: “Podemos definir a cláusula penal como a estipulação negocial segundo a qual o devedor, se não cumprir a obrigação ou não cumprir exactamente nos termos devidos, maxime no tempo fixado, será obrigado, a título de indemnização sancionatória, ao pagamento ao credor de uma quantia pecuniária.(…)
Dada a sua simplicidade e comodidade, a cláusula penal é instrumento de fixação antecipada, em princípio ne varietur, da indemnização a prestar pelo devedor no caso de não cumprimento ou mora, e pode ser eficaz meio de pressão ao próprio cumprimento da obrigação. Queremos com isto dizer que, na prática, a cláusula penal desempenha uma dupla função: a função ressarcidora e a função coercitiva.
No que concerne à primeira destas funções, a cláusula penal prevê antecipadamente um forfait que ressarcirá o dano resultante de eventual não cumprimento ou cumprimento inexacto. (…). O que significa que o devedor, vinculado à clausula penal, não será obrigado ao ressarcimento do dano que efectivamente cause ao credor com o seu incumprimento ou cumprimento não pontual, mas ao ressarcimento do dano fixado antecipadamente e negocialmente através daquela, sempre que não tenha sido pactuada a ressarcibilidade do dano excedente (art. 811.º-2). (…).
Por conseguinte, mesmo que o devedor prove não ter resultado nenhum dano do seu incumprimento ou retardado cumprimento a pena negocial é devida. (…).” (sublinhado nosso)().
Esta posição não é, no entanto, unânime, defendendo outros autores posição diversa: “(…) Expurgada a cláusula penal indemnizatória de funções coercitivas ou compulsórias, o pagamento da pena quando não haja danos ou prejuízos revela-se porém incompatível com o «desenvolvimento do regulamento negocial, de acordo com o seu sentido e a sua justiça interna.»
Face ao exposto, a cláusula penal indemnizatória tem como consequência a alteração dos critérios de distribuição do ónus da prova da existência de um dano e da existência de uma conexão causal entre o dano e o incumprimento: nada menos, mas também nada mais.
As regras de distribuição do ónus da prova explícitas no art. 342º colocam a cargo do credor a alegação e a prova da existência de um dano e da conexão causal entre o dano e o incumprimento; as regras de distribuição do ónus da prova implícitas na cláusula penal, essas, colocam a cargo do devedor a alegação e a prova da inexistência de dano ou da inexistência de conexão causal entre o dano e o incumprimento. (…).” (sublinhado nosso)().
De todo o modo, “O principal objectivo da cláusula penal é evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização. Muitas vezes, porém, ela é fixada com o carácter de verdadeira penalidade, ou, ao contrário, com o intuito de pôr um limite à responsabilidade, nos casos em que os danos possam atingir proporções exageradas em relação às previsões normais dos contraentes. (…)”().
Trata-se duma “liquidação convencional antecipada dos prejuízos, feita «a forfait», visto não se saber ainda qual o valor real dos prejuízos nem mesmo se eles virão a produzir-se”().
Defendemos que a cláusula penal encerra a dupla função, ressarcidora e coercitiva, sendo sempre exigível desde que o incumprimento seja imputável ao devedor. Isto é, a cláusula penal não constituirá um simples pacto quanto ao ónus probatório.
Assim sendo, fixada a cláusula penal, fica o contraente cumpridor dispensado da alegação e prova dos danos sofridos com o incumprimento da contraparte e do valor de tais danos.
Cabia, por isso, apenas à A. a demonstração do incumprimento da Sociedade Ré, de modo a poder exigir e liquidar a cláusula penal convencionada (art. 342 do C.C.).
Mas ainda que se defenda, num outro entendimento, que o estabelecimento da cláusula penal apenas operou a inversão do ónus da prova, passaria a caber aos RR., mormente à Sociedade Ré, a alegação e prova da inexistência de dano ou da inexistência de conexão causal entre o dano e o incumprimento. Ora, também nessa perspetiva, teríamos de concluir que não foi feita tal demonstração, pelo que a solução não seria outra ainda que se entendesse que ocorreu a inversão do ónus da prova.
Dizem, por outro lado, os apelantes que, no caso, a referida cláusula penal consta de um contrato de adesão e consiste no recebimento da contrapartida pecuniária de prestações que nunca se vão ter de cumprir, ou seja, cujos custos nunca irão suportar, pelo que a mesma é nula.
Para além da questão da validade desta cláusula penal não ter sido suscitada no processo nem na decisão sob recurso, o que em princípio impediria esta Relação de a conhecer, a verdade é que nunca cumpriria discuti-la à luz do DL nº 446/85, de 25.10, que estabelece o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, como pretendem os apelantes no recurso.
Na verdade, estabelece o art. 1º do referido Diploma que: “1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma. 2 - O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar. 3 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”
Ora, resultou provado que a minuta do contrato de franquia, bem como as condições particulares das quais a Sociedade Ré beneficiaria, foi facultada pela A. à sociedade Ré em 7.9.2011, tendo existido negociações e alterações à dita minuta (Ponto H supra). Assim, tendo havido negociação prévia entre as partes quanto ao conteúdo do contrato, não será ao mesmo aplicável o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais.
Em súmula, não merece reparo a aplicação feita no acordão arbitral da cláusula penal estabelecida (cláus. 19.A), não discutindo os RR./apelantes o cálculo realizado em obediência à mesma, nem sequer tendo requerido a respetiva redução ao abrigo do art. 812 do C.C.. Improcede, deste modo, a apelação dos RR., sem prejuízo da retificação da data do contrato de franquia indicada no segmento decisório que é 1 de Novembro de 2011 e não “1 de Novembro de 2012”, como, por manifesto lapso, do mesmo consta.

  B) Apelação da A. (da cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do contrato de franquia):
Passando à apreciação do recurso da A., temos que a mesma discorda do acordão arbitral na parte em que absolveu os RR. do pagamento da quantia de € 112.500,00 a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual, conforme estipulado na cláusula 11. B., al. vii), subal. e), do contrato de franquia, declarando tal cláusula nula por falta de fixação de prazo.
Na decisão recorrida decidiu-se nesta matéria: “(...) Pretende, ainda, a Autora que os Réus sejam, solidariamente, condenados a pagar-lhe a quantia de 112.500 € (cento e doze mil e quinhentos euros) a título de cláusula penal por violação da obrigação de não concorrência pós contratual, estipulada na cláusula 11. B. (vii) (e) do Contrato.
Foi pactuado pelas partes na referida cláusula que:
 “(vii) Conflito de Interesses e Não Concorrência
O Franquiado e qualquer das Afiliadas do Franquiado definidas infra não poderão, durante a vigência do presente Contrato, sem o consentimento prévio do Franquiador, prestado por escrito, directa ou indirectamente (incluindo como funcionário, administrador, accionista, sócio, Mediador Responsável ou a outro título) operar, gerir ou deter participação em qualquer mediadora imobiliária ou negócio relacionado (que não seja outra franquia CENTURY 21) que se encontre localizado no território português. A expressão Afiliadas do Franquiado inclui cada uma das entidades que a seguir se especificam, aplicando-se as restrições acima estabelecidas a cada uma dessas entidades: cada associado, Mediador Responsável, funcionário ou administrador; membro, ou qualquer sócio que detenha (ou seja beneficiário de) de qualquer percentagem de capital social do Franquiado, incluindo entidades que controlem, sejam controladas por, ou estejam sob o controlo conjunto do Franquiado ou suas outras Afiliadas;
(a) Como condição essencial à celebração do presente Contrato, o Franquiado declara expressamente que, no termo deste Contrato, qualquer que seja o fundamento, se obriga a não exercer ou explora, por si ou por interposta pessoa, por qualquer forma, na localização da Agência, negócios ou actividades, conforme atrás definido.
(b) …
(c) …
(d) …
(e) Pela violação do disposto nas alíneas anteriores, o Franquiado incorrerá em Responsabilidade Civil, estabelecendo-se desde já uma indemnização pecuniária, a título de cláusula penal, de valor não inferior a €100.000,00 (cem mil euros) ou ao quíntuplo do valor do Direito de Entrada estipulado na Cláusula 7, aplicável à data do incumprimento, conforme o que for mais elevado. “
(cfr. fls 192 e 193, dos autos)
O montante de 112.500,00 €, peticionado pela Autora a este título, corresponde ao quíntuplo do valor do Direito de Entrada estipulado na Cláusula 7, que, igualmente, se transcreve:
“7. Direito de Entrada
Em simultâneo com a celebração do presente contrato, o Franquiado pagará ao Franquiador, na sua sede, ou noutro local designado pelo Franquiador, em dinheiro (salvo se o Franquiador autorizar, por escrito, que o pagamento se faça de outra forma), um direito de Entrada no montante de vinte e dois mil e quinhentos euros (€ 22.500,00).
Este direito de entrada é devido na íntegra ao Franquiador com a celebração do presente Contrato e não é reembolsável.”
(cfr. fls 183 dos autos)
A cláusula 11. B. (vii), do Contrato supra transcrita, estipulação ao abrigo da qual a Autora assenta o seu pedido ora em análise, impõe à sociedade Ré uma obrigação de não concorrência, vedando o exercício ou exploração por qualquer forma, por si ou por interposta pessoa, na localização da Agência, de negócios ou actividades concorrentes de mediação imobiliária.
E a verdade é que se provou que a sociedade Ré, após a resolução do Contrato, continuou a exercer a actividade de mediação imobiliária na localização da Agência, agora sob os sinais distintivos de comércio da “Remax”, marca claramente concorrente da marca Century21 da titularidade da Autora, pelo que dúvidas não existem de que a sociedade Ré efectivamente violou a obrigação de não concorrência pós-contratual estipulada no Contrato dos autos.
Questão distinta é saber se, na sua configuração contratual, esta obrigação constitui uma restrição admissível à concorrência.
Importa, por conseguinte, analisar o quadro legalmente aplicável ao efeito.
Dispõe a este respeito o Regulamento (UE) N.º 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010, relativo à aplicação do artigo 101.º, n.º 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de acordos verticais e práticas concertadas, que entrou em vigor em 20 de Abril de 2010, que beneficiam da isenção de aplicação do disposto no art. 81º, nº 1, do referido Tratado, as obrigações incluídas em acordos verticais que, ao que ao caso interessa, directa ou indirectamente impeçam o comprador, após o termo do acordo, de produzir, adquirir, vender ou revender bens ou serviços, desde que se reúnam as seguintes condições:
a) A obrigação diz respeito a bens ou serviços que concorrem com os bens ou serviços contratuais;
b) A obrigação é limitada às instalações e terrenos a partir dos quais o comprador exerceu as suas actividades durante o período do contrato;
c) A obrigação é indispensável para proteger o saber-fazer transferido pelo fornecedor para o comprador;
d) A duração da obrigação é limitada a um período de um ano sendo certo que as estipulações contratuais que se mostrem indispensáveis para impedir que os concorrentes se aproveitem do património de conhecimentos, da técnica e da assistência do franqueado, não constituem restrições à concorrência. 
“Conforme se explana no recente Ac. S.T.J. de 5-2-2013 (Proc. 3371/08.7TVLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi, pt), “a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a prática da Comissão e os Regulamentos por esta aprovados apontam inquestionavelmente para a isenção das cláusulas de não concorrência, pós contratuais, sempre que limitadas no tempo (um ano), no espaço (área franqueada) e indispensáveis para proteger o “saber fazer”, transferido pelo franquiador para o franquiado”.
Também os arts 4º e 5º da Lei da Concorrência, então vigente, (Lei 18/2000, de 11 de Junho), não proíbem tais cláusulas, antes as considerando justificadas, desde que preencham os requisitos de aplicação dos Regulamentos de isenção (art. 5º, nº3, da citada Lei).
Por sua vez, no direito interno, o art. 9º, nº2, do dec-lei 178/86, de 3 de Junho, prevê a possibilidade de ser estipulada uma obrigação de não concorrência, nos contratos de agência, por um período máximo de dois anos e circunscrita à zona ou círculo de clientes confiado ao agente”.
Conclui-se, por conseguinte, que é lícita a inclusão num contrato de franquia de uma cláusula proibitiva de concorrência, desde que limitada no tempo e no espaço e que respeite os limites e fins da indispensabilidade da protecção e salvaguarda do saber transmitido pelo franquiador.
No caso concreto, não foi fixado qualquer prazo para a obrigação de não concorrência pós-contratual estipulada na cláusula 11. B. (vii), do Contrato dos autos, e tanto basta para, sem mais considerações, declarar a sua nulidade (cfr. art. 280º, nº 1, e 286º, do Código Civil).
Fica, consequentemente, prejudicado o pedido formulado pela Autora a este respeito já que a aplicação de uma cláusula penal estipulada para o incumprimento de uma obrigação pressupõe, como é evidente, a validade da obrigação cujo incumprimento se sanciona.
Improcede, assim, o pedido formulado pela Autora de condenação solidária dos Réus no pagamento de indemnização por violação da obrigação pós-contratual de não concorrência. (…).”
Invoca a A./apelante no recurso que os RR. nunca questionaram a validade desta cláusula, apenas defendendo que esta só seria aplicável ao período de vigência do contrato e que o seu valor não poderia ser peticionado uma vez que não pagaram qualquer direito de entrada. Defende que ainda que a referida cláusula seja omissa quanto ao prazo de duração da obrigação de não concorrência pós contratual, deveria ter-se considerado o limite legal de 1 ano, sendo a nulidade apenas parcial e reduzida a esse prazo, nos termos do art. 292 do C.C., concluindo-se, deste modo, pela sua aplicação ao caso e condenando-se os RR. conforme reclamado.
Em contra-alegações, sustentam os RR./apelados que a referida cláusula é proibida por lei por constituir uma obrigação de não concorrência de duração indefinida, à luz do art. 101, nº 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, e à luz do art. 18, al. j), do DL nº 446/85, de 25.10, sendo certo que a mesma cláusula não serve qualquer fim lícito e que a Sociedade Ré, ao subscrever o contrato de franquia, apenas pretendia manter uma atividade que já desenvolvia, não havendo necessidade, no caso, de proteção do “saber fazer”. Mais referem que o nº 3 do art. 5 do Regulamento (UE) n.º 330/2010 da Comissão, de 20.04.2010, não é aplicável às obrigações de não concorrência, mas sim a alínea a) do nº 1 desse artigo, a qual não permite a redução da cláusula de obrigação de não concorrência para qualquer limite temporal, prevendo apenas a inaplicabilidade da isenção prevista no art. 2 daquele Regulamento, nos casos em que tal obrigação de não concorrência seja de duração indefinida. Mais referem que não foram alegados danos decorrentes do suposto incumprimento, pelo que sempre seria abusiva a fixação de uma indemnização à A. a este título.
Analisando.
Desde já deixamos aqui reproduzido tudo quanto acima dissemos sobre a cláusula penal e a prova dos danos, bem como sobre a natureza do contrato firmado entre as partes que se provou ter sido negociado, sendo-lhe por isso inaplicável o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais.
Isto posto, estipularam as partes na cláusula 11.B, al. vii), do contrato de franquia, sob a epígrafe “Conflito de Interesses e Não Concorrência”:
“O Franquiado e qualquer das Afiliadas do Franquiado definidas infra não poderão, durante a vigência do presente Contrato, sem o consentimento prévio do Franquiador, prestado por escrito, directa ou indirectamente (incluindo como funcionário, administrador, accionista, sócio, Mediador Responsável ou a outro título) operar, gerir ou deter participação em qualquer mediadora imobiliária ou negócio relacionado (que não seja outra franquia CENTURY 21) que se encontre localizado no território português. A expressão Afiliadas do Franquiado inclui cada uma das entidades que a seguir se especificam, aplicando-se as restrições acima estabelecidas a cada uma dessas entidades: cada associado, Mediador Responsável, funcionário ou administrador; membro, ou qualquer sócio que detenha (ou seja beneficiário de) de qualquer percentagem de capital social do Franquiado, incluindo entidades que controlem, sejam controladas por, ou estejam sob o controlo conjunto do Franquiado ou suas outras Afiliadas;
a) Como condição essencial à celebração do presente Contrato, o Franquiado declara expressamente que, no termo deste Contrato, qualquer que seja o fundamento, se obriga a não exercer ou explorar, por si ou por interposta pessoa, por qualquer forma, na localização da Agência, negócios ou actividades, conforme atrás definido.
(…)
e) Pela violação do disposto nas alíneas anteriores, o Franquiado incorrerá em Responsabilidade Civil, estabelecendo-se desde já uma indemnização pecuniária, a título de cláusula penal, de valor não inferior a €100.000,00 (cem mil euros) ou ao quíntuplo do valor do Direito de Entrada estipulado na Cláusula 7, aplicável à data do incumprimento, conforme o que for mais elevado. “
Por sua vez, estipularam as partes na cláusula 7 do contrato de franquia, sob a epígrafe “Direito de Entrada”: “Em simultâneo com a celebração do presente contrato, o Franquiado pagará ao Franquiador, na sua sede, ou noutro local designado pelo Franquiador, em dinheiro (salvo se o Franquiador autorizar, por escrito, que o pagamento se faça de outra forma), um direito de Entrada no montante de vinte e dois mil e quinhentos euros (€ 22.500,00).
Este direito de entrada é devido na íntegra ao Franquiador com a celebração do presente Contrato e não é reembolsável.”
Na decisão recorrida entendeu-se, assim, inaplicável a referida cláusula 11.B, al. vii), do contrato de franquia em virtude da mesma ser nula.
A primeira questão suscitada no recurso pela A./apelante é que os RR. nunca questionaram a validade desta cláusula, apenas defendendo que esta só seria aplicável ao período de vigência do contrato e que o seu valor não poderia ser peticionado uma vez que não pagaram qualquer direito de entrada.
Afigura-se-nos que decorre da conjugação do art. 101, nºs 1 e 3, do Tratado de Funcionamento da União Europeia, com o art. 5, nºs 1, al. b), e 3, do Regulamento (UE) Nº 330/2010 da Comissão, de 20 de Abril de 2010, relativo à aplicação daquele artigo 101, nº 3, do Tratado, a determinadas categorias de acordos verticais() e práticas concertadas, e com relação ao contrato de franquia, a possibilidade de consagração de cláusulas de não concorrência após o termo do contrato, sempre que limitadas no tempo (um ano), no espaço (área franqueada) e indispensáveis para proteger o “saber-fazer” transferido pelo franquiador para o franquiado().
Com efeito, o art. 5, nº 3, do citado Regulamento (CE), dispõe, em derrogação ao disposto na al. b) do nº 1, que a isenção prevista no art. 2 se aplica a qualquer obrigação direta ou indireta que impeça o comprador, após o termo do acordo, de produzir, adquirir, vender ou revender bens ou serviços, desde que se reúnam as seguintes condições:
· A obrigação diga respeito a bens ou serviços que concorram com os bens ou serviços contratuais;
· a obrigação for limitada às instalações e terrenos a partir dos quais o comprador exerceu as suas atividades durante o período do contrato;
· a obrigação seja indispensável para proteger o saber-fazer transferido pelo fornecedor para o comprador;
· a duração da obrigação seja limitada a um período de um ano após o termo do acordo.
Por sua vez, a al. b) do nº 1 do art. 5 do mesmo Regulamento (CE) não impede a possibilidade de que seja imposta, com duração indefinida, uma restrição à utilização e divulgação do saber-fazer que não seja do domínio público (art. 5, nº 3, parte final).
Entende-se, afinal, que as cláusulas que sejam indispensáveis para impedir que os concorrentes se aproveitem do património de conhecimento, técnica e assistência fornecidas ao franquiado não constituem restrições ilegítimas à concorrência no sentido do art. 101, nº 1, do Tratado de Funcionamento da União Europeia.
A isenção do princípio da livre concorrência e a admissão de práticas restritivas da mesma (como a obrigação de não concorrência pós contratual) encontra-se igualmente prevista nos diplomas que estabeleceram o regime jurídico da concorrência (cfr. arts. 4 e 5 da Lei nº 18/2003, de 11.6, e arts. 9 e 10 da atual Lei n.º 19/2012, de 8.5, que revogou a primeira) e nos arts. 4 e 9 da Lei nº 178/86, de 3.7, que regula o contrato de agência.
Quanto ao primeiro reparo da ora apelante, cremos que concluindo o Tribunal que uma determinada cláusula contratual é restritiva da concorrência fora das condições de isenção previstas, não poderá aplicá-la, devendo julgar a mesma nula, ainda que oficiosamente, porque contrária ao art. 101, nº 1, do Tratado de Funcionamento da União Europeia() (cfr. art. 101, nº 2, do Tratado, e arts. 280, 286 e 294 do C.C.).
Questão é saber se a cláusula 11.B, al. vii), do contrato de franquia em que a A. assenta o pedido de condenação dos RR. por concorrência pós contratual deve considerar-se válida.
A referida cláusula, como vimos, não contém nenhuma limitação temporal, defendendo a A./apelante a sua validade ou, pelo menos, a sua redução.
Cremos que a referida cláusula não poderá deixar de considerar-se nula por, não contendo limitação temporal, violar uma norma comunitária, aplicável na ordem jurídica nacional.
No entanto, julgamos também que a nulidade nesses termos definidos sempre seria apenas parcial, aproveitando-se o restante da cláusula e do contrato, através da figura da redução prevista no art. 292 do C.C.. Conforme se disse no Ac. do STJ de 8.11.2016(): “(…) A nulidade pode ser, total ou parcial, conforme afete todo o negócio jurídico ou, somente, uma parte ou qualquer cláusula do mesmo, pelo que a nulidade de alguma das suas cláusulas não determina, necessariamente, a nulidade total do negócio, quando as cláusulas nulas são substituídas, «ope legis», por normas imperativas, de acordo com a regra da incomunicabilidade da nulidade (utile per inutile non vitiatur), correspondente ao princípio da primazia da conservação do negócio[14], resolvendo-se a nulidade da cláusula com a projeção no contrato da norma imperativa, que, assim, o passa a integrar, em substituição da parte violadora da disposição legal, aproveitando-se o restante da cláusula e do contrato, através da chamada “eficácia mediata das normas imperativas”, enquanto solução alternativa à nulidade que resultaria da supressão do negócio ou da respetiva cláusula nula. (…).”
No Ac. do STJ de 5.2.2013, já acima citado em rodapé, concluiu-se, justamente, no sentido da redução da cláusula de proibição de concorrência à área territorial de aplicação que ali se discutia.
Isto é, na situação dos autos a dita cláusula de proibição de concorrência pós contratual deveria ser mantida, ainda que reduzida temporalmente a um ano, em conformidade com as regras de direito comunitário.
Sucede, porém, que para se considerar válida a referida cláusula esta deveria ser limitada, no tempo e no espaço, mas também indispensável a proteger o “saber-fazer” transferido da A. para os RR..
Conforme se refere no Ac. do STJ de de 8.10.2013, também já citado em rodapé, a propósito da referida proteção numa cláusula de não concorrência num contrato de franquia: “(…) as informações transmitidas devem ser secretas, substanciais e identificadas, como é entendimento da doutrina e da jurisprudência.
Secretas, na medida em que o “saber fazer” não é normalmente conhecido ou de fácil obtenção.
Substanciais, porque este inclui informações indispensáveis ao comprador para utilização, venda, revenda de bens ou serviços prestados.
Identificadas, na medida em que este deve ser definido de uma forma suficientemente abrangente, a fim de permitir verificar se preenche os critérios de confidencialidade e substancialidade. (…).”
No caso em análise, não resultou efetivamente demonstrada a transmissão pela A. aos RR./apelados de qualquer “saber-fazer” relevante, que deva considerar-se secreto, substancial e identificado, sendo certo que, como defendem estes em contra-alegações, a Sociedade Ré não iniciou com a A. a atividade de mediação imobiliária no âmbito de uma rede de franquiados.
Com efeito, segundo se apurou, até 31.10.2011 a Sociedade Ré integrava a rede de franquia de mediação imobiliária denominada Fitamétrica no âmbito de um outro contrato de franquia celebrado, em 7.5.2008, com Net..., Lda, tendo a A. assumido a posição contratual da dita Net..., Lda (Pontos I e J supra). Por outro lado, já em aditamento ao contrato de franquia sub judice (em que A. e RR. celebraram o contrato de franquia para a rede Century21), embora com a mesma data (1.11.2011), “resolveram” as partes de comum acordo o dito contrato respeitante à rede Fitamétrica (cfr. Ponto N).
Para além do particular circunstancialismo que rodeou a outorga do contrato de franquia dos autos e a atividade já antes desenvolvida na mediação imobiliária pela Sociedade Ré, não decorre dos factos assentes que a A. tenha transmitido aos RR., no âmbito do contrato dos autos, “saber-fazer” relevante que justifique o impedimento do exercício de uma atividade concorrente com a da A..
Nessa medida, não poderá deixar de se considerar a referida cláusula 11. B., al. vii), subal. e), do Contrato de Franquia, contrária às normas comunitárias sobre concorrência e, por conseguinte, nula, nos termos do art. 101, nº 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, e arts. 280, 286 e 294 do C.C..
Neste caso, porém, e como é evidente, sem lugar à redução prevista no art. 292 do C.C. nos termos atrás referidos.
Em suma, é de manter a decisão também no segmento impugnado, embora com fundamento diverso.
Improcede, assim, a apelação da A..
                                  
                                       ***
IV- Decisão:
Termos em que e face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedentes ambas as apelações, da A. e dos RR., mantendo, em consequência, o acordão arbitral recorrido (sem prejuízo da retificação, no segmento decisório, quanto à data do contrato de franquia ali indicado que será a de 1 de Novembro de 2011).
Custas por cada um dos apelantes quanto ao recurso por si interposto.
Notifique.
***
Lisboa, 29.5.2018

Maria da Conceição Saavedra
                                                                      
Cristina Coelho
                      
Luís Filipe Pires de Sousa