Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10667/12.1TCLRS.L1-8
Relator: CARLA MENDES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES
CÁLCULO DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CRITERIOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I. O dano emergente inclui o prejuízo causado nos bens, ou direitos existentes aquando da lesão, podendo consistir na diminuição do activo ou num aumento do passivo, enquanto que os lucros cessantes engloba a perda de benefícios que a lesão impediu de auferir e que ainda não tinham existência à data do evento.


II. O art. 496 CC estabelece um critério que consiste em que se conceda (compense) ao ofendido uma quantia em dinheiro considerada adequada a proporcionar-lhe alegria ou satisfação que de algum modo contrabalancem as dores, desilusões, desgostos ou outros sofrimentos (físicos ou psíquicos) que o ofensor lhe tenha provocado

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 8ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


AC demandou Seguros Logo, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento a título de danos patrimoniais da quantia de € 22.216,30, acrescida dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento, na quantia de € 8.000,00, a título de danos morais, e ainda nos danos futuros nos quais a autora venha a incorrer em virtude do acidente.

Alegou, em suma, que, em 23/11/2010, foi atropelada pelo veículo ligeiro, matrícula 8...-...7-...V, tendo sofrido danos patrimoniais e não patrimoniais.

O proprietário do veículo automóvel transferiu para a ré a responsabilidade, mediante contrato de seguro.

Na contestação a ré, impugnando o valor da indemnização, concluiu pela improcedência parcial da acção – fls. 54.

Após julgamento foi prolatada sentença que julgando a acção parcialmente procedente,condenou a ré a pagar à autora a quantia
de € 30.174,88 (€ 21.974,88 a título de danos patrimoniais e € 8.200,00, a título de danos não patrimoniais), acrescido dos juros de mora, a contar do trânsito em julgado da sentença, absolvendo a ré, no mais – fls. 273 e sgs.

Inconformada, a ré apelou formulando as conclusões que se transcrevem:
1.ª O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença de 19.07.2017, com a ref. 133697723, sendo que o recurso se restringe na parte em que avalia os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela autora e fixa os termos da indemnização por eles devida;
2.ª Verifica-se uma errada interpretação e aplicação do Direito que aplicou ao caso em concreto, existindo violação dos princípios de equidade na fixação da indemnização atinente aos danos patrimoniais e não patrimoniais;
3.ª Relativamente à matéria de facto dada como provada, apurou-se que a autora/recorrida “trabalhava num lugar de mercado no Mercado de Levante da Freguesia de Sacavém e tinha um lugar de frutas e legumes” e que “teve de desistir da venda no mercado e encerrar o seu lugar de frutas e legumes por não conseguir fazer os esforços inerentes a essa actividade, nomeadamente carregar e descarregar caixas e levantar pesos” (factos provados 18 e 20);
4.ª E, bem assim, o Tribunal a quo entendeu que a autora/recorrida “auferia em média um salário mínimo nacional por mês” (factos provados 19);
5.ª Sucede que, por um lado, as sequelas sofridas pela autora/recorrida, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da actividade profissional, ainda que impliquem esforços suplementares ou acrescidos, não se perspectivando danos futuros;
6.ª E, por outro lado, não foi apurada a perda concreta de ganho que a autora/recorrida teve ou que possa vir a resultar da incapacidade que lhe sobreveio após o acidente e devido a este;
7.ª Produzida toda a prova em juízo, e não se tendo logrado demonstrar cabalmente os danos e/ou valores atinentes às perdas salariais/lucros cessantes – rendimentos e perdas que a autora/recorrida facilmente poderia comprovar, bastando juntar as competentes declarações de IRS dos anos anteriores -, o que se impunha era a relegação da sua liquidação em sede de execução de sentença ou mesmo a absolvição do pedido, nunca se atendendo à retribuição mínima mensal garantida no período em causa;
8.ª Pelo que, deverá nesta parte ser anulada a decisão proferida, sendo relegada para execução de sentença a liquidação daqueles danos ou ser declarada a absolvição do pedido, o que se requer;
9.ª Por outro lado, e atentos os danos (patrimoniais e não patrimoniais) apurados nos presentes autos, maxime através do relatório de perícia médico-legal, bem como as demais circunstâncias do caso (v.g., o grau de culpabilidade do responsável, situação económica deste e do lesado), verifica-se que a indemnização arbitrada à autora - quanto aos danos não patrimoniais – se revela manifestamente injusta, excessiva e exagerada, devendo a quantia arbitrada ser objecto de redução;
10.ª Os danos não patrimoniais são aqueles que não sendo susceptíveis de avaliação pecuniária, apenas podem ocasionar uma compensação, compreendendo o quantum doloris, o dano estético e o prejuízo de afirmação pessoal, em função da descrição feita pelos médicos (a avaliação do dano corporal) e tendo em conta os precedentes jurisprudenciais;
11.ª Os danos não patrimoniais apenas são reparados quando a sua gravidade assim o sugira, sendo aqui o princípio da reparação integral limitado pela gravidade do dano (artigo 496/1 CC), sendo o montante indemnizatório deve ser proporcional à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades da vida, deve ainda atender-se ao grau de culpabilidade do responsável (o segurado), à sua situação económica deste e do lesado, e às demais circunstâncias do caso, sendo de atender aos padrões de indemnização geralmente adoptados pela jurisprudência;
12.ª No caso em apreço, tendo em consideração o relatório de perícia de avaliação do dano corporal produzido, verificou-se um quantum doloris fixável no grau 3 numa escala de sete graus de gravidade crescente; um défice funcional permanente da integridade física-psíquica fixável em 5 pontos; a inexistência de dano estético permanente; repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer no grau 1 numa escala de sete graus; bem como que as sequelas sofridas, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da actividade profissional, ainda que impliquem esforços suplementares, não se perspectivando a existência de dano futuro;
13.ª Assim, não se revela adequada a fixação da quantia de  € 8.200,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais à autora, devendo a mesma ser reduzida e fixada em valor nunca superior a € 4.000,00;
14.ª A sentença recorrida viola, entre outras normas e princípios do sistema jurídico, o artigo 609 CPC, bem como os artigos 483, 496, 562, 563, 564 e 566 CC.
15ª. Assim, deve a sentença recorrida ser revogada, nos termos acima preconizados.

Nas contra-alegações apresentadas, a autora pugnou pela confirmação da decisão.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

A 1ª instância considerou assentes os seguintes factos:

1 No dia 23 de Novembro de 2010, cerca das 06 horas e 45 minutos, na Rua P...F...R..., em S..., concelho de L..., distrito de L..., a autora saiu de sua casa sita na Rua PR, e dirigiu-se à passadeira para atravessar a mesma.
2 Tendo sido embatida na passadeira pelo veículo com a matrícula 8...-...7-...V, propriedade de LP e por ele conduzido.
3 A responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo com a matrícula 86-37-CV havia sido transferida para a R. através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 7000110847.
4 A autora participou à ré o sinistro e esta desencadeou o processo de sinistro nº 7000028767/001.
5 A ré entendeu que o acidente foi causado pelo condutor do veículo 8...-...7-...V por si seguro, e consequentemente assumiu a responsabilidade pela produção do mesmo.
6 A autora sofreu uma ITPT (Incapacidade Temporária Profissional Total, actualmente denominada Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total) de 23/11/2010 a 18/04/2011.
7 Após o acidente a autora foi transportada pelos Bombeiros Voluntários de S... ao Hospital de S... J..., em L....
8 Em resultado do acidente a autora sofreu os seguintes danos físicos:
- traumatismo craniano sem perda de conhecimento;
- traumatismo da coluna vertebral;
- traumatismo do ombro esquerdo;
- traumatismo da clavícula direita;
- contusão da coxa e anca esquerda;
- fractura do 1/3 médio da clavícula esquerda.
9 A autora continua com dores e limitações na sua mobilidade ao nível do ombro e mão esquerda.
10 Recorreu várias vezes aos serviços médicos hospitalares com queixas de dores.
11 Em razão do acidente a autora não consegue esticar o braço esquerdo; ficou com dificuldade em levantar pesos e em lavar as costas por limitação da cintura escapular esquerda; tem dificuldade em dormir deitada sobre o ombro esquerdo devido a omalgia e dorme mal por causa das dores; tem queixas álgicas no ombro esquerdo, mais intensas com esforços, mas tem dores constantes, embora ligeiras; tem dores com irradiação para todo o membro superior esquerdo; tem parestesias no braço esquerdo; tem queixas álgicas na bacia da região esquerda, que irradia para todo o membro inferior.
12 A autora teve défice funcional temporário total no dia do acidente, em 23/11/2010.
13 A autora teve défice funcional temporário parcial situado entre 24/11/2010 e 18/04/2011, num total de 146 dias.
14 A autora teve um período de 147 dias de repercussão temporária na actividade profissional total (de 23/11/2010 a 18/04/2011), tendo tido alta clínica em 19/04/2011.
15 A autora está afectada de um défice funcional permanente da integridade físico - psíquica de 5%, e as sequelas de que padece, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, são compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicam esforços suplementares.
16 A autora sofreu um quantum doloris de grau 3 numa escala crescente de 7.
17 Por causa da lesão ao nível do membro superior esquerdo a autora passou a ter dificuldade em fazer renda, e por isso deixou de desenvolver essa actividade que constituía o seu único hobbie, do qual extraia grande satisfação e prazer, o que representa uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de 1 grau numa escala crescente de 7.
18 A autora trabalhava num lugar de mercado no Mercado de Levante da Freguesia de S... e tinha um lugar de frutas e legumes.
19 Da sua actividade de vendedora no mercado e no lugar a autora auferia em média um salário mínimo nacional por mês.
20 A autora teve de desistir da venda no mercado e encerrar o seu lugar de frutas e legumes por não conseguir fazer os esforços
inerentes a essa actividade, nomeadamente carregar e descarregar caixas e levantar pesos.
21 Desde o acidente até atingir a idade da reforma a autora não mais trabalhou.
22 A autora está reformada, desde Novembro 2016.
23 A autora nasceu, em 13/06/1949.
24 Com o acidente estragou-se a roupa que a autora, então usava, em valor não concretamente apurado.
25 (…) e perderam-se os brincos em ouro que a autora naquele momento usava, de valor não concretamente apurado.
26 (…) e partiram-se os óculos graduados que então a autora envergava, no valor de € 677,85.
27 Devido ao acidente, em assistência médica a autora despendeu taxas moderadoras pelo menos no valor de € 61,55.
28 (…) e gastou em medicamentos pelo menos € 20,83.
29 (…) e em deslocações para a assistência médica despendeu com transportes (táxis) pelo menos € 134,65.
30 E despendeu ainda € 60,00 numa certidão do Auto de Notícia.

Atentas as conclusões dos apelantes que delimitam, como é regra, o objecto do recurso – arts. 639 e 640 CPC – as questões que cabe decidir consistem em saber se os valores das indemnizações fixadas (danos patrimoniais e morais), são excessivos e se deveria ter sido relegado para execução de sentença o apuramento dos
valores atinentes aos danos emergentes/perdas salariais/lucros cessantes ou, por falta de prova, deveria a ré ter sido absolvida.

Vejamos, então.

a)Danos patrimoniais

Defende o apelante que, por um lado, as sequelas sofridas pela autora, em termos de repercussão permanente na sua actividade profissional, são compatíveis com exercício da mesma, ainda que acarretem esforços suplementares ou acrescidos, não se perspectivando danos futuros e, por outro, não se apurou a perda concreta de ganho que a autora teve ou possa vir a resultar da incapacidade que lhe sobreveio após o acidente.
E que, não tendo sido apurado os valores atinentes às perdas salariais (lucros cessantes), deveria o apuramento de tal valor ter sido relegado para execução de sentença ou conduzir à absolvição do pedido, por falta de prova.
O princípio geral subjacente à obrigação de indemnização pressupõe que quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação – art. 562 CC (princípio da reposição natural).
O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, os danos emergentes e os lucros cessantes – art. 564/1 CC, traduzindo-se os primeiros na diminuição efectiva do património e os segundos na frustração de um ganho.
O dano emergente inclui o prejuízo causado nos bens, ou direitos existentes aquando da lesão, podendo consistir na diminuição do activo ou num aumento do passivo, enquanto que os lucros cessantes engloba a perda de benefícios que a lesão impediu de auferir e que ainda não tinham existência à data do evento.
O lucro cessante como compreende benefícios que o lesado não obteve, mas deveria ter obtido, tem de ser determinado segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade. São vantagens que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido, não fora o facto lesivo – cfr. CC anot. P.Lima e A. Varela - art. 564 CC.
A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor; a indemnização em dinheiro, sem prejuízo de preceituado noutras disposições, tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados – art. 566 CC.
Do nº 2 do art. cit. resulta que o montante da indemnização pecuniária mede-se pela diferença entre a situação (real) em que o lesado se encontra e a situação (hipotética) em que ele se encontraria  se não tivesse ocorrido o facto gerador do dano.
A determinação do montante indemnizatório através da avaliação da situação real e da hipotética deverá reportar-se à data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal.
Sendo a indemnização liquidada por via judicial, a data mais recente a que a lei manda atender será, normalmente a do encerramento da discussão em primeira instância – art. 611 CPC.
O disposto no nº 3 não dispensa o lesado de alegar e provar os factos que revelem a existência de danos e permitam a sua avaliação segundo critérios de equidade - cfr. P. Lima e A. Varela in CC anot.
No caso em apreço, verificados que foram os pressupostos da responsabilidade civil extra-contratual, art. 483 CC, constituiu-se a ré na obrigação de indemnizar a autora pelos prejuízos causados.
Apurado ficou que, em virtude do sinistro, a autora sofreu danos, danos patrimoniais e não patrimoniais, cfr. factos apurados sob os nºs. 6 e sgs., despesas que suportou, estragos sofridos na roupa e perda de brincos, perda de capacidade de ganho/rendimento no trabalho (após o acidente (2010), incapacidade absoluta para o trabalho habitual e, após a alta clínica até idade da reforma, incapacidade para o exercício do seu negócio de venda de frutas e legumes), choque que vivenciou com o acidente, dores que teve e permanecem e ainda pela limitação dos movimentos de que padece.

Apurado ficou que a autora ficou afectada na sua integrada física/psíquica de um défice funcional permanente de 5%, sendo que a sua actividade profissional, atentas as sequelas de que padece, apesar de compatíveis com a mesma, implicam esforços adicionais.
Ficou privada de poder exercer a sua actividade profissional (vendedora no mercado), uma vez que teve de desistir e encerrar a venda (frutas e legumes) por não conseguir fazer esforços inerentes a essa actividade, nomeadamente, carregar e descarregar caixas e levantar pesos, auferindo, à data do sinistro, o salário mínimo nacional, reformando-se, Novembro de 2016.
Sofreu incapacidade temporária absoluta desde a data do acidente até a data em que teve alta, num total de 147 dias.
Assim, demonstrado ficou que a autora sofreu prejuízos, prejuízos esses indemnizáveis a título de lucros cessantes.
Defende a apelante que o défice funcional não impedia a autora de continuar com a venda que tinha no mercado do Levante – venda de frutas e de legumes e que não foi apurado a perda concreta de ganho que a autora teve ou possa vir a resultar da incapacidade sofrida que lhe adveio do acidente.
Ora, tal como referido na 1ª instância, a venda de frutas e de legumes no mercado implica esforços diários consideráveis, tal como carregar e descarregar caixotes de frutas, legumes (hortículas), sacos de batatas com os pesos inerentes e não conseguindo a autora esticar o braço esquerdo, dificuldade em levantar pesos, dores permanentes
e que se agravam com a realização de esforços (facto 11), está bem de ver, que tal é incompatível com a sua actividade profissional.
No entanto, não se pode afiançar que durante o período que medeou entre as datas indicadas, Abril de 2011 a Junho de 2014, a autora tivesse, na verdade, facturado o valor mensal de € 485,00, sendo certo que a autora teve que desistir da venda, por virtude das sequelas com que ficou.
Estamos no domínio das hipóteses – quod era demonstrandum -, nos “ses”/conjecturas que podem ou não ter lugar, as variáveis e imponderáveis, são muitas e diversas.
Não obstante, socorrendo-nos das premissas tidas em conta pela 1ª instância - perda de ganho, desde a data da alta (19/4/11) até à reforma (13/6/2014) - 38 meses - no valor de € 18.430,00, por referência ao salário mínimo nacional (€ 485,00) –, e fazendo apelo à equidade, mantemos o valor fixado.
Destarte, atento o explanado supra e os arts. citados soçobra a pretensão da apelante seguradora no que tange aos lucros cessantes.

b)Danos não patrimoniais

Sustenta a apelante que o valor atribuído aos danos morais é excessivo, devendo ser fixados em € 4.000,00, atento os factos provados.

Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, devendo o montante ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em conta, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494 – art. 496/1 e 3 CC.

Esta expressão, “em qualquer caso”, deve ser entendida no sentido de que, para o efeito de fixação do quantitativo dos danos não patrimoniais, deve atender-se às circunstâncias referidas no    art. 494, quer o agente tenha procedido com dolo ou com mera culpa.

As circunstâncias do art. 494 CC, que se refere à limitação da indemnização no caso de mera culpa – que estabelece que a indemnização pode ser fixada equitativamente em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados -, reportam-se ao grau de culpabilidade do agente, à sua situação económica, bem como a do lesado e às demais circunstâncias do caso que o justifiquem.

Esta limitação é restrita ao caso de mera culpa. Em caso de dolo a indemnização nunca pode ser inferior ao montante do dano por mais elevado que seja – cfr. Pereira Coelho, Obrigações – 122; Mota Pinto, Teoria geral, 3ª ed. - 116.

A ressarcibilidade dos danos não patrimoniais circunscreve-se aos danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (a apreciação deve ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada).

Não enunciando a lei os casos de danos não patrimoniais que justificam uma indemnização - “devem merecer, pela sua gravidade a tutela do direito” -, cabe ao tribunal, em cada caso, dizer se o dano é ou não merecedor da tutela jurídica.

O montante da indemnização destes danos deve ser sempre calculado segundo critérios de equidade, como referido supra e deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida - A. Varela, CC Anot. vol. I, 3º ed., Coimbra Ed.

Os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais – Ac. STJ de 26/5/77, in BMJ nº 273-140 segs.;  Vaz Serra, Reparação do dano não Patrimonial, nº 2, in BMJ nº 83.

O art. 496 CC estabelece um critério que consiste em que se conceda (compense) ao ofendido uma quantia em dinheiro considerada adequada a proporcionar-lhe alegria ou satisfação que de algum modo contrabalancem as dores, desilusões, desgostos ou outros sofrimentos (físicos ou psíquicos) que o ofensor lhe tenha provocado; assim, o tribunal, equitativamente, terá de fixar quais os danos relevantes e a indemnização que lhes corresponderá, de harmonia com as circunstâncias de cada caso, o que importará uma certa dificuldade de cálculo, com o inerente risco de nunca s estabelecer a indemnização rigorosa e precisa – cfr. Acs. STJ de 16/4/91, in BMJ nº 406-618 e de 26/2/91, in BMJ 404-424.

In casu, atentos os factos apurados, constata-se que a autora na sequência do atropelamento (choque) sofreu lesões, lesões estas que lhe causam e continuam a causar dores e sofrimento, ficou com sequelas que se repercutem na sua vida acarretando-lhe dificuldades várias que afectam o seu quotidiano (dormir, lavar-se, hobbie, levantar pesos) e uma incapacidade permanente de 5%.

Está bem de ver que toda esta situação, atento o supra enunciado cfr. factos provados), se traduz em danos, danos estes classificados como não patrimoniais, susceptíveis de ser indemnizáveis (danos que pela sua gravidade merecem a tutela do direito).

Tendo em atenção o relatado supra, fixa-se a indemnização, em € 4.000,00.

Destarte, procede a conclusão da apelante.

Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, consequentemente, revogando-se o segmento da sentença no que concerne ao montante relativo aos danos não patrimoniais, fixa-se a indemnização em € 4.000,00 (quatro mil euro), confirmando-se, no mais, a sentença.
Custas na proporção do decaimento.



Lisboa, 22-03-2018



(Carla Mendes)
(Octávia Viegas)
(Rui da Ponte Gomes)