Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
693/07-1
Relator: ANTÓNIO GONÇALVES
Descritores: INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/26/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: JULGADA IMPROCEDENTE
Sumário: 1. O regime legal respeitante à interrupção da prescrição, no que se refere à citação, está delineado no normativo ora citado e pode resumir-se assim:
- Se a citação for concretizada para além do prazo de cinco dias após ter ela sido requerida, considera-se interrompida a prescrição logo após o termo deste prazo de cinco dias, desde que a detectada omissão da citação não seja imputável ao requerente;
- Se o atraso da citação ocorre por culpa do requerente, o momento a atender é aquele em que a citação foi realmente realizada.
2. Deste modo, a fim de poder beneficiar do regime consagrado no n.º 2 do mencionado art.º 323.º, o autor somente tem de cumprir duas condições: i) requerer a citação do réu cinco dias antes do termo do prazo prescricional e ii) evitar que eventual retardamento da citação lhe seja imputável. Abílio Neto; C. P. Civil Anotado (art.º 323.º).
3. O exame a fazer sobre a conduta da parte no sentido de se saber se há, ou não há, culpa do demandante na efectivação da citação que se quer regular e atempadamente feita, há-de resultar da ponderação sobre o procedimento que ele tomou no sentido da concretização deste acto judicial, impondo-se-lhe para tanto uma actuação zelosa, expedita, desembaraçada, apropriada e adequada à sua fácil e célere ultimação, isto é, que pratique dentro do prazo de cinco dias todos os actos processuais indispensáveis à produção da citação.
4. Anote-se a este propósito que o juízo que neste contexto se tem de completar se circunscreve à prática do requerente na tramitação da acção onde se procura levar a cabo a desejada e necessária citação; as peripécias que porventura surjam fora do processo, mesmo que evidenciem de algum modo a causa da dificuldade de execução da citação, só poderão ser legitimamente aferidas no quadro de uma obstrução à consecução da citação tornada perceptível através da reacção observável da parte no processo.
5. Estes princípios que ora acabamos de enunciar não deixam de ter plena eficácia pela circunstância de o citando ter já falecido durante a pendência da causa ou mesmo que o seu decesso tenha ocorrido mesmo antes da propositura da acção.
Na verdade, a possibilidade de o autor poder accionar a parte que sabe ter já falecido é legalmente admitida (n.º 2 do art.º 371.º do C.P.Civil); e, sendo assim, porque ex vi legis se equiparam ambas estas situações processuais, não é de imputar ao embargado a culpa na demora da citação do demandado pelo facto de, só por isso, ter intentado a acção contra o executado que havia já falecido e era do seu conhecimento; é que os sucessores da parte falecida estão na acção a configurar a parte que pereceu e é nesta qualidade que foram habilitados para, em sua representação, prosseguirem na lide.
6. Quando dizemos que é o executado quem está em mora, nesta afirmação incluímos agora os habilitados que prosseguem na acção por morte de seu pai; na verdade, a habilitação decidida colocou as embargantes, sucessoras de seu pai, no lugar que o falecido seu progenitor ocupava no processo executivo; e, sendo assim, estamos conceptualmente perante apenas uma pessoa parte na acção, desta circunstância se inferindo que não é permitido fazer distinção entre elas e o seu pai como de duas dissemelhantes pessoas se tratasse.
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:


Andresa F..., Nilza E... e Verónica D..., representadas pela sua mãe Teresa A..., instauraram os presentes embargos de executado - processo n.º 686 -B/02/5.º Juízo Cível do T.J. da comarca de Guimarães - contra a “C.G.C.P.P., S.A.”, com sede em Lisboa, actualmente denominado de “Banco S... T..., S.A.”, alegando não ser da sua responsabilidade os juros peticionados que, de todo o modo, sempre estariam prescritos, nos termos do disposto no art.º 310º/ d), do Código Civil.

Contestou a embargada referindo que nunca lhe foi exibida a certidão de óbito do Arlindo A... e que “nada poderia comunicar à seguradora, nem tal comunicação lhe incumbia”, pelo que termina pugnando pela improcedência dos embargos.

Foi proferido despacho saneador e dispensada a elaboração da base instrutória.

Procedeu-se a julgamento e, a final, o Ex.mo Juiz proferiu sentença em que, julgando a acção parcialmente proce-dente, em consequência:
a) - Julgou procedentes os presentes embargos de executado deduzidos por Andresa F..., Nilza E... e Verónica D..., representadas pela sua mãe Teresa A...;
b) - Condenou os legais representantes da embargada “Banco S... T..., S.A.” como litigantes de má fé na multa de 15 (quinze) UC´s.

Inconformado com esta sentença dela recorreu o embargado/exequente “Banco S... T..., S.A.”, que alegou e concluiu do modo seguinte:
I. Em 17 de Setembro de 2002, a embargada intentou execução ordinária para pagamento de quantia certa contra Arlindo A....
II. Em 14 de Janeiro de 2003 a embargada requereu a habilitação de herdeiros de Arlindo A... tendo a citação das habilitadas e aqui embargantes sido efectuada, na pessoa de sua mãe, em 14 de Fevereiro de 2003.
III. As mesmas, apenas foram citadas para os termos da execução, também na pessoa de sua mãe, em 6 de Abril de 2006.
IV. A expressão “causa não imputável ao requerente" contida no n.º 2 do artigo 323° do Código Civil deve ser entendida em termos de causalidade objectiva, o que significa que a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objectivamente a lei em qualquer termo processual e até à verificação da citação.
V. Arlindo Araújo faleceu antes do exequente ter proposto a execução contra ele.
VI. "Se, em consequência das diligências para citação do réu, resultar certificado o falecimento deste, poder-se-á requerer a habilitação dos seus sucessores, em conformidade com o que nesta secção se dispõe, ainda que o óbito seja anterior á propositura da acção." -artigo 371° n.º 2 do C.P.C.
Analisando o incidente de habilitação, nada na lei prescreve que o requerente tenha de alegar e provar que não era conhecedor do falecimento do executado quando deu entrada em juízo da execução.
VII. Nenhuma responsabilidade incumbe ao exequente pelo facto de as habilitadas só terem sido citadas para os termos da execução, também na pessoa de sua mãe, em 6 de Abril de 2006, decorridos cerca de quatro anos após a entrada da petição em juízo e cerca de três anos após ser requerida efectuada a sua habilitação como sucessoras do falecido.
VIII. Ao fazê-lo e ao considerar procedentes os embargos a douta sentença violou o disposto no artigo 323.º do Código Civil e 371.º, n.º 2, do Código de Processos Civil.
IX. Incumbia às embargantes (representadas pela sua mãe) fornecer à Companhia de Seguros F... - M... S.A. (ou à embargada) a documentação necessária que comprovasse a causa e circunstâncias do óbito, para assim a companhia verificar se tal óbito se encontrava abrangido pelas Condições gerais, e em caso afirmativo, proceder ao pagamento do valor seguro, como, de facto veio a ocorrer.
X. Tal comunicação, como resulta da matéria provada, só veio a ocorrer por carta recepcionada na Companhia em 7 de Outubro de 2004 e que lhe foi enviada pelo 1. Mandatário da filha mais velha do falecido à qual foi anexada cópia dos Acórdãos referidos em 12. e 13.
XI. Tal atraso na comunicação (de Fevereiro de 2002 a 7 de Outubro de 2004), só pode ser imputável às embargantes.
XII. Ao decidir ao invés, ao considerar procedentes os embargos, a douta sentença, violou o correcto entendimento do disposto no artigo 804° n.° 2 do Código Civil.
XIII. Em 19 de Julho de 2000, a embargada enviou à Companhia de Seguros F... - M... S.A. uma carta de Alice D... a participar o falecimento de Arlindo A..., no mês de Abril.
XIV. Por lapso manifesto da embargada, alegou na contestação dos embargos que não tinha comunicado á Seguradora tal facto, situação pela qual desde logo se penitenciou e lamentou e que se entende face ao peso da máquina burocrática da embargada.
XV. Não houve da parte da Recorrente/Embargada qualquer actuação dolosa ou maliciosa, não houve da parte do recorrente/embargado qualquer intenção em omitir documentos ou ocultar os factos, nem da matéria de facto provada se pode concluir a má - fé da embargada.
XVI. A embargada, entendeu, que não tendo qualquer documentação que atestasse o óbito do falecido (certidão de óbito, habilitação de herdeiros) nem que confirmasse as causas e circunstâncias do óbito, tal comunicação e a respectiva documentação deveria ser feita pelas habilitadas (naturalmente representadas pela sua mãe).
XVII. Tal interpretação (que admite-se possa estar errada), não pressupõe uma lide dolosa ou de negligência grave, que tenha deduzido pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar.
XVIII. Somente a lide dolosa ou com negligência grave, pressupõe a má fé e não também a lide errada, se promovida por quem está honestamente convencido da razão.
XIX. Por tudo isto, ao ser condenada como litigante de má -fé, pensamos que houve um incorrecto entendimento do disposto no artigo 456° n.º 2 do Código de Processo Civil.
Termina pedindo que em que seja revogada a sentença recorrida.

Contra-alegaram as recorridas pedindo a manutenção do decidido.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

A sentença recorrida considerou assentes os factos seguintes:
1. Em 17 de Setembro de 2002, a embargada intentou execução ordinária para pagamento de quantia certa contra Arlindo A... com base no contrato de empréstimo n.º 562100425344 por este subscrito em 29 de Dezembro de 1999 (cfr. fls. 4 e seguintes dos autos de execução, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
2. Como garantia desse contrato, o Arlindo A... outorgou com a Companhia de Seguros F... - M..., S.A. um seguro de vida com a apólice n.º 9.700.596 - Adesão 31.173, com o capital seguro de Esc. 1.000.000$00, o qual garantia o pagamento dessa quantia à embargada em caso de morte do Arlindo A....
3. O Arlindo A... veio a falecer em hora e dia ignorado de Abril de 2000 (cfr. fls. 20 do apenso A.).
4. Do contrato referido em 1., o Arlindo A... pagou as três primeiras prestações, vencidas em 29 de Janeiro de 2000, 29 de Fevereiro de 2000 e 29 de Março de 2000, deixando de pagar a prestação vencida em 29 de Abril de 2000.
5. Em 13 de Outubro de 2004 a embargada recebeu da referida Companhia de Seguros uma indemnização no valor do capital seguro, ou seja, € 4.987,98, não tendo a Companhia de Seguros liquidado os juros e as despesas pelo atraso no pagamento.
6. Pelo menos em finais de Junho de 2000, esteve presente na agência da embargada em Maximinos, Braga, uma senhora que se intitulou ex-esposa do Arlindo A... e mãe de uma sua filha, a qual comunicou verbalmente a morte do Arlindo A... e solicitou informação verbal sobre a documentação necessária para reclamar o pagamento da indemnização junto da Companhia de Seguros, tendo a embargada prestado os esclarecimentos necessários.
7. Em 19 de Julho de 2000, a embargada enviou à Companhia de Seguros F... - M..., S.A. uma carta de Alice D... (cfr. fls. 35 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) a participar o falecimento de Arlindo A..., no mês de Abril - cfr. cópia junta a fls. 161 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
8. Em 4 de Dezembro de 2002, a embargada foi notificada, no âmbito dos autos de execução, da certidão negativa de citação na qual consta menção de que o Arlindo A... havia falecido “há cerca de dois anos” (cfr. fls. 22, 23 e 24 dos autos de execução em apenso).
9. Em 14 de Janeiro de 2003, a embargada requereu a habilitação de herdeiros de Arlindo A... tendo a citação das habilitadas e aqui embargantes sido efectuada, na pessoa de sua mãe, em 14 de Fevereiro de 2003 (cfr. fls. 33 do apenso A) e tendo as mesmas sido citadas para os termos da execução, também na pessoa de sua mãe, em 6 de Abril de 2006 (cfr. fls. 188 dos autos de execução).
10. A Companhia de Seguros Fidelidade Mundial prestou no processo 186/2001 da Vara Mista da Comarca de Braga as informações constantes das missivas cujas cópias foram juntas a fls. 11, 33 e 34 (e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
11. No dia 30 de Maio de 2000, no 2.º Cartório Notarial de Braga, Rosa A..., Ana G... e Helena P... declararam que, “em dia ignorado do mês de Abril (...), faleceu Arlindo A... (...) no estado de divorciado e sem qualquer disposição de última vontade, tendo deixado por suas herdeiras, as seguintes quatro filhas, todas menores: Cátia V... (...) Andresa F... (...), Nilza E... (...) Verónica D... (...)”.
12. No 1º Juízo do Tribunal Judicial de Vila Verde correu termos o processo comum colectivo n.º 24/00.8GCVVD em que foi arguida Teresa A... onde foi proferido douto Acórdão de 8 de Junho de 2001 onde se julgou como provado que a referida arguida “em local ermo e com declive montanhoso, estando o veículo direccionado para fora da estrada, ateou-lhe fogo e fez com que o mesmo se precipitasse na encosta, com o Arlindo no seu interior (...). Em consequência da acção das chamas a que foi exposto, o Arlindo sofreu intoxicação por monóxido de carbono com os ferimentos (...) o que tudo foi causa directa e adequada da sua morte”.
13. A referida decisão veio a ser confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27 e Fevereiro de 2002, entretanto já transitado em julgado.
14. No aludido processo judicial a abertura de instrução deixou de poder ser requerida no dia 9 de Maio de 2001 e não houve fase de instrução (cfr. ofício de fls. 184).
15. A Companhia de Seguros F... - M..., S.A. procedeu ao pagamento do capital referido em 5. naquela data por ter tido conhecimento das circunstâncias em que ocorreu a morte do Arlindo A... por carta recepcionada em 7 de Outubro de 2004 e que lhe foi enviada pelo 1. Mandatário da filha mais velha do falecido à qual foi anexada cópia dos Acórdãos referidos em 12. e 13..

Passemos agora à análise das censuras feitas à decisão recorrida nas conclusões do recurso, considerando que é por aquelas que se afere da delimitação objectiva deste (artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, do C.P.C.).

As questões postas no recurso são as de saber:
- Se, nos termos do disposto no art.º 310º, alínea d), do Código Civil, está prescrita a obrigação do pagamento de juros abrangidos pela execução;
- Se existe mora “debitoris” que fundamente a execução quanto aos juros;
- Se o Banco embargado merece a punição prevista no art.º 456.º do C.P.Civil.

I. A prescrição, que tem o seu fundamento específico na situação antijurídica de negligência, Aníbal de Castro; A caducidade; pág. 28. interrompe-se, nos termos do estatuído no artigo 323.º, n.º 1, do Código Civil, pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence, equiparando-se à citação ou notificação para efeito de interrupção da prescrição qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito é exercido (artigo 323.º, n.º 4, do Código Civil).
Quer isto dizer que a inutilização de todo o tempo decorrido anteriormente e o começo do curso de um novo prazo (art. 326º, n.º 1, do Código Civil) está dependente da prática pelo credor de actos judiciais que, directa ou indirectamente, levem ao conhecimento do devedor a intenção de exercer o seu direito, salientando-se que a interrupção não resulta, todavia, de aqueles actos judiciais (citação ou notificação ou outro) ocorrer no processo em que se pretende exercer o direito, podendo eles ocorrer noutro processo em que as partes tenham vindo a exercer esta sua prerrogativa legal.
A interrupção do prazo de prescrição de um direito está, por conseguinte, subordinada à prática pelo credor, em qualquer especificado processo, de particularizado acto acomodado a exprimir a intenção de exercer o seu direito e deste modo comunicado ao devedor.
Sublinhe-se também que, de uma forma geral, a interrupção da prescrição tão-só se circunscreve ao direito que através desse acto judicial se faz enunciar e apenas é eficaz no contexto de quem expressa a intenção de exercer esse direito e relativamente a quem obtém a recepção dessa descrita intenção.

II. Neste enquadramento legal dispõe ainda o n.º 2 do artigo 323.º do Código Civil que “se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias”.

O regime legal respeitante à interrupção da prescrição, no que se refere à citação, está delineado no normativo ora citado e pode resumir-se assim:
1. Se a citação for concretizada para além do prazo de cinco dias após ter ela sido requerida, considera-se interrompida a prescrição logo após o termo deste prazo de cinco dias, desde que a detectada omissão da citação não seja imputável ao requerente;
2. Se o atraso da citação ocorre por culpa do requerente, o momento a atender é aquele em que a citação foi realmente realizada.
Deste modo, a fim de poder beneficiar do regime consagrado no n.º 2 do mencionado art.º 323.º, o autor somente tem de cumprir duas condições: i) requerer a citação do réu cinco dias antes do termo do prazo prescricional e ii) evitar que eventual retardamento da citação lhe seja imputável. Abílio Neto; C. P. Civil Anotado (art.º 323.º).
O exame a fazer sobre a conduta da parte no sentido de se saber se há, ou não há, culpa do demandante na efectivação da citação que se quer regular e atempadamente feita, há-de resultar da ponderação sobre o procedimento que ele tomou no sentido da concretização deste acto judicial, impondo-se-lhe para tanto uma actuação zelosa, expedita, desembaraçada, apropriada e adequada à sua fácil e célere ultimação, isto é, que pratique dentro do prazo de cinco dias todos os actos processuais indispensáveis à produção da citação.
Anote-se a este propósito que o juízo que neste contexto se tem de completar se circunscreve à prática do requerente na tramitação da acção onde se procura levar a cabo a desejada e necessária citação; as peripécias que porventura surjam fora do processo, mesmo que evidenciem de algum modo a causa da dificuldade de execução da citação, só poderão ser legitimamente aferidas no quadro de uma obstrução à consecução da citação tornada perceptível através da reacção observável da parte no processo.
Decorre claramente do preceituado no art.º 323.º do C.Civil que não basta o exercício extrajudicial do direito para interromper a prescrição: é necessária a prática de actos judiciais que, directa ou indirectamente, dêem a conhecer ao devedor a intenção de o credor exercer a sua pretensão. Pires de Lima e A. Varela; C. P. Civil Anotado; I; pág. 269.

Estes princípios que ora acabamos de enunciar não deixam de ter plena eficácia pela circunstância de o citando ter já falecido durante a pendência da causa ou mesmo que o seu decesso tenha ocorrido mesmo antes da propositura da acção.
Na verdade, a possibilidade de o autor poder accionar a parte que sabe ter já falecido é legalmente admitida (n.º 2 do art.º 371.º do C.P.Civil); e, sendo assim, porque ex vi legis se equiparam ambas estas situações processuais, não é de imputar ao Banco embargado a culpa na demora da citação do demandado pelo facto de, só por isso, ter intentado a acção contra o executado Arlindo A... que havia já falecido e era do seu conhecimento - é absolutamente indiferente que o autor, ao apresentar em juízo a petição, ignorasse o falecimento do réu, ou tivesse conhecimento do facto. Prof. Alberto dos Reis; Código de Processo Civil Anotado; I; pág. 577.
É que os sucessores da parte falecida estão na acção a configurar a parte que pereceu e é nesta qualidade que foram habilitados para, em sua representação, prosseguirem na lide - a habilitação destina-se, pois, a colocar o sucessor ou sucessores do falecido no lugar que este ocupava no processo, Anselmo de Castro; Direito Processual Civil Declaratório; II; pág. 149. sendo função da habilitação incidental colocar o sucessor no lugar que o falecido ou transmitente ocupava em processo pendente. Prof. Alberto dos Reis; Código de Processo Civil Anotado; I; pág. 573/574.
Não podem, assim, aproveitar às embargantes as inusitadas vicissitudes por que passaram após a morte em condições trágicas do seu pai - o executado Arlindo A... - pois que é em sua representação que estão habilitadas na acção para continuarem na lide e também são elas que, embora representadas pela sua mãe, estão habilitadas na demanda.
Assim, os efeitos relativos à interrupção da prescrição pelo decurso de cinco dias desde a propositura da acção, que se produziram em relação àquele contra quem a acção foi proposta, transferiram-se, nos termos dos preceitos citados, àquelas que, como suas sucessoras, vieram ocupar no processo a respectiva posição. Ac. STJ de 23.01.1992; BMJ; 413.º; pág. 462.
Tendo a presente execução dado entrada em juízo em 17 de Setembro de 2002 e ocorrendo a interrupção da prescrição logo após o decurso do prazo de cinco dias a partir desta data (17/09/2002), segue-se que, conforme procurámos demonstrar, não se mostram prescritos os juros vencidos desde 30 de Abril de 2000 até 6 de Abril de 2001.

III. Nas obrigações pecuniárias a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (art.º 806.º, n.º 1, do C.Civil).
Tendo o executado Arlindo A... pago apenas as três primeiras prestações vencidas em 29/01/2000, 29/02/2000 e 29/03/2000 e deixando de pagar as restantes obrigações vencidas a partir de 29 de Abril de 2000, assumidas no contrato de empréstimo n.º 562100425344 por ele subscrito em 29 de Dezembro de 1999, o executado ficou a partir deste momento em mora no que concerne ao pagamento das prestações que deixou de satisfazer a partir de tal data.
E o constatado atraso no pagamento da prestação pecuniária, porque tem de se imputar ao devedor (art.º 804º, n.º 2 do Código Civil) - a mora do devedor extingue-se se o devedor faz ou oferece ao credor adequadamente a prestação devida com os acréscimos derivados da mora ou quando o credor renunciar aos efeitos desta Vaz Serra; RLJ, 111.º-207; Almeida Costa; Obrigações; 3., pág. 782. - e porque a “Companhia de Seguros F... - M..., S.A.” não satisfez ao Banco embargado os juros e as despesas pelo atraso no pagamento, constitui o credor/exequente no direito de ser ressarcido pela demora havida no seu cumprimento.
Quando dizemos que é o executado Arlindo A... quem está em mora, nesta afirmação incluímos agora as embargantes/recorrentes Andresa F..., Nilza E... e Verónica D..., tudo porque, em consequência de terem sido habilitadas a prosseguirem na acção por morte de seu pai, elas estão na demanda em representação do executado Arlindo A.... Não estamos em presença de diferenciadas personalidades, mas sim estamos jurídico-processualmente perante a mesma pessoa, parte na acção.
Na verdade, a habilitação decidida colocou as embargantes, sucessoras de seu pai, no lugar que o falecido seu progenitor ocupava no processo executivo; e, sendo assim, estamos conceptualmente perante apenas uma pessoa parte na acção, desta circunstância se inferindo que não é permitido fazer distinção entre elas e o seu pai como de duas dissemelhantes pessoas se tratasse.
Estas mesmas considerações valem, “mutatis mutandis”, para se concluir que as embargantes e a sua mãe Teresa A... que as representa em juízo, não são diferentes pessoas adjectivamente colocadas e, desta forma, é insusceptível de se diferençar o seu relacionamento comportamental em relação ao exequente como se em face de duas diversas entidades estejamos. Não poderemos acompanhar a sentença recorrida quando assevera que o alegado atraso no pagamento do capital mutuado não é claramente imputável às embargantes que, obviamente e até por serem menores, desconheciam as causas da infeliz morte do seu pai.
Os embargos não poderão, assim, proceder.

IV. Os pressupostos de condenação da parte como litigante de má fé estão enunciados no artigo 456.º, do C.P.C, havendo a destacar que só aos comportamentos praticados com dolo ou negligência grave se lhes pode assacar a cominação deste preceito legal.
A doutrina distingue entre má fé material - quando a parte deduz pedido ou oposição cuja falta de fundamento conhece, altera conscientemente a verdade dos factos ou omite factos essenciais e má fé instrumental - se a parte faz uso reprovável do processo ou dos meios processuais para conseguir um fim ilegal, entorpecer a justiça ou impedir a descoberta da verdade. Ac. S.T.J. de 05/12/1975; BMJ; 252.º; pág. 105.
Dentro desta linha de pensamento, exigindo-se a consciência de não ter razão ou de não poder ignorar a sua falta de fundamento, não é subsumível àquele normativo (art.º 456.º, do Cód. Civil) o comportamento da parte que, embora sem razão, defende convictamente a sua posição jurídico-processual.Ac. do S.T.J. de 20/07/1982; BMJ; 319.º; 301.
Não detectamos na acção do recorrente alguma atitude a merecer a censura cominada pelo artigo 456.º, do C.P.C.

Pelo exposto, revoga-se a sentença recorrida e, em consequência, julgam-se improcedentes os presentes embargos de executado.

Custas pelas recorridas.

Guimarães, 26 de Abril de 2007.