Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
| ||
Relator: | ANTERO VEIGA | ||
Descritores: | ADMINISTRADOR EMBARGOS | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 10/25/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Sumário: | - O pedido de rectificação da sentença não é meio próprio para atacar a sentença que decreta a insolvência, na parte em que nos termos do artº 36º, al. c) do CIRE, refere os administradores do devedor e lhes fixa residência. - O administrador do devedor referenciado na sentença que decreta a insolvência nos termos do artº 36º, al. c) do CIRE, pretendendo contestar tal qualidade, deve deduzir oposição por embargos nos termos do artigo 40º do CIRE, aplicado por analogia, alegando a respectiva factualidade e indicando e solicitando a produção das pertinentes provas. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães. Neste recurso de agravo é recorrente Nuno e Carlos..., e recorrida a massa insolvente de …Vestuário S.A.. O agravante, notificado da decisão que decretou a situação de insolvência da requerida, proferida a 14/3/07, na qual, sendo considerado administrador lhe foi fixada residência, veio por requerimento de 3/4/07 informar que pelo menos desde Novembro de 2006 deixou de ser administrador. Pede a correcção da sentença dando-se sem efeito a referência feita ao requerente como administrador e presidente do concelho de administração. Para prova juntou os documentos juntos a fls. 290 e 291 (68 e 69 destes autos), os quais nenhuma cópia ou referência existia nos autos anteriormente. Não juntou nem indicou outras provas. Foram notificados para se pronunciarem o administrador da insolvência e os restantes administradores da sociedade insolvente. O primeiro declarou que, não obstante a documentação fornecida pelo signatário do requerimento em apreço, este deveria ter diligenciado pelo registo da renúncia ao cargo de administrador da insolvente. Os segundos impugnaram parte dos factos alegados e os documentos n.° 1, 2 e 4, mais arguindo a falsidade do documento junto sob o n.° 3, na parte em que refere um acordo para cessação de funções do presidente do conselho de administração o qual, a existir, seria ineficaz, porquanto o órgão competente seria a assembleia geral. Não juntaram qualquer prova. Por despacho de 27/4/07 foi indeferido o requerido, nos termos constantes do despacho de fls. 53ss., fundamentando-se designadamente no seguinte: “… Sucede que, por força do disposto nos artigos 3°, al. m), e 15°, do Código do Registo Comercial (CRC), a cessação de funções dos membros dos órgãos de administração das sociedades comerciais por qualquer causa que não seja o decurso do tempo, incluindo a renúncia, está sujeita a registo obrigatório. Não sendo efectuado esse registo, o acto será eficaz entre as partes, mas não é oponível a terceiros, nos termos previstos nos artigos 13° e 14° do mesmo código….” Inconformado com o despacho deduziu o requerente o presente agravo. Conclusões do agravo: A) Muito antes da apresentação do pedido de insolvência da … Vestuário S.A., e evidentemente, da própria decretação da insolvência, o requerente deixara de ser administrador e presidente do conselho de administração desta. O Mmº Juiz sustentou o despacho agravado referindo sucintamente que; À data da sentença não estava comprovado que o requerente não fosse administrador da insolvente. Não é por efeito da rectificação da sentença que se apreciam novos meios de prova. Era sobre o recorrente que impendia o ónus de promover o registo da sua renúncia. Sem registo o acto não será eficaz em relação a todos os que nele não participaram. Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso. * A factualidade com interesse é a que resulta do relatório precedente. Conhecendo do recurso: A questão colocada prende-se com saber se em face dos documentos juntos pelo recorrente a sentença que decretou a insolvência deveria ser rectificada (o requerente pede a correcção da sentença), retirando-lhe a menção ao agravante como administrador da insolvente. Posta a questão nestes termos é óbvia a improcedência do recurso. Podem ser objecto de rectificação nos termos do artigo 667 do CPC as omissões ou lapsos manifestos. Apenas se enquadra em vício corrigível o erro material - o julgador escreveu coisa diversa do que pretendia -. Não é o caso dos autos. À data da prolação da sentença nenhuma informação existia nos autos no sentido de que questionar a qualidade de administrador do recorrente. O meio utilizado foi impróprio. Isto porque o indicado administrador (referenciado na petição inicial nos termos do artigo 23, 2, b) do CIRE), não tem intervenção enquanto visada a sua qualidade de administrador, até à prolação da sentença que decreta a insolvência e mediante a qual vê invadida a sua esfera pessoa – fixação de residência, com a inerente obrigação de a respeitar -. Limita-se assim a possibilidade de livremente mudar de residência (conquanto continue a poder fazê-lo, solicitando-o no processo). Têm-se em vista com a medida manter o visado contactável pelo tribunal. Resulta tal falta de intervenção (e contraditório) dos artigos 28 do CIRE (sendo requerente a devedora é logo declarada a insolvência), e 29 e 30 do mesmo diploma (requerida por outrem, a tramitação subsequente e até decisão, processa-se exclusivamente entre o requerente e o/a devedor(a)). A indicação dos administradores, aos quais é fixada residência conforme artigo 36, al. c) do CIRE, é efectuada sem contraditório por parte destes. E assim é porque normalmente a indicação efectuada no requerimento inicial corresponderá à realidade. Não prevê o CIRE meio de reacção ao administrador que pretenda contestar essa qualidade. Talvez por se tratar de uma nova consequência do decretamento da insolvência – inexistia no artigo 128 do CPEREF -. Visando a reapreciação das provas tendo em vista a modificação da decisão, prevê o artigo 40º: Oposição de embargos 1 - Podem opor embargos à sentença declaratória da insolvência: a) O devedor em situação de revelia absoluta, se não tiver sido pessoalmente citado; … e) Os responsáveis legais pelas dívidas do insolvente; f) Os sócios, associados ou membros do devedor. 2 - Os embargos devem ser deduzidos dentro dos 5 dias subsequentes à notificação da sentença ao embargante ou ao fim da dilação aplicável, e apenas são admissíveis desde que o embargante alegue factos ou requeira meios de prova que não tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência. --- A situação dos autos em boa verdade enquadra-se ou consiste na pretensão de ver reapreciada uma determinada factualidade (qualidade de administrador), em função de provas não tidas em conta pelo tribunal. Visa-se a alteração da decisão, não relativamente ao decretamento da insolvência mas sim quanto a um dos efeitos legais desta. Para o efeito juntou o recorrente a prova que entendeu pertinente. Abandonada a previsão que constava da al. e) do artigo 39, 1 do projecto do CIRE, nos termos da qual o poder de reagir contra a sentença por embargos se estendia “às pessoas efectiva ou potencialmente prejudicadas pela decisão” - (informação colhida em Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE anotado, Vol. I., Quid Yuris, pág. 209 em nota ao artigo 40) -, parece ficar sem protecção a pessoa que pretenda contestar a sua indicação como administrador da insolvente, pois de nenhuma utilidade se reveste a interposição de recurso, em virtude da necessidade de produzir prova. Mas tal consequência não é aceitável, dados os princípios constitucionais do direito de acesso à justiça e proibição da indefesa ( artigo 20 CRP - Sobre a proibição da indefesa, Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª Ed., pp. 163 e 164 ). Tal impossibilidade implicaria uma limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, acerca de questão que lhe diz respeito e o afecta. Assim, atento o disposto no artigo 10, nº 1 do CC., considerando que existe identidade substancial entre os fundamentos da norma do artigo 40 do CIRE e a situação omissa, é de aplicar aquele normativo analogicamente, no que respeita à legitimidade para deduzir oposição por embargos à sentença que decreta a situação de insolvência. Relativamente à circunstancia de no nº 2 do ref. artigo 40º, se referir que a oposição apenas é admissível nos casos em que se pretenda afastar os fundamentos da declaração de insolvência, a não se entender que os efeitos legais da declaração estão abrangidos no preceito (como parece não estarem), deve aplicar-se igualmente por analogia, sem os efeitos embora do nº 3 do normativo. No entanto, esta questão não foi colocada em primeira instância, sendo o requerimento apreciado nos termos em que foi deduzido – como pedido de correcção (rectificação da sentença) -. Como acima referido, a situação não se enquadra na rectificação, pois nada há a rectificar, nem no âmbito desta é possível produzir prova. Nenhum erro ocorreu que precise ser rectificado, sendo legitima a menção constante da sentença dado o facto de o requerente constar do registo comercial como administrador da insolvente e nos termos do artigo 11 do CRC o registo constitui presunção de que existe a situação jurídica nos precisos termos em que é definida. Improcede consequentemente o agravo. DECISÃO: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao agravo, confirmando-se a decisão recorrida. |