Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1247/06-1
Relator: FERNANDO MONTERROSO
Descritores: DEFENSOR
DEFENSOR OFICIOSO
SUBSTITUIÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/11/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO
Sumário: I – O art. 39 nº 1 da Lei 34/04 de 29-7 é taxativo no sentido de que: “a nomeação do defensor nomeado, a dispensa de patrocínio e a substituição são feiras nos termos do Código de Processo Penal e em conformidade com os artigos seguintes” .
II – Nos artigos «seguintes» ao 39 daquela Lei, apenas está prevista a cessação das funções do defensor por iniciativa do arguido no caso deste constituir mandatário - art. 43 n° 1.
III – Por sua vez, o art. 66 n° 3 do CPP estatui que “o tribunal pode sempre substituir o defensor nomeado, a requerimento do arguido, por justa causa”.
IV - O conceito de «justa causa» remete para a ponderação do caso concreto, pelo que para que seja formulado o juízo de que ela se verifica, é necessária a alegação de algum facto donde seja possível concluir que poderá estar em causa a eficácia da defesa, como serão os casos, por exemplo, de o defensor se mostrar desinteressado da defesa, ser inábil profissionalmente, ou ter uma relação de inimizade com o arguido.
V – Nada disso resulta dos motivos invocados pelos arguidos, pois que estes, simplesmente, preferem outro defensor, alegando que o advogado indicado é conhecido de longa data, tem com os arguidos uma estrita relação de confiança e acompanhou-os noutros processos em que foram intervenientes.
VI – Finalmente, a favor da sua pretensão, invocam a norma do art. 32 n° 3 da CRP, mas esta norma não impõe o deferimento da sua pretensão.
VII – Na verdade, se o arguido optar por constituir mandatário, são irrestritas as suas possibilidades de escolha, pois a todo o tempo, pode juntar procuração ou, depois, revogá-Ia, constituindo novo mandatário.
VIII – Para o caso de se socorrer da nomeação oficiosa, aquela norma da CRP não impede o legislador ordinário e estabelecer, dentro de limites razoáveis, o processo, o modo e o tempo em que deve ser feita a escolha, sendo que, por exemplo, os arguidos não alegaram que a Lei do apoio judiciário coloca restrições inadmissíveis à possibilidade de terem um defensor por si escolhido, pelo que, por outras palavras, o direito à escolha de defensor não implica a possibilidade de os arguidos, arbitrariamente, a todo o momento, independentemente de justa causa, decidirem a substituição do que já foi nomeado.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
No Processo de Inquérito 590/05.1GAFLG-A dos Serviços do Ministério Público de Felgueiras, os arguidos Maria A... e José D... requereram a substituição da defensora oficiosa nomeada, dra. Rute Rodrigues, pelo advogado dr. Carlos P....
O sr. juiz proferiu despacho a deferir a substituição requerida.
A magistrada do MP junto daquele tribunal interpôs recurso.
A questão a decidir no recurso é a de saber se existe fundamente legal que permita requerida substituição de defensor.
Não houve resposta ao recurso.
*

Nesta instância o sr. procurador geral adjunto emitiu parecer no sentido do recurso merecer provimento. Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


FUNDAMENTAÇÃO
Aquando da acusação, após indicação nesse sentido pela Ordem dos Advogados, a magistrada do MP nomeou a dra. Rute R.... defensora oficiosa dos arguidos.
Posteriormente, os arguidos requereram a substituição daquela defensora pelo dr. Carlos P..., invocando o seguinte:
- o advogado indicado é conhecido de longa data;
- tem com os arguidos uma estrita relação de confiança;
- acompanhou-os noutros processos em que foram intervenientes.
Finalmente, a favor da sua pretensão, invocam a norma do art. 32 nº 3 da CRP.

*
O despacho recorrido e a motivação do recurso distraem-se na questão de saber se na nomeação da defensora dra. Rute R... foram observadas todas as regras previstas na Lei 34/04 de 29-6.
Mas a legalidade da nomeação daquela defensora nunca foi posta em causa pelos arguidos. Por isso, não pode agora tratar-se dela, conhecendo-se dos argumentos, num e noutro sentido, do despacho recorrido e da motivação do recurso. Nos direitos processuais existe o princípio da preclusão, segundo o qual o processo tem ciclos, mais ou menos rígidos, dentro dos quais os actos devem ser praticados e as questões suscitadas.
Repete-se: o que os arguidos requereram foi a substituição da defensora oficiosa com os fundamentos acima discriminados, sem questionarem se a nomeação havia sido correctamente feita. A questão a decidir é só a de saber os motivos invocados podem justificar a substituição.
A resposta é negativa.
O art. 39 nº 1 da Lei 34/04 de 29-7 é taxativo: “a nomeação do defensor nomeado, a dispensa de patrocínio e a substituição são feitas nos termos do Código de Processo Penal e em conformidade com os artigos seguintes”.
Nos artigos «seguintes» ao 39 daquela Lei, apenas está prevista a cessação das funções do defensor por iniciativa do arguido no caso deste constituir mandatário – art. 43 nº 1.
Por sua vez, o art. 66 nº 3 do CPP estatui que “o tribunal pode sempre substituir o defensor nomeado, a requerimento do arguido, por justa causa”. O conceito de «justa causa» remete para a ponderação do caso concreto. Para que seja formulado o juízo de que ela se verifica, é necessária a alegação de algum facto donde seja possível concluir que poderá estar em causa a eficácia da defesa. Serão os casos, por exemplo, de o defensor se mostrar desinteressado da defesa, ser inábil profissionalmente, ou ter uma relação de inimizade com o arguido.
Nada disso resulta dos motivos invocados pelos arguidos. Estes, simplesmente, preferem outro defensor.
Finalmente, invocaram os arguidos a norma do art. 32 nº 3 da CRP: “o arguido tem direito a escolher defensor…”.
Esta norma não impõe o deferimento da pretensão.
Se o arguido optar por constituir mandatário, são irrestritas as suas possibilidades de escolha. A todo o tempo, pode juntar procuração ou, depois, revogá-la, constituindo novo mandatário.
Para o caso de se socorrer da nomeação oficiosa, aquela norma da CRP não impede o legislador ordinário de estabelecer, dentro de limites razoáveis, o processo, o modo e o tempo em que deve ser feita a escolha. Os arguidos não alegaram, por exemplo, que a Lei do apoio judiciário coloca restrições inadmissíveis à possibilidade de terem um defensor por si escolhido. Por outras palavras, o direito à escolha de defensor não implica a possibilidade de os arguidos, arbitrariamente, a todo o momento, independentemente de justa causa, decidirem a substituição do que já foi nomeado.
Tem, pois, de ser concedido provimento ao recurso.

DECISÃO
Os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães, concedendo provimento ao recurso, revogam o despacho recorrido e, consequentemente, determinam que a anterior defensora, dra. Rute R..., mantenha as funções para que foi nomeada.
Sem custas.