Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2573/08-1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: CRÉDITO DOCUMENTÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/15/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: JULGADA PROCEDENTE
Sumário: I - A função económica do crédito documentário é garantir a satisfação do crédito resultante duma transacção, pese embora as vicissitudes que esta possa sofrer.
II - As entidades bancárias emitente e confirmadora apenas têm que se certificar da realidade do crédito.
III - O adquirente da mercadoria ao constituir um crédito irrevogável cumpriu a sua obrigação de pagamento, razão pela qual não pode vir invocar o cumprimento defeituoso ou incumprimento do outro contraente para não cumprir.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 2573/08-1
Apelação .
3º Juízo Cível de Guimarães.

I – A.., S A. instaurou procedimento cautelar contra B... e Banco... S.A, requerendo que se ordene a notificação deste último para não pagar nem autorizar o pagamento, até decisão final da acção principal que se irá intentar, o Crédito Documentário Irrevogável n.º CIL 5004168R, no valor de USD 41.421,81 (€ 28.566,76).

Foi dispensado o contraditório, e procedeu-se à inquirição de testemunhas.
Foi então proferida sentença na qual se decidiu:

Pelo exposto, o tribunal julga procedente o presente procedimento cautelar não especificado e, em consequência, determina que a 2ª Requerida Banco ... , não proceda ao pagamento, nem autorize o pagamento do crédito documentário irrevogável n.º CIL5004168R, no valor de USD 41.421,81, até decisão final da acção principal a propor pela requerente.
Para tal efeito, e atento o prazo de vencimento da carta de crédito, oficie-se via fax ao Banco.... , agência sita no......., nos termos ordenados”.

Inconformado, o requerido veio interpor recurso, cujas alegações de fls. 2 a 11, terminam com conclusões onde se colocam as seguintes questões:

O thema decidendum do presente recurso passa por analisar a susceptibilidade de um ordenante impedir o Banco emitente de proceder ao pagamento de um crédito irrevogável.
A recorrida e autora da providência aceitou, quando solicitou ao banco ora recorrente a emissão de crédito documentário, que o mesmo se regesse pelas Regras e Usos Uniformes relativos aos Créditos Documentários emitidos pela Câmara de Comércio Internacional.
As RUU estabelecem no seu artigo 4º a natureza autónoma de crédito documentário.
Não obstante o tribunal a quo decidiu o contrário, pois baseado no cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda de mercadoria subjacente ao contrato e crédito documentário irrevogável, ordenou o não pagamento deste crédito.
Da matéria de facto provada resulta que houve um cumprimento defeituoso do contrato subjacente ao crédito documentário o que não é suficiente para fundamentar o decretamento da providência cautelar.
A recusa de pagamento só pode ter por fundamento uma fraude nos documentos, ou quando muito uma fraude na transacção manifesta, ou seja, que implique necessariamente a destruição do contrato base.
Não se verifica fraude nos documentos, nem fraude na transacção. Os factos dados como provados, nomeadamente no ponto 28 demonstram que a mercadoria corresponde à constante do contrato, embora não apresente a capacidade de resistência à torção contratada.
Ficou por provar o elemento psicológico associado à fraude que se traduz na intenção de enganar a contra-parte.
Se quisesse enganar a recorrida a beneficiária do crédito teria enviado um tipo completamente diferente de mercadoria ou até não teria enviado mercadoria alguma, o que não foi o caso.
Não se verifica, assim, a ameaça de violação grave do direito da requerente da providência ora recorrida, prevista no art. 381º do CPC.
O decretamento da providência pode vir a implicar um prejuízo maior para o recorrente do que o dano que com ela a recorrida pretende evitar.
A recusa de pagamento ordenada pela Mmª Juíza a quo é nefasta para a imagem e credibilidade do recorrente a nível das suas relações internacionais com outros bancos.
O que representa um prejuízo relevante para o recorrente na medida em que lhe faz diminuir o rating que possui internacionalmente, e torna mais caro o recurso ao financiamento em bancos estrangeiros para poder exercer a sua actividade.
O artigo 406º do C. C. impõe o dever de cumprimento pontual dos contratos mas a decisão recorrida impede o banco ora recorrente de cumprir o contrato de abertura de crédito documentário irrevogável, nos termos estipulados.
Foi violado o disposto nos artigos 406º do C. Civil, e 3º, a), 9º, a) e 14º, a) das Regras Uniformes relativas aos Créditos Documentários elaboradas pela Câmara de Comércio Internacional (Publicação UCP 500).

A recorrida apresentou contra-alegações nas quais pugna pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

II - Nos termos dos artigos 684º, n.º 3 e 690º do n.º 1 do Código de Processo Civil, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do disposto na última parte do n.º 2 do artigo 660º do mesmo código.

Em 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto:

1º - A requerente é uma sociedade comercial, cuja actividade habitual consiste no comércio de fios têxteis e indústria de confecções, sendo que no âmbito desse exercício importa fio que revende a empresas nacionais ou confecciona nas suas instalações.
2º - Por seu turno, a 1ª Requerida é uma sociedade que, habitualmente e com intenção do lucro, exerce a actividade comercial de exportação de fios têxteis.
3º - No dia 11 de Março de 2008, a Requerente celebrou com a 1ª Requerida um contrato de compra e venda, com o n.º 599/HTD-LI/2008,
4º - por força do qual lhe adquiriu, e esta lhe vendeu, 19.000,00 Kgs de fio 100% algodão cardado 24/2 para tecelagem, Tpi 16, pelo preço de USD 2.68/Kg, no valor global de USD 50.920,00 (dólares americanos).
5º - Todas as negociações foram feitas através do Sr. .....
6º - A referida quantia seria paga pela Requerente A.. mediante a emissão de Carta de Crédito Documentário Irrevogável (L/C), pelo que no dia 25/03/2008 o Banco...., por solicitação da ora Requerente, emitiu o Crédito Documentário Irrevogável n.º CIL 5004168R, no dito valor.
7º - Tendo-se fixado o pagamento a 90 dias da data do B/L (Bill of Landing, ou seja, do conhecimento de embarque).
8º - Tendo-se ainda fixado como data limite para o embarque da mercadoria o dia 30/04/2008,
9º - e como data limite para a recepção dos documentos por parte do Banco .... o dia 21/05/2008, data a partir da qual o crédito expiraria.
10º - A 1ª Requerida, após ter a confirmação da emissão de Carta de Crédito Documentário Irrevogável (L/C) a seu favor, comunicou à Requerente que ia iniciar a produção da mercadoria objecto do contrato referido.
11º - E em 12 de Abril de 2008, a 1ª Requerida informou a Requerente que tinha procedido ao embarque do fio de algodão com as características, quantidades e condições contratadas.
12º - A Requerente foi então informada que se encontrava no Porto de Leixões um contentor proveniente do Vietname, expedido pela 1ª Requerida, e dirigido à Requerente.
13º - Tendo em conta que a viagem de um navio de carga, proveniente do Vietname com destino Portugal (porto de Leixões), dura mais de um mês, a Requerente imediatamente constatou que aquele contentor não podia conter a mercadoria contratada com a 1ª Requerida.
14º - Pelo que, solicitou esclarecimentos à 1ª Requerida, a qual afirmou tratar-se de um contentor destinado a um outro cliente seu, que não procedeu ao pagamento do respectivo preço e para evitar despesas de paralisação, a 1ª Requerida tinha procedido à transferência do dito contentor para a Requerente.
15º - A 1ª Requerida solicitou à Requerente que recebesse a mercadoria constante do mencionado contentor com o n.º ZCSU8701054, uma vez que se tratava de fio 100% algodão cardado 24/2 para tecelagem, Tpi 16, ou seja, exactamente com as mesmas características da mercadoria encomendada pela Requerente,
16º - sendo que a única diferença em relação ao contrato efectuado consistia na quantidade de mercadoria, que era inferior à inicialmente encomendada.
17º - Uma vez que as explicações da 1ª Requerida pareceram plausíveis à Requerente e tendo em conta que a mercadoria em questão era, segundo a 1ª Requerida, da mesma qualidade e características daquela que havia sido encomendada, apenas divergindo na quantidade,
18º - A Requerente impôs à 1ª Requerida a alteração do prazo do pagamento, o que a última aceitou, que passou a ser a 120 dias a contar da data do levantamento dos documentos, afim da Requerente verificar se as características da mercadoria existente no contentor em apreço e descritas nos sobreditos documentos coincidiam com as pretendidas pela Requerente.
19º - Dias volvidos, a Requerente recebeu da 2ª Requerida, Banco ....., a comunicação de que os documentos recebidos – entre os quais os docs. 4 e 5 - relativos à carta de crédito referida supra apresentavam algumas divergências com

as cláusulas nela estabelecidas.
20º - Na sequência de tal informação, a Requerente, a 23 de Maio de 2008, comunicou à 2ª Requerida que levantava as reservas sobre a carta de crédito, aceitando, portanto, as divergências da mesma, designadamente no que diz respeito à diferença de quantidade da mercadoria, no valor de USD 41.421,81, ou seja, 28.566,76€,
21º - com a condição do vencimento da carta de crédito ser a 120 dias da data do levantamento dos documentos,
22º - condição essa previamente acordada com a 1ª Requerida e
posteriormente confirmada entre a 2ª Requerida e o Banco Vietnamita.
23º - Logo que o fio adquirido – 15.422,40 Kgs de fio 100% algodão cardado 24/2 para tecelagem, Tpi 16 - começou a ser utilizado, quer pela Requerente quer pela sua cliente “C ..., Lda.”, foi notório que o mesmo não correspondia minimamente às características requeridas,
24º - pois que, o fio apresenta-se sem a resistência/torção necessária para o fim a que se destina: tecelagem.
25º - O fio parte quando colocado na máquina de urdir- urdideira, o que obriga à paragem da mesma máquina.
26º - Sendo certo que, o fio rebentava (e rebenta) sempre quando o tear começa a trabalhar,
27º - obrigando à paragem do tear.
28º - Isto porque o fio é do tipo TPI 13, 4,
29º - o que significa que tem uma torção/ resistência muito inferior, que inviabiliza totalmente o uso para o qual foi adquirido – tecelagem para confeccionar felpos.
30º - Assim que a " C..., Lda" começou a utilizar o fio em questão, de imediato exigiu da Requerente a sua substituição, mais a responsabilizando pelos defeitos do mesmo.
31º - De imediato, a Requerente, através do Sr. ....., informou a

1ª Requerida dos defeitos em causa e exigiu a sua substituição, mais a responsabilizando pelos defeitos da mesma mercadoria.
32º - Porém, apesar de contactada a 1ª Requerida e de lhe ter sido dado conta da situação, e de ter sido solicitada a sua presença nas instalações da Requerente A.. afim de ser efectuada uma vistoria urgente à respectiva mercadoria, a verdade é que até ao momento aquela não se mostrou disponível para tal…
33º - A Requerente solicitou ao laboratório do CITEVE (Centro tecnológico das indústrias têxtil e do vestuário de Portugal) uma perícia à mercadoria,
34º - vindo-se a concluir que o fio apresenta uma torção (TPI) de 13,4.
35º - Os factos relatados foram dados a conhecer à 1ª Requerida, tendo esta apresentado, durante o mês de Agosto, duas propostas para resolução do assunto, a saber:
1- Desconto de USD 15cents/Kg;
2- Levantamento da mercadoria nas instalações da Requerente, contra a entrega do respectivo preço, descontando o valor da mercadoria gasta.
36º - Tendo a Requerente comunicado à 1ª Requerida a sua opção pela segunda proposta e solicitado designação de data para o levantamento da mercadoria em questão, o qual era urgente face ao vencimento da carta de crédito em 23 de Setembro de 2008,
37º - a Requerente nunca mais teve notícias da 1ª Requerida.
38º - À 1.ª Requerida não é conhecido qualquer património que possa garantir o pagamento do crédito da Requerente.
40º - A 1ª Requerida tem sede e exerce actividade no Vietname.
**
Conforme resulta dos factos provados, e de acordo com as Regras e Usos Uniformes Relativos aos Créditos Documentários – RUU – emitidas pela Câmara Internacional de Comércio, regime a que as partes submeteram a operação, a recorrida acordou com a 1ª requerida o pagamento da mercadoria, através duma carta de crédito documentário irrevogável.

Estas regras foram alteradas pela Câmara de Comércio Internacional, tendo sido introduzido um artigo relativo a definições e outro sobre interpretações, alteração que entrou em vigor em 1 de Julho de 2007.
Uma das principais novidades da alteração, é a eliminação dos créditos revogáveis , e assim, após a entrada em vigor das novas regras (1/7/07), os créditos só podem ser irrevogáveis.

No caso, e apesar de se aplicar já o novo regime, atenta a data da transacção, essa questão não é relevante, uma vez que não sofre qualquer contestação que, no caso, se trata de um crédito documentário irrevogável.

E assim, o recorrente (face ao acordo estabelecido entre compradora e vendedora) comprometeu-se perante a recorrida a pagar a quantia referida nos autos, à 1ª requerida, mediante a entrega por esta de determinados documentos (no caso através de outro banco).
Nos créditos irrevogáveis o banco emitente – neste caso o recorrente – deve dar sequência à obrigação que assumiu, sejam quais forem as circunstâncias .
O banco – recorrente – com o envio e recepção da carta de crédito pelo beneficiário, assume uma obrigação perante este, a que não pode eximir-se unilateralmente.

No caso, e como resulta dos factos apurados, na operação existe a presença de um banco intermediário.
Como refere Menezes Cordeiro, em “Os Créditos Documentários”, na revista da Ordem dos Advogados, ano 67, disponível na internet no sítio da Ordem dos Advogados, “ o banqueiro assume perante o mandante e o beneficiário, a obrigação de executar o pagamento ou a negociação previstos no contrato”.

Subjacente ao contrato de emissão do crédito documentário, está um contrato de compra e venda entre a recorrida e a empresa Huthada Co LTD (1ª requerida), sendo o crédito documentário, a forma de pagamento do preço.

Dispõe o artigo 4º alínea a) das RUU que o compromisso de um banco de honrar, negociar ou executar qualquer obrigação ao abrigo do crédito não pode dar lugar a reclamações ou contestações por parte do ordenador que resultem do seu relacionamento com o banco emitente ou com o beneficiário”.
Mediante a cláusula de irrevogabilidade a obrigação do banco emitente perante o beneficiário autonomiza-se, tanto no que respeita às relações entre o banco e o ordenador, como às existentes entre o beneficiário e o próprio ordenador.

Deste modo, o crédito documentário irrevogável é totalmente independente do negócio base.
“O crédito documentário irrevogável funciona como uma verdadeira garantia, independente das vicissitudes ulteriores”, Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, Almedina, 1998, pág. 545
A função económica do crédito documentário é garantir a satisfação do crédito resultante duma transacção, pese embora as vicissitudes que esta possa sofrer.
A entidade emitente – no caso o recorrente – apenas tem que se certificar da realidade do crédito.
O pagamento só pode ocorrer contra a entrega de documentos conformes aos que constam na carta de crédito, e o banco tem o dever de os verificar em ordem a constatar se os mesmos são aparentemente conformes aos enumerados na carta de crédito, verificando formalmente a inexistência de irregularidades manifestas ou grosseiras.
“Do crédito irrevogável nasce uma obrigação autónoma e independente que o Banco deve cumprir mesmo que o ordenante entre em estado de impotência económica ou haja incumprimento defeituoso do contrato principal de compra e venda , salva a hipótese de fraude do beneficiário – Calvão da Silva, C.J, Acs do STJ, Ano II, t. 1, pág. 20; no mesmo sentido, Ac. do STJ de 10/11/05, disponível na internet em www.dgsi. pt ).

Como já se referiu, só no caso de fraude é que o banco pode recusar o cumprimento.
Da matéria de facto provada, resulta que apesar de ter sido contratado pela recorrida fio do tipo TPI 16, foi enviado fio do tipo TPI 13.
Em termos genéricos podemos dizer que se verifica um cumprimento defeituoso do contrato, uma vez que o fio não tem as características contratadas.
A nosso ver esse incumprimento do contrato não pode ser visto como uma fraude na transacção.

Conforme refere Carlos Costa Pina em “Créditos Documentários”, pág. 105, esta questão não é tratada no seio das RUU.
Refere o citado autor que “a fraude tem sempre que ver com os documentos apresentados e implica a existência da aparente conformidade com os termos do crédito (...). Para além disso implica ainda, da parte do banco em causa, o conhecimento de que, apesar da aparente conformidade sob ela se escondem factos que, se expressos imporiam que os documentos fossem rejeitados”.

Discute a doutrina se, basta o conhecimento da falta de sinceridade dos documentos ou se é ainda necessário um requisito subjectivo ligado à pessoa do apresentante dos documentos.
Seja qual for a posição que se opte, nas relações entre bancos, não pode o banco emitente recusar-se a cumprir a sua obrigação, com base na situação de fraude objectiva.
No caso em apreço, a providência cautelar baseou-se no cumprimento defeituoso da obrigação por parte da 1ª requerida, e não em qualquer outro fundamento, nem em qualquer facto praticado pelo recorrente (2ª requerido).

São pressupostos da providência cautelar não especificada:
Verosimilhança da existência do direito; fundado receio de que outrem lhe cause lesão grave e dificilmente reparável; adequação da providência a assegurar a efectividade do direito ameaçado; que o prejuízo resultante para o requerido não exceda consideravelmente o dano que com ela se pretende evitar; e que ao caso não caiba nenhuma das providências tipificadas.

Para ser decretada a providência contra o recorrente era necessário que se tivesse alegado e provado a fraude manifesta e abuso evidente por parte do beneficiário do crédito documentário irrevogável (neste sentido entre outros, Acs. desta Relação de 16/3/05, proferido no processo 81/05-1 e de 12/10/05, proferido no processo n.º 1596/05-2.
É que sendo a obrigação do banco autónoma e independente em relação à relação subjacente – contrato de compra e venda - não estão verificados, no caso, os pressupostos do artigo 381º do Código de Processo Civil.
E porque também a função económica do crédito documentário é a de garantir a satisfação do crédito resultante duma transacção, independentemente das vicissitudes que esta possa sofrer (Ac. do STJ de 27/4/06, disponível na internet em www.dgsi.pt).

Também não existem factos provados de onde se possa concluir que o prejuízo resultante da providência não excede o dano que com ela se pretende evitar.
Com efeito, o recorrente não foi ouvido, e a providência foi decretada sem a sua audição.
O juiz ao decretar uma providencia cautelar deve ponderar a gravidade dos factos que, com probabilidade, resultarão da lesão iminente na esfera jurídica do requerente, sem esquecer, porém, os danos que previsivelmente decorrerão do decretamento da providência.
Essa ponderação tem que ser feita em concreto. Ora, não foram ponderados em concreto os eventuais danos, que decorrem para o recorrente, não constando dos autos quaisquer factos nesse sentido, como exige o n.º 2 do artigo 387º do Código de Processo Civil.

Assim, e em síntese:
O crédito documentário irrevogável funciona como uma verdadeira garantia, independente das vicissitudes ulteriores.
As entidades bancárias emitente e confirmadora apenas têm que se certificar da realidade do crédito.
O adquirente da mercadoria ao constituir um crédito irrevogável cumpriu a sua obrigação de pagamento, razão pela qual não pode vir invocar o cumprimento defeituoso ou incumprimento do outro contraente para não cumprir.
**
III – Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação procedente e, em consequência revogam a sentença recorrida, julgando-se improcedente a providência cautelar.
Custas da providência e do recurso pela recorrida.
Guimarães, 15 de Janeiro de 2009