Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2488/07-2
Relator: GOUVEIA BARROS
Descritores: REDUÇÃO
DISPENSA
MULTA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/10/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I) Incumbe à parte que pratica o acto processual dentro dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo, diligenciar junto da secretaria pela entrega ou envio atempado da guia necessária ao pagamento da multa.
II) A redução ou dispensa da multa previstas no nº7 do artigo 145º do CPC apenas têm lugar no âmbito do nº5 do mesmo artigo e devem ser requeridas no momento da prática do acto.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

ISIDRO A. C. veio deduzir oposição à execução que contra si move a sociedade M.-Materiais de Construção, Lda, dizendo fazê-lo no 2º dia útil subsequente ao termo do prazo que lhe fora consignado para tal efeito e solicitando por isso o pagamento da multa legal respectiva.
Liquidada a multa e remetida em 27/7, p.p. a guia pertinente no valor de €384,00, o executado, depois de expirado o prazo para o pagamento da multa cuja liquidação ele próprio requerera, veio pedir dispensa do pagamento da multa ou a sua redução, porquanto considera o seu valor manifestamente desproporcionado.
Por despacho de fls 14 a 17 foi indeferida a mencionada pretensão e ordenado o desentranhamento da oposição oferecida.
Inconformado agravou o executado, oferecendo alegações que conclui do seguinte modo:
1) O executado foi citado da penhora e da execução que corria contra ele.
2) O executado deduziu a oposição no segundo dia útil após o decurso do prazo, enviando por correio registado, uma vez que o mandatário do executado tem morada profissional em Fafe e acção corre os seus termos no tribunal judicial de Vieira de Minho.
3) Na peça processual, o executado requereu que lhe fosse ordenado o pagamento da taxa de justiça acrescida de multa de dois dias, o que se deve entender a emissão das guias.
4) O seu pagamento imediato seria impossível, além de que não se pode interpretar restritivamente o conceito de imediação.
5) O recurso ao meio utilizado e constante dos autos, o envio por correio registado da oposição, não foi utilizado de forma dilatória, mas sim era o meio mais adequado às condicionantes geográficas.
6) Tendo requerido a emissão das guias para pagamento da multa e tendo em conta o meio utilizado, as referidas guias deveriam ser notificadas e enviadas para o executado, aliás o que foi pedido também por telefone para que as mesmas fossem emitidas por fax.
7) Não podemos, nem devemos limitar o exercício desse preceituado a um período de tempo curto e determinado, somente permitido pelo contacto pessoal.
8) No entanto, como se poderá colher dos autos, não houve por parte da secretaria do tribunal “a quo” qualquer notificação feita ao executado para o pagamento imediato da multa, nem mesmo por fax.
9) Entende-se que, dadas as circunstâncias geográficas, este seria o procedimento mais adequado, respeitando assim o princípio de igualdade consagrado no art°13° da Constituição da Republica Portuguesa, bem como o princípio da igualdade do acesso ao direito consagrado no art°20° da C.R.P..
10) O Tribunal “ a quo”, apesar do executado o ter requerido, não notificou nem emitiu as guias para pagamento da multa previsto no art°145º, n°5 C.P.C, foi notificado, isso sim, pelo tribunal “a quo” para pagar multa no dobro da taxa de justiça nos termos do art°145º, n°6 C.P.C., conforme se pode colher dos autos.
11) Atento ao art. 145º, n°7 do C.P.C., o executado, antes decorrer o tempo para o pagamento nos termos ordenados, veio requerer a dispensa ou redução da multa, alegando dificuldades económicas.
12) Mesmo assim, o Tribunal “a quo” entendeu que o executado não apresentou provas que comprovasse as dificuldades económicas, como se pode colher no despacho proferido em fls. 13 a 17 dos autos e,
13) Ordenou que, não tendo pago a multa, deve ser desentranhada a oposição e respectivos documentos, isso significa a não admissão da oposição, impedindo assim, sem em nosso entender ter violado qualquer preceito processual, o executado de se defender.
14) Ora, se é dada a possibilidade ao executado de requerer a redução ou dispensa da multa por dificuldades financeiras nos termos do disposto do 145º, n°7 do C.P.C, entende-se que o prazo para o pagamento da multa suspende, retomando o seu decurso após a notificação do despacho que indefere ou defere redução ou dispensa do pagamento da multa.
15) Seriam salvaguardados os direitos de defesa do executado no que concerne ao princípio constitucionalmente consagrado, o princípio de igualdade ao acesso ao direito, art. 20° da C.R.P, sendo inconstitucional, salvo melhor opinião, a decisão do tribunal “a quo”.
16) Devendo o tribunal de recurso anular a decisão proferida pelo tribunal “a quo” e ser dado ao recorrente/executado de pagar a multa nos termos do art°145 n°5 CPC e, se assim os Venerandos Desembargadores o não entenderem, o que não se acredita, deverá ser dada a oportunidade de pagar nos termos do art. 145º, nº 6 do CPC, para que não seja vedada a possibilidade ao executado de se defender, sendo notificado o Recorrente/executado das guias para o efeito, devendo manter-se nos autos a oposição, seguindo-se os demais trâmites.
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Não foi apresentada resposta à alegação.
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O Sr. juiz a quo manteve o despacho recorrido.
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Corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
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Fundamentação:
É princípio incontroverso do direito processual que os recursos apenas visam modificar as decisões impugnadas mediante o reexame das questões nelas equacionadas, mas não criar decisões sobre matéria nova.
Por isso – e ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que podem ser apreciadas no tribunal ad quem ainda que a decisão recorrida não cuide delas – os tribunais de recurso só podem apreciar sobre questões decididas nos tribunais hierarquicamente inferiores.
Como se colhe do requerimento de fls 10, no requerimento entrado em juízo no dia 11/9/07 (no dia subsequente ao termo do prazo para pagamento da multa liquidada pela secretaria) o recorrente veio pedir a dispensa de tal pagamento ou a respectiva redução, invocando para tal a sua desproporção e referindo, em discurso indirecto, “dificuldades de liquidez e manifesta carência económica” que o haviam impedido de liquidar a multa (no dia subsequente à apresentação da oposição, ou seja, em 10 de Julho anterior).
O Sr. juiz do processo, no despacho sob censura mas que reputamos modelar, analisou os fundamentos invocados à luz do quadro legal aplicável e indeferiu a pretensão, referindo, em síntese, que “nada foi alegado quanto à manifesta carência económica do executado, nem a mesma resulta dos autos”.
Compulsado o teor das conclusões, verifica-se que o recorrente sustenta que, tendo requerido o pagamento da multa com a apresentação da oposição, deveriam ter-lhe sido enviadas guias, só lhe sendo enviadas depois para o pagamento da multa, mas liquidada agora em harmonia com o disposto no nº6 do artigo 145º do CPC.
O recorrente, pelo punho do mesmo mandatário que subscreve as alegações, informara em 11/9/07 que não tinha podido pagar a multa no dia seguinte à apresentação da oposição “por dificuldades de liquidez e manifesta carência económica”, ancorando exactamente nessa circunstância a dedução do pedido cuja recusa está na génese deste agravo.
Diz-nos agora que não pagou a multa porque não lhe enviaram as guias!
Ora, independentemente do merecimento que a tese do recorrente possa ter, o certo é que essa questão não foi suscitada no tribunal a quo nem nele foi conferida a alegada solicitação das guias junto da secretaria, nem avaliada qualquer questão conexa com o processamento administrativo do pagamento da multa.
Neste contexto, nada tendo o despacho em crise decidido atinente a tal questão, vedado está também a este tribunal dela conhecer, pela razão acima enunciada.
Vejamos então se deverá mesmo assim sufragar-se o desentranhamento da oposição decidido pelo despacho impugnado.
Alega a propósito o recorrente que “se é dada a possibilidade ao executado de requerer a redução ou dispensa da multa por dificuldades financeiras (…) entende-se que o prazo para o pagamento da multa se suspende, retomando o seu decurso após a notificação do despacho que indefere ou defere a redução (…)”.
Temos por inquestionável o acerto de tal conclusão, sem que todavia daí derive a revogação pretendida pelo recorrente, pela seguinte ordem de razões:
I) Por um lado, o benefício pretendido tem natureza excepcional e assenta na consideração de circunstâncias que apontem no sentido de a falta de pagamento da multa se dever a lapso desculpável e se configure como manifestamente desproporcionado o montante a pagar em função da falta cometida ou represente um sacrifício desmesurado em função da manifesta carência económica do requerente.
Neste quadro é de todo injustificado estender a concessão de um benefício excepcional a alguém que requereu o pagamento da multa e não o efectua ou nem sequer formula esse requerimento, limitando-se a desrespeitar o prazo para a prática do acto e esperar que a secretaria se aperceba do facto.
Por isso subscrevemos o entendimento do acórdão da Relação de Lisboa de 25/6/98 (Silva Santos) de que “o mecanismo da redução ou dispensa de multa a que alude o nº 7 do artigo 145º do CPC, opera tão só no âmbito do nº5 e não tem aplicação às situações do nº6 do mesmo preceito legal.”
É que neste último, sublinha o mesmo aresto, estão previstos os casos em que a negligência da parte é mais acentuada e, por isso mesmo, “a sanção pecuniária é mais gravosa e não merece já compreensão”.
No limite, bem podia suceder que o requerente viesse praticar o acto apenas no 3º dia útil ou não pagasse a multa cuja liquidação solicitara, induzindo o agravamento da sanção para depois invocar a sua desproporção ou esgrimir a sua carência económica para prover ao pagamento.
No entanto, tendo o interessado requerido a redução/dispensa da multa (o que tem implícito que não requer a sua liquidação), a secretaria não pode proceder à notificação a que se refere o nº6, antes de haver decisão sobre tal pretensão (Ac. R. Lx, de 19/4/07, Fernando Estrela).
Por conseguinte, a tese do agravante só colhe relativamente a uma situação que in casu não se verifica.
II) Por outro lado, mesmo que não devesse ser como acaba de expor-se – o que se equaciona como mero raciocínio – não assistiria razão ao recorrente, pois há um lapso manifesto nos pressupostos em que ancora a sua tese, não sendo exacto que quando formulou o requerimento estivesse em curso qualquer prazo.
Com efeito, o prazo de pagamento da multa expirara em 10/9/07 e só no dia seguinte (11/9/07) o recorrente requereu a dispensa da multa.
Ou seja, mesmo que tivesse direito ao benefício – e não tem – o recorrente deixara esgotar o prazo de pagamento da multa cujo pagamento conferia eficácia à oposição que deduzira.
Consequentemente, a oposição fica sem efeito por virtude do não pagamento da multa, devendo todavia permanecer no processo a cuja autuação deu causa, possibilitando a compreensão do decidido e justificando os termos respectivos.
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Decisão:
Nos termos expostos, acorda-se em negar provimento ao agravo, confirmando-se o despacho no tocante à ineficácia da oposição deduzida que todavia deverá permanecer nos autos bem como a procuração e documento apensos por linha.
Custas pelo agravante.

Guimarães, 10 de Janeiro de 2008